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LIÇÕES DE ONTEM PARA OS COMBATES DE HOJE
Lições da greve geral de 2017 para a batalha rumo ao 14J
Diana Assunção
São Paulo | @dianaassuncaoED

Não conseguiram, com o golpe institucional, impor a reforma da previdência em 2017 porque a classe trabalhadora se levantou em importante paralisação nacional, uma das maiores das últimas décadas. Este foi um episódio emblemático que fala muito sobre a vontade dos capitalistas descarregarem a crise nas nossas costas, a força da nossa classe organizada apesar das direções burocráticas mas também fala muito sobre a estratégia e o programa da esquerda.

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Há quase 3 anos do golpe institucional vivemos em um governo de extrema direita que protagoniza disputas entre os "fatores reais de poder" pra definir quem de fato governará o Brasil. Neste cenário ainda segue sendo uma questão "de vida ou morte" para os capitalistas a necessidade de aprovar a reforma da previdência. Faltando menos de uma semana para a greve geral do dia 14 de junho, convocada pelas centrais sindicais, mais uma vez é importante remarcar que não partimos do zero. Nem de nossas conquistas, nem das derrotas. E, neste caso, não é necessário ir muito longe: retomemos a experiência da paralisação nacional de 28 de abril de 2017, que paralisou diversas categorias impondo uma mobilização mais forte do que as próprias direções das centrais sindicais gostariam e derrotando naquele momento o plano da reforma da previdência.

Veja aqui: O pacto precário entre os poderes pela reforma da previdência, e como combatê-lo

Isso ocorre alguns meses depois de aprovado o impeachment de Dilma Rousseff, quando as centrais sindicais em especial a CUT (dirigida pelo PT) e a CTB (dirigida pelo PCdoB) mostraram que tinham mais medo da luta de classes do que dos golpistas não organizando nenhum plano de luta real nas bases pra enfrentar o golpe institucional. A esquerda tradicional ainda estava profundamente dividida entre aqueles que apoiaram – de forma mais ou menos velada – o golpe, seja usando a consigna "Fora Todos", seja apoiando a Lava Jato, e os que rechaçavam o golpe, porém com diferentes conteúdos e estratégias que chegavam até o limite de assumir integralmente a política petista em nome da chamada "unidade". Se por um lado apontamos que o PT sofreu um golpe institucional isso jamais poderia tirar de cena o fato de que foi durante 13 anos um governo que administrou o capitalismo em decadência no Brasil, e atuou pra reconquistar as alianças da década de 2000, como com o agronegócio, com os banqueiros e com a bancada evangélica, que assentaram as bases para o golpe institucional. Então vínhamos de um momento de fortes ataques, inação das centrais sindicais e adaptação da maior parte da esquerda.

Entretanto, não era simples a implementação dos objetivos do golpe institucional: um plano de ajustes maior do que o que PT vinha implementando. Com uma agenda totalmente antipopular encabeçada pela reforma da previdência, o golpe foi tendo que lidar com a falta de aprovação pra este plano. Ainda assim, contando com a burocracia sindical que foi auxiliar durante os anos de governo do PT no aumento do trabalho precário, deixou passar a lei da terceirização irrestrita logo no começo de 2017 como antessala do que poderia estar por vir. Mas o descontentamento com a possibilidade de ter que trabalhar até morrer foi maior do que as centrais sindicais esperavam para uma negociação pactuada, obrigando-as a se movimentar. Algumas correntes do PSOL naquele momento comemoravam que os dirigentes das centrais sindicais tinham chegado a um acordo sobre a data da paralisação nacional, e não o fato de que os trabalhadores estavam pressionando suas direções. Isso obviamente leva a políticas opostas: a tarefa da esquerda é endossar as decisões e política das centrais sindicais em nome da "unidade", ou incentivar a auto-organização dos trabalhadores pra que esta pressão que se expressou possa se transformar em uma potência impondo cada vez mais que a direção da luta seja controlada pela base?

A segunda opção seria uma política verdadeiramente revolucionária, partindo de que mesmo o dia 28 de abril com a força que expressou, ainda expressava o limite do controle das burocracias sindicais desde sua preparação e inclusive uma política consciente de utilizar a paralisação nos transportes pra ter uma linha de que "os trabalhadores fiquem em casa" e não fizessem uma greve ativa, com piquetes e manifestações. Então vimos naquele momento uma das paralisações nacionais mais fortes das últimas décadas, mas sem a existência de um setor claramente anti-burocrático que pudesse utilizar o seu peso pra desenvolver a auto-organização dos trabalhadores pra superar as traições das burocracias assim que ficassem mais evidentes aos olhos das massas. A questão é que a burocracia queria que o dia 28 fosse apenas um dia protocolar que desse força pra melhor negociar, mas que não saísse do seu próprio controle. E a linha mais estratégica do PT naquele momento, além de agitar "eleições gerais" era justamente deixar correr vários ataques pra poder se eleger novamente em 2018. Ou seja, uma estratégia parlamentar pra reeditar os anos de governo do PT, só que agora sem o momento de "boom econômico" que deu respiro ao lulismo, o que levaria como mínimo a um choque entre as ilusões de um passado melhor com a realidade de uma crise econômica forte.

Depois do dia 28, ocorreu uma nova ação em Brasília em 24 de maio, menor do que poderia ter sido pois as burocracias sindicais não colocaram milhares de ônibus a disposição pra levar mais trabalhadores ao Distrito Federal. Diante da situação de grande instabilidade no governo, com possibilidades concretas de queda do então presidente golpista Michel Temer, novamente pela via da Lava Jato, o PSOL majoritariamente decidiu por levantar uma bandeira que era, em si mesma, o desvio do processo de luta: a bandeira das "eleições gerais", que era a mesma política do PT já fazendo campanha eleitoral rumo a 2018. A agitação dessa bandeira era combinada a aceitar a política das centrais sindicais de tratar o 28 de abril como mera forma de negociação.

Então, sem nenhum tipo de crítica à política de contenção das centrais sindicais, sem nenhuma batalha pra conformar uma ala anti-burocrática, combativa e que defendesse a auto-organização (assembleias de base, comando nacional de greve com delegados eleitos pela base) e levantando uma consigna que poderia ser funcional ao regime naquele momento, grande parte da esquerda terminou atuando como ala esquerda da política das centrais sindicais, que utilizaram o 28 de abril pra descomprimir a insatisfação na classe trabalhadora e depois atuaram de forma consciente e coordenada pra boicotar por baixo a nova greve geral convocada pra 30 de junho. O fracasso dessa nova ação do dia 30 de junho foi o que abriu espaço, somente algumas semanas depois, para aprovação da reforma trabalhista.

As lições desse episódio são valiosas pra preparar a luta que está em curso neste momento. Deveria ser uma lição elementar que a unidade que precisamos não tem nada a ver com unidade entre burocracias sindicais ou então unidade com partidos golpistas, de direita ou que apoiam parcial ou integralmente a reforma da previdência. Por isso, desde o ano passado viemos debatendo com os companheiros do PSOL sobre o equívoco de lançar um manifesto programático em comum com partidos como REDE, PSB, PT e PDT, o equívoco de conformar um bloco parlamentar com parte destes atores e o equívoco de seguirem buscando tipos de alianças que nada têm a ver com independência de classe, como por exemplo a participação de Guilherme Boulos em reunião onde estava o PSDB de João Doria. A força para derrotar os ataques de Bolsonaro não está nos acordos que são feitos entre estes partidos, pois cada acordo com partidos deste tipo significa abrir mão de um programa de independência de classe. Ao contrário deste tipo de "unidade", a única unidade possível pra derrotar os ataques é a unidade do conjunto da classe trabalhadora, e por isso é decisivo exigir das centrais sindicais que parem de nos dividir, separar e conter nossa luta. A unidade necessária é o que, na tradição marxista, é chamada de frente única operária: a ação coordenada das massas trabalhadoras a partir dos sindicatos, centrais sindicais, comissões de fábrica pra enfrentar os ataques do capital.

Por isso, o silêncio do PSOL em relação à política das centrais sindicais é um problema estratégico pra conformar uma alternativa na luta de classes. É como se para ter o que eles chamam de "unidade" fosse necessário fechar os olhos pra cada traição e sempre começar do zero, e nunca entender de onde partimos e qual é a história das experiências da classe trabalhadora. É como se as centrais sindicais fossem setores que não têm nenhum tipo de responsabilidade, como se não fossem direções e nem tivessem que ser cobradas de nada. Basta para nós esperar que seus dirigentes se reúnam e cheguem num acordo de data pra convocar a luta. Não importa depois com que conteúdo, com que política, como atuam ou como devemos preparar uma ala consciente dos trabalhadores pra enfrentarem também as burocracias sindicais. Isso só pode despreparar os trabalhadores pra realmente levar a luta adiante.

Foi o que aconteceu desde a construção do 28 de abril até o 30 de junho de 2017: a esquerda não preparou nenhum tipo de alternativa, na luta de classes, à burocracia sindical e mais que isso assumiu o programa das direções como PT e PCdoB de "eleições gerais".

Naquele momento uma política revolucionária só poderia ser a de levantar a necessidade de impor com a força da mobilização uma Assembleia Constituinte Livre e Soberana, pois não era suficiente mudar os jogadores, era precisa mudar as regras do jogo com uma política que desse conta de enfrentar os ataques em curso mas também de avançar pra uma política independente. Aceitando ser ala esquerda da política petista de desvio do processo de luta, a esquerda rechaçou o programa de Assembleia Constituinte e agitou as "eleições gerais". A política meramente parlamentar e de contenção da luta de classes se mostrou uma fracasso: Lula foi preso arbitrariamente no ano seguinte, também sem um um enfrentamento real na luta de classes organizado pelas centrais sindicais, e diante de uma crise orgânica tão profunda como a que vivemos no país, o principal partido da direita "derreteu", o que abriu espaço pra ascensão da extrema direita.

Veja aqui: O pacto precário entre os poderes pela reforma da previdência, e como combatê-lo

Hoje por mais que alguns setores falem em impeachment de Bolsonaro, não estamos diante da mesma situação que em 2017, e mais que isso, estamos no momento anterior a primeira ação unificada da classe trabalhadora neste ano e oficialmente convocada pelas centrais sindicais. Não está claro ainda a força que terá este processo mas o que sim deve ser claro é que desde já é decisivo conformar um pólo na classe trabalhadora e na juventude que tenha independência de classe em primeiro lugar enxergando o papel das direções burocráticas: é preciso exigir que coloquem de pé imediatamente um plano de luta concreto, com milhares de assembleias e reuniões de base, em uma greve ativa que não seja "em casa" como quer a burocracia, preparando a auto-organização dos trabalhadores pra que possam superar suas direções quando estas virarem um freio, como ocorreu 2017, o que abriu o caminho para a reforma trabalhista. Por isso, o silêncio diante da política das centrais sindicais é um problema estratégico e não prepara uma política alternativa e à esquerda do PT. Ao contrário, temos que fazer com que o 14J da próxima semana seja ainda mais contundente que a força que se expressou em 28 de abril; mas sem ser uma paralisação isolada, é preciso que tenha continuidade num plano de luta que impeça a trégua e traição que se consumou em 2017 na traição da paralisação nacional convocada pra 30 de junho.

Veja aqui: 14J: Sejamos milhões de jovens e trabalhadores nas ruas para derrotar o pacto pela reforma entre Bolsonaro, Maia e o STF

Colocar de pé o que é conhecido como uma "frente única operária" significa batalhar pra que as bases pressionem suas direções pra atuar concretamente na luta, com ações diante dos ataques dos governos e dos capitalistas. A ideia de "unidade dos aparatos sindicais por cima" é o que mantém a divisão da classe trabalhadora. É uma ilusão achar que quando os dirigentes sindicais estão de mãos dadas a classe está unida e forte pra atuar: ali podem estar preparando o desvio do processo de luta. O último exemplo de "unidade" comemorado por setores da esquerda foi o 1º de maio em São Paulo, que contava com Paulinho da Força, que no mesmo dia dizia a todos os jornais que estava buscando uma forma de desidratar a reforma da previdência pra poder garantir a manutenção do imposto sindical. Sobre isso: nenhuma palavra. Do nosso ponto de vista, a batalha por unificar a classe trabalhadora é muito mais profunda, unificando todas as fileiras da nossa classe com um só punho pra impor a estas direções sindicais que assumam a luta contra todos os ataques mais cruéis dos governos e capitalistas, e isso passa por alertar os trabalhadores sobre as políticas destas direções.

Um exemplo neste sentido é a política levada pelo PTS na Argentina, a partir da Frente de Esquerda e dos Trabalhadores, que não busca nenhum tipo de aliança parlamentar com o kirchnerismo pra enfrentar o macrismo: atuam de forma orgânica nas fábricas, locais de trabalho e universidades, exigindo das centrais sindicais deste país um plano de lutas concreto pra derrotar o pacto com o FMI, assumido até mesmo pelos candidatos kirchneristas.

E não há um muro que separa a luta defensiva da ofensiva. A classe trabalhadora em movimento, numa frente única defensiva contra os ataques, é a força material capaz de avançar num programa anticapitalista de saída pra crise. Diante da tentativa de descarregar a crise capitalista em nossas costas a elementar bandeira pelo não pagamento da dívida pública não foi e não é bandeira da esquerda como o PSOL: se dividem entre diversas correntes desde os que defendem pagar uma parte da dívida, até os que defendem a auditoria cidadã da dívida – como se esta pudesse ter algo de legítimo – até a economista da campanha eleitoral de Boulos, que é favorável ao pagamento da dívida já anunciou não ser contra a reforma da previdência.

Diante do radicalismo da extrema direita pra nos atacar não é possível responder com soluções moderadas como os "4 pontos pra enfrentar a crise fiscal" que o PSOL apresentou. É preciso um programa que vá até a raiz. Por isso é preciso levantar o não pagamento da dívida pública. Chamamos o PSOL a assumir este programa anticapitalista frente à situação no Brasil.

Neste momento é fundamental reforçar a exigência às centrais sindicais: que organizem milhares de assembleias por todo o país pra fazer uma paralisação nacional ainda maior do que foi o 28 de abril e que seja parte de um plano de luta concreto, pra que o 14J não seja um dia "pra negociar". Diante da tentativa de pacto entre Bolsonaro, centrão e o STF é preciso romper as negociações com Rodrigo Maia, do contrário as centrais sindicais terminarão sendo ala esquerda deste pacto. É preciso denunciar todos aqueles que de alguma maneira estão tentando "melhorar" a reforma da previdência ou "negociar" o nosso futuro: os governadores do PT que dialogam com Bolsonaro sobre a reforma da previdência, todos os partidos golpistas, Tabata Amaral, que virou idealizadora de uma "reforma da previdência melhorada". Não aceitamos nenhuma destas variantes de reformas que querem nos fazer trabalhar até morrer: que os capitalistas paguem pela crise.

Veja também: Tabata Amaral: "Tem faculdades e universidades que dá pra cortar mais que outras"

Com a juventude tendo mostrado uma força impressionante contra os cortes na educação, não aceitemos a separação das nossas lutas: a educação não é moeda de troca, queremos estudar sem ter que trabalhar até morrer. Num momento em que temos mais de 13 milhões de desempregados no país, a juventude recebe os postos de trabalho mais precários: Rappi, Ifood, Uber e tantos outros tipos de trabalho precário. Uma juventude sem futuro que não irá nem mesmo se aposentar. É preciso organizar uma mesma luta! Por isso, a juventude que saiu nas ruas no 15M e 30M pode incendiar a classe trabalhadora e fazer uma aliança explosiva. Estudantes e trabalhadores, unidos, desde cada local de trabalho e estudo, para derrotar este pacto pela reforma da previdência.

Para isso, consideramos que o PSOL, Guilherme Boulos e os parlamentares deste partido podem cumprir um importante papel se fizerem um chamado a toda essa juventude que se referencia no PSOL a tomar pra si a batalha por incendiar a classe trabalhadora e alertar sobre o papel das burocracias: é preciso ir para a porta das fábricas, escolas, hospitais, metrôs e garagens de ônibus.

Construir pela base um 14 de junho que seja a ponta de lança de uma enorme luta nacional, coordenada e unificada, pra derrotar Bolsonaro, centrão, STF e os capitalistas.

Neste processo, os debates sobre que partido é necessário pra passar de uma luta defensiva a uma luta ofensiva contra esta sociedade capitalista estarão colocados: os exemplos internacionais de "partidos amplos" que buscam administrar o capitalismo como se mostrou por exemplo o Syriza na Grécia são uma tragédia diante do desafio de enfrentar o populismo de direita. Por isso, é preciso colocar de pé um partido revolucionário dos trabalhadores que lute por um governo dos trabalhadores de ruptura com o capitalismo, e é por esta perspectiva que batalhamos a partir do MRT e Esquerda Diário, debatendo com todos os companheiros e companheiras do PSOL e outras organizações que se colocam na luta contra os ataques do governo Bolsonaro.

 
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