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Editorial MRT | Enfrentar a ofensiva israelense contra a Palestina é indispensável para uma esquerda revolucionária hoje

Enquanto publicamos este editorial, a quantidade de mortos pelo massacre de Israel contra a Palestina já ultrapassa 10.000, com muitíssimas crianças. Em uma situação internacional marcada pela instabilidade da Guerra na Ucrânia e a disputa entre os Estados Unidos e a China, a situação palestina irrompe como retrato da sanha imperialista rechaçada por centenas de milhares ao redor do mundo, enquanto o presidente brasileiro, Lula, ocupa a presidência temporária no Conselho de Segurança da ONU e se absteve de nomear claramente o Estado sionista e Netanyahu como responsáveis pelo massacre criminoso contra os palestinos.

Marie CastañedaEstudante de Ciências Sociais na UFRN

quarta-feira 1º de novembro de 2023 | Edição do dia

Há mais de duas semanas, o Estado sionista de Israel, hoje com o ultra direitista Benjamin Netanyahu à frente, vem bombardeando a Faixa de Gaza, a Cisjordânia e também o sul do Líbano, no que configura um castigo coletivo histórico contra a população palestina. São inomináveis crimes de guerra perpetrados pelo Estado colonialista de Israel, com apoio do imperialismo norte-americano e europeu. Na manhã de ontem (30), após chocar o mundo bombardeando até mesmo hospitais, incluindo hospitais católicos, Israel bombardeou um campo de refugiados com seis toneladas de bombas despejadas em Jabalia, parte considerável de bombas estadunidenses. Sob a justificativa de supostamente matar uma liderança do Hamas, já estão confirmadas mais de 100 mortes neste ataque, e as perspectivas apontadas pelos médicos apresentam riscos de chegarem a 500 mortos. Para a CNN, um tenente-coronel das Forças Armadas israelenses descreveu isso como “parte da tragédia da guerra”, uma situação que ilustra o que significa este castigo coletivo do Estado de Israel contra o povo palestino. Nós não compartilhamos a estratégia do Hamas, que vai na contramão da unidade entre es trabalhadores, jovens e oprimides, e seu programa de um Estado teocrático burguês. Mas o enfrentamento à ofensiva militar israelense, combinado a um programa consequente para enfrentar o Estado sionista de Israel, é indispensável para uma esquerda revolucionária, como debateremos neste editorial.

Este ataque ao campo de refugiados de Jabalia é emblemático, já que se tratava do maior campo de refugiados em Gaza, onde a densidade populacional é superior à já elevada em toda a região. Trata-se de uma situação de precariedade e miséria profundas, provocada pelos métodos da colonização por meio da expansão dos assentamentos de colonos e ataques anteriores aos vividos agora na pequeníssima faixa de território que resta. A situação é tal que há poucos dias, em meio aos bombardeios, Israel deixou toda a Faixa de Gaza sem sinal de celular, nem luz, como continuidade da interrupção do fornecimento de energia, água, alimentação e medicamentos destas semanas e desde sábado. Além disso, Israel começa a fazer novas incursões terrestres no território palestino, com mais de mil soldados de infantaria e dezenas de tanques. A Unicef advertiu na última terça-feira que “Gaza se transformou em um cemitério para milhares de crianças.”

Mas, ao redor do mundo, a solidariedade se multiplica. Neste mesmo dia, centenas de milhares de manifestantes tomaram as ruas de Nova Iorque, Londres e também Paris e Berlim, onde o direito de manifestação está atacado por Macron e Scholz, que tentaram, mas não conseguiram, impedir a solidariedade internacional ao povo palestino, que também tomou as ruas da Turquia, Coreia do Sul, Indonésia, Tunísia, Itália, do Canadá e outras. No Estado Espanhol, estudantes universitários e secundaristas fizeram uma forte greve na última sexta-feira, denunciando o governo espanhol do PSOE e seus negócios com Israel. A esta solidariedade internacional se soma a corajosa solidariedade de judeus no território de Israel, com manifestações questionando o regime do ultradireitista Netanyahu e demonstrando um caminho de unidade que pode dar respostas.

A mídia burguesa segue seu papel criminoso contra o povo palestino, alardeando uma guerra contra Israel, justificando sua ofensiva militar como legítimo direito de defesa. Mas, não se trata de defesa nenhuma: estamos diante de mais um capítulo da ofensiva de limpeza étnica do povo palestino. O rechaço é tamanho a nível internacional que a propaganda imperialista também vem acompanhada de demagogia dos mandantes estatais. Em particular de Joe Biden, que em meio à escalada dos bombardeios e mortes israelenses anuncia ajuda humanitária combinada com reiterar que ‘Israel tem todo o direito de defender seus cidadãos do terrorismo e a responsabilidade de fazê-lo de uma forma consistente com as leis humanitárias internacionais que priorizam a proteção de civis’. Os bombardeios em Gaza, na Cisjordânia e no sul do Líbano são demonstração prática do que significa realmente este pronunciamento de Biden como representante do principal imperialismo mundial, defensor irredutível do Estado sionista de Israel, que se apressou em ir abraçar Netanyahu pessoalmente, logo no começo do conflito, ao passo que vetou qualquer tipo de medida de cessar fogo no Conselho de Segurança da ONU. Olaf Scholz, primeiro-ministro alemão, segue legitimando cada ataque israelense, alentando a defesa do “terrorismo” do Hamas. Os dados do castigo coletivo alentado internacionalmente pelas potências demonstram como é impossível tratar os dois lados como iguais.

Ainda assim, a demagogia de Biden revela o desespero do imperialismo estadunidense de maior instabilidade no Oriente Médio, com sua hegemonia decadente na disputa com a China e as repetidas intervenções militares fracassadas, com a retirada das tropas do Afeganistão como conjunção desta crise. A situação internacional veio marcada pelas incertezas de uma recuperação econômica precária após a pandemia do COVID 19 e a Guerra da Ucrânia, gerando altas da inflação e uma perspectiva mínima de crescimento do PIB mundial em no máximo 3% para 2023. O tensionamento crescente dos blocos entre os Estados Unidos e a China, que se expressa militarmente também na Guerra da Ucrânia, também está recheado de tensões em torno da ofensiva militar de Israel na Palestina, já que a aproximação que Israel vinha tendo com a Arábia Saudita pela via dos Estados Unidos encontra contratempos, combinado à anterior entrada do Egito, Irã, Etiópia, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos no bloco dos BRICS, dos quais o Irã apoiou a operação do Hamas, assim como fez a Síria. O Irã enviou mísseis contra Israel há duas semanas, e ontem, o Yemen declarou o envio de mísseis balísticos e de cruzeiro.

Estas disputas interestatais não são qualquer alternativa para o povo palestino que segue sendo massacrado. É necessário erguer uma gigantesca campanha de solidariedade internacional, exigindo o fim imediato de toda ofensiva militar de Israel, o fim do cerco e das sanções e a liberação imediata dos presos palestinos. Assim como denunciar a grande mídia que esconde esses atos e aplaude a carnificina do imperialismo e de Israel e taxa os palestinos de “terroristas”, assim como toda a expansão colonial de Israel sobre o território palestino com seus assentamentos há 76 anos. É necessário derrubar as sanções econômicas e medidas de castigo coletivo, impedir toda ajuda financeira e militar dos Estados Unidos a Israel e impor a ruptura de todos os acordos políticos e militares com Israel. Estas medidas só podem ser arrancadas pela luta de classes. Por isso nós da Fração Trotskista pela IV Internacional, organização da qual o MRT é parte, somos linha de frente de convocar as manifestações atropelando as proibições como na França e na Alemanha, impulsionando comitês de solidariedade ao povo palestino no Estado Espanhol, enfrentando o imperialismo estadunidense na sua fronteira sul no México e resgatando o legado do marxismo revolucionário na defesa do povo palestino. Na Argentina, Myriam Bregman, ex-candidata à presidência pelo PTS na Frente de Esquerda Unidade denunciou o massacre ao povo palestino durante toda a sua campanha, se enfrentando com a extrema direita de Milei apoiadora de Netanyahu e também com o oficialismo peronista que apoia sua campanha em organizações contrárias à causa Palestina, como desenvolvemos mais adiante.

Aqui no Brasil, foram convocadas manifestações em apoio, que somos parte de batalhar para que se massifiquem, e convocamos todes a marcharem conosco nas manifestações em solidariedade ao povo palestino, defendendo a ruptura imediata das relações com Israel. Estamos travando batalhas para que este conteúdo seja parte do movimento operário e no movimento estudantil, com a defesa de uma campanha pela ruptura imediata de todas as relações diplomáticas, econômicas e militares do Brasil com Israel, que fomentam a repressão de Israel ao povo palestino, e, no Brasil, à juventude negra e aos trabalhadores, visto que as relações entre Brasil e Israel têm como um de seus pilares a exportação de armas.

Bolsonaro, em 2019, fez um acordo de cooperação na área de defesa assinado entre o Brasil e Israel, depois aprovado pelo legislativo. Esse decreto segue em vigor no governo Lula-Alckmin, mesmo em meio ao massacre do povo palestino que Israel promove. Mas, as relações entre o governo brasileiro e Israel não começaram no mandato de Bolsonaro, pois elas existem desde 2003, no primeiro ano de governo Lula, quando as forças armadas brasileiras abriram um escritório em Tel Aviv. Depois, em 2010, no último ano do segundo mandato do atual presidente, o governo brasileiro assinou um acordo de cooperação de segurança com Israel no final de novembro de 2010 para facilitar a cooperação e os contratos militares. No último dia 18, já em meio ao conflito atual, a Câmara dos Deputados aprovou um outro acordo de cooperação em “segurança” entre Brasil e Israel, tecnologias e serviços na segurança pública, táticas de investigação policial, análise forense, e mais. Também rechaçamos as parcerias de universidades brasileiras com Israel, como na UFRGS, onde a atual reitoria interventora bolsonarista mantém convênio com a empresa AEL Sistemas, subsidiária da empresa israelense Elbit Systems, que produz tanques de guerra e outros materiais para a indústria bélica. As manifestações convocadas no Brasil precisam, portanto, de total independência do governo Lula-Alckmin, para defender a imediata ruptura das relações Brasil-Israel e apontar um caminho de superação do multilateralismo internacional de Lula e sua demagogia, que ao passo que tem aumentado pronunciamentos pedindo a paz, mantém todas as relações e é parte de aprofundá-las, já que as armas que matam no Rio de Janeiro nas planos arquitetados entre seu Ministro da Justiça Flávio Dino e o governador da extrema-direita Cláudio Castro são armas de Israel. Apesar de Lula dizer em “paz”, “defesa das crianças” e “cessar fogo” não questiona o governo de Netanyahu e os bombardeios de Israel, o que acaba sendo uma falsa neutralidade de Lula, que hoje está como presidente temporário do Conselho de Segurança da ONU, e que de fundo coloca um sinal de igual a ambos os lados, Palestina e Israel.

A defesa intransigente do povo palestino não é negociável, isso passa justamente pela exigência da ruptura das relações com Israel, de forma independente do governo Lula-Alckmin, por isso também questionamos a submissão da esquerda ao governo, como a do PSOL sendo parte do governo, mas também as organizações stalinistas e seus distintos graus de adaptação como por exemplo o caso da Unidade Popular, que compõe gabinete de deputada federal do PT. Essa adaptação a candidaturas e governos burgueses que seguem suas relações com Israel é vista hoje em boa parte da esquerda brasileira na sua campanha para o ajustador e embaixador do FMI na Argentina, Sérgio Massa, supostamente para enfrentar a nefasta extrema direita de Milei, que teve seu caminho aberto pelo governo peronista. Massa faz campanha eleitoral junto aos sionistas da DAIA na Argentina. Mais um exemplo de que a conciliação de classes, que certa esquerda apoia, fortalece todos os nossos inimigos. A esquerda consequente, organizada na FITU, luta em defesa do povo palestino contra o sionismo. Ademais, a nível latino-americano, não se pode alimentar ilusões em governos burgueses, como o de Gustavo Petro, como faz o MES-PSOL, que alenta a esperança na administração capitalista da Colômbia pela sua ruptura das relações com Israel enquanto ataca as condições de vida da população. Já o Resistência/PSOL atribui a solução do conflito a ninguém menos que...a ONU, essa instituição tradicional que marcou o poderio imperialista dos EUA depois da Segunda Guerra Mundial, e que foi responsável pela fundação do Estado terrorista de Israel em maio de 1948. Trata-se não apenas de mais uma submissão ao governo Lula (atualmente resopnsável pela presidência rotativa do Conselho de Segurança da ONU), mas uma concessão direta às potências imperialistas, que independente das votações na ONU alentam esse massacre do sionismo. Não poderia haver abandono mais categórico do ABC do marxismo.

A política de dois Estados dos acordos de Oslo fracassou, demonstrando a necessidade de um programa que supere qualquer ilusão na manutenção do Estado sionista de Israel caso o objetivo seja terminar com o Apartheid existente, não existe auto-determinação do povo palestino a partir desta defesa. Tampouco podemos compartilhar dos métodos, programa, ou estratégia do Hamas, como se adapta parte da esquerda brasileira, já que este grupo, além de atuar na contramão da unidade entre a classe trabalhadora e oprimidos do Oriente Médio, tem como objetivo a instalação de um Estado fundamentalista islâmico em todo o território do Estado de Israel.

Para acabar com o regime de apartheid, é necessário desmontar o Estado sionista de Israel. Neste sentido, retomamos a greve da juventude trabalhadora palestina no Oriente Médio de 2021, assim como a persistência das famílias que guardam suas chaves e pedras pelo direito ao retorno e toda a força demonstrada na Primeira e Segunda Intifadas, nesta segunda quando um dos exércitos mais armados do mundo precisou de cinco anos para derrotar a fúria palestina. O que ocorre na Palestina é retrato da sanha imperialista e da incapacidade capitalista de resolver conflitos assim, por isso, estamos também impulsionando o curso Palestina ontem e hoje: um olhar marxista no Campus Virtual do Esquerda Diário, resgatando a história da Palestina, sua resistência e a tradição do marxismo revolucionário. O curso é ministrado por André Barbieri, doutor em Ciências Sociais pela UFRN e especialista em China e Simone Ishibashi, doutora em Economia Política pela UFRJ e especialista em Oriente Médio. O curso é totalmente gratuito e hoje será sua segunda sessão, intitulada A questão Israel-Palestina na Guerra Fria e a teoria da revolução permanente. Também publicamos um especial do Semanário Ideias de Esquerda, uma entrevista para a compreensão do conflito e um episódio especial do Podcast Espectro do Comunismo sobre a tradição trotskistas na questão Palestina.

É necessário erguer organizações revolucionárias que defendam o direito à autodeterminação nacional do povo palestino e lutem em todo o mundo por uma Palestina operária e socialista, nos marcos de uma federação socialista do Oriente Médio. Porque somente um Estado que se proponha terminar com toda a opressão, exploração e reação imperialista poderá garantir o direito ao retorno dos refugiados palestinos e uma convivência democrática e pacífica entre árabes e judeus, uma tarefa que deverá ser empreendida pela classe trabalhadora e pelos camponeses de toda a região.

Inscrição do curso Palestina ontem e hoje: um olhar marxista




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