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Tribuna Aberta | A queda do Silicon Valley Bank: a análise de Michael Roberts

Publicamos abaixo a tradução de um artigo do economista marxista Michael Roberts, que pode interessar as nossas e nossos leitores.

sexta-feira 17 de março de 2023 | Edição do dia

O artigo original em inglês foi publicado em 11 de março no site do autor: SVB: from the valley to the chasm

Na sexta-feira, o Silicon Valley Bank (SVB) da Califórnia se tornou o maior banco a falir desde a crise financeira de 2008. Em um colapso repentino que chocou os mercados financeiros, deixou bilhões de dólares pertencentes a empresas e investidores retidos.

O SVB recebia depósitos e concedia empréstimos a empresas no centro do setor de tecnologia dos Estados Unidos. A Corporação Federal de Seguros de Depósitos dos Estados Unidos (FDIC na sigla em inglês) agora atua como administradora judicial. A FDIC é uma agência governamental independente que garante depósitos bancários e supervisiona instituições financeiras, o que significa que liquidará os ativos do banco para pagar seus clientes, incluindo depositantes e credores.

O que aconteceu com o SVB? É um caso isolado ou um sinal de que mais falências estão por vir? O evento imediato foi o anúncio do SVB de que havia vendido, com prejuízo, um grande número de títulos em que havia investido e que teria de vender US$ 2,25 bilhões em novas ações para tentar equilibrar suas contas. Isso desencadeou pânico entre as principais empresas de tecnologia da Califórnia que tinham seus depósitos no SVB. Seguiu-se a clássica corrida aos bancos. Na velocidade da luz, o banco teve que impedir que os depositantes sacassem dinheiro. O preço de suas ações despencou, levando consigo outros bancos. A negociação de ações foi interrompida e o SVB posteriormente abandonou seus esforços para levantar capital ou encontrar um comprador, levando a FDIC a assumir o controle.

Embora relativamente desconhecido fora do Vale do Silício, o SVB estava entre os 20 maiores bancos comerciais dos EUA (16º), com US$ 209 bilhões em ativos totais no final do ano passado, segundo a FDIC. É o maior credor a falir desde que o Washington Mutual faliu em 2008 durante a crise financeira global. Portanto, ao contrário de alguns relatórios, o SVB não é um jogador pequeno. Ele oferecia serviços para quase metade das empresas de tecnologia e saúde dos Estados Unidos apoiadas pelo chamado venture capital ou capital de risco. O SVB recebeu depósitos desses "capitalistas de risco" (aqueles que investem em novas empresas, do tipo start-up).

Mas também fez investimentos com os depósitos que recebia, fazendo empréstimos às vezes arriscados aos fundadores de empresas de tecnologia, tanto pessoalmente quanto para suas empresas. Mas seus investimentos começaram a dar prejuízo. O SVB havia apostado na compra de títulos aparentemente seguros do governo americano. No entanto, quando o Federal Reserve, o banco central dos EUA, iniciou seu ciclo de aumento das taxas de juros para "controlar a inflação", o valor desses títulos despencou e o balanço do SVB começou a sofrer. Quando ele informou ao mundo financeiro que estava vendendo esses títulos com prejuízo para atender às retiradas de dinheiro dos clientes, a corrida aos bancos transbordou. Não conseguindo obter financiamento adicional por meio da venda de ações, teve que declarar falência e entrar em liquidação judicial pela FDIC.

Alguns rejeitam a ideia de que a falência do SVB seja um sinal do que está por vir. "O SVB era um banco pequeno, com uma base de depósitos muito concentrada", diz Ciaran Callaghan, chefe de análise de ações europeias da Amundi. Eles estavam “despreparados para uma fuga de fundos, não tinham liquidez para cobrir resgates e, como resultado, foram forçados a vender títulos, levando a um aumento de capital e criando contágio. Este é um caso isolado e idiossincrático."

Então parece ser um caso isolado. Mas é mesmo? O colapso do SVB se deve a um evento maior, ou seja, os aumentos agressivos dos juros pelo Federal Reserve no ano passado. Quando as taxas de juros estavam próximas de zero, bancos como o SVB se abasteceram com títulos do Tesouro norte-americano aparentemente de baixo risco. Mas quando o Fed elevou as taxas de juros para "combater a inflação", o valor desses ativos caiu, deixando muitos bancos com perdas não realizadas.

Esses aumentos também atingiram fortemente o setor de tecnologia, minando o valor das ações de tecnologia e dificultando a captação de novos fundos. Assim, as empresas de tecnologia começaram a retirar seus depósitos do SVB para pagar suas contas. Ed Moya, analista de mercado da Oanda, comentou: "Todo mundo em Wall Street sabia que o aumento dos juros do Federal Reserve acabaria quebrando alguma coisa, e agora isso está esmagando os pequenos bancos." A outra rachadura na parede bancária está nas criptomoedas. Silvergate, um credor dos chamados bancos criptográficos, também foi forçado a falência após o colapso dos preços e taxa de câmbio de bitcoin e outras criptomoedas.

“Os desafios institucionais do SVB refletem um problema sistêmico mais amplo e generalizado: o setor bancário está assentado sobre uma tonelada de ativos de baixo desempenho que, graças aos aumentos das taxas do Fed no ano passado, estão agora bem abaixo da água, e afundando”, disse Konrad Alt, co-fundador do Grupo Klaros. Alt estimou que o aumento da taxa "efetivamente eliminou cerca de 28% de todo o capital do setor bancário até o final de 2022".

A falência do SVB pode ser um evento pontual, mas os colapsos financeiros sempre começam com os elos mais fracos ou imprudentes. Trata-se de um banco que estava ameaçado por um perigo iminente: a queda dos lucros do setor de tecnologia e dos preços dos ativos provocada pela alta dos juros. O SVB cresceu para cerca de US$ 209 bilhões em ativos, com uma base de clientes concentrada em startups de tecnologia, tornando-o particularmente vulnerável ao impacto da política do Fed. Mas as perdas do SVB na venda de títulos estão sendo replicadas em muitos outros bancos. A FDIC informou recentemente que os bancos americanos estão acumulando US$ 620 bilhões em perdas não realizadas em suas carteiras de títulos.

Enquanto isso, depois que os últimos números de empregos continuaram a mostrar um mercado de trabalho "apertado", o Federal Reserve parece disposto a continuar aumentando as taxas ainda mais rápido e mais alto do que os investidores esperavam. Em seu depoimento perante o Congresso dos EUA na semana passada, o presidente do Fed, Jay Powell, deixou claro: "Empregos, gastos do consumidor, produção manufatureira e inflação reverteram parcialmente as tendências de moderação que havíamos observado nos dados há apenas um mês”. E como Larry Summers, o guru keynesiano e ex-secretário do Tesouro, disse: "Temos que estar preparados para continuar fazendo o que for necessário para conter a inflação". Possivelmente ao ponto de afundar parte do setor bancário e empresarial.




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