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Unicamp | Como a crise do HC na Unicamp é reflexo do desmonte neoliberal no SUS?

Nestes primeiros meses do ano, temos visto sair nos jornais notícias sobre a crise de superlotação no Hospital de Clínicas da Unicamp, como parte de uma crise generalizada no SUS paulista da região de Campinas que tem todos os seus leitos de urgência e emergência ocupados. Esta crise, por sua vez, é resultado claro da intensificação do desmonte do SUS operado pelo governador de extrema direita Tarcísio de Freitas, sustentado por mecanismos do governo de frente ampla Lula-Alckmin como é o Arcabouço Fiscal. Mas afinal, como a crise do HC na Unicamp é reflexo do desmonte neoliberal no SUS?

terça-feira 23 de abril | Edição do dia

Veja nosso Editorial MRT: É urgente uma luta nacional para derrubar o arcabouço fiscal do governo Lula-Alckmin

Segundo entrevista recente do diretor-executivo da área de saúde da universidade ao G1 para além da crise de superlotação do Pronto Socorro (que possui 30 leitos e cerca de 70 pacientes internados) o HC está operando com cerca de R$7 milhões e passa por um subfinanciamento de praticamente 50% da verba que costumava operar até implementação da Tabela SUS Paulista, que passou a valer a partir de 1° de Janeiro de 2024. Um aspecto central da mudança na regra de repasse das verbas públicas da saúde é o favorecimento de instituições “filantrópicas” e autárquicas (administradas por fundações, a famosa Organização Social ou OS) que prestam serviços de saúde via SUS, em outras palavras é a terceirização do SUS para entidades cada vez mais do âmbito privado, em detrimento do sistema de saúde operado diretamente pelo poder público. Como o HC está vinculado à pasta de Ciência e Tecnologia, se enquadra como instituição autárquica, mas ainda subordinada ao poder público do Estado e não via OS.

Com esta nova regra a verba destinada para as instituições será pautada na quantidade de procedimentos realizados, o que acaba impactando o HC duplamente:

  • Anteriormente a esta mudança o HC recebia um valor fixo do SUS que estava no teto de R$186 milhões anuais, o que dava aproximadamente R$15,4 milhões mensais de repasse independentemente da quantidade de procedimentos realizados.

Poderíamos pensar mesmo em uma lógica estritamente formal que uma vez tendo seus leitos todos ocupados e operando acima da sua capacidade de atendimento o HC receberia maior repasse por isso, certo? E mais uma vez somos surpreendidos com esta nova regra, que pauta o valor de repasse dos procedimentos de acordo com sua complexidade. Procedimentos como cirurgias cardíacas, cirurgias em bebês e transplantes de órgãos. Já os procedimentos de urgência e emergência são classificados como menos complexos e portanto “valem menos” para este governo reacionário de Tarcísio, isso em meio a uma epidemia de dengue severa e uma quantidade ainda significativa de casos de Covid (no mês passado Campinas teve maior número de mortos em uma semana desde dezembro de 2022). Portanto:

  • A alta de casos de urgência e emergência no HC, que já vem de tentativas de desvinculação e terceirização de parte da burocracia universitária da Unicamp com o discurso de “ocupar muito do orçamento da instituição”, faz com que o hospital receba um valor menor ao que costumava operar anteriormente, mais ou menos 50%.

Nesta mesma entrevista dada ao G1 foi dito como não é possível simplesmente recusar ou encaminhar os pacientes que chegam ao PS para outras instituições pois na verdade o HC está na ponta do sistema, isto é, as pessoas que buscam atendimento por lá o fazem por não terem conseguido ser atendidas em outros hospitais e UPAs, já que há uma crise sistêmica de superlotação de toda rede regional em casos de urgência e emergência. No entanto, já foi emitido comunicado oficial pedindo para que instituições não encaminhem mais pacientes para o HC pois simplesmente não há mais espaço. Existem relatos de trabalhadores de que o CAISM - Hospital da Mulher também está com seus leitos de UTI Neonatal todos ocupados e em crise semelhante. Mais uma vez, vemos como o resultado de anos do desmonte neoliberal do SUS em São Paulo - encabeçado durante anos por ninguém menos que o atual vice-presidente Geraldo Alckmin - recai principalmente na precarização das condições de trabalho e na precarização do serviço para a população.

Enquanto isso os tubarões da saúde estão extremamente felizes com essa nova regra, isso porque o governo já divulgou as projeções de repasse para o ano:

"Por meio dos repasses do IGM SUS Paulista, a SES destinará R$70.788.170,00 anualmente aos municípios da região de Campinas para a melhoria da atenção primária à saúde da região. Além disso, 102 prestadores filantrópicos da região receberão o montante mensal de aproximadamente R$27.440.602,17 por meio da nova Tabela SUS Paulista, que corrige o sub-financiamento da Tabela SUS Federal complementando com recursos do tesouro do estado".

Vamos então aos cálculos:

  • 70 milhões 788 mil e 170 reais multiplicado por 21 (número de municípios integrantes da região metropolitana de Campinas contando com sua cidade-sede) equivale ao montante de 1 bilhão 486 milhões 551 mil e 570 reais que serão destinados aos municípios anualmente para suas respectivas secretarias de saúde via Secretaria Estadual de Saúde.
  • 27 milhões 440 mil e 602 reais multiplicado por 12 meses equivale ao montante de 329 milhões 287 mil e 224 reais que por sua vez multiplicado por 102 (número de “prestadores filantrópicos”) equivale a cifra exorbitante de 33 bilhões 587 milhões 296 mil e 848 reais!

Estamos falando portanto de uma diferença de mais de 30 bilhões de reais que serão entregues nas mãos dos empresários da saúde, preaticamente todo orçamento da saúde do Estado em 2024, enquanto o sistema público segue sendo sucateado com o esforço neoliberal desse governo de extrema direita, governo este que Lula financia como nunca em um pacto reacionário e que também realizou cortes bilionários no orçamento destinado à saúde por parte do governo federal. A privatização da saúde avança a passos largos enquanto os empresários receberão bilhões em repasse de verba pública! É um verdadeiro escândalo.

Esta crise está apenas em seu começo, isso porque a Unicamp tem buscado suprir o déficit do repasse com verbas da própria universidade, mas que para tanto já teve que adiantar parcelas que seriam pagas no final do ano ao HC já neste primeiro semestre, o que significa que ao final do ano o HC irá operar com ainda menos dinheiro do que hoje. Este momento de crise, uma crise construída conscientemente pelo governo do Estado, favorece os setores da burocracia universitária que defendem a desvinculação do HC da Unicamp e sua terceirização via OS que pregam a necessidade de “ampliar o espectro de captação de verba para o hospital”. Mas ora, se o governo está disposto a pagar bilhões para empresários então o problema certamente não é falta de dinheiro, as arrecadações estão acima do previsto, assim como a reitoria de Tom Zé mantém bilhões em caixa enquanto observa a crise da saúde se desenvolver na universidade.

Sem confiança alguma de que a solução para essa crise passa pelas mãos dessa reitoria do Tom Zé, que já mostrou que está disposto à subserviência em relação ao governo Tarcísio enquanto ataca trabalhadores e estudantes dentro da universidade, devemos apostar na força da mobilização da nossa categoria de maneira completamente independente, inclusive independente do governo de frente ampla Lula-Alckmin que aprovou o arcabouço fiscal que já limita os próprios investimentos do SUS e agora para sustentar esse regime fiscal quer a desvinculação dos pisos constitucionais da saúde e da educação o que acarretará invariavelmente no avanço da precarização e sucateamento dos serviços públicos. Como assistimos hoje em meio à greve nacional dos técnicos administrativos contra o reajuste zero, que também é reflexo direto do arcabouço fiscal. É urgente que o STU paute com toda categoria uma solução para a crise do HC que ataque os lucros dos empresários e garanta melhores condições de trabalho e de serviço para toda população, em uma luta unificada em defesa da saúde pública contra os ataques neoliberais. Isso deve estar totalmente combinado com a nossa campanha salarial em curso, pois dinheiro é que não falta!




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