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REFERENDO SOBRE O BREXIT
Reino Unido: a esquerda e o referendo pelo brexit
Alejandra Ríos
Londres | @ale_jericho
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O destino do Reino Unido e sua relação com a UE será decidido no referendo; entretanto, essa discussão foi artificialmente instalada pelo primeiro-ministro britânico, David Cameron, logo após as eleições de maio de 2015. Temeroso de mais deputados saírem para o partido de extrema direita UKIP (Partido Independente do Reino Unido), o primeiro-ministro convocou o referendo para apaziguar a ala eurocética de seu próprio partido.

Nos últimos dias, as discussões econômicas foram desprezadas pelo debate em torno da imigração. Isso se aprofundou com o terremoto político que significou o assassinato da jovem deputada trabalhista, Jo Cox, que gerou a suspensão momentânea das campanhas pelo referendo. E se exasperou ainda mais quando se soube que uma das principais pistas da investigação do assassinato levava à relação do atacante com grupos de ultradireita, nacionalistas e anti-imigrantes. Por sua vez, o UKIP reforçou sua política anti-imigrante ao revelar um cartel de campanha que tem claras associações com um outdoor de propaganda nazi que desperta medo e é uma antecipação da narrativa que seguramente se fortalecerá, se ganhar a saída da UE.

Com as sondagens das últimas semanas mostrando vantagens em vários pontos para os brexit, - ainda que as novas enquetes prevejam uma leve vantagem à permanência – e tenham a queda da bolsa como pano de fundo, Cameron e o establishment empresarial e político alçam sua campanha com declarações alarmistas sobre o futuro do país. E dizem: o brexit significa o colapso da economia do país, a falta de remessas da UE, a ausência de instâncias para negociar a cota de imigrantes com as competências necessárias para incorporar-se ao mercado de trabalho.

O debate do referendo do Reino Unido fortaleceu os setores nacionalistas e anti-imigrantes que acusam os imigrantes de todo o mal que existe e por haver no país desde o esvaziamento do sistema nacional de saúde, passando pela falta de desenvolvimento industrial e a crise econômica. Essas manifestações de polarização e o grau de rivalidade política – não vista em nenhuma campanha eleitoral nas últimas décadas – põem em cheque a jogada de Cameron.

Por que escolher entre Cameron ou Farage?

Lamentavelmente, quase todos os grupos e setores da esquerda britânica acabaram presos em uma das duas opções da pergunta do referendo: deve o Reino Unido seguir sendo um membro da União Europeia ou deve abandoná-la? As respostas possíveis são duas: Remain a member (permanecer) ou Leave (sair).

A luta pelos direito dos trabalhadores e das trabalhadoras, dos migrantes, da população pobre não se encontra em nenhum dos dois bandos do referendo, e a primeira resposta da esquerda deveria ser denunciar o referendo pelo que ele é, uma manobra de Cameron para solucionar sua própria divergência interna.

O Socialist Workers’s Party (SWP) é parte da plataforma “#Lexit: a campanha por uma saída pela esquerda da UE” com outras organizações políticas de esquerda. Em seu texto de apresentação, dizem, corretamente, que os votantes merecem mais que optar entre a posição europeísta de Cameron (ou o sonho impossível de uma “Europa Social”), por um lado, e a campanha reacionária eurocética da UKIP e a ala direita do partido conservador, por outro. Para enfrentar essas falsas opções, argumentam, lançaram o #Lexit (acrônimo de “esquerda” e “saída” em inglês, com o fim de impulsionar uma campanha “principista, antirracista e internacionalista comprometida com a democracia, a justiça social e a sustentabilidade do meio ambiente”. Lexit é apoiada por Counterfire e o Partido Comunista da Grã-Bretanha e por Antarsya (Grécia).

Justificam votar pela saída com os seguintes argumentos: a UE segue uma agenda patronal, que inclui negociações secretas da Associação Transatlântica para o Comércio e o Investimento (ATCI) e os programas de austeridade na Grécia, Chipre, Irlanda e Portugal. Em segundo lugar, a UE é ingovernável, com instituições megaburocráticas como a Comissão Europeia e o Banco Central Europeu (BCE). Terceiro, o argumento de que a UE defende os direitos dos trabalhadores é um mito, todas as conquistas são produto da luta. Em quarto lugar, a UE é uma fortaleza europeia envolvida em planos de deportação massiva, e a livre mobilização dos trabalhadores se aplica exclusivamente aos comunitários. Por último, no plano político, não representará automaticamente um giro à direita. Se o Reino Unido sair da Europa, poderia se desenvolver uma grande crise para a classe dominante.
Em relação ao assassinato de Jo Cox, opinam que é produto da atmosfera de racismo e islamofobia na qual os imigrantes e refugiados são o bode expiatório.

Ninguém na esquerda nega a agenda liberal da UE nem seus aspectos reacionários; contudo, grupos solidários com o movimento migratório opinam que, caso ganhe o brexit, o racismo aumentará.

A posição do SWP não deixa de ser perigosa, porque a campanha pela saída está associada com o Farage e a extrema direita. Como pode um Farage encorajado representar uma situação melhor para a luta e abrir uma situação favorável às massas?

O Socialist Party (pertencente ao Comitê por uma Internacional dos Trabalhadores) se localiza pela saída da UE também. Em seus materiais, argumentam que o fazem desde uma perspectiva internacionalista de classe e que se trata de uma oportunidade para que os trabalhadores expressem sua oposição ao governo conservador e à classe capitalista. Sobre o assassinato de Jo Cox, sustentam que, ao não haver uma campanha de independência de classe em torno do referendo que unifique a voz contra a austeridade e o racismo em um só grito, não se pode descartar um resultado perigoso do referendo com um aumento dos ataques a migrantes e pessoas das minorias étnicas.

Por sua vez, tanto Socialist Resistance (organização-irmã do NPA, França) como Left Unity, a formação que conta com o apoio do cineasta Ken Loach, localizam-se no outro extremo do arco político. Em seu folheto “A União Europeia e o Referendo: por um voto crítico a favor de ‘permanecer’ contra a xenofobia”, denunciam o caráter antidemocrático e neoliberal da UE, suas instituições e do referendo. Argumentam que a campanha pela saída da UE é um projeto da direita xenofóbica e que seu triunfo alimentará o sentimento anti-imigrante e racista no Reino Unido e na Europa. Descartam absterem-se pelas terríveis consequências do brexit.

A organização Left Unity trata de estabelecer um diálogo com as pessoas que defendem que permanecer é mais progressivo, mas seu ponto débil é o embelezamento do projeto europeísta. Posiciona-se fortemente contra o governo conservador e suas políticas de cortes, porém, ao discutir com a esquerda que defende o contrário, esclarecem que a vitória do brexit lhe daria poder e credibilidade à extrema direita e ao sentimento anti-imigrante.

As posições cruzadas, por permanecer e por sair da UE, têm dividido a esquerda britânica. O referendo se apresentava à esquerda como uma oportunidade de denunciar conjuntamente e de maneira militante que se trata de uma disputa burguesa e negar-se, assim, a tomar partido nesses bandos. Depois de tudo, o debate está dominado inteiramente por campos burgueses: o de Cameron com um discurso pró-empresarial e neoliberal e o de Farage com uma narrativa populista de direita.

Os jovens descontentes com o establishment que se mobilizaram pela candidatura de Jeremy Corbyn seguem ativos em outros fenômenos políticos. Vão aos centros de detenção de imigrantes, trabalham como voluntários em Calais e se mobilizam na luta contra o racismo e pelos direitos dos imigrantes e se pronunciam pelo pertencimento à UE.

Diante da perspectiva do fortalecimento da ideologia reacionária – no marco da ausência de uma campanha que defenda uma solução independente, a favor dos trabalhadores, do povo pobre, da luta das mulheres, dos direitos dos imigrantes e da comunidade LGBT, permanecer na UE é visto como um mal menor.

No entanto, é necessário defender claramente que não é uma alternativa. A luta contra o nacionalismo xenófobo e racista está necessariamente unida à luta contra União Europeia do capital, por uma perspectiva internacionalista e de classe.

 
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