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VOZ ANTICAPITALISTA
Devem os trabalhadores participar das eleições e fazer política revolucionária no parlamento?
André Barbieri
São Paulo | @AcierAndy

A crença na democracia capitalista como expressão da soberania popular segue apresentando-se ante as grandes maiorias como o máximo de liberdade ao qual se pode aspirar. Há críticas, intermináveis a este degradado sistema corrupto, porém não há, ainda um horizonte de superar este regime de forma revolucionária. E isto permanece, mesmo com a crítica ao PT por ter feito governos ajustadores como sempre fizeram os tucanos e agora faz o golpista Temer.

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De fato, através do sufrágio universal a cada tantos anos, a democracia burguesa que se autoproclama expressão da “vontade popular” tem como objetivo principal a separação das massas do governo do Estado mediante diversos mecanismos: reconhecimento puramente formal das liberdades democráticas (como votar), divisão de poderes entre o legislativo e executivo, impossibilidade de revogar mandatos, a não eleição do poder judiciário, privilégios financeiros dos altos funcionários.

Diante da podridão da política habitual, por que a tradição dos marxistas revolucionários defende que os trabalhadores precisam ter seus representantes de classe na tribuna parlamentar? Não seria isto “vender-se à política habitual”?

Qual a posição dos revolucionários sobre a participação nos parlamentos burgueses?

Em 1920, Lênin afirmou que o Parlamento burguês constitui um espaço a ser ocupado pelos revolucionários com o objetivo de agitar um programa revolucionário. Discutindo contra as tendências ultraesquerdistas da Internacional Comunista que consideravam uma traição de princípios participar no parlamento (em nosso caso, “vender-nos à política”), Lênin reafirmou sua postura de que os marxistas na época imperialista devem ocupar todos os mecanismos legais que possibilitem difundir o programa da revolução socialista para educar as massas operárias que ainda depositavam sua confiança nas instituições do Estado burguês.

Com um tom intransigente, Lênin afirmou “os bolcheviques atuamos nos parlamentos mais contrarrevolucionários, e a experiência demonstrou que semelhante participação foi, não só útil, mas necessária para o partido do proletariado revolucionário”. Lutando no Segundo Congresso da Internacional Comunista contra os preconceitos anarquistas de alguns comunistas, Lênin conclui a partir da experiência na Rússia que “a participação num parlamento democrático-burguês, longe de prejudicar o proletariado revolucionário, permite-lhe demonstrar com maior facilidade às massas atrasadas a razão por que semelhantes parlamentos devem ser dissolvidos, facilita o êxito de sua dissolução, facilita a ‘supressão política’ do parlamentarismo burguês”.

Que queria dizer com isso? O seguinte: em diversos países da Europa ocidental e nos Estados Unidos o parlamento havia se tornado odioso para as camadas trabalhadoras mais avançadas. Algo compreensível, em vista da atuação dos políticos tradicionais, e principalmente da traição daqueles conciliadores reformistas que diziam atuar “em nome dos trabalhadores”, durante e depois da I Guerra Mundial. Entretanto, este ódio por si só não fazia os parlamentos desaparecerem. Muito menos fazer com que milhões de trabalhadores parassem de votar em seus inimigos. Estava claro que derrotar estes preconceitos era uma batalha a ser dada pelos revolucionários, usando todos os meios – mesmo o parlamento – para fortalecer a luta extraparlamentar. Assim, “[...] no seio de instituições como os parlamentos burgueses os comunistas podem (e devem) travar uma luta prolongada e tenaz, sem retroceder diante de nenhuma dificuldade, para denunciar, desvanecer e superar tais preconceitos”.

Esta intervenção estava a serviço também de fortalecer a convicção dos trabalhadores de que para derrotar o capitalismo e suas instituições é preciso possuir a mais importante ferramenta histórica da classe trabalhadora: um partido operário revolucionário internacionalista.

Estas lições ainda são válidas para nós?

É suficientemente claro que amplos setores de trabalhadores e jovens de todo o país nutrem um saudável sentimento de desconfiança e raiva do sistema representativo nesta democracia degradada que temos. Este rechaço, que escalou bruscamente depois das jornadas de junho de 2013, é a base para uma importante crise de representatividade que afeta todo o regime político e seus partidos tradicionais (PT, PSDB e PMDB), colocando em evidência contradições fundamentais que não podem se resolver pela política habitual. Isso leva a que amplos setores de massas se afastem de suas representações políticas tradicionais e surjam novas formas de pensar.

Este sentimento saudável, entretanto, não impede que estes mesmos setores, acompanhados por milhões, prestem muita atenção nas eleições, como um momento especial de politização. Não impede sequer que – mesmo aqueles que têm críticas duras às representações políticas tradicionais – concedam seu voto ao que julgam ser o “menos pior”, na ausência de uma opção em que realmente valha a pena confiar. Em boa medida, este sentimento do mal menor representou importante base de votos ao PT nas eleições de 2014, aglutinando os votos de pessoas que desconfiam corretamente do PT, de seus métodos corruptos e de conciliação com a direita e os empresários, mas que na ausência de uma esquerda anticapitalista, escolheram Dilma.

Se é certo que os revolucionários não depositamos nenhuma confiança nos métodos da democracia burguesa e seu parlamentarismo, que é um instrumento da violência organizada da classe dominante contra os oprimidos para preservar a propriedade privada dos meios de produção e da vida, disso não concluímos que se pode avançar um milímetro na luta de classes dos trabalhadores virando as costas ao parlamento burguês. Isso significaria deixar milhões de trabalhadores que refletem e participam das eleições à mercê das mentiras e da demagogia dos políticos dos patrões, não só durante as eleições mas por falta de denúncia cotidiana dos privilégios dos políticos, do que votam, o que pretendem.

Assim como Lênin e Trotsky, acreditamos que a tarefa dos revolucionários é batalhar em todos os âmbitos disponíveis para conquistar a consciência de amplos setores de massas para as idéias da revolução socialista, inclusive nos servindo dos instrumentos do inimigo como plataforma para que “se ouça mais alto” nossos princípios antiburgueses e anticapitalistas.

Se acreditar que a acumulação gradual e pacífica de deputados até conquistar uma maioria dentro do Congresso é cair num absoluto fetichismo da aritmética parlamentar, como faziam os reformistas da socialdemocracia, ou o PT que apostava que juntando e agradando duzentos Cunhas e quarenta Renans dominaria a política por décadas, ignorar o parlamento burguês e abster-se de lutar para participar das eleições, como pregam os anarquistas e “autonomistas”, significa entregar pacificamente a consciência de massas de pessoas nas mãos das idéias da burguesia, que se utilizam das vantagens materiais de sua posição para pacificar os trabalhadores seja com seus representantes “puro sangue” tucanos ou colocando ex-operários como Lula, reforçar seus preconceitos individualistas, enterrar sua rebeldia de classe e conservá-los longe da política.

Não à toa, o anarquismo, assim como sua “versão 2.0” autonomista, é uma estratégia conservadora e reacionária que hoje, como ao longo da história, levou e levará à derrota lutas heróicas da classe trabalhadora, porque do alto do seu individualismo não se preocupa em batalhar para eliminar os preconceitos burgueses (inclusive o parlamentarismo) de sua consciência. Tudo se resume ao que o indivíduo pensa da política e pequenas esferas de ação política de uma rede de indivíduos e não de ações de classe, organizadas para golpear nossos poderosos inimigos não só nos parlamentos, mas na FIESP, nos poderosos meios de comunicação, na Febraban, em Wall Street, e um longo etc.

Portanto, participamos das eleições não porque “concordamos com os métodos parlamentares”, mas porque queremos usar este momento especial de politização para batalhar e arrancar estes milhões de trabalhadores da influência reacionária dos políticos da patronal, influenciando-os com as idéias anticapitalistas e revolucionárias. Sempre combinado com as lutas extraparlamentares, com o objetivo de fortalecer, coordenar e organizar estas lutas como alavanca destinada estrategicamente à derrubada do capitalismo. Para usar os termos do revolucionário russo Trotsky (diga-se de passagem, alguém que dirigiu a tomada do poder pelos trabalhadores e camponeses derrubando o parlamento recém nascido na Rússia), “combater o parlamentarismo do alto da tribuna parlamentar”. Trata-se do parlamentarismo revolucionário.

“Mas existe algum exemplo atual que mostre que se pode fazer parlamentarismo revolucionário?”

Não precisamos voltar mais de cem anos para encontrar um exemplo de como fazer política revolucionária no parlamento, como foi o voto do comunista alemão Karl Liebknecht em 1914 contra os créditos de guerra que a classe dominante alemã precisava para a I Guerra Mundial.

Na Argentina temos um exemplo concreto do que significa o parlamentarismo revolucionário em ação. Nicolás Del Caño e Myriam Bregman, dirigentes do PTS (Partido dos Trabalhadores Socialistas) na Frente de Esquerda e dos Trabalhadores (FIT), tornaram-se as principais referências da esquerda argentina ao apoiar-se em sua militância política na luta de classes para atuar no parlamento como tribunos do povo que denunciam de dentro do parlamento a corrupção e os planos da burguesia contra os explorados e oprimidos.

A Frente de Esquerda e dos Trabalhadores conquistou a maior votação da esquerda argentina para a categoria presidencial desde 1983 com Del Caño como candidato, superando os 800 mil votos (3,3% a nível nacional), tornando a FIT a quarta força política nacional e conquistando 1,1 milhão de votos para deputados. Estes resultados da esquerda classista configuram o dobro dos votos conquistados por Luciana Genro do PSOL (1,6%) nas eleições presidenciais no Brasil em 2014.

Del Caño denunciou os políticos corruptos da burguesia nas sessões do Congresso, dando exemplo na defesa do programa, inspirado no primeiro governo dos trabalhadores da história, a Comuna de Paris de 1871, de que todo alto funcionário de Estado receba o mesmo salário que uma professora e seja revogável, doando o restante do seu próprio salário às lutas dos trabalhadores como dos metalúrgicos de Lear, junto aos quais lutou ombro a ombro e foi reprimido com balas de borracha nos piquetes da Rodovia Panamericana pela Polícia Federal.Faz ou não faz diferença na luta de classes um deputado em um piquete, disposto a ser reprimido junto aos lutadores? É para construir esta tradição, inexistente no Brasil, que buscamos participar das eleições.

O internacionalismo também é um fator desta atuação. No Congresso Federal argentino Myriam Bregman pediu um posicionamento comum em repúdio ao golpe institucional no Brasil, e em solidariedade à classe trabalhadora brasileira contra o avanço da direita. Essa intervenção causou divisão interna nos políticos dos diversos blocos parlamentares e obrigou a grande mídia a dar publicidade à esta intervenção revolucionária, o que possibilitou que por iniciativa do PTS ocorresse o maior ato em repúdio ao golpe fora das fronteiras brasileiras.

No México também pudemos ver uma campanha eleitoral semelhante. A chapa 5, dos Anticapitalistas, encabeçadas por Sergio Moissen e Sulem Estrada, do Movimento dos Trabalhadores Socialistas (MTS), alcançou o quinto lugar entre os 21 candidatos independentes na Assembléia Constituinte da Cidade do México, com mais de 11 mil votos, mesmo com a fraude eleitoral. Esta grande votação - elogiada por personalidade como Aguilar Mora - foi produto de uma enorme campanha militante que centenas de jovens, mulheres, trabalhadores, professores e intelectuais de esquerda abraçaram como sua própria, dirigindo com idéias anticapitalistas o surgimento de uma alternativa à esquerda do reformista Morena na capital do país.

A experiência do PTS/FIT e do MTS contradiz a hipótese de que “entrar na política significa corromper-se” ou “não é possível ganhar influência em amplos setores com um programa anticapitalista”. Mostra que é possível conquistar peso em setores de massas sem abandonar a luta para que o movimento operário se transforme em sujeito político, avance das lutas sindicais à militância política e construa um partido com independência de classe que lhe seja próprio.

Os trabalhadores podem e devem fazer política com sua própria estratégia independente e seu partido. Aproveitar a grande crise brasileira para agitar as idéias da revolução para amplos setores servindo-se das eleições: é a serviço desta batalha nós do MRT lançamos nossas pré-candidaturas eleitorais.

 
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