×

BANDEIRANTES | 14 de novembro: dia do bandeirante. Dia do genocídio indígena, escravidão e colonização.

No dia escolhido para homenagear os bandeirantes e as expedições das bandeiras, a única coisa que deve-se comemorar é a resistência histórica e a revolta dos oprimidos, como os Tapuias e o Quilombo dos Palmares.

terça-feira 14 de novembro de 2023 | Edição do dia

O dia 14 de novembro foi escolhido pela burguesia para celebrar os bandeirantes por marcar o dia, no ano de 1625, em que Santana de Parnaíba, cidade no interior de SP, foi elevada à condição de vila. A cidade com o passar do tempo tornou-se um grande ponto para as expedições das bandeiras, que eram jornadas travadas por grupos de brasileiros liderados por colonos a cruzar lugares não-explorados pela Coroa Portuguesa em sua colônia, o Brasil.

O que a historiografia tradicional nos faz acreditar é que os bandeirantes adentravam terras a serem descobertas de forma heroica, e quase que por direito “natural”, essas eram incorporadas à colônia, até então litorânea. No entanto, as terras brasileiras eram terras povoadas por diversos povos indígenas, que foram totalmente atravessados pelas armas de fogo que carregavam os bandeirantes e pelo sistema escravista e colonial de Portugal. Foram séculos de perseguição, estupro, escravização e catequização forçada. A cada “conquista” dos bandeirantes diversas grupos oprimidos, que com o tempo encontraram-se na berlinda entre a resistência e a barbárie, foram sendo assassinados em nome da conquista de terras e da Coroa, como o emblemático caso do fim do Quilombo de Palmares, em Alagoas.

Palmares é o maior e mais importante exemplo de luta e resistência negra. Que nos deixa até hoje lições sobre a força, ousadia, a subversão e a auto-organização dos negros escravizados, que fugiram das fazendas e construíram quilombos. A luta do povo negro no Brasil é histórica, contra os portugueses, contra os bandeirantes e até hoje contra a violência policial. Palmares foi destruído em 1694 pelos bandeirantes paulistas, que depois foram convocados, em 1720, a reprimir a revolta dos Tapuias, uma forte luta indígena contra a escravização e em defesa de suas terras. Começou no litoral do Rio Grande do Norte e Ceará, em 1651, e se espalhou pelo Maranhão, Pernambuco e Piauí. Esses são exemplos de que os bandeirantes não tem nada de heróis, ou de grandes desbravadores, pelo contrário, são assassinos que mancharam de sangue a história do Brasil.

Pode te interessar: A revolta dos Tapuias e a Confederação dos Cariris: um símbolo da resistência Indígena no Nordeste

Atualmente no estado de São Paulo a iconografia bandeirante se faz presente e resplandecente, em bairros ricos, monumentos vistosos como o Borba Gato, que foi incendiado em forte protesto contra a falsificação histórica e a exaltação de figuras racistas e genocidas. Também o Monumento às Bandeiras, figuram a paisagem urbana, atravessadas por ruas que, quando nem se percebe, carrega uma menção a um dos líderes bandeirantes ou a alguma memória desse passado sangrento. Dentre as principais rodovias do estado está a Raposo Tavares, ou então a Fernão Dias. Consagrando a história dos vencedores. Em uma relação de duas mãos, o passado escravista que os bandeirantes emplacaram solidifica a mesma exata visão de mundo das elites paulistanas contemporâneas, e acima de tudo, a mesma sensação de impunidade a cometer genocídio em nome de um Brasil com as mãos sujas de sangue.

No ano de 2023, a “comemoração” do dia 14 de novembro de 1625 nos remete à lembrança de outro dia, esse muito mais recente: 31 de julho pelo menos 28 moradores da Baixada Santista foram assassinados pelas armas de fogo da Polícia Militar do estado. O governador Tarcísio de Freitas ainda defendeu a atuação dos policiais, afirmando “que não houve excesso”. Tarcísio, esse reacionário de extrema direita, herança do bolsonarismo, faz parte do Republicanos, partido que hoje está diretamente no governo de Frente Ampla de Lula/Alckmin. A conciliação de classes do PT é o que abre espaço para a extrema direita, que ataca a esquerda quando protesta contra figuras como Borba Gato, ou contra a polícia racista e assassina. Não podemos confiar nos governos, que dão as mãos aos nossos inimigos e não pensam duas vezes antes de se aliar à burguesia em nome de seus interesses. Nossa luta contra o racismo, a violência policial e todas as formas de opressão tem que se dar de forma independente.

Passados mais de 300 anos, a inversão é trágica: o que antes era uma ida ao interior buscando o desmonte de diversas populações indígenas sob a demarcação de terras, voltou ao litoral do país para assassinar a população negra e pobre. Da mesma forma que o bandeirantismo é consolidado como um progresso para o Brasil, as ações da polícia são condecoradas como atestado de sucesso e ordem para o Estado e a burguesia nacional.

A memória do bandeirantismo, além de comemorada, ainda é reproduzida no Brasil, e como retrocesso. Além das ofensivas violentas contra a população brasileira, resistindo na classe trabalhadora e sob uma dura realidade de séculos de opressão fruto do estupro e da escravidão sistemáticas, o modo de produção colonial se recompõem no Brasil a partir da lógica do capitalismo financeiro e industrial. Em Minas Gerais a exploração de minérios e o descaso com o meio-ambiente gera sucessivos desastres ambientais, como em Mariana em 2015 e em 2019 em Brumadinho. A exploração e a descoberta do ouro marcam tantos outros processos que historicamente degradam a própria realidade do país, e frontalmente causam retrocessos à população brasileira, perdendo seu território, casas e por vezes sendo contabilizadas como grandes acidentes.

No caso do Estado de São Paulo, a cultura de fomentação da imagem dos bandeirantes reforça esse ideal racista e elitista dentro do estado, como um dos maiores símbolos de São Paulo como “a locomotiva do Brasil”. A história dos bandeirantes é reivindicada como a história dos que fundaram o Brasil enquanto o país que conhecemos hoje. Retratado também como os heróis que conquistaram regiões importantes para essas elites na conjuntura política e econômica atual, como o Centro-Oeste, território no qual o desmatamento e a pecuária crescem há décadas. A própria figura dos bandeirantes é totalmente distorcida: os corpos musculosos, as roupas vistosas e os grandes cavalos retratados no século passado não condizem com a figura histórica dos bandeirantes: muitas vezes brasileiros nus, que perderam todas as roupas em jornadas de anos no sertão, mirrados e perdidos nas matas densas, apenas percorridas sobre mulas, que somavam meros 4km por dia percorridos, são evidências históricas que ajudam a se engrandecer essa imagem vitoriosa e falseada desses tão falsos quanto heróis.

A burguesia tenta recontar a história a partir de invenções e falseamentos, enaltece assassinos e barbariza, ou por vezes torna pacíficos, os oprimidos. No entanto as marcas de resistência não se apagam, e hoje, a luta dos negros, dos indígenas, dos palestinos e tantos outros setores tradicionalmente massacrados se faz presente em protestos internacionais, no coração do imperialismo, com exemplos como o Black Lives Matter, e agora as fortes mobilizações contra o Estado assassino de Israel. A solidariedade operária não nos deixará esquecer quem são nossos heróis e quem são aqueles que devem ir para o lixo da história, pelas mãos de quem sempre foi oprimido.

Leia mais: No 20N vamos às ruas pela ruptura das relações Brasil-Israel e contra a cooperação para intervir no Haiti! Chega de chacinas!




Comentários

Deixar Comentário


Destacados del día

Últimas noticias