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CRISE VENEZUELA | Venezuela: ingerência imperialista, mediação e ’desencontros’ em meio a uma aguda tensão política

Humberto ZavalaVenezuela | @1987_zavala

segunda-feira 23 de maio de 2016 | Edição do dia

Fotografia: O presidente da Comissão de Política Exterior do Parlamento venezuelano entrega ao secretário geral da OEA, Luis Almagro, o pedido formal de convocação da Carta Democrática Interamericana. EFE/LENIN NOLLY.

A vontade intervencionista de Almagro e da OEA na política nacional não aguentou dois pedidos da MUD [oposição de direita ao presidente Maduro], enquanto que Maduro busca servir-se da mediação da Unasur, e de ex-presidentes como Rodríguez Zapatero, para propiciar condições favoráveis em um eventual “diálogo político” com a direita.
Também na arena diplomática, governo e oposição disputam o controle da situação no tenso clima político nacional, marcado pela disputa política e institucional em torno ao referendo revogatório promovido pela direita, a negativa do governo a realizá-lo neste ano, e o auto-prorrogado “estado de exceção e emergência econômica” imposto pelo mesmo Maduro, com o apoio do TSJ.
Tudo isto enquanto os aumentos de preços, desabastecimento e inflação, golpeiam ainda mais a deteriorada capacidade de consumo das famílias trabalhadoras e populares, em meio à crise econômica.
MUD diz à OEA: “urgimos sua atuação”
A MUD não está sozinha, nem pela vontade de intervenção de organismos como a OEA, nem pela mediação interventora de ONGs como Human Right Watch (HRW), que por meio de seu diretor para as Américas, José Miguel Vivanco, pediu na segunda-feira passada à OEA que aplique a Carta Democrática contra o governo de Maduro, no mesmo dia e com o mesmo motivo da carta dirigida pela Assembleia Nacional.
O conteúdo desta (última) carta já se conheceu por meio de publicação na conta de Twitter de Luis Almagro na quinta-feira (19). Nela ele diz que “a situação na Venezuela é de uma deterioração sem precedentes, e de tal gravidade que nos últimos meses superou as possibilidades de resolução institucional exclusivamente interna” (!), além de “uma grave crise sanitária e alimentícia sem precedentes” e com a qual os parlamentares da MUD declararão “urgimos sua atuação (…) antes que seja tarde demais”.
Como já vínhamos dizendo, dentre os recursos manejados pela MUD para alavancar iniciativas de retomada do poder, está o de pressionar com a mediação do imperialismo e dos blocos de governos direitistas aliados na região.
Nestes marcos, a OEA, como organismo que desde sua fundação responde a uma política de arbitragem do imperialismo sobre os países membros da região, sem dissimular sua orientação política, intervencionista e ideológica, não desaproveita a oportunidade que lhe dão os representantes da MUD, para forçar o governo de Maduro. Ainda que Almagro diga cinicamente que está preocupado com o “aumento exponencial da violência e conflitividade que vive nosso país”, a verdade é que buscam aproveitá-la para submeter o governo nacional, e com sua demagogia democrática, buscam também aproveitar o descontentamento popular e encobrir seu programa profundamente antioperário, antipopular e reacionário.
O diálogo que a UNASUR e Zapatero buscam no país
Mas pra além da falação altissonante da Chanceler Rodríguez assegurando que o governo “não está nem estará sob o exame de ninguém”, ou do embaixador frente à OEA, Jorge Valero, pedindo a membros da OEA para “repreenderem Almagro” por suas “delirantes” declarações contra Maduro, o governo consegue despertar muito pouca convicção quando diz “defender a soberania”, e ao mesmo tempo, flerta com a mediação da Unasur pelas mãos dos ex-presidentes Leonel Fernández (República Dominicana), Martín Torrijos (Panamá), e Rodríguez Zapatero (Espanha).
Nesta semana a visita desta comissão de ex-presidentes e da Unasur acontece nos marcos de um novo pico no clima de tensões políticas e sociais, motivado – como dissemos acima – pelo processo de revogatório, a negativa até o momento do governo a realizá-lo e o auto-prorrogado “estado de exceção”, além das tensões diplomáticas entre o governo e a OEA, e a incerteza política e social que os recentes inícios de saques e protestos pela crise nos serviços de água e luz geram sobre os distintos fatores de poder, além da escassez de alimentos básicos.
Como foi escrito em uma recente nota “as FANB [Forças Armadas] estão no centro da cena” e todas as forças políticas que imperam voltam seus olhos a elas, seja buscando acelerar a transição a uma “mudança de governo” ou a uma nada descartável “saída negociada”, e até movimentos mais forçados que possam vir do interior castrense [do interior das Forças Armadas].
Neste sentido se explica que Zapatero diga querer “mover todos os atores” e pedir “a máxima colaboração dos representantes políticos da Venezuela e da comunidade internacional”, motivo pelo qual se reuniu na quinta-feira com líderes da oposição como Enrique Capriles (PJ) e Ramos Allup (AD), e também com figuras do chavismo como a Chanceler Rodríguez e o próprio presidente Maduro.
Em outro artigo adiantamos que o processo de referendo “poderia ser o terreno onde buscar ‘consensos’ (…) funcional à necessidade da ordem da classe dominante”e que em caso de habilitar-se mas para o próximo ano,“facilitaria tal entendimento” ficando aberta a pergunta “Prevalecerá uma saída deste tipo? (…) Nestas explosivas condições nada pode ser descartado”, mas ao mesmo tempo advertíamos que “uma ‘transição pactuada’ se apoiaria em aspectos bonapartistas do atual regime, aos quais a MUD estaria muito disposta a recorrer para seus próprios fins antipopulares e pró-imperialistas”.
A ALBA-TCP e sua impotência
Frente às declarações de Almagro contra Maduro também aconteceu o “automático” pronunciamento dos países que conformam a ALBA-TCP, que em apoio incondicional ao presidente Maduro chamaram “a unir-se frente a esta contínua ameaça contra a estabilidade democrática do país e da região”, como eles mesmos dizem.
Este último fato seria a chave do motivo de seu comunicado contra a OEA, em um momento em que a própria crise política e social do país encontra Maduro em seu momento mais crítico desde que assumiu a presidência, e este organismo das débeis burguesias nacionais da região teme perder outro país da aliança.
Na realidade, é o próprio projeto limitadamente nacionalista burguês dos países que conformam a ALBA-TCP e suas tímidas medidas econômicas e políticas que jamais levaram a questionar a fundo o imperialismo nem avançaram realmente para de uma verdadeira libertação nacional, pra além de políticas de negociatas, foi o que possibilitou o avanço da direita sobre a região sobre a qual se debruça o imperialismo, e entorpecer o caminho próprio da luta dos povos latino-americanos para uma verdadeira libertação.
A mesma atitude tímida está também no plano político mais recentemente, encontrando a ALBA-TCP impotente tanto para frear o golpe Institucional no Brasil como para lutar contra o mesmo uma vez consumado.
Não é só a direita da MUD que ameaça a soberania nacional com seus chamados à intervenção política pelas mãos do imperialismo; também o próprio projeto nacionalista do governo de Maduro se mostrou impotente para frear e combater o avanço do imperialismo e da direita na região, e seu crescente bonapartismo não faz mais que acelerar esta tendência, apesar de que o use como retórica para combater o imperialismo.
Para os trabalhadores, é de primeira importância ligar a luta contra a ingerência imperialista à luta por suas demandas fundamentais e um plano de emergência operária e popular de saída à crise, em uma clara aliança dos distintos setores operários e populares da cidade e do campo. Para isso é fundamental a total independência política e de classe, por isso uma vez mais insistimos, contra o “estado de exceção”, e também contra a direita reacionária, são os trabalhadores e o povo pobre os que podem abrir o caminho a uma saída progressiva para a crise nacional.

Tradução: Francisco Marques




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