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DEBATE PROFESSORES RJ
Chega de farsa: é urgente que o SEPE articule professores e comunidades para enfrentarem os ataques
Luiz Henrique
Professor da rede estadual em Resende, RJ

Em meio ao caos pandêmico do Estado do Rio de Janeiro, as alas do judiciário disputando para intervir na política, e com o cenário eleitoral marcado pela forte adaptação dos partidos de esquerda, o novo secretário de educação, o empresário Comte Bittencourt, autoritariamente impõe o retorno parcial das aulas a partir do dia 19 de Outubro. Enquanto isso o sindicato dos profissionais da educação do estado do Rio de Janeiro, SEPE RJ, referenda, em uma plenária esvaziada, uma farsesca “greve pela vida” apenas com um setor mínimo da categoria. É preciso buscar sempre unidade de luta entre os diversos setores que compõem a classe trabalhadora para fortalecer a luta pela educação.

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A cada dia aumenta o número de mortes pela COVID 19 no Rio de Janeiro, principalmente entre a população negra e pobre das periferias. Não é coincidência que esta parte da população fluminense seja também a que mais sofre nas mãos da polícia assassina, que somente no primeiro ano de governo do reacionário Wilson Witzel, matou pelo menos 1.810 pessoas (e mais de mil somente de Janeiro a Julho deste ano). Também não é coincidência que esta mesma parcela da população seja a que mais sofre em trabalhos precarizados, muitas vezes sem quaisquer garantias e direitos, tendo que se arriscar diariamente sem ter direito a fazer quarentena, para conseguirem o mínimo para o sustento de suas famílias. Nada disso é coincidência, diante da decadência capitalista, o projeto de poder da burguesia fluminense passa justamente pelo aumento brutal da exploração e controle da população mais pobre, fazendo do estado, que é um dos mais ricos da união, amargar alguns dos piores índices sociais nas suas periferias.

Por outro lado, uma herança dos tempos de capital, o estado também conta com uma larga parcela de setores do funcionalismo público, muitas vezes progressista, mas que outras vezes não se vê como parte da mesma classe trabalhadora que é assassinada nas favelas, pressionada pela grave crise social do estado. É em cima destes setores que nestas eleições os partidos do regime político trabalham a ilusão de que é possível construir gestões “progressistas” nos municípios, por fora de toda a luta que deve ser dada a nível nacional contra Bolsonaro, os militares, e todos os golpistas (do legislativo, da mídia burguesa e também do STF), que a todo o momento tramam para empurrar um jeito de despejar os efeitos da crise sobre os trabalhadores, a partir de uma agenda extremamente agressiva de reformas para o capital.

Assim, o afastamento do reacionário Witzel a partir da decisão monocrática de um único juiz, enquanto o prefeito-bispo da capital e aliado de Bolsonaro, Crivella, passou incólume por diversos processos de impeachment, nos mostra que não podemos ter nenhuma ilusão neste sistema, que serve apenas para atender da melhor forma as necessidades de um governo que precisa impor medidas de privatização e de aumento da exploração para acalmar a sanha do mercado financeiro. As recentes medidas autoritárias do judiciário no Rio de Janeiro abrem o caminho para um maior controle político das instituições dos grupos ligados ao governo federal e, no caso, aumentam a influência política de Bolsonaro no Rio de Janeiro.

É neste cenário que o governador interino coloca um nome indicado pela ALERJ, o deputado Plínio Comte Leite Bittencourt, um empresário ligado as faculdades privadas Plínio Leite, para conduzir não somente a reabertura das escolas, mas também o plano de ataques ao ensino público que vinha sendo gerido por Pedro Fernandes, antes de este ser preso acusado de corrupção. Como primeira ação, já impôs arbitrariamente a reabertura das escolas públicas, sem que estas recebam um tostão sequer para prepararem o retorno, e sem qualquer consulta as comunidades escolares.

Além de problemas de infraestrutura básica, que vão desde falta de recursos tecnológicos como computadores e internet, até problemas no saneamento e climatização, as escolas da rede estadual vêm de um período de fechamento de turmas que resultou justamente numa maior concentração de alunos por sala de aula. Se isto já prejudicava a qualidade das aulas antes, agora, em um cenário de retorno em plena pandemia, torna as aglomerações simplesmente inevitáveis. Além disto, a precariedade do trabalho na escola vem aumentando consideravelmente. A terceirização dos funcionários de apoio, como merendeiras e zeladoras, criou um cenário de graves inseguranças para estas profissionais, que constantemente sofrem com atrasos nos pagamentos. Os professores já amargam quase sete anos sem reajuste, e cada vez mais se tornam dependentes de gratificações temporárias para sustentar suas famílias. E em meio a tudo isso, muitos alunos ficaram meses sem receber qualquer suporte para alimentação, e quando receberam, este foi insuficiente e apenas para uma pequena parcela. É por isso que nós do Esquerda Diário defendemos um programa de medidas emergenciais para a educação no Rio de Janeiro..

Tudo isto nos leva a questão do SEPE: o papel mais importante que o sindicato poderia ter seria justamente o de articular as lutas de todos estes setores, desde os trabalhadores de aplicativo que compõem os pais e estudantes das nossas escolas, até os terceirizados e funcionários administrativos para construírem junto com os professores e estudantes uma organização desde a base, onde as demandas poderiam ser discutidas para construção de um plano de lutas. Mas o que as direções do SEPE, compostas principalmente pelo PSOL, PT, PCdoB e PSTU, fazem é justamente o contrário, por um lado fortalecendo a passividade da categoria a partir do discurso de que todas as demandas podem ser atendidas através de processos judiciais, e por outro, atacando a própria categoria, principalmente os setores mais ativos, a partir da farsa de que “não é possível fazer nada porque a categoria não adere à luta”.

Precisamos nos deter um pouco neste último ponto. Desde a última greve, em 2016, o sindicato vem chamando uma série de paralisações esvaziadas, que as direções chamam de “greves”. Estas ações, muitas vezes tomadas em assembleias esvaziadas e que depois de tomadas, simplesmente não são construídas pelos núcleos do SEPE nas escolas, acabam tendo uma baixíssima adesão, expondo os professores a descontos e ameaças, principalmente em escolas com direções mais ligadas a reacionária burocracia da SEEDUC. O que foi se tornando cada vez mais claro, é que à medida que muitos professores começam a não paralisar, isso começa a ser usado pelas direções do SEPE, de forma consciente, para desmoralizar uma parte da categoria. O bordão “o SEPE está paralisando, os professores é que não paralisam” é usado frequentemente nestas situações, e mais grave, isso contamina setores de vanguarda que passam a ter um olhar sectário para a categoria. E desta forma os focos de luta vão se tornando cada vez mais isolados, até que por fim se extinguem e dão lugar a adaptação e a passividade.

Não é exagero dizer que na direção do SEPE tanto as correntes do PSOL (principalmente a US, mas também os grupos oriundos da Insurgência e Resistência e seus aliados do PCB), quanto o PT e o PC do B tornaram-se os grandes bombeiros dos incêndios na categoria, desempenhando um papel de contenção da luta de classes em pleno período de ascensão da mesma extrema direita que eles dizem combater. Já o PSTU cumpre uma função similar, embora de uma forma distinta: ao agitar indiscriminadamente a greve como solução para todos os problemas a todo o momento, mas sem dar luta política séria com as correntes que se “descolam” cada vez mais da categoria ou tentar fomentar a auto-organização nas escolas, acabam alimentando uma imagem caricata da militância, afastando muitos setores da luta. E entre os grupos que se reivindicam autonomistas ou anarquistas, mesmo quando criticam as correntes majoritárias, também há sempre a forte tendência de formar pequenas seitas que, justamente por agir de forma autônoma, não colaboram em nada nem para a unidade da luta, nem para um aprofundamento do aprendizado dos professores com suas experiências.

E assim, o SEPE seguiu 2020 desarmando a categoria. Mesmo com os governos de Bolsonaro e Witzel conduzindo inúmeros ataques aos trabalhadores durante a pandemia, em nenhum momento as correntes que o dirigem sequer levantaram qualquer consigna de luta contra o governo, limitando-se a algumas declarações esporádicas. Também em nenhum momento a auto-organização dos professores para enfrentar os problemas da pandemia nas escolas foi levantada, pelo contrário, a política do SEPE limitou-se ao princípio equivocado de que “cada professor deve bancar a sua posição” despejando um peso desproporcional nos indivíduos, enquanto as próprias direções sequer moviam um dedo para que houvesse uma construção da resistência coletiva. Assim, quando veio a absurda proposta de Ensino a Distância de Pedro Fernandes, em nenhum momento as direções levantaram o problema do que fazer durante a pandemia, preferindo inclusive não se comprometerem diretamente com uma tentativa de boicote puxado por alguns setores minoritários, alimentando a confusão de que a entrada nesse programa era opcional, o que fez com que diversos professores sofressem corte no salário. E diante da perspectiva de reabertura, o máximo de discussão que houve, não com a categoria, mas entre as próprias correntes, foi se a volta “deveria se dar somente com a vacina” ou “com protocolos das instituições científicas”, como se isso fizesse diferença, já que em ambos os casos o governo decidiria quando voltar.

Coroando os absurdos, para discutir a proposta de greve, ao invés de convocar assembleias online de fato, foram chamados absurdos referendos, onde os professores não teriam direito de discutir as propostas da direção, cabendo apenas dizer sim ou não. Desta forma foi votada uma “greve” absurda, segmentada, de cada professor a medida que estes fossem convocados a retornar. É um absurdo sem tamanho, que não pode ser chamado de greve, mas sim de farsa: o SEPE finge que está convocando uma greve para mascarar que na verdade não quer organizar a categoria para enfrentar o governo em nenhuma de suas absurdas políticas para a educação durante a pandemia.

Mesmo com toda a crise, os professores são uma categoria politizada, que está em contato direto com os filhos da classe trabalhadora e a partir daí, entram mais facilmente em sintonia com as lutas de outras categorias. No momento em que os ataques são generalizados, as escolas poderiam de fato servir como centros para organizar as lutas em cada comunidade. Para isso é necessário não apenas a auto-organização dos professores, como também sua articulação com terceirizados, estudantes, outros trabalhadores que compõem a comunidade escolar. Essa articulação é o que o SEPE deveria estar fazendo, por isso é preciso exigir das direções atuais, desmascarando seu papel hoje, em perspectiva de superar essa lógica burocrática que tomou conta da atuação do sindicato, tomando essa ferramenta de luta novamente para as mãos dos professores e demais trabalhadores da educação para que volte a estar à serviço da luta.

 
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