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MUNDO OPERÁRIO
O Trabalho Precário e Negro nas Cozinhas de Cuiabá
Comitê Esquerda Diário DF/GO
Carlos Quariterê

Na luta do cotidiano devemos partir do que é comum para conseguirmos nos organizar para luta contra a precarização do trabalho.

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Na luta do cotidiano devemos partir do que é comum para conseguirmos nos organizar para luta contra a precarização do trabalho. Os trabalhadores concursados da Secretaria Municipal da Educação de Cuiabá que fazem parte do quadro técnico, da área de nutrição escolar, e que trabalham nas escolas rurais enfrentam precárias condições de trabalho nas cozinhas. Desde a redução do quadro de funcionários até enfrentar altas temperaturas por trabalhar com o fogão ligado durante horas sem poder ligar o ventilador ou até mesmo o exaustor com a justificativa, por parte da direção da escola, que devemos economizar energia.

Trabalho em uma escola rural como merendeiro. Alimento cerca de sessenta crianças de cinco salas de aula, do Infantil ao Fundamental 1. Sou responsável por dar o café da manhã e a refeição principal (arroz, feijão, carne, legume...), limpar a cozinha, a louça e controlar o estoque. Todos os dias, sozinho. Na formação para enfrentar a pandemia que fizemos vimos que a demanda aumentou, teremos que higienizar cada item da cozinha de forma muito mais severa, e deve ser assim. Pode não parecer muito, mas é. A profissional da tarde, minha colega, faz o mesmo. No ano passado em 2019 haviam dois funcionários por turno mas em 2020 houve redução dos gastos e de quadro.

A precarização então se dá nos baixos salários, (recebo duzentos reais a mais do que um salário mínimo), se dá no enfrentamento diário da exposição às altas temperaturas dentro da cozinha em Cuiabá, a capital mais quente do Brasil e se dá no manuseio de pesadas panelas que podem lesionar a coluna.

No dia de tomar a posse do cargo de merendeiro vi que a maioria esmagadora dos técnicos em nutrição escolar é composta por mulheres negras. Nesta classe das servidoras do município que trabalham nas cozinhas das escolas existe muito preconceito racial e desvalorização por parte do Estado e consequentemente dos funcionários mais próximos que nos vêem como serviçais muitas vezes. Nos olhando com a visão típica do sinhozinho e da sinhazinha. Ainda mais na capital de um Estado marcado pelo agronegócio e da oligarquia podre ligada aos tempos dos bandeirantes que fundaram esta cidade vindos da São Paulo de antigamente. O racismo aqui se chama “pensamento provinciano”. A maioria dos trabalhadores moram nos CPA´s (centro político administrativo) que contraditoriamente são bairros distantes do centro se divide em em CPA 1, CPA 2, CPA 3 e 4.

Só quem trabalha dentro de uma cozinha e é negro sabe do que estou falando quando abordo o racismo no meio urbano. Estou tentando passar aqui um pouco desta experiência para depois da pandemia fortalecer na organização das merendeiras do município de Cuiabá e compreender de fato qual é o papel do Sintep de Cuiabá que se coloca como um sindicato de luta na defesa dos trabalhadores da educação deste município.

Há cerca de quatro meses aproximadamente comecei a trabalhar nesta função: merendeiro de uma escola rural situada a poucos quilômetros da Chapada dos Guimarães. A estrada e a própria formação geológica da Chapada de cor terra vermelha que se estende por dezenas de quilômetros passaram a ser habituais e rotineiras.O trabalho está distante, aproximadamente, quarenta quilômetros de onde moro. Desde que assumi o cargo de técnico em nutrição escolar na cidade de Cuiabá, na Secretaria Municipal de Educação estou sentindo na pele o que é gastar mais da metade do salário em transporte, o ônibus que vai pra Chapada custa oito reais. Meu salário dá praticamente para pagar minha locomoção e a pensão do meu filho, já que ganho um pouco mais que o salário mínimo, Não sei se é correto pensar em semi-escravidão neste caso uma vez que eu escolhi trabalhar em uma escola rural. Por que escolhi trabalhar tão longe? Uma das razões da minha decisão é o adicional de quinhentos reais que os trabalhadores concursados tem direito por trabalhar na zona rural, como este direito está distante minha razão passou a ser a luta.

Os professores, por exemplo, ganham um adicional para trabalhar em escolar rurais, mas os técnicos em nutrição escolar não. Fui informado que neste ano, 2020, seria votada a lei que dá direito aos trabalhadores da área técnica o mesmo adicional que os educadores recebem... e meus colegas da Secretaria me deram a vitória da conquista deste direito como certa. Fui informado também por um funcionário da Secretaria Municipal da Educação de Cuiabá que a escola ficava quatorze quilômetros de distância do meu bairro. Quando fui me apresentar na escola vi que a escola fica a mais de vinte quilômetros de distância da casa onde moro.

O trabalho ficou praticamente inviável não só por não ter a conquista deste direito nos próximos meses. Com a pandemia não sabemos do nosso retorno. Talvez na próxima semana a cidade entre em Lockdown.

Se as informações que me foram dadas se confirmassem, se a escola fosse mais próxima e se eu recebesse o adicional seria possível pagar meu transporte, pagar a pensão do meu filho e pagar as contas da casa onde moro. Moro com minha companheira e os filhos dela.

 
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