×

Declaração do MRT | É urgente uma forte paralisação nacional contra o PL do Marco Temporal e o Arcabouço Fiscal

A aprovação na Câmara dos Deputados do reacionário PL 490 do Marco Temporal, com ampla margem de votação e forte colaboração de partidos que são da base do governo Lula-Alckmin, comprova mais uma vez que o caminho para enfrentar os ataques e defender o meio ambiente e os povos indígenas não é pela via do governo que negocia esses ataques e das instituições do regime político, como o STF. É preciso exigir das centrais sindicais e das entidades estudantis que rompam sua paralisia e organizem a luta contra o Marco Temporal e também contra o Arcabouço Fiscal do governo, colocando a classe trabalhadora e juventude em cena junto aos indígenas, sem terra e demais movimentos sociais. É necessário um plano de lutas, preparado desde as bases, para derrotar essas medidas que serão votadas no Senado nas próximas semanas. A conciliação de classes petista somente abre espaço para a extrema direita, o Centrão e sua base social, como o agronegócio, que querem "passar a boiada". Confiamos na força dos povos indígenas em aliança com a classe trabalhadora e a juventude, e não no STF que ataca direitos trabalhistas.

quinta-feira 1º de junho de 2023 | Edição do dia

A tese do Marco Temporal prevê que podem ser demarcadas somente terras indígenas que estavam ocupadas na data da promulgação da Constituição, em Outubro de 1988. Por isso, com relatoria de Arthur Maia (União Brasil), a aprovação do PL 490 na Câmara se trata de um ataque sem precedentes aos povos originários, em um país que se constituiu também com sangue e suor indígenas. Significa impedir qualquer possibilidade de ampla demarcação de novas terras, reconhecendo somente os territórios que conseguiram resistir aos séculos de violência, estupros e extermínio da colonização e se mantiveram sob controle das comunidades indígenas até 1988. Além disso, o texto votado na Câmara presidida por Arthur Lira abre margem para que terras já demarcadas sejam anuladas e para que o Estado intervenha em comunidades isoladas, afetando sua dinâmica.

Esse ataque, articulado pela Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), responde aos interesses do agronegócio, da bancada ruralista e do extrativismo predatório, que devastam o meio ambiente e avançam contra os indígenas no Brasil. Isso no país que começou o ano escancarando a brutalidade do garimpo ilegal contra os Yanomamis, com centenas de indígenas protagonizando casos de desnutrição e contaminação por mercúrio, por responsabilidade também da casta militar e sendo o mesmo país do brutal assassinato político de Dom e Bruno no ano passado. O Marco Temporal agora é sobretudo um “sinal verde” para “passar a boiada” e favorecer os mesmos que, com ampla representação no Congresso, buscam se articular para perseguir e criminalizar o MST, com sua CPI.

Embora a tese reacionária do Marco Temporal viesse sendo pautada desde o governo Bolsonaro, que se apoiou nos setores mais reacionários do agronegócio e do garimpo ilegal, é simbólico que essa medida tenha sido aprovada na Câmara justamente neste momento e contando com 100 votos dos partidos da base do governo Lula-Alckmin, com seu Ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, inclusive saindo em defesa da medida. O líder do governo na Câmara, o deputado petista José Guimarães, já havia liberado sua base para votar pela urgência dessa tramitação na semana passada. Agora, por sua vez, o PL é aprovado no Congresso com votos do PSB de Alckmin, assim como do PV, que compõe a federação do PT-PCdoB, do PDT, e amplamente com votos de partidos agraciados com ministérios no governo, tais como o MDB de Tebet, o PSD de Kassab e o União Brasil de Daniela "do Waguinho".

Assim, o Congresso reacionário acaba de aprovar ataques importantes em um intervalo de somente uma semana, não apenas com ajuda da base aliada do governo, mas também sendo um deles o Arcabouço Fiscal, ataque proposto e articulado diretamente pelo governo Lula-Alckmin como um novo teto de gastos a serviço do pagamento da fraudulenta dívida pública, que limita recursos para distintas áreas e pode significar congelamento de salários e mais terceirização. Não parando por aí, está em debate no Legislativo a votação da MP que visa retirar as atribuições das pastas dos Ministérios do Meio Ambiente, com Marina Silva (Rede), e dos Povos Indígenas, com Guajajara (PSOL), e aumentar os poderes do Centrão e de Lira no regime. É uma ofensiva desse setor em busca de mais emendas parlamentares e cargos, com R$1,7 bilhão já liberados pelo governo em um dia. Mas, mesmo sobre isso, o Ministro das Relações Institucionais do governo, Alexandre Padilha, declarou que Lula apoiaria a versão da MP proposta pela Câmara, para caminhar junto a ela e ao Senado, o que se trata de mais uma sinalização forte ao Centrão por parte do governo. Ainda assim, é possível que mesmo essa versão da MP que avança contra as pastas do meio ambiente e indígena não seja aprovada e que a estrutura ministerial volte a ser a mesma do governo Bolsonaro.

Tudo isso demonstra mais uma vez que a conciliação de classes petista abre espaço à extrema direita e sua base social. O meio ambiente e os povos indígenas estão sendo rifados pelo governo em acordos com o Centrão e com o agronegócio e seus representantes estão fortalecidos com ministérios no governo. Mesmo que o PT alegue que sua bancada parlamentar votou contra o PL 490 na Câmara - o que não se deu no caso da MP do desmatamento da Mata Atlântica, à qual o PT deu dezenas de votos -, a principal lição que deve ser tirada das votações da última semana é que os interesses mais devastadores das elites não podem ser enfrentados com jogos de cena nas votações e confiando em governos que também nos atacam. O mesmo Supremo Tribunal Federal, em quem muitos setores depositam expectativa de que julgará a tese do Marco Temporal como inconstitucional no próximo dia 7 de Junho, acaba de negar que há vínculo empregatício no trabalho de motoristas por aplicativo, uma decisão de Alexandre de Moraes que reforça a uberização no Brasil marcado por trabalho semiescravo. Também no STF foi aprovado que a patronal não precisa justificar o motivo pelo qual demite um trabalhador, contrariando até mesmo uma norma da OIT (Organização Internacional do Trabalho), em mais uma mostra de que está na linha de frente de atacar direitos sociais. Por isso, não é possível confiar no STF para enfrentar o Marco Temporal, sendo uma instituição que veio nos últimos anos se colocando como “guardiã da democracia”, ao mesmo tempo em que degradava a já degradada democracia dos ricos no Brasil aprofundando seus próprios poderes e avalizando a piora das condições de vida das massas brasileiras, as reformas, privatizações e os ataques a direitos.

Durante a pandemia, os indígenas deram uma forte demonstração de luta, indo aos milhares a Brasília protestar contra o Marco Temporal. Essa disposição apontava um caminho ao qual as direções dos movimentos de massas, das grandes centrais sindicais, das entidades estudantis nacionais, como a UNE, e demais movimentos sociais, vieram fechando os olhos. Mantiveram a luta indígena isolada e apostaram no caminho das alianças com a direita, para enfrentar a extrema direita. Agora, sob o novo governo, a via de confiar novamente que o governo Lula da frente ampla ou o STF vão barrar o Marco Temporal, enquanto esses mesmos setores são parte de ataques e negociatas que fortalecem o agronegócio, está em detrimento do único caminho que pode de fato defender o meio ambiente e os povos indígenas, assim como revogar as reformas e privatizações dos últimos anos, que é a mobilização. Também a demagogia ambientalista das potências imperialistas da União Europeia e do governo Biden, enquanto aprofundam a crise ambiental em todo o globo, não pode ser alternativa à sanha devastadora dos grandes latifundiários e do garimpo.

Enquanto isso, o PSOL segue sendo parte do governo que articula o arcabouço fiscal e deixa passar a ofensiva contra os indígenas e o meio ambiente, possuindo ministério e ocupando o cargo de vice-liderança do governo na Câmara. Nós do MRT viemos chamando esse partido, que surgiu como uma ruptura do PT em face à aprovação da Reforma da Previdência no primeiro governo Lula, a romper com o governo atual, pois seu atrelamento e compromissos com o governo vão contra a construção de qualquer enfrentamento aos ataques em curso, que só pode se dar com independência do governo. Discursos e votos contrários no plenário da Câmara por si só não barrarão a burguesia brasileira racista de atacar os povos indígenas e o meio ambiente, enquanto partidos por ela representados são também parte do governo que o PSOL compõe e de sua base no Congresso. Enquanto se mantém no governo, o PSOL fortalece as burocracias sindical e estudantil, dirigidas em grande parte pelo PT e PCdoB e responsáveis por paralisar as lutas e separar as demandas dos indígenas das demandas da classe trabalhadora, como vimos recentemente nas eleições da Apeoesp, maior sindicato da América Latina, marcadas por um processo repleto de fraudes para garantir que somente a chapa da burocracia cutista, junto a correntes do PSOL como a Resistência, o MES e ao PCB, tivesse representação na diretoria.

Pelo contrário, é preciso exigir das centrais sindicais e das entidades estudantis que organizem um plano de lutas pela base, com uma paralisação nacional, contra o Marco Temporal, o Arcabouço Fiscal e a CPI que persegue o MST. Há urgência, diante da agenda do Senado nas próximas semanas: a classe trabalhadora, da cidade e do campo, precisa entrar em cena, junto aos indígenas, aos sem terra, ao movimento ambientalista e a todos os oprimidos, unificados para enfrentar os lucros daqueles que se beneficiam da devastação da Amazônia e da Mata Atlântica e querem o extermínio das populações indígenas. As greves em curso, como da rede estadual da educação do Rio de Janeiro e os 6 mil terceirizados de Cubatão que cruzam seus braços, devem ser um ponto de apoio para unificar as lutas e organizar um combate sério contra todos os ataques, assim como junto às ações articuladas por indígenas em várias cidades e universidades. Nosso programa defende expropriar as grandes mineradoras e impor uma reforma agrária radical, que enfrente diretamente o latifúndio e reparta a terra entre todos que necessitam, ampliando a área de proteção ambiental e assegurando a demarcação de terras indígenas. Essas lutas podem também impor a revogação integral das reformas e privatizações dos últimos anos, com o fim da terceirização e uberização e plenos direitos à classe trabalhadora, luta que estamos impulsionando junto a milhares de intelectuais, juristas, entidades e entregadores de aplicativo a partir do Manifesto contra a terceirização e a precarização do trabalho.

Esse é o caminho para a construção de uma saída anticapitalista e revolucionária, a única que pode assegurar a auto-determinação dos povos oprimidos e apontar a um modo de vida e de produção superior ao capitalismo, por uma sociedade socialista, que estabeleça um metabolismo harmônico entre ser humano e natureza, nas mãos da classe produtora da nossa época.




Comentários

Deixar Comentário


Destacados del día

Últimas noticias