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Juventude e pandemia
A variante ômicron e a necessidade de uma juventude trotskista
Camila Galvão

No dia 24 de novembro, foi reportada à OMS a nova variante ômicron, encontrada na África do Sul. A OMS declarou ser uma variante de preocupação devido às 50 alterações no seu material genético, sendo 32 delas no gene que produz uma proteína utilizada pelo vírus para entrar nas células humanas, a proteína Spike, que é o alvo de muitas das vacinas desenvolvidas até hoje, o que eleva o risco de a imunização da vacina não nos proteger contra essa variante. Além disso, foi detectada a sua rápida disseminação por todo o planeta e a ômicron já é a variante dominante da África do Sul, podendo ser ainda mais transmissível que todas as outras.

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A identificação do vírus no continente africano levou diversos países a uma política racista e xenofóbica de proibir pessoas que viessem de diversos países do continente a ingressarem em países da Europa, América e Ásia. Além da proibição da ingressão nos países ser uma medida que se comprovou nada eficaz para a disseminação de novas variantes, foi anunciado na Holanda que no dia 19 de novembro a ômicron já circulava no país.

O surgimento de alterações no material genético e uma nova variante de algum vírus é um evento ao acaso. Porém, com uma grande propagação do vírus, consequentemente uma maior quantidade de vírus existindo, são muito mais elevadas as chances de que isso ocorra. Essa maior propagação do vírus, no entanto, não é ao acaso. Mesmo com diversas vacinas já aprovadas para uso no mundo inteiro e com dados que comprovam sua eficácia e diminuem a circulação do vírus, existem governos de países do continente africano que sequer começaram as suas campanhas de vacinação, havendo estimados 93% da população do continente africando inteiro ainda sem ser vacinado, enquanto há países imperialistas que chegaram a comprar mais doses do que a sua população inteira.

A responsabilidade por essa crise sanitária e o surgimento de novas variantes é da irracionalidade capitalista que proporciona a “guerra das vacinas” com países com baixíssimas coberturas vacinais e outros onde as vacinas vão até mesmo fora. Isso acontece porque o lucro da burguesia das indústrias farmacêuticas está acima da vida da classe trabalhadora, e essas empresas acumulam riquezas exorbitantes privatizando o conhecimento que salva vidas, as chamadas patentes das vacinas e medicamentos.

Para além disso, a própria origem da pandemia está intrinsecamente ligada ao modo de produção capitalista que somente sobrevive através exploração sem limites da natureza, através do desmatamento e queimadas desenfreados para a expansão dos latifúndios de monocultura e gado, desregulando completamente o ecossistema das regiões e colocando a população em contato com diversos tipos de patógenos que anteriormente circulavam somente em ambientes silvestres.

Somado a isso, todo o desenrolar dramático das mais de 5 milhões de mortes no mundo inteiro e o medieval método da quarentena e do isolamento social, aplicados em grande medida de maneira irracional, pois se deu sem testagem massiva e sistemática, foram causados diretamente pela falta de uma política que garantisse desde o início o rastreamento do vírus, para isolar apenas os contaminados, além da reconversão das indústrias para produzir todo o tipo de equipamentos e insumos para proteção individual e para hospitais, para os quais seria necessário atacar o lucro dos capitalistas. Porém, a política levada a frente em todos os países foi um precário, insuficiente e parcial isolamento social para minoritários setores da classe trabalhadora, demissões em massa e falta de respiradores e leitos, enquanto os ditos setores essenciais e os mais precários trabalhavam sem direito a medida sanitária alguma, tudo para manter o lucro da burguesia.

O surgimento da ômicron acontece em um momento em que, apesar de todo o negacionismo, a falta de aquisição de vacinas e a precarização do Sistema Único de Saúde por parte governo Bolsonaro e Mourão, a vacinação avançou bastante no país graças aos trabalhadores do SUS, com uma grande queda do número de internações e mortes, mesmo que ainda com desigualdades entre as regiões mais pobres e mais ricas. Essa nova situação da pandemia no país voltou a possibilitar a setores da juventude que ficaram mais de 1 ano e meio em casa, espremidos entre a ansiedade e a depressão da quarentena, voltar a ver os amigos, voltar a fazer algumas atividades e explorar a juventude, a sexualidade nos mínimos limites do que o capitalismo permite, enquanto para os que nunca tiveram direito à quarentena, uma maior segurança a sua saúde. Entretanto, essa “nova normalidade” que agora pode estar sendo colocada em risco com os até então não conhecidos riscos de não sermos protegidos pela imunidade adquirida com a vacinação, vem se dando abaixo de muita repressão, opressão, e precariedade.

Essa “nova normalidade” vem junto com um momento de profunda crise econômica, com a inflação chegando à níveis altíssimos e elevando absurdamente o custo da alimentação, transporte e o custo de vida geral da juventude brasileira, que hoje também está com 25,2% de desempregados e imersa em trabalhos informais sem direito trabalhista algum, se equilibrando entre freelas, uma bag de aplicativo nas costas, a falta de perspectivas e o constante medo de ficar sem seu sustento. Esses dados também são expressos no ENEM deste ano, o mais branco e elitista da década, com o menor número de inscritos em 14 anos. O sonho de entrar na universidade, devido a cada vez maior dificuldade até mesmo de se manter vivo, se torna cada dia mais distante, somado também ao inacessível ensino remoto, pela falta de assistência tecnológica e também pela necessidade de abandonar os estudos para procurar maneiras de se sustentar frente ao desemprego.

Para além de toda a drástica precarização de vida da juventude, os mesmos prefeitos e governadores que durante todo o período não forneceram condições de saúdes básicas, submetendo a população a pegar ônibus lotados, trabalhar sem EPIs de qualidade e morrer na fila da espera por um leito, hoje se utilizam demagogicamente da pandemia para justificar o uso da polícia para reprimir os rolês da juventude, principalmente da juventude pobre e negra, alegando que não estão cumprindo as medidas sanitárias.

Toda a precariedade desta nova normalidade recai com muito mais peso sobre a juventude LGBTQIA+, negra e mulher, que hoje ocupa os piores postos de trabalho, o que retira desses setores qualquer condição material que permita exercer, nos mínimos limites que o capitalismo permite, sua liberdade sexual e de gênero, pois gastam todas as suas forças pensando como vão fazer para poderem se alimentar no dia seguinte no país da fila do osso e do lixo, contando com a sorte de não ser um dos alvos da bala da polícia racista. Além das condições materiais objetivas, as condições subjetivas psicológicas são sistematicamente massacradas, enquanto são censurados nas escolas, universidades, locais de trabalho e até mesmo dentro de suas próprias casas pela ideologia burguesa e opressora, aprofundada drasticamente pelo misógino, racista e LGBTfóbico governo de Bolsonaro e Mourão.

É preciso uma juventude que não aceita ver o meio ambiente sendo destruído pelo agronegócio e a poluição enquanto é gerada uma crise climática sem precedentes com cada dia novos e maiores desastres naturais que tiram a perspectiva de um futuro possível no planeta em prol de manter o capitalismo. Uma juventude que lute pela quebra das patentes para que o conhecimento esteja em prol da vida e não da acumulação de riquezas. Uma juventude que lute por uma reforma agrária radical que arranque da burguesia os seus latifúndios e que coloque-os sob controle dos trabalhadores para que, junto aos pesquisadores, planejem cientificamente um modo de produção agroecológico e sustentável onde haja uma relação harmônica da natureza com a sociedade.

É preciso uma juventude que questione os problemas desde a raiz. Que questione não só o presidente, mas o regime político de conjunto e todo o Congresso Nacional que está unido para nos atacar. Que questione a serviço de que a polícia existe. Que questione o judiciário que não foi eleito por ninguém e que mantém encarcerada uma grande massa de pessoas negras sem sequer direito a julgamento. Que questione as reformas e que questione a que serve hoje a destruída Constituição Brasileira. Que questione quem se diz estar ao lado da classe trabalhadora e que está do lado da burguesia quando o assunto é manter aumentar o lucro. Que questione se realmente os interesses dos capitalistas responsáveis pela barbárie que vivemos hoje são minimamente conciliáveis com os interesses da classe trabalhadora de viver uma vida digna. Que questione o que de fato irá mudar trocar um presidente pelo outro em meio à uma crise econômica internacional se se manterem intactas as reformas e as instituições da burguesia responsáveis pela miséria da juventude.

É preciso uma juventude que entenda que o seu poder está para muito além de apertar algumas teclas numa urna de 4 em 4 anos. Uma juventude que acredite que somente através da auto organização é possível levar a frente uma luta consequente e queira varrer as burocracias que são um entrave nos locais de estudo e trabalho. Uma juventude que entenda como funciona a engrenagem que a classe trabalhadora faz movimentar todos os dias e que, através de suas mãos e suas mentes, mantém o mundo de pé ao mesmo tempo que sofre com as consequências mais cruéis da exploração do sistema capitalistas, mas que, se auto organizada nos seus locais de trabalho a partir de seus anseios mais democráticos e decidir parar, o mundo e o lucro dos capitalistas para. Uma juventude que saiba que os próprios trabalhadores entendem melhor do que ninguém como deveria funcionar o modo de produção e que, se for gerido por eles, pode fazer com se haja um modo de produção racional onde todos uma vida digna.

É preciso uma juventude que busque enxergar através de olhos marxistas e trotskistas à luz da história da humanidade, que é movida pelo choque dos interesses entre as classes sociais, a luta de classes. Uma juventude que busque compreender os processos mais profundos da sociedade, que a roda da história gira, e que existe um futuro para além de uma eterna pandemia e das distopias ficcionais de Black Mirror e Jogos Vorazes. Uma juventude que esteja disposta a ser a partícula do futuro da humanidade para forjar as bases de um novo mundo e tire lições estratégicas dos processos de luta da classe trabalhadora e das atuações de todos os setores políticos, buscando unir o que se tem de mais avançado para se preparar para intervir nos próximos processos que irão acontecer.

A covid-19 e a variante omicron são uma das faces mais irracionais da barbárie capitalista. O trotskismo com os métodos da luta de classes são as armas que a juventude aliada ao conjunto da classe trabalhadora pode usar para enfrentar a burguesia e seus aliados responsáveis pela crise econômica, sanitária, ambiental, social e climática que hoje assola a humanidade em todo o planeta.

 
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