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Vale do Lítio | Seguindo Bolsonaro e com Zema, Lula abre as portas à exploração de lítio para enriquecer mineradoras

Continuando a política extrativista e de entrega dos recursos naturais de Bolsonaro, que retirou as restrições à exportação, o Governo Lula e Zema (Novo) foram à bolsa de valores da Nasdaq nos EUA para vender os recursos do Vale do Jequitinhonha (MG), uma das regiões mais pobres do país, rebatizando-o “Vale do Lítio”. Os impactos ambientais e sociais dessa atividade são motivos de protestos e revoltas sociais, como ocorre hoje em Jujuy, na Argentina. Nos inspiremos nessa luta para defender nossos recursos hídricos e minerais contra esse projeto permeado de “greenwashing” e cuja riqueza irá para os bolsos dos capitalistas pela mineração exportadora e a fraudulenta dívida pública.

sábado 8 de julho de 2023 | Edição do dia
O secretário de mineração do MME, Vitor Saback, o governador de Minas Gerais, Romeu Zema, e representantes da mineradora Sigma Lithium no lançamento do Lithium Valley Brasil (Foto: Linkedin/Nasdaq)

O lítio é um dos principais componentes para a produção de baterias recarregáveis utilizadas em smartphones, laptops, tablets e nos novos veículos elétricos da demagógica “transição energética” (cuja estimativa de redução de gases de efeito estufa é de apenas 1%) propagandeada pela mídia, a indústria e os governos capitalistas. Trata-se de um recurso estratégico cobiçado pelos imperialismos norte-americano e europeus, como também por potências em ascensão na luta por hegemonia industrial e militar, como a China.

Assim, por parte dos Estados capitalistas e das multinacionais se desenrola uma importante competição política e econômica pelo controle da tecnologia produtiva das baterias e do acesso aos recursos necessários, principalmente o lítio. No extremo da cadeia produtiva se encontram gigantes como Toyota, BMW, VW, Nissan, General Motors, Audi e as líderes do setor: Tesla e a chinesa BYD, cujo peso no mercado afeta diretamente a demanda global de lítio.

O Fundo Monetário Internacional calcula que as receitas dos produtores de metais usados na fabricação de baterias deve aumentar 4 vezes até 2050 e que a produção global desses minérios some 13 trilhões de dólares entre 2021 e 2040. Ou seja, um valor quase igual ao esperado para o setor do petróleo no mesmo período. Nesse cenário, o lítio vem sendo chamado de “ouro branco” do século XXI e é alvo de uma corrida extrativista pelos recursos das regiões que possuem as maiores reservas, como é o caso da América Latina - onde se encontra o “triângulo do lítio” (Bolívia, Argentina e Chile), a maior reserva do mundo, estimada em 52 milhões de toneladas de conjunto (cerca de 58% das reservas mundiais), e o Brasil, com 8% das reservas mundiais concentradas no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais.

Seguindo o projeto extrativista iniciado com Bolsonaro, que decretou a extinção das cotas e restrições à exportação de lítio em 2022, em maio, Lula enviou à Nasdaq (uma das principais bolsas de valores norte-americanas) uma comitiva com Vitor Saback, do Ministério de Minas e Energia (MME), ao lado do governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), milionário privatista que apoiou a campanha de reeleição de Bolsonaro, para anúnciar o “Vale do Lítio”, como chamaram o Vale do Jequitinhonha - que abriga 85% das reservas do Brasil e já é um dos maiores produtores do mundo. No enorme evento em Nova York, os recursos dessa que é uma das regiões mais pobres do Brasil, com um IDH de 0,66 diante de uma média nacional de 0,76, foram anunciados ao mercado financeiro do imperialismo estadunidense para serem integrados em cadeias de valor internacionais das mais lucrativas da atualidade.

Uma mostra da lucratividade do lítio do Jequitinhonha e de seu potencial para os capitalistas como nicho de acumulação na esteira da transição tecnológica é que, enquanto o preço da tonelada do lítio bruto gira em torno de US$ 100, o insumo pré-químico produzido pela mineradora canadense Sigma, instalada em Minas Gerais desde maio, chega a US$ 8000. Um valor que facilita à mineradora o envio para a China (US$ 120 por tonelada), onde se concentra o maior número de fábricas de baterias. Uma imensa riqueza que não será colocada à serviço das necessidades da população, mas irá para investidores estrangeiros, multinacionais e os banqueiros que lucram com a dívida pública.

A instalação de diversas operações de mineração de lítio se deu com a flexibilização das leis ambientais estaduais e se acentuou no estado de Minas Gerais com a liberação da exportação por Bolsonaro, operando principalmente: a CODEMGE e a Oxis Energy do Reino Unido; a AMG Mineração, de capital holandês; a canadense Sigma Lithium; a norte-americana Atlas Lithium (ex-Brazil Minerals); as brasileiras Elektro Lithium Mining, CBL e a Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração (CBMM), associada ao grupo Moreira Salles do Itaú.

(Foto: Sigma Lithium)

Como relatamos neste informe especial sobre os conflitos do lítio na Argentina, para embelezar suas atividades, obter licenças e minimizar a resistência local, mineradoras como a Sigma (que mantém um discurso ecologista e socialmente comprometido como linha de frente) tem como táticas políticas assistenciais e oferecimento de capacitação técnica e postos de trabalho às comunidades locais, o que em situações de vulnerabilidade como a de muitos municípios do Vale do Jequitinhonha - combinado com obras de infraestrutura para garantir a produção e o escoamento - funcionam como promessas de desenvolvimento social e moldam os territórios em torno do extrativismo. Segundo o próprio MME, o projeto afetará 980 mil habitantes em 55 municípios (sem contabilizar os impactos ambientais).

No estado onde ocorreram catástrofes capitalistas como os rompimentos de barragem de Mariana (2015) e Brumadinho (2019), o maior acidente de trabalho no Brasil em perda de vidas humanas e o segundo maior desastre industrial do século, os impactos da mineração entre as comunidades incluem a expulsão de muitas famílias de suas terras, a poluição sonora, do ar e das águas - causando doenças respiratórias e elevação dos casos de câncer - danos sísmicos à casas e construções, bem como o aumento do custo de vida e estatísticamente o aumento dos índices de violência, inclusive contra as mulheres, como denunciam movimentos sociais.

Com Zema e garantindo os lucros bilionários dos capitalistas nacionais e estrangeiros, o governo da frente ampla busca inserção em um possível novo “boom das commodities” do lítio e outros minerais essenciais às tecnologias mais avançadas. Mas também se inclui nesse projeto o investimento de R$ 3 bilhões pela chinesa BYD na Bahia. Para assumir as instalações da antiga Ford, Lula e o governador Jerônimo Rodrigues (PT) garantiram à montadora chinesa de veículos elétricos isenções fiscais colossais, de até 95%, bem como concessão de portos, obras viárias, isenções de impostos municipais e agilização de licenças e alvarás. Conta nessa negociação também fatores como a garantia de força de trabalho barata com a manutenção das reformas trabalhista e da terceirização irrestrita, bem como a nova reforma tributária.

A corrida por lucros com a produção de automóveis elétricos individuais, onde se insere a demanda de lítio para armazenar energia elétrica (que em muitos países deriva de fontes fósseis) nas baterias, não é uma saída para a crise climática. É uma insanidade capitalista que aposta na continuidade da drenagem industrial de recursos naturais e humanos para lucrar com um consumo de massas, em vez de apostar, a partir do campo das necessidades sociais, em sistemas de transporte públicos e gratuitos.

E é justamente o Arcabouço Fiscal, o novo teto de gastos de Lula e Haddad - que trava o aumento dos investimentos públicos em no máximo 2,5% conforme o superávit primário - uma das políticas fiscais ajustadoras que serão centrais em garantir que a receita dos recursos e da atividade produtiva da cadeia do lítio no Brasil não se converta em mais saúde, mais educação, mais investimento público, e sim em lucros para o mercado financeiro pela via da fraudulenta, ilegal e ilegítima dívida pública.

Por isso, diante de tamanhos ataques acumulados desde o golpe de 2016 e que agora o PT se propõe a administrar, nós do MRT levantamos que é preciso conformar um polo de independência de classes se apoiando na luta da nossa classe internacional, como vemos hoje em Jujuy na Argentina com uma forte rebelião popular, unindo trabalhadores e indígenas para enfrentar a sanha exploratória do lítio e os ataques da direita.

(Corte de rodovia se enfrenta com a repressão policial em Jujuy, Argentina.)

Em Jujuy, há semanas comunidades indígenas, trabalhadores e a juventude se enfrentam com a brutal repressão do governador Gerardo Morales, repudiando nas ruas a reforma constitucional reacionária aprovada com votos do peronismo de Fernández e Kirchner. Uma reforma que acaba com o direito de protesto de trabalhadores por seus salários e comunidades indígenas por suas terras - onde se encontram grandes reservas de lítio cobiçadas por multinacionais e projetos extrativistas endossados pelos governos, às custas das comunidades locais e dos recursos ambientais.

Longe do mito dos carros elétricos, combater a crise climática envolve um plano que questione o modo de produção e consumo capitalistas de conjunto. É preciso levantar a estatização integral da mineração sob administração democrática dos trabalhadores e das comunidades, questionando o modelo extrativista semicolonial do imperialismo, protegendo os recursos naturais, os ecossistemas e colocando o conhecimento científico a serviço disso.




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