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TRIBUNA ABERTA
Uma nova onda neoliberal na América Latina?
Modesto Neto
Ativista dos Direitos Humanos e dirigente do PSOL potiguar.
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A ditadura do general Stroessner implantada em 1954 no Paraguai foi um sinal de anunciação para a América Latina. A ascensão do cesarismo militar de Stroessner foi o prelúdio que os governos nacional-populares de orientação progressista cairiam e uma transição para o autoritarismo duro de base militar floresceria pelo Cone Sul. As quedas de Getúlio Vargas no Brasil (1954), Perón na Argentina (1955) e Rojas Pinilla na Colômbia (1957) simbolizaram o início de uma ponte entre duas épocas históricas [1]. Entre as décadas de 1960-1970 os governos populares que buscavam reformas como o de João Goulart no Brasil e Allende no Chile foram suplantados pelo conluio entre militares, burguesias regionais consorciadas ao projeto continental do capitalismo internacional e os EUA. O resultado foi um rosário de ditaduras que arrasaram os povos da América Latina.

O caráter burgo-militar era da maioria das ditaduras na América do Sul [2]. A transição entre governos progressistas e as ditaduras resultou num retumbante fracasso para os níveis de vida dos povos. Welfort aponta que com as ditaduras o PIB por habitante caiu 16% no Uruguai, 12% na Argentina, 11% no Chile e 9% no Brasil. Isso significa dizer que um habitante latino-americano vivia com uma renda equivalente a 1/6 de um habitante dos EUA, 1/4 de um habitante no Japão e na Inglaterra. Na América Latina os únicos números que batiam recordes eram os das empresas estrangeiras. Entre 1950-1965 os EUA investiu US$ 3.8 bilhões e transferiram mais de US$ 11 bilhões de lucros, respaldados em isenções e arranjos fiscais neocoloniais [3].

O resultado da transição entre os regimes populares e as ditaduras foi catastrófico em todas as dimensões: econômicas, sociais e políticas. A Argentina registrou meio milhão de exilados, o Chile mais de 40 mil mortos e o Brasil 25 mil presos políticos. Os muitos anos de ditaduras deixaram sequelas irreparáveis na realidade dos povos e somente com um intenso movimento de lutas se conquistou um lento, limitado e inconcluso processo de redemocratização. O significado da transições pela metade é a ausência de democracias consolidadas e o receio de rupturas institucionais que podem ter como corolário uma nova rajada de violentos ataques aos mais pobres.

Nos últimos anos governos socialdemocratas com um fraco verniz popular e um reformismo de fachada conquistaram espaços importantes em países do Cone Sul e algumas conquistas foram significativas como a ascensão social no Brasil, produto de uma política econômica keynesiana que expande o consumo, mas não toca nos pilares da desigualdade. Lula no Brasil, Cristina Kirchner na Argentina e Evo Morales na Bolívia, com gradações diferentes, representam parte de um bloco de governos vendidos internacionalmente como “governos de esquerda”. No fundo, são e foram apenas governos socialdemocratas que tiveram algumas políticas distributivas, mas se negaram a enfrentar as grandes questões como a Dívida Pública. Apesar do caráter conciliatório e dócil com o capitalismo internacional, uma tendência de suplantação desses governos se esboça e começa a ganhar peso na América Latina.

A eleição de Macri em 2015 na Argentina, assim como a ascensão de Stroessner no Paraguai, representam esboços de uma transição e uma nova onda neoliberal que pode varrer o continente sul-americano. Na Argentina as medidas implantadas pelo Macri se materializaram em intragáveis aumento tarifários. As contas de energia subiram em média 250%, em alguns casos chegou-se a 700% de aumento. O transporte público e ferroviário dobrou. Água e gás aumentaram em 300% e somente em 2016 os alimentos dispararam 10%. Os índices de pobreza crescem, nos últimos três meses 1,4 milhão de novos pobres, 13 milhões não tem o suficiente para as necessidades básicas. Os pobres se multiplicam e hoje 34% do povo argentino vive mergulhado na miséria [4]. O pacote neoliberal é descarregado contra o povo e essa é uma tendência continental.

Na Venezuela a oposição de direita derrotou Nicolas Maduro e seu partido nas eleições parlamentares. O risco de Maduro perder as próximas eleições presidenciais e a ascensão e aprofundamento de medidas neoliberais na terra do ex-presidente Hugo Chaves é real e palpável. No Brasil o impeachment de Dilma Rousseff e a ascensão de Michel Temer levaria a Presidência da República o irmão siamês de Macri, e o pior: a reedição de políticas neoliberais contra o povo brasileiro e o alargamento do Ajuste Fiscal já iniciado. A caracterização que aponta o crescimento de uma onda neoliberal no continente não deve ser negligenciada. Um fantasma ronda a América Latina: o espectro do neoliberalismo. A construção acelerada de um bloco de forças continental anticapitalista é o único receituário possível para impedir que esse espectro continue vivo e robusto.

NOTAS

[1] – Francisco C. Welfort. Incertezas da transição na América Latina. IV Encontro do Fórum Cone Sul, Brasil, 1987.

[2] – Milton Pinheiro. Os comunistas e a ditadura burgo-militar: os impasses da transição. Ditadura: o que resta da transição? São Paulo: Boitempo, 2014.

[3] – Oswaldo Coggiola. O Ciclo militar na América do Sul. Blog da Boitempo. 2014. Disponível em: http://migre.me/t4EWz

[4] – El País. Argentina tem 1,4 milhão de novos pobres desde que governa Macri. 2016. Disponível em: http://migre.me/tqXDf

 
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