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FRANÇA
Depois das eleições europeias, para onde vão os coletes amarelos?
Juan Chingo
Paris | @JuanChingoFT

Apesar do aumento da participação em relação a 2014, a última eleição europeia na França foi uma das que menos gerou interesse e entusiasmo, apenas compensou as duas últimas semanas com a intervenção pessoal do presidente, incentivando a participação e, sobretudo, o voto útil, a favor ou contra o seu governo. O resultado é uma polarização entre a extrema direita de Le Pen e a nova direita de Macron, o avanço dos Verdes em um campo político minado pelo recuo dos dois partidos tradicionais de direita e esquerda, somado à queda de Mélenchon. Um resultado negativo para os trabalhadores que abre uma questão sobre o destino dos Gilets Jaunes (coletes amarelos).

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Uma polarização fraca que se destaca em um campo político arruinado

O triunfo relativo do RN (Reagrupamento Nacional, o novo nome do partido de Marine Le Pen) permite que o macronismo, apesar de sua derrota, mantenha sua imagem. RN tornou-se o novo partido da ordem após a revolta dos Gilets Jaunes e tornou-se abertamente neoliberal, substituindo cada vez mais a direita tradicional, que está em perigo de desaparecimento. Macron rouba o programa dos republicanos tradicionais para seduzir os altos escalões, enquanto sua base popular minoritária é cada vez mais seduzida pelo RN. Assim, pela primeira vez, a direita perde sua base eleitoral entre os idosos e os aposentados. Mas se a LREM (A República Em Marcha, o partido de Macron) mantiver uma base eleitoral sólida indo a direita, restringe sua já fraca base de apoio em um setor social elevado e com pouca capacidade de unificar, como resultado da perda de uma parte significativa dos seus eleitores do primeiro turno de 2017 para o EELV (Europa Ecológica- Os Verdes).

Segundo Arnaud Benedetti, professor associado à Universidade Paris-Sorbonne e observador da vida política francesa: “o campo majoritário se equivocaria a cantar vitória muito cedo... se o LREM confirma que tem uma base eleitoral sólida. No entanto, [LREM] se endurece sobre uma camada social elitista e pouco mobilizada”. E acrescenta: “Macron reúne uma base sociológica motivada e politizada, ciente de que, para defender seus interesses, deve trabalhar em conjunto e em bloco. Marx poderia ter feito uma ilustração fiel desta sequência histórica. Como nunca antes, pelo menos desde meados do século XIX, os de cima não haviam se organizado tão habilmente para proteger sua visão de mundo. [Macron] soube recuperar a direita ordoliberal [1], conformista e paternalista que o resgatou durante estas eleições em detrimento de François-Xavier Bellamy [chefe da lista de LR, a direita republicana tradicional de Sarkozy]. Os resultados dos "Marcheurs" [os macronistas] em Hauts-de-Seine, em Yvelines, em Versalhes e em outros lugares são ilustrações dessa transferência de voz ".

Enquanto isso, o RN consegue sair da crise em que entrou logo depois das eleições presidenciais, onde foi derrotado no segundo turno e especialmente do debate televisivo com Macron, que havia deixado sequelas sobre sua líder, Marine Le Pen. Tal como em 2014, esta formação de extrema-direita vence as eleições europeias com 500.000 votos mais como consequência, em parte, devido à menor taxa de abstenção, o que lhe permite olhar para a frente com algum otimismo. Além disso, é reforçada em áreas onde a extrema direita era tradicionalmente fraca, especialmente no oeste e até mesmo na banlieue parisiense, mantendo a sua fraqueza nas grandes cidades, devido ao aumento nos preços dos imóveis que acentuam o processo de gentrificação. Como Sylvain Crépon diz: "Assim, a lista de [de RN encabeçada por] Jordan Bardella é colocada em primeiro lugar em Aulnay-sous-Bois, Sevran, Villepinte ou Livry-Gargan, em Seine-Saint-Denis, mas também em Orly e Villeneuve-Saint-Georges, em Val-de-Marne. Territórios marcados pela abstenção (60,59% em Seine-Saint-Denis, por exemplo). Vimos essa participação aparecer nos banlieues nas décadas de 1980 e 1990 e depois desaparecer ", lembra o especialista da extrema direita. "E mais uma vez ele retorna. Há um fenômeno de desmobilização das classes populares de origem imigrante que votaram pela esquerda, que deixaram de se reconhecer nos partidos de esquerda e se abstiveram. E, por outro lado, os ’pequenos brancos’ [brancos dos bairros populares] que parecem se mobilizar em favor do RN. Como se a questão racial substituísse a questão social".

Conservando o voto majoritário dos trabalhadores que foram votar [2], o mais promissor para o seu projeto de converter-se em uma alternativa de governo não está lá, mas à direita, como produto da crise histórica da LR. No domingo 26/5, 18% dos que em 2017 votaram em Fillon, então candidato presidencial da LR, desta vez votaram em RN, fazendo com que certos muros entre a extrema direita e a direita se tornassem menos herméticos. Isso prediz a formação de um bloco nacionalista-conservador de vocação majoritária? Tem que se ver. O perigo de marginalização da direita tradicional joga a seu favor, mas não seria a primeira vez que o RN se chocou com esse limite político que agora é intransponível.

O que está claro é que, no marco da forte volatidade política existente, expressão da persistência da crise orgânica, o RN mantém seu resultado em número de votantes, ao mesmo tempo em que se enraíza no cenário político francês, tendo o maior percentual de fidelidade em relação à sua eleição anterior. Mas apesar do "momento populista a nível internacional", e especialmente do forte sentimento anti-macronista agudizado ainda mais pela revolta dos Gilets Jaunes e no plano eleitoral uma forte tendência ao voto útil explorada a fundo por Jordan Bardella e pela presidente do partido, RN ainda não consegue dar um golpe, também não progride necessariamente como mostram suas dificuldades em obter os 24,8% que havia alcançado há cinco anos, atingindo apenas 23,3%.

A ilusão do possibilismo Verde

A única corrente que avança decididamente, ainda que bem atrás da polarização entre Le Pen e Macron, é a dos Verdes (EELV). Conseguiram tomar um espaço com a ajuda da onda verde em outros países europeus, da discussão nos meios de comunicação em torno dos desafios climáticos, bem como da politização da juventude de classe média (ainda não radicalizada) e no marco político da crise da socialdemocracia e suas dificuldades para se recompor, assim como o impasse estratégico da La France Insumisa (LFI, o partido de Mélenchon), com seu candidato Yannick Jadot e sua aposta "nem de direita nem de esquerda", somando-se ao balaio macroniano.

Se a pacificação política do ambientalismo é um fenômeno que vem ocorrendo há décadas, a normalização do mesmo no contexto da Europa liberal assume níveis ridículos. A questão é que o neoliberalismo e o capitalismo nunca poderão ser verdes. Jadot, mais ainda que seus antigos colegas, avança, todavia, no caminho da assimilação liberal do ambientalismo. Sua pretensão de discutir no parlamento europeu um tratado ambiental que faria da ecologia “o mais alto padrão legal” e que “voltaria à lógica produtivista dos tratados anteriores”, fazendo crer que este pode "mudar as regras do jogo contra indústrias poluidoras e seus lobbies " é o mais novo engano do possibilismo verde. Altissonantes para esconder sua ineficiência, tal tratado iria considerar a criação de uma justiça ambiental que pode "lutar contra ecocrimes e ecocídios” ou estabelecer decretos ambientais vinculantes, onde países que não respeitam sua “pegada ecológica” “podem ser processados pela Comissão”. No tratado, a luta contra o capitalismo é substituída por um “protecionismo verde contra a destruição do planeta". Fazendo referência ao ambiente da soberania imperialista, eles criam uma taxa "socioambiental" para as fronteiras que permitiria levar em conta o custo real dos produtos, progredindo em direção a um imposto [imposto sobre o valor agregado] de 0% sobre o território europeu para os bens de primeira necessidade”. Em suma, esse tratado não é mais que uma perigosa miragem que trata de vender-nos um controle liberal da crise ecológica. Enquanto o antigo ambientalismo alertava sobre a crise ambiental, o ambientalismo contemporâneo se converteu em um estilo de vida mais da “modernidade” neoliberal.

Dito isto, o voto ecologista na França continua sendo frágil (inclusive, em 2009 haviam tomado uma porcentagem maior do que agora, para logo desaparecer e perder sua identidade política com Hollande) e embora pudesse haver novos desenvolvimentos a nível municipal e regional (a ambientalista burguesa e neoliberal Anne Hidalgo, prefeita parisiense do PS, já os tem em vista para a luta das municipais em Paris), os Verdes franceses não tem a estruturação política dos “Grünen” [verdes] alemães. Sua capacidade de constituir-se como uma alternativa nas eleições presidenciais está por se ver.

O populismo de esquerda é mais instável que o velho reformismo

Em artigos anteriores, alertamos as fortes debilidades do LFI frente a irrupção violenta da luta de classes, que ampliaram suas ambivalências estratégicas. Como disse um jornalista do Médiapart, embora com bases diferentes das nossas, seu fracasso eleitoral foi a "crônica de um desastre anunciado" [3]. A luta entre os defensores de uma linha de esquerda reformista clássica e os defensores do soberanismo de esquerda, enquanto as mesmas dúvidas neste terreno de Jean Luc Mélenchon, fez a linha política e o discurso de LFI incompreensível. Parte disso foi a evolução do discurso sobre a União Européia, que se moderou ao longo do tempo com o suposto objetivo de não alienar os eleitores clássicos da esquerda reformista. Como Jérôme Sainte-Marie, cientista político e pesquisador próximo de Mélenchon, disse durante as eleições presidenciais, se trata de um posicionamento "no meio de uma encruzilhada", nem realmente populista nem realmente da esquerda clássica, que acabou deixando todos insatisfeitos. "A estratégia era muito populista para a esquerda e muito esquerdista para os populistas", resume.

Mas, fundamentalmente, Mélenchon está pagando pelo seu giro soberanista de esquerda. Em dezembro de 2017, em entrevista ao jornal patronal Les Echos, ele declarou confiante: "A linha política e meus objetivos não têm nada a ver com os da Frente Nacional [o nome do partido de Le Pen na época] ou os nacionalistas. Mas todas essas pessoas estão rezando para mim de alguma forma, contribuindo para a construção de um campo cultural em que nossas consignas - "a Europa não protege os franceses, e sim os ameaça" - estão se tornando dominantes. Devemos capitalizar positivamente esta raiva, que pode ser perigosa". Na realidade aconteceu exatamente o oposto: Le Pen capitalizou não apenas o voto antieuropeu, mas também o voto útil contra Macron. O flerte com os temas da extrema direita sempre acaba mal. Pior ainda, suas fraquezas diante da luta de classes na revolta dos Gilets Jaunes, onde agiu de forma acrítica, onde Le Pen apoiou o movimento no começo, mas mantendo sua distância, preservando sua estatura presidencial, defendendo a polícia e até sentenças de prisão para GJs condenados. Essa atitude de Mélenchon alienou-o da simpatia de uma parte dos GJs, alguns temiam uma recuperação política de seu movimento, enquanto que, por outro lado, contribuía a distanciá-lo de seu eleitorado mais moderado de classe média que preferiu a ilusão do possibilismo verde. Em suma, o abandono de qualquer menção à classe trabalhadora como sujeito da transformação social e sua substituição pelo "povo" tornou impensável a menor batalha política, a menor diferenciação dentro dos Gilets Jaunes. Isto é o que LFI e Mélenchon em particular estão pagando duramente.

O colapso do LFI, assim como o retrocesso da esquerda radical na Europa, mostra o impasse mesmo em termos eleitorais (o terreno central de seus partidários e teóricos como Chantal Mouffe) do populismo de esquerda. Como um jornalista da Médiapart disse: "Essas experiências fornecem uma lição: os partidos populistas geralmente fazem importantes avanços eleitorais, mas são muito efêmeros". A estratégia populista permite, com efeito, fazer uma irrupção fulgurante no jogo político, passar rapidamente de 1 ou 2% para entre 15 e 20%, mas é ineficaz, até mesmo incapaz, de se manter em 20% ". Ao contrário do velho reformismo, que foi baseado em setores orgânicos da classe trabalhadora e recomposto nos chamados "trinta anos gloriosos" após a Segunda Guerra Mundial, ligado à conquista e organização política e sindical, o movimentismo populista atual carece de todos seus atributos compartilhando seus mesmos defeitos estratégicos. Mélenchon teorizou a onda "dégagiste [4]", mas perdeu de vista que as mesmas condições objetivas de crise do capitalismo neoliberal e os fortes curtos-circuitos das democracias burguesas que foram desgastando seus fusíveis (sindicatos e organismos intermediários), que levam à crise do reformismo, fazem com que os “momentos populistas” de esquerda sejam efêmeros. Frente a efervescência política dos setores populares, ou se avança em direção a uma política de classe e na subjetividade e à organização dos trabalhadores e do movimento de massas, ou são as forças da reação as que terminam de distintas formas impondo-se. O objetivo de Mélenchon, defensor de décadas das diferentes variantes do reformismo republicano burguês, obviamente não é a primeira variante, daí sua impotência estratégica.

A perda de hegemonia do LFI dentro da esquerda reparte as cartas novamente, frente a crise histórica de quem lidera este setor que se abriu depois do colapso do PS, que hegemonizava desde 1971. Embora o EELV seja o melhor posicionado, o caráter abertamente pró-mercado dessa organização torna difícil o conjunto das forças que alegam serem de esquerda se alinharem a eles, mesmo que a perda de seus bastiões municipais pressione o Partido Comunista Francês (PCF) a buscar alianças com quem quer que seja. Mas o forte golpe na estratégia populista de Mélenchon deu novos ares à esquerda dessas variantes, às forças que dentro ou fora do LFI sonham com um reagrupamento de anti-neoliberais e anticapitalistas, apesar de serem órfãos dos modelos europeus que encorajaram no passado, como Syriza na Grécia ou Podemos no Estado Espanhol, após o giro neoliberal do primeiro ou mais recentemente a adaptação à centro-esquerda neoliberal e o fracasso do segundo.

Não apenas a direita tradicional ou o PS podem desaparecer, mas lamentavelmente existe esse risco também na extrema esquerda. A política testemunhal vermelha nos discursos, adaptação à burocracia e a passividade sectária da Lutte Ouvrière (LO) ou a política de atalhos para a construção de um partido revolucionário da maioria do Novo Partido Anticapitalista (NPA) poderiam, atingindo um salto qualitativo, significar a certidão de óbito desta tradição política, muito presente desde 1968. Mas este resultado não é de todo inevitável: contra a passividade sectária de alguns e o impressionismo oportunista de outros, a estratégia trotskista é o único caminho que permite aos revolucionários fundirem-se de forma correta com a vanguarda do movimento de massas, como tentou a vanguarda ferroviária da Intergare, o Comitê Adama e setores da extrema esquerda como os que publicamos no Revolução Permanente o que ficou conhecido como Polo Saint Lazare (pela estação de Paris onde se concentravam) que foi o mais sério, ainda que embrionário e em grande parte simbólico de ligar a outros setores sociais a revolta dos Gilets Jaunes, saindo para a encruzilhada da hostilidade aberta, da denegrição e do aval à repressão das direções sindicais, incluindo a CGT, no ponto mais alto da revolta no início de dezembro. Se o conjunto das forças da extrema esquerda tivessem colocado todas as suas forças numa política independente e ousada, ajudando a superar tanto quanto possível os aspectos contraditórios, tanto na organização como no programa da revolta dos Gilets Jaunes, a mesma poderia aparecer claramente como uma verdadeira alternativa revolucionaria para um setor destes, frente aos impasses reacionários de RN ou a impotência estratégica da soberania de esquerda.

Há um fechamento provisório da situação pré-revolucionária, mas a estabilidade está longe de ser consolidada

A relativa vitória da polarização Macron / Le Pen é uma má notícia para os trabalhadores. Contra os defensores do voto útil, a continuação do falso duelo entre a direita e a extrema-direita reforça mutuamente esses dois como inimigos dos trabalhadores. Esse duopólio reacionário é um engano que vai ao encontro da luta de classes buscando reforçar os aspectos mais reacionários do regime da V República. Por mais que Marine Le Pen chame "pour la galerie" à dissolução da Assembleia, é o governo atual que se sente de alguma forma legitimado a evitar uma catástrofe e passa de novo a ofensiva, com três reformas perigosas que são anunciadas daqui para as eleições municipais, embora as modalidades concretas das mesmas ainda estão em aberto. No entanto, basicamente o que incentiva o macronismo a avançar não é tanto sua relegitimação, extremamente relativa como dissemos, mas o caráter covarde e traidor das direções do movimento operário, que não apenas deram as costas aos Gilets Jaunes, mas alinharam-se com o regime e o Estado burguês em momentos decisivos e se mantiveram com o caráter trapaceiro para com os trabalhadores em momentos de dialogo social, também da vontade do Poder Executivo de não negociar ou mesmo dar migalhas para se salvar, como fez o governo Hollande do PS, que é demonstrado pelas dificuldades do colaboracionista CFDT (central operária tradicionalmente socialista) com o atual governo.

Porém, além do eleitoral, é o impasse estratégico da ação dos Gilets Jaunes, que vem se estendendo desde os últimos meses, o que permitiu que Macron tentasse voltar à ofensiva depois das europeias. Embora tenhamos observado que a situação pré-revolucionária aberta em novembro não avançou qualitativamente após seu pico em dezembro, quando o "trono" vacilou - com vários rebotes críticos que não se cristalizaram, o que poderia significar um novo ponto de partida, como quando Castaner ( Ministro do Interior) estava no centro das atenções com suas mentiras sobre o falso ataque do primeiro de maio [5] - na medida que o Executivo não podia retomar a ofensiva, do nosso ângulo, preferimos mantê-lo em suspense. Mas a persistência deste impasse que temos apontado, incluindo certos sinais de desânimo em atos recentes, no marco do papel traidor da burocracia das confederações sindicais que deixaram seu protesto sozinho e a falta da menor alternativa por parte da extrema esquerda no auge do desafio, permite provisoriamente fechar essa situação pré-revolucionária e sua passagem para uma transitória, de caráter ainda indefinido.

Mas seria um erro acreditar que o novo ciclo histórico da luta de classes que abriu a insurreição dos Gilets Jaunes está fechado. As contradições que levaram a esse movimento não mudaram nem um pouco, enquanto os efeitos duradouros e subversivos de uma revolta inédita, mais cedo ou mais tarde, acabarão aparecendo e se expressando. Do ponto de vista dos acima, com seus resultados nas europeias, o macronismo tem os votos de apenas 12% dos eleitores registrados. No poder, governando solitariamente, eles representam 22,4% do eleitorado, enquanto a Grande Coalizão Alemã, apesar de muito debilitada, tem o dobro do apoio, com 44,5%. Sua força no terreno político vem da fraqueza de seus adversários. Mais importante ainda, em termos de hegemonia, o macronismo aprofunda as características do bloco burguês a níveis quase patéticos, o que o obriga a continuar atacando para continuar consolidando sua base social, mas aumenta seu caráter cada vez minoritário no conjunto da população.

A realidade é que o alívio imediato de Macron depois das europeias, graças ao fracasso e fagocitação do LR, esconde as dificuldades de sua corrente para incluir uma fração suficiente das classes médias dentro de um núcleo duro formado pelas classes mais favorecidas, fundamental para consolidar a estabilidade do novo regime. Mas os efeitos nocivos das reformas neoliberais impedem essa agregação com uma maior incerteza sobre seu futuro político, levando em conta que a reserva de votos à direita está se esgotando e a competição pelo que resta vai aumentar. A grande burguesia, um dia depois do alívio que significou o resultado eleitoral, começa a se preocupar porque o regime político está desequilibrado diante de um possível fracasso do macronismo. A ausência de uma direita que seja um eventual substituto ao LREM não é uma boa notícia, tampouco o vazio que há a esquerda se a situação política e ideológica se radicaliza. Sem mencionar socialmente, onde a insurreição dos Gilets Jaunes parecia como se não tivesse existido.

Do ponto de vista dos que estão abaixo, embora não saibamos em que ritmo, tudo pode começar de novo, sem que a mobilização dos Gilets Jaunes termine, como o governo e todos grandes meios vêm declarando sábado a sábado há meses, além do impasse que se arrasta e que poderia levar ao seu fim. Ou não. Como dizia a poucos dias das europeias, o analista político e diretor do departamente de opinião e estratégias de negócios do instituto de pesquisas IFOP, Jérôme Fourquet, em relação aos Gilets Jaunes: "Certamente há menos pessoas, mas elas são as mais determinadas e estão se mobilizado durante 26 sábados consecutivos. Essa presença de longo prazo no espectro político é espetacular. Pesquisas de popularidade mostram que sete entre dez franceses estão insatisfeitos com Emmanuel Macron. O núcleo duro dos muito descontentes inclui quatro em cada dez franceses [...] um erro de governo, um novo anúncio fiscal, uma saída infeliz [...] pode ser que, dentro de alguns meses, por causa de alguma decisão, comecem novamente. Há algo elétrico no ar ". Nada dessa tensão estrutural mudou depois do 26/5 e, especialmente, quando estamos diante de um piromaníaco social como Macron, que está pronto para jogar mais combustível no fogo.

NOTAS

[1] O liberal-conservadorismo cristão, que que enfatiza a ação do Estado para assegurar que o livre mercado possa ser preservado. Sua origem está na Escola de Friburg e foi hegemônica na Alemanha Ocidental nos anos do pós-guerra.

[2] 40% dos eleitores que votaram no RN são trabalhadores, mas não devemos esquecer que estamos falando de votos reais, prevalecendo ainda a abstenção no eleitorado popular, com trabalhadores assalariados, desempregados, aposentados que ficaram as margens das europeias. Os que se abstiveram devem acrescentar todos aqueles que (especialmente nos bairros populares) nem sequer estão registrados para votar. Sem mencionar aqueles que, sendo imigrantes, não têm o direito de votar, embora sejam explorados na França e sejam uma fração importante do proletariado.

[3] Apenas 37% dos que elegeram Mélenchon no primeiro turno de 2017 votaram em seu partido nessas eleições. Do resto dos eleitores da LFI de 2017, 17% votaram nesta eleição para os Verdes, 13% para a lista comunista e 7% para o PS. Deve-se também ter em mente que uma grande parte do eleitorado da LFI se absteve.

[4] Em referência à revolução tunisiana de 2011, quando o povo nas ruas se manifestou ao grito de "dégage!" contra o ditador Ben Ali, isto é, exigindo que ele renunciasse.

[5] Castaner denunciou um suposto ataque dos Gilets Jaunes a um hospital, algo que se provou totalmente falso.

 
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