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REVESES DA DIREITA
Reveses da direita internacional: rumo a um maior isolamento de Bolsonaro?
Caio Reis

Os últimos meses têm trazido grandes dores de cabeça para os aliados políticos de Bolsonaro a frente de nações por todo o mundo. A direita mais conservadora e repulsiva enfrenta debilidades e desafios, situações que podem gestar uma configuração internacional desfavorável para Bolsonaro no futuro próximo. Em meio a fenômenos como as tendências de recessão econômica mundial, de possíveis rupturas como o Brexit, da guerra comercial entre EUA e China e da emergência da crise ambiental, alteram-se também as políticas internas e externas dos países do norte e do sul.

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Os últimos meses têm trazido grandes dores de cabeça para os aliados políticos de Bolsonaro a frente de nações por todo o mundo. A direita mais conservadora e repulsiva enfrenta debilidades e desafios, situações que podem gestar uma configuração internacional desfavorável para Bolsonaro no futuro próximo. Em meio a fenômenos como as tendências de recessão econômica mundial, de possíveis rupturas como o Brexit, da guerra comercial entre EUA e China e da emergência da crise ambiental, alteram-se também as políticas internas e externas dos países do norte e do sul.

Ao norte do continente, com a coroa do imperialismo ianque, Donald Trump segue tendo de administrar a disputa pela hegemonia mundial contra o crescimento econômico e tecnológico Chinês, enquanto procura uma localização eleitoral segura para disputar a reeleição pelos republicanos em 2020. Em nossa vizinha do sul, com quem o Brasil mantém uma forte relação econômica, Macri sofreu uma pesadíssima derrota eleitoral nas primárias, sendo muito provável sua derrota nas eleições definitivas em outubro e indicando um possível limite no giro à direita na América do Sul. No oriente médio, em Israel, o amigo militar, conservador e ultra-direitista de Trump e Bolsonaro, Benjamin Netanyahu, não vem conseguindo manter o quinto mandato de primeiro-ministro frente às recentes denúncias de corrupção e à ascensão política do general de direita “laico”, Benny Gantz. Por fim, na Itália, o racista Matteo Salvini, inimigo dos imigrantes, não conseguiu ir de vice a primeiro-ministro, após provocar a ruptura da coalizão de seu partido ultradireitista (Liga) com o governista M5S, direita mais liberal.

Trump: entre a manutenção da política imperial dura e as eleições de 2020

Ano que vem, Trump disputará a reeleição à Presidência do principal país imperialista do mundo, e vem tentando mostrar ao capital que pode ser o seu melhor defensor na tormenta. Trump é um notório Republicano defensor das políticas de supremacia branca, dos valores conservadores cristãos, do negacionismo do aquecimento global e de medidas nacionalistas e intervencionistas agressivas em prol da hegemonia norte-americana. Porém, é importante observarmos que ele foi eleito perdendo por 3 milhões de votos, graças ao sistema anti-democrático dos colégios eleitorais estadunidenses e em cima de uma campanha alimentada por um sofisticado sistema de disseminação de fakenews - o mesmo usado por Bolsonaro, gerido pelo ex-estrategista-chefe da Casa Branca, Steve Bannon. Seu governo se envolve recorrentemente em novos escândalos e Trump não possui hegemonia tanto nas esferas do poder quanto na opinião das massas, se apoiando eleitoralmente nos setores mais reacionários de seu país, através de uma retórica preconceituosa e violenta que, para além de torná-lo um dos presidentes mais impopulares da história dos EUA, tem provocado um absurdo aumento nos crimes de ódio contra negros e latinos - um entre muitos, lembremos o brutal massacre de El Paso que ocorreu este ano. Há 3 anos um dos principais pontos do programa político de Trump tem sido o ódio e a perseguição racistas contra imigrantes, investindo no sistema de controle nas fronteiras e promovendo uma verdadeira caça aos trabalhadores latinos (mais de 27 milhões no país), com operações da polícia em locais de trabalho e domicílios, separando famílias e as jogando nas centenas de campos de detenção de migrantes.

O que pode determinar a continuidade ou não da era Trump é a maneira com que irá lidar com os próximos desdobramentos da economia norte-americana, que apresenta indícios de rumar à uma nova recessão com a inversão da curva de juros e a retração na produção industrial, efeitos da crise acelerados pela guerra comercial com a China. Esse ano as taxas de crescimento trimestral que Trump mantinha em 3% despencaram pela metade em relação a 2018, fruto da queda do comércio internacional que afeta principalmente o decrescente setor industrial norte-americano. O desenvolvimento ou estancamento das tendências à recessão são fatores chave no futuro da campanha de Trump em 2020, colocando à prova sua capacidade de gerir a crise para os capitalistas. No campo do anti-trumpismo, o Partido Democrata vem buscando um ganho eleitoral em meio a uma maior polarização à esquerda. Os Democratas não são nenhuma alternativa progressista aos trabalhadores e setores oprimidos, sejam estadunidenses ou estrangeiros. Sua histórica política imperialista, e capacidade de absorver no interior do regime movimentos oposicionistas, pode ser justamente o que o Wall Street procure para acalmar a crise social: é o que buscam fazer com as figuras progressistas como Bernie Sanders e Elizabeth Warren, obstáculos para que a juventude que se interessa pelas ideias do socialismo realmente se identifiquem com um programa anticapitalista e antiimperialista. Joe Biden, principal candidato dos democratas contra Trump em 2020, recentemente se favoreceu com o escândalo aberto por uma denúncia ao The Washington Post de que Trump havia pedido ao governo da Ucrânia, em tom confidencial, a abertura de uma investigação contra a empresa do filho de Biden no país. Biden foi vice de Obama por 8 anos e já foi senador por outros 36 anos, é um velho conhecido da política imperialista, a favor da atual intervenção americana no regime venezuelano, da guerra no Afeganistão, da intervenção no Iraque em 2002 e da aliança militar-industrial com Israel.

A coalizão anti-Trump encabeçada pelo Partido Democrata tem como alvo os aliados internacionais do atual presidente norte-americano. No Brasil, Bolsonaro é o alvo dessa iniciativa, o que podemos ver com clareza na VazaJato, ou nas movimentações do chamado "bonapartismo institucional", que tem nas figuras de Rodrigo Maia e Dias Toffoli dois expoentes, na tentativa de enfraquecer as aspirações "imperiais" de Bolsonaro.

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A queda Macri e o futuro da crise Argentina

A surpreendente derrota eleitoral de Macri foi uma demonstração clara do descontentamento das massas argentinas com os ajustes neoliberais de seu governo. É na pauta econômica ultraliberal e entreguista, assim como na servitude ao imperialismo norte-americano, que Macri e Bolsonaro acabaram por se tornar tão próximos. Derrotado nas primárias por uma margem que garantiria vitória em primeiro turno para a chapa peronista de Alberto Fernandez e Cristina Kirchner, Macri se tornou um morto-vivo na política argentina. A crise da dívida pública levou Macri a requisitar um empréstimo colossal com o FMI, garantindo 80% do fundo diretamente para o lucro dos especuladores e comprometendo os trabalhadores com o pagamento da dívida através de mais ataques para que o país não caia em moratória.

Fato é que, após o resultado das primárias e do voto dos trabalhadores argentinos contra o descarrego da crise em suas costas, veio imediatamente o voto dos mercados: o peso se desvalorizou em 30% e a fuga de capitais lança o país em uma nova catástrofe social. O bloco peronista da Frente de Todos não ganhou somente votos com a derrocada da popularidade do governo, mas também firmou uma série de alianças com políticos e empresários antes ao lado de Macri. O peronismo retorna ao governo argentino em meio à maior crise em mais de uma década, canalizando o descontentamento da classe trabalhadora com um projeto com o qual não mantém um profundo desacordo - e inclusive mantém em seu bloco ex-aliados de Macri. O comprometimento do futuro governo Fernandez-Kirchner e de seus governadores com o FMI, o mercado financeiro e o grande capital imperialista e latifundiário tenderá a entrar em choque com as expectativas progressistas das massas.

Por si mesma, a derrota de Macri debilita os avanços dos ataques econômicos exigidos pelos capitalistas e da política imperialista de Trump na América do Sul, principalmente em relação à correlação de forças na região para uma possível intervenção ianque na crise venezuelana. Com isso, Guedes e Bolsonaro perdem um precioso “colega de serviço” no subcontinente. Para além, a clara mensagem “anti-ajuste” das massas e a consolidação da Frente de Esquerda e dos Trabalhadores - Unidade (um polo de esquerda classista, anticapitalista e anti-imperialista) como a terceira força nacional, com 800 mil votos em meio à altíssima polarização, marcam possibilidades desagradáveis para Bolsonaro caso entre em cena o movimento de massas no país vizinho.

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Fim da era Netanyahu? Israel entre dois belicistas da direita

Em abril, o catedrático Benjamin Netanyahu entrava para o quinto mandato como Primeiro Ministro de Israel, depois de uma eleição acirrada onde dividiu a proporção majoritária de votos com Benny Gantz, militar fundador de um novo partido de direita que vem competindo pela liderança do país. Netanyahu acabou com o cargo devido à coalizão com a extrema-direita e os conservadores religiosos, garantindo sua maioria parlamentar. Porém, os meses seguintes foram de crise para o governo da extrema-direita, com diversas acusações do Ministério Público sobre suborno e fraude em cima de Netanyahu, assim como um crescente desgaste de seus aliados de extrema-direita - A coalizão governista, o Likud, é formado por diversos partidos conservadores, fascistas, racistas e xenofóbicos do extremismo religioso sionista, que vem gerando descontentamento inclusive dentro da direita israelense.

Incapaz de governar, o Primeiro Ministro convocou novas eleições onde o resultado lhe caiu mais dramático ainda: vitória por 2 cadeiras da coalizão de direita rival. Netanyahu rapidamente se prontificou a propor uma coalizão com o rival Gantz, que respondeu com a condição de que ele mesmo fosse o líder (no lugar de Benjamin) e que se excluísse do bloco os partidos religiosos, base mais radical de Netanyahu. Neste domingo (22), o bloco árabe de 13 deputados, rompendo uma histórica abstenção de mais de 25 anos dos árabes-israelenses, declarou apoio à Benny Gantz sob a palavra de ordem “Fazer Netanyahu Cair”. Ao todo Gantz parece obter 57 deputados, o que ainda não garante a margem de 61 cadeiras que derrubaria o atual governo imediatamente, mas conforma uma maioria (contra os 55 de Netanyahu) que abre um bloqueio político ao Likud e uma incógnita sobre o futuro do país.

Netanyahu é um aliado histórico de Bolsonaro, ambos próximos de Trump e partidários de uma ideologia abraâmica teocrática, extremamente reacionária, conservadora e militarista. O próprio peso do sionismo israelense cresceu com a chegada desses governos de extrema-direita, que endossam não só politicamente as suas posições supremacistas, mas também através da cooperação com seus serviços de inteligência e de acordos de obtenção de tecnologias militares, de controle e de repressão. Para além de um apreço em comum pela barbárie e o autoritarismo sobre populações oprimidas, Bolsonaro também se liga ao possível ex-premiê israelense através de sua base evangélica adoradora do messianismo religioso do sionismo do Likud, cujo enfraquecimento enquanto dirigente de uma das maiores potências militares e econômicas do mundo certamente trará reflexos para o Brasil.

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Um Salvini estancado

Defensor do porte de armas e dos valores familiares e religiosos cristãos, Salvini tem uma admiração mútua com o clã Bolsonaro. Em janeiro, o refugiado Cesare Battisti, militante político condenado na década de 90 por quatro homicídios durante os anos de chumbo italianos, sem direito a defesa e enquanto estava fora do país, foi extraditado da Bolívia de Evo Morales para a Itália de Salvini sob os aplausos de Bolsonaro e o aperto de mão de seu filho Eduardo - que foi à Europa pedir “desculpas” pela colaboração passada do Brasil com Battisti.

Após tentar subir ao posto de premiê no início do ano, quando era vice-primeiro-ministro, rompendo a coalizão com o M5E em busca de uma nova coalizão de direita onde pudesse assumir o governo, Matteo Salvini acabou por jogar seu partido fora do bloco majoritário do parlamento italiano. Co-governando com Giuseppe Conte (M5E), Salvini (Liga), o político atualmente mais popular no país, rompeu procurando uma antecipação das eleições e pedindo ao povo italiano que lhe conferisse “plenos poderes”. Em agosto, o M5E fechou um novo bloco com o Partido-Democrático (centro), colocando Conte no cargo de premiê. Salvini e seu partido de extrema-direita, a Liga, advogam uma dura política anti-imigração e de criminalização de ONGs e embarcações de resgate humanitário no mediterrâneo. Admirador de outros governos de direita como Bolsonaro, Orbán e Putin, Salvini curiosamente foi rejeitado por Trump, que preferiu apoiar Conte mesmo com a crescente popularidade do indigesto Liga nas eleições ao parlamento europeu, com mais de 34% dos votos no país.

Leia a nota do MRT sobre o caso Batistti: Repudiamos a prisão de Cesare Battisti executada por Bolsonaro, Salvini da Itália e Evo Morales

Uma provável relocalização no próximo período

A ascensão do bolsonarismo no Brasil se inseriu no contexto da onda de fortalecimento da direita e extrema-direita mundo afora, que talvez tenha tido seu auge entre 2016 e 2018. Porém, este processo não se dá no vazio, mas sim no marco de disputas (que tendem apenas a se acirrar) pelas eleições nos EUA, com a contra-ofensiva Democrata articulando uma "frente mundial anti-Trump" do ponto de vista político e ideológico-cultural, e já a partir dos reveses do Brexit, das dificuldades de Salvini e, agora, inclusive de Netanyahu, parte de um processo de ascenso anterior. Aqui na região, o que não é um fator menor, pesa muito a espantosa derrota de Macri nas eleições primárias e a iminência de uma volta do peronismo na Argentina. Esses condicionantes internacionais podem antecipar maiores dificuldades políticas a um presidente que faz "diplomacia personalista" e depende tão profundamente do destino de Trump.

 
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