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Caso Miguel | Caso Miguel: O que nos revela a decisão do TST?

O casal corte real foi condenado pelo tribunal superior do trabalho a pagar indenização de r$ 386 mil, e a decisão é mais uma mostra do caráter de classe da justiça.

quinta-feira 6 de julho de 2023 | Edição do dia

A luta por justiça pela morte de Miguel, vitimado pelo descaso, após Sarí Corte Real, patroa de sua mãe, colocá-lo em um elevador e apertar o botão que o levou ao andar de onde caiu, teve, na última quarta-feira (28 de junho), mais um episódio: o julgamento e a condenação ao pagamento de indenização de Sergio Hacker e Sari Corte Real.
A decisão foi celebrada e definida pelos próprios ministros do TST como uma “decisão histórica”, já que tomou como embasamento para a tese a condenação do “privilegio branco” e também “a ideologia racista operante no mundo do trabalho”.

Estando em liberdade, já que o pedido de prisão para Sari Corte Real foi negado pelo próprio Ministério Publico de Pernambuco, para que à ela caiba recorrer nas instâncias criminais, o caso julgado pelo TST diz respeito à contratação fraudulenta de Mirtes e sua mãe, que na época trabalhavam na casa do casal rico, mas eram registradas como funcionárias da Prefeitura de Tamandaré, e não tinham horas extras remuneradas, nem vale-transporte, muito menos o recolhimento previdenciário e de FGTS garantidos.

Entretanto, a reflexão que devemos fazer diante de uma decisão como esta é sobre qual é o avanço que temos diante do reconhecimento de que a cor da pele historicamente, em um país como o nosso, foi e é fator para diferenciar como ideologia e como prática, na vida real, indivíduos? Como pode ser lido por nós esse reconhecimento, pela justiça, de que há uma hegemonia de cor que aparece no caso do Menino Miguel? É preciso relembrar antes as condições em que se deu a morte de Miguel para entendermos que uma decisão como essa manifesta a retirada de todo o conteúdo de classe do caso. Sob o véu do progressismo que a decisão possa carregar, está o fato de que o que sustenta o privilégio de Sari Corte Real é o fato de que ela é da classe política mandatária no estado, é o fato dela pertencer ao grupo seleto dos que detém o poder econômico no estado e, por isso, pode impor a obrigação de, em meio a uma pandemia, fazer uma mãe pobre, periférica e negra ter que trabalhar e levar seu filho, que terminou sendo a vítima maior. Ao embasar a sentença condenatória na ideia de um “privilégio branco”, o TST argumentou a partir do racismo, mas tirando-o da condição de ser uma degeneração do modo de produção do sistema capitalista. A justiça usou, então, o racismo enquanto base, inverteu a lógica de análise, ocultando assim o caráter de classe de um sistema de onde essa própria Justiça emana, é parte e lhe serve.

Para nós trabalhadores, que não nutrimos nenhuma confiança na justiça burguesa, essa reparação por danos morais coletivos, baseada no conceito de “racismo estrutural”, coloca a questão sob o ponto de vista meramente relacional, no qual o casal e seus privilégios foram facilitados e garantidos apenas por serem brancos. Mas, o que a dura desigualdade racial nos deixa bem claro é que reconhecer os privilégios de grupos brancos está diretamente ligado a construção de relações sociais produzidas e reproduzidas pela sociedade de classe.

No caso da morte de Miguel, não podemos esquecer que é justamente no momento em que estava submetida à exploração do casal Corte Real (e no momento de pandemia do Covid) que Mirtes viu seu filho ser vitima do descaso e da desumanização.

A relativa aparência de “igualdade jurídica”, da qual se reveste a justiça burguesa, ainda quando emite decisão como essa baseada no histórico de racismo que embasa a história e as relações no Brasil, ainda assim visa ocultar o caráter de classe que sustenta a própria justiça. Na raiz do dito “privilégio branco”, no qual se embasou o TST para condenar o casal de ricos/empresários/patrões, está a classe social.

Assim, categoricamente, o que a decisão de indenização tenta ocultar através da pretensa neutralidade é que os marcos legais que constituem o Direito se estruturam para a manutenção das diferenças entre “quem manda” e “quem deve trabalhar”, mesmo que isso lhe custe a vida de seu filho de cinco anos!

É fundamental lembrar que a justiça do Estado burguês possui um caráter de classe sim e num país onde a classe trabalhadora é esmagadoramente negra, ela é por consequência, profundamente racista também. Mas, precisa estar muito claro entre as nossas bandeiras de luta que não há saída para os trabalhadores quando confiam nessa justiça, pois só a luta dos setores explorados e oprimidos pode arrancar a verdadeira justiça.

Nós do ED continuamos acompanhando e em solidariedade à Mirtes buscando até o fim justiça por Miguel.




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