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Debate com a esquerda
Quem tem medo das jornadas de junho de 2013?
Diana Assunção
São Paulo | @dianaassuncaoED

As discussões sobre as manifestações do último 3J recolocaram o verdadeiro debate por trás de preocupações com infiltrados ou “extremismos”: a volta de manifestações de massas por fora do controle das direções oficiais.

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As últimas manifestações do dia 3 de julho seguiram o ritmo das manifestações anteriores quanto ao número de participantes e extensão territorial pelo país. Uma diferença que talvez tenha passado despercebido às grandes massas, mas que certamente se notou aos olhos da vanguarda, foi a diminuição do que poderíamos chamar de “aparato petista” nas manifestações. Menos bandeiras, balões, blocos organizados de sindicatos. Ao menos parte disso se explica pelo fato de que diante da entrada de setores da direita nas manifestações, o PT acionou por baixo uma operação ideológica com um “alerta” de que as manifestações com a direita e novos setores sociais poderia trazer de volta o “fantasma” das jornadas de junho de 2013. A presença da direita nos atos é demagógica e hipócrita, são os mesmos que aprovam os ataques contra nós, e agora querem fingir que são aliados. Não são. Inclusive a presença da direita, que repudiamos, foi residual, com um pequeno bloco em SP. No entanto, se foi algo pontual, porque o fato ganhou repercussão, em especial com esse viés que tenta associar junho de 2013 à direita? Esse episódio do país é tema de disputa narrativa até hoje tendo no PT uma das mais conservadoras de todas: de que o início do “fascismo” no país teria sido as manifestações contra seu governo.

Para colocar alguns pontos nos is: em primeiro lugar as manifestações contra o governo do PT em junho de 2013 foram justas manifestações em defesa da educação, saúde, moradia, transporte, ou seja, os serviços essenciais para a população quando o governo Dilma começava a aplicar ajustes contra os trabalhadores e o povo pobre. Justamente por isso os sindicatos e movimentos dirigidos pelo PT não conseguiram controlar as manifestações, como o fazem normalmente. Foi uma explosão essencialmente espontânea da juventude, que como todo tipo de manifestação de massa tinha um caráter difuso, e onde a esquerda organizada era um fator bastante minoritário. Mas quem abriu espaço para a direita? Não foram as manifestações de rua com a juventude encabeçando os enfrentamentos com a repressão policial (repressão em que o prefeito de São Paulo naquele então, Fernando Haddad do PT, colaborava com o tucano Alckmin). O que abriu espaço para a direita foi a resposta repressiva do governo e a sua política que fortaleceu o agronegócio, as Forças Armadas, a bancada evangélica e o judiciário, que foram justamente parte dos setores que impulsionaram o golpe institucional de 2016. Quem abriu espaço para a direita foi o PT que incorporou os métodos de corrupção próprios do capitalismo permitindo que a direita utilizasse disso para erguer a bandeira contra a corrupção, além de impor outros processos fraudulentos como do próprio ex-juíz Sérgio Moro que condenou Lula em um processo político arbitrário. Então quando o PT diz que as jornadas de junho foram o início do “fascismo” é uma forma de esconder que foi o seu governo que incorporou a direita no poder e governou fortalecendo setores sociais que hoje são base do bolsonarismo, abrindo espaço para o golpe institucional que depois desembocou na entrada da extrema-direita.

A tese do PT contra as jornadas de junho de 2013 é muito difundida pela intelectual petista Marilena Chauí, que chegou a ir em uma massiva palestra de estudantes da USP diante da entrada de Bolsonaro dizer que era melhor as “toupeiras não saírem debaixo da terra”, ou seja, aconselhando a juventude a não sair às ruas e fazer um trabalho “subterrâneo”. Comentário mais conservador impossível. Hoje quando vemos que as manifestações de rua para o PT tem conteúdo meramente eleitoral e quando aparece qualquer sinal de “fora do controle” revivem os fantasmas de junho, essas questões ficam em evidência. Portanto, não nos enganemos: as discussões sobre “violência” e “extremismo” nos atos escondem dois debates de fundo que se complementam. Por um lado os defensores da unidade a qualquer custo com qualquer partido, inclusive aqueles do regime burguês que se oponham a Bolsonaro, como por exemplo Valério Arcary que parece emocionado com a presença do PSDB nas manifestações e por isso crítica pela direita os Black Blocks e a ação midiática do PCO com a tentativa de expulsão do PSDB. Tudo isso porque para ele, ter o PSDB nos atos é um grande exemplo de “política revolucionária” ainda que não tenha absolutamente nenhum ponto de contato com o marxismo. Diga-se de passagem, unidade com a direita compartilhada também pelo PSTU, que defendeu a legitimidade de sua participação nos atos. Mas por outro lado volta o “medo” das jornadas de junho. Gilberto Maringoni que é uma das alas simpáticas ao PT no interior do PSOL, também condenando as ações consideradas extremistas profetizou em sua última nota “Não nos esqueçamos da captura pela extrema-direita que as jornadas de 2013 sofreram”. Essa definição está a serviço da mesma narrativa petista. Por trás de condenar as manifestações de junho de 2013 supostamente porque teriam sido capturadas pela direita, a narrativa busca esconder que quem abriu espaço para a direita foi o próprio PT. E, ao mesmo tempo, fica evidente que o medo das jornadas de junho é muito mais da falta de controle das direções burocráticas sobre o movimento de massas do que qualquer outra coisa.

Por isso, diante dos pedidos de criminalização contra o PCO por terem tentado promover a expulsão física do PSDB dos atos, nos posicionamos taxativamente contra. Ao mesmo tempo não é secundário apontar que o PCO é o setor que mais “pinta pela esquerda” a expectativa de que a solução para o país é a volta de Lula, enquanto ele próprio está negociando com a velha direita como FHC, Sarney e Kassab, portanto a tentativa de expulsão do PSDB é para encobrir uma política completamente adaptada ao petismo e suas alianças com a direita. Ao passo que fazem esse jogo de cena, são totalmente adaptados à paralisia das centrais dirigidas pelo PT, o que é funcional para evitar que a classe trabalhadora seja o sujeito hegemônico das mobilizações, único caminho que pode realmente expulsar a direita das ruas.

Por tudo isso e retomando junho, uma das grandes debilidades dessas jornadas foi, na realidade, não ter avançado para uma auto-organização superior às manifestações de rua, com a entrada em cena da classe trabalhadora como sujeito hegemônico, buscando levar adiante por exemplo uma greve geral organizada nos locais de trabalho e estudo. A ausência de uma forte esquerda, socialista e revolucionária, cobrou seu preço, uma vez que era necessário abrir um canal para que as manifestações superassem pela esquerda a burocracia petista, de um lado, e o beco sem saída do autonomismo conservador, de outro. Não nos opomos à espontaneidade, mas buscamos sempre dar-lhe um canal revolucionário, sem o qual se dissipa na impotência e dá lugar ou a fenômenos reformistas, ou mesmo a governos bonapartistas de direita. A falta de controle das direções não é abstrata. Elas boicotaram e atacaram as jornadas de junho, no extremo oposto da busca da auto-organização das massas para conquistar suas demandas. Essa falta de controle é o que aterroriza tanto o PT quanto a burguesia. Precisamos estar preparados para aproveitar os próximos estouros da luta de classes no Brasil com uma forte esquerda baseada na auto-organização e na independência de classes.

Junto ao PT que tem pânico de movimento de massas na rua e claramente se desespera para o país não ter nada que mude seu roteiro eleitoral para 2022, há vários setores que discursivamente apoiam a luta do povo colombiano, do povo chileno, que explodiu com a radicalidade da juventude nas ruas, cinicamente sendo parte do “terrorismo” que criminaliza qualquer ação mais radical. Óbvio que devemos combater qualquer tipo de infiltração, com a organização combativa do movimento. Mas o discurso por trás da criminalização de ações de “violência”, de “extremismos”, de “black blocks”, da “captura da direita” enquanto aceitam a direita na chamada frente ampla são cortina de fumaça para o verdadeiro temor: que as manifestações saiam do controle e encontrem o caminho da auto-organização da nossa classe ao lado da juventude para superar as direções burocráticas e derrotar esse governo Bolsonaro-Mourão e todos os ataques, reformas e privatizações com uma greve geral e não com eleições daqui há um ano que vão, na prática, preservar toda a obra econômica do golpe institucional como Lula já anunciou. Por isso nossa política é para resgatar o melhor das jornadas de junho de 2013 que era o levante de massas com a juventude à frente e batalhar pelo caminho da auto-organização e para a classe trabalhadora se colocar no centro da luta com seus próprios métodos. Estes que consideram uma heresia ter um pequeno conflito com a direita no ato ou que setores da juventude queiram radicalizar atos pacifistas eleitorais, vão ver a roda da história passar por cima novamente quando a juventude sair em massa na rua seguindo os exemplos latinoamericanos. Não se trata de um “fantasma de junho” que se pode evitar. Cedo ou tarde as massas se colocarão em movimento de novo como ali fizeram. A questão é se a esquerda vai como naquela oportunidade estar do outro lado da barricada, apostando em saídas institucionais, ou canalizando essa explosão para a via correta da luta de classes.

 
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