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5 anos após o crime de Mariana, atingidos seguem sem casas, indenização e justiça
Redação

O crime foi um dos maiores desastres ambientais da história da humanidade. Dezenove pessoas morreram. A mineradora Samarco e suas acionistas, Vale e BHP Billiton, duas das maiores empresas mundiais do setor, seguem impunes, cometendo novos crimes – como o de Brumadinho – e seguem lucrando bilhões todos os anos.

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Imagem: Neno Vianna/EFE. 6 de novembro de 2015.

A casa do trabalhador rural Paulo César Mendes, ex-morador da extinta Bento Rodrigues, distrito de Mariana, deixou de existir há cinco anos. Foi levada por uma onda gigante de lama há exatamente cinco anos, em 5 de novembro de 2015, pelos rejeitos de minério de ferro da barragem de Fundão, que se rompeu, liberando lamaçal que passou por cima do distrito e arrasou cursos d’água - o principal deles foi o Rio Doce, chegando até a sua foz, no Oceano Atlântico, em Linhares, no Espírito Santo.

A casa nova de Paulo também não existe, pois foi prometida pelos responsáveis pela lama que destruiu sua residência anterior e, meia década depois, ainda é um pequeno quadrado desenhado numa planta arquitetônica.

Depois do crime, as mineradoras responsáveis criaram uma fundação, batizada de Renova, à qual Paulo se refere como “Enrola”, e que tem à frente as próprias mineradoras, segundo o Ministério Público de Minas Gerais, é a encarregada de tocar o projeto de construção do Novo Bento Rodrigues. Desde 2016, quando os ex-moradores aprovaram a área para sua construção, a entrega das obras foi adiada por duas vezes.

A data inicial, março de 2019, foi remarcada para agosto deste ano, e em seguida transferida para fevereiro do ano que vem. Mas um documento da Prefeitura de Mariana mostrado por Paulo César deixou-o mais apreensivo. No papel, a previsão máxima para início das obras em lote no Novo Bento Rodrigues é 9 de outubro de 2021, ou seja, o começo pode ocorrer oito meses após a já terceira data marcada para a entrega da casa. E o prazo máximo para término está previsto para outubro de 2024 - quase 9 anos depois da destruição das casas. Uma outra informação no documento deixou a família estarrecida. No campo “proprietário do imóvel” aparece Fundação Renova, e não o nome do atingido.

Paulo César, de 51 anos, morou em Bento Rodrigues por 30 anos. Desde o rompimento da barragem passou a morar em casa paga pelas mineradoras em Mariana. “Tem época em que fico sem comer por três dias”, diz. Há seis meses sua mulher teve um AVC e ficou com os movimentos comprometidos. A casa paga pelas mineradoras tem dois lances de escada, dificultando a saída da esposa para a rua. “Pedi para arrumarem outra, mas não foi resolvido”, lamenta o trabalhador rural. As mineradoras fornecem auxílio financeiro aos atingidos.

Mas nem todos conseguiram esperar a nova casa. Dona Orides da Paixão de Souza vivia no distrito com uma filha, Gercina Juliana de Souza, de 62 anos, que em maio passado morreu de enfarte. O filho Antonio Fagundes, de 67 anos, morreu também este ano. “O que mais me faz falta é a vizinhança”, diz outra filha dela, Neusa, que morava em Bento Rodrigues com a família de oito pessoas. Todos estão agora em Mariana.

Geraldo, amigo de Paulo César, às vezes pensa em desistir do Novo Bento Rodrigues. “É muito tempo de espera. Minha casa nem foi desenhada ainda.”

Veja também: Depois de 5 anos do crime da Samarco, somente 2 de 300 casas prometidas foram entregues

Um relatório de cinco anos da tragédia, elaborado pelo Ministério Público estadual, aponta que em outubro de 2020 “está em andamento” a construção de cinco casas, escola, posto de serviços e posto de saúde. Ou seja, em relação a moradias, não há nada pronto. A igreja sequer está com o projeto aprovado. Postes de iluminação foram colocados e ruas foram asfaltadas. O site da Renova afirma que serão construídas 255 casas para 255 famílias.

Em nota, a Fundação Renova afirmou que o prazo para a entrega das obras do Novo Bento Rodrigues “está sendo tratado no âmbito de uma Ação Civil Pública, tendo sido o juízo devidamente informado sobre os impactos da covid-19 no andamento das obras”. Porém, o prazo inicial de entrega era em março de 2019, um ano antes da pandemia chegar ao Brasil. Sobre o documento da prefeitura de Mariana que a aponta como proprietária dos terrenos, a fundação afirmou que os lotes só podem ser transferidos para as famílias “após a baixa do loteamento na prefeitura”, mas ao que parece, essa informação não foi passada aos moradores, que não sabem se podem acreditar em uma fundação que, além de ser gerida pelos mesmo criminosos que criaram essa situação, já adiou os prazos tantas vezes.

O promotor público Guilherme Meneghin declarou em reportagem ao G1 que a postura da Fundação Renova é ineficiente não apenas na entrega das casa, mas também no pagamento das indenizações. Segundo o Ministério Público de Minas Gerais, 925 núcleos familiares foram cadastrados em Mariana, porém, apenas 345 já receberam as indenizações finais.

Esses são apenas as consequências nas regiões imediatas da tragédia, entre aqueles que perderam casas, o distrito inteiro, as vidas. Mas os efeitos são maiores, acompanham todo o destruído Rio Doce e deságuam no oceano em Linhares/ES. As consequências fazem o caminho da lama tóxica. Todos aqueles que viviam do Rio Doce e seus afluentes foram atingidos, assim como os que dependem do mar no Espírito Santo. Famílias de pescadores e agricultores que perderam seus meios de subsistência, e também seguem há 5 anos sem justiça.

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A Samarco, Vale e BHP Billiton são responsáveis por toda essa situação criminosa, desde o rompimento da barragem – uma tragédia anunciada – até cada família que hoje ainda não viu justiça e, mais que isso, viu ao longo dos anos seus familiares e conterrâneos adoecerem e morrerem em decorrência de tudo que se desencadeou depois daquele 5 de novembro de 2015.

A Vale, ex-estatal que foi privatizada na década de 1990 pelo governo FHC, acumula altos lucros enquanto cria rios de lama impunemente. A Vale reportou um lucro líquido de US$ 2,908 bilhões no terceiro trimestre de 2020, alta de 76% em relação ao mesmo período de 2019, um valor ínfimo perto das multas que teve que pagar e que também não chega nem perto das indenizações já pagas em 5 anos.

Até o final de agosto, a Fundação Renova havia destinado 2,6 bilhões de reais a auxílios emergenciais e indenizações, o que não faz cócegas nos 2,9 bilhões de dólares lucrados pela Vale em apenas 3 meses.

A construção de Novo Bento Rodrigues, como suas casas e tudo que seja necessário à vida de um distrito, assim como as indenizações e a recuperação ambiental de todo o caminho da lama, só poderão ocorrer de maneira efetiva e segundo os interesses dos atingidos se for a partir da organização e decisão desses atingidos, e não pelas mãos de uma fundação que é gerida justamente pelos criminosos. Como já dissemos aqui, a expropriação – sem indenização – dos antigos donos e a reestatização de mineradoras como a Vale sob controle dos trabalhadores, é a única saída de fundo para essa barbárie.

Com informações do jornal O Estado de S. Paulo.

 
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