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EUA
Trump se livra de Bolton, mas no que isso mudará na política imperial?
Claudia Cinatti
Buenos Aires | @ClaudiaCinatti

Fiel ao seu estilo, com um tweet Donald Trump se livrou de seu assessor de segurança nacional, John Bolton. Faltavam apenas alguns minutos para que se iniciasse uma coletiva de imprensa na Casa Branca, em que o funcionário iria compartilhar o microfone com Mike Pompeo e Steven Mnuchin, secretários de Estado e do Tesouro respectivamente. O presidente recorreu mais uma vez desta maneira pouco protocolar de exercer seu poder de decisão, que vale tanto para despedir funcionários quanto para declarar guerras comerciais ou em pressionar líderes mundiais, aliados ou inimigos.

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Entretanto, ainda não se conhece quem será o sucessor de Bolton, porém já se fala em alguns nomes. Entre os candidatos possíveis estão Stephen Biegun, que atualmente é o representante dos Estados Unidos para a Coreia do Norte, e Douglas Macgregor, um coronel aposentado do exército e ocasional comentarista da Fox News, com posições menos agressivas e mais próximas à ala “realista” da política exterior.

O perfil dos possíveis substitutos de Bolton parece indicar, segundo vários analistas, que no recente curso errático da política exterior norte-americana se iniciará um movimento de moderação.

Bolton foi o terceiro assessor de segurança nacional de Trump. Em um ano e meio no cargo ele tem até agora o recorde de permanência. Seus antecessores tiveram menos sorte. Michael Flynn teve que renunciar em um mês por seus supostos vínculos com a Rússia. E o general HR McMaster se foi depois de um ano em ter assumido o cargo, quando Trump pôs fim à débil hegemonia que tiveram os militares em seu governo, no momento que o establishment confiava nos “adultos na sala” para conter as tendências mais extremas do trumpismo.

A chegada de Bolton, um falcão duro, junto com a designação de Mike Pompeo a frente do Departamento de Estado, indicou que Trump alinharia temporariamente a política exterior da Casa Branca de acordo com sua linha, que, por sua vez, sofrem duras resistências por um importante setor do aparato estatal.

Antes de Trump, Bolton serviu três administrações republicanas – Reagan, Bush pai e Bush filho – alternando sua militância entre funções estatais e em think tank privados. Foi o artífice das últimas grandes derrotas estratégicas do imperialismo norte-americano, em particular a guerra no Iraque e a política de “mudança de regime”. Uma política que está nas antípodas da base eleitoral de Trump, mais próxima a alguma variante de isolacionismo.

Apesar dessas diferenças, o unilateralismo de Bolton sintonizava muito bem com o “EUA em primeiro lugar” de Trump. O homem de bigode proeminente é também um forte partidário do Brexit e um cético quanto à União Europeia.

Para Trump a aliança com os neoconservadores foi útil para desfazer o “multilateralismo” que caracterizou a política exterior da administração Obama, que segundo sua percepção apenas aprofundou a decadência imperial. Em particular, Bolton foi funcional para romper o acordo com o Irã, retirar os EUA do acordo nuclear com a Rússia e fortalecer os laços com Israel, ou melhor dito, com o ultradireitista Benjamin Netanyahu, que joga seu futuro político em incertas eleições no próximo 17 de setembro.

Porém, estes serviços vinham com o preço de dar fôlego a setores da extrema-direita republicana com interesses próprios, como o senador Marco Rubio, um dos principais artífices da fracassada tentativa de golpe na Venezuela.

Com Bolton a política imperialista endureceu, por mais que não tenha sido tão eficaz. Trump escalou a guerra comercial com a China e recrudesceu o uso de sanções econômicas. Mas, no balanço ainda terá que ver como tudo isso ajuda a restaurar a liderança dos EUA.

As diferenças entre as posições de Bolton e Trump em temas fundamentais da política internacional já anunciavam uma convivência com data de vencimento.
Na Coreia do Norte, enquanto Trump apostava na diplomacia pessoal com Kim Jong Un, Bolton agitava a guerra preventiva como método para lidar com o desafio nuclear, a esta altura inevitável, do regime norte-coreano. Na Rússia, Bolton foi o postulante da posição mais agressiva contra o regime de Putin.

No entanto, onde as diferenças alcançaram um ponto de não retorno foi na política em como lidar com o Afeganistão e o Irã.

Bolton frustrou uma negociação com os talibãs que propunham um acordo a Trump e Pompeo para pôr fim a uma guerra muito impopular que já leva 18 anos. A bem da verdade, ao establishment que não o quer, de qualquer maneira lhe foi favorável Bolton frustrar uma reunião de Trump com os talibãs em Camp David na mesma semana que se faz mais um ano dos atentados contra as Torres Gêmeas em 2001.

No Irã, Bolton colocou Trump fora da sua zona de conforto das sanções e das ameaças para negociar e quase o levou a uma guerra, em represália ao abatimento de um drone norte-americano pelo regime iraniano. O presidente norte-americano retrocedeu minutos antes de acionar o detonador. As diferenças estão no terreno da estratégia. Bolton segue sendo um militante da “mudança de regime”, e junto com Netanyahu busca derrubar a teocracia persa. Trump aspira a um objetivo mais modesto, tratando de forçar mediante pressões econômicas o atual regime para negociar um novo acordo nuclear em términos mais favoráveis aos EUA.
Depois de um ano e meio de tensões, o jogo do policial mal (Trump) e do policial pior ainda (Bolton) terminou numa ruptura abrupta.

Sua saída do governo é parte do cálculo eleitoral de Trump. As guerras com as quais Bolton sonha não são populares entre o eleitorado do presidente, mais preocupados por uma eventual futura recessão do que em empreender novas aventuras militares.
Uma nova pesquisa do Washington Post e da ABC News revela que a taxa de aprovação de Trump caiu 6 pontos desde junho, se mantendo em 38% no geral.

Apesar da economia continuar crescendo, 47% desaprovam a política econômica do presidente, 60% esperam uma recessão no próximo ano, 56% desaprovam a guerra comercial com a China e 60% esperam que essa guerra lhes prejudicará diretamente.

Numa coluna de opinião, Ian Bremmer, presidente da Eurasia Group, indica que as tensões geopolíticas e a incerteza retroalimentam os temores de uma recessão nos EUA, transformando-a quase numa profecia autoproclamada, chamando essa situação de “recessão geopolítica”. Alguns analistas esperam que retroceda a onda “populista” e se restabeleça a normalidade pré-crise de 2008. Porém, os fenômenos como a presidência de Trump, de Bolsonaro, o Brexit ou o estado degradado dos sistemas democrático-burgueses, como o da Itália, são os sintomas mais visíveis de que estes tempos turbulentos chegaram para ficar.

 
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