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CONUNE
As perspectivas para uma juventude marxista e revolucionária rumo ao 57º Congresso da UNE
Odete Assis
Mestranda em Literatura Brasileira na UFMG
Isa Santos
Assistente social e residente no Hospital Universitário Pedro Ernesto/UERJ

De 19 a 23 de Junho acontecerá o 57º Congresso da União Nacional dos Estudantes (Conune). É preciso batalhar em cada escola e universidade para que esse evento possa organizar os estudantes em todo o país, construindo uma forte oposição ao governo Bolsonaro, sua reforma da previdência e para fazer com que a crise seja paga pelos capitalistas.

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O 57º Conune será o primeiro congresso nacional de estudantes no governo Bolsonaro. Só esse fato já faz com que esse congresso possa ter um caráter histórico, por se tratar do maior evento estudantil frente a um presidente, que quer “uma garotada que comece a não se interessar por política”. Uma construção desde a base dos estudantes, contra toda lógica burocrática que domina a entidade nos últimos anos, poderia ser fundamental para demonstrar o potencial de uma juventude que se interessa por política desde junho de 2013, que ocupou suas escolas e universidades, lutou contra o golpe institucional e a PEC do congelamento dos gastos públicos, saiu às ruas para gritar #EleNão frente às eleições mais manipuladas da história do nosso país. Uma juventude que é parte do fenômeno internacional de mulheres, que revela orgulhosa sua identidade negra na luta contra o racismo, e não tem medo de mostrar sua diversidade sexual. Uma juventude que pode incendiar os trabalhadores contra a Reforma da Previdência e cada um dos ataques que Bolsonaro, Moro, Damares, o judiciário e a extrema direita quer nos impor. Mas quais ideias estão à altura dos desafios da juventude frente ao governo Bolsonaro, filho do golpe institucional e do autoritarismo judiciário?

Há pouco mais de cem dias deste governo está evidente a urgência de construir uma força real que barre o avanço de uma extrema direita representada por Bolsonaro, eleito graças a manipulações de toda ordem conduzidas pelo judiciário, com uma missão principal: aprovar a Reforma da Previdência, que conta com “cláusulas especiais” escolhidas por Paulo Guedes para atacar a juventude e nos fazer trabalhar até morrer. Enquanto este ataque tramita, a juventude já amarga 25,2% de desemprego, sofre com a precarização do trabalho e a ameaça da concretização do que já se anunciava no ano passado: o fim de verbas para bolsas nas universidades em julho de 2019. E enquanto isso, a UNE decide defender o STF, pilar do golpismo no país.

Um congresso nacional de estudantes nessa conjuntura deveria se dedicar, desde a preparação, a refletir como chegamos até aqui como parte da tarefa de responder a um desafio colocado à juventude em tempos de crise capitalista. O Brasil atual é o da continuidade violenta do golpe institucional, que deixou como uma das suas feridas abertas o brutal assassinato de Marielle Franco. Há pouco mais de um ano de seu assassinato continuamos sem saber quem mandou matá-la, enquanto o exército escancara seu racismo com 80 tiros contra o carro de uma família negra, assassinando o músico Evaldo Rosa.

O regime brasileiro está em ponto de mutação, e acompanha uma ofensiva imperialista na América Latina, para nos arrancar petróleo, minério, sangue e suor - e devolvendo lama tóxica e fechamento de fábricas inteiras, deixando milhares de famílias sem fonte de renda, visando uma reestruturação muito mais servil ao imperialismo. No Brasil, essa ofensiva se deu sobretudo pelas mãos do autoritarismo judiciário e do atual ministro Sérgio Moro desde a Lava Jato, com a prisão arbitrária de Lula para permitir a eleição de um candidato que aplicasse ajustes ainda mais duros do que o PT implementou em seus governos. Na Venezuela, o braço do imperialismo de Donald Trump tem a cara de Juán Guaidó, com uma tentativa de golpe contra a qual devemos levantar todo nosso rechaço sem que isso signifique apoio político ao governo autoritário de Nicolás Maduro.

Diferentes forças do regime atuam permanentemente para disciplinar Bolsonaro e seu chamado “núcleo ideológico”, que quer o Escola Sem Partido para calar os professores e a juventude em sala de aula, o desengavetamento de mais uma “PEC da vida” contra o direito ao aborto, e a perseguição à liberdade de gênero e sexualidade. Entre ministros demitidos, escândalos de corrupção e algumas fissuras, o que orienta os de cima é “equilibrar” os cofres públicos para seguir o saque do país pelo pagamento religioso da dívida pública, ilegal, ilegítima e fraudulenta. E para isso, seguirão se utilizando das opressões às mulheres, negros, indígenas e LGBTs para melhor explorar.

VEJA TAMBÉM: Por que a dívida pública é uma fraude contra os trabalhadores e não deve ser paga

E para oprimir e explorar sem obstáculos, Bolsonaro e sua corja miram nos sindicatos e entidades estudantis. Enquanto o MBL ataca a UNE, é fundada no Brasil uma União Nacional de Estudantes Conservadores. Em defesa das nossas entidades e de nossa luta nos locais de estudo já demos uma demonstração de disposição de luta em 2018, com manifestações contra a censura que o TSE impôs, invadindo universidades e entidades e retirando faixas e cartazes.

Poucos meses depois da censura às faixas antifascistas, Bolsonaro decreta a comemoração do golpe de 64, como se fosse possível comemorar a morte de Edson Luís e tantos outros torturados e assassinados. É também por isso que, para Abraham Weintraub, novo ministro da educação, é melhor que as universidades não ensinem sociologia. Por isso querem que as crianças cantem o hino nacional e os professores não possam contar a história da nossa classe. Mais do que nunca precisamos de um movimento estudantil capaz de questionar profundamente a lógica da educação como mercadoria, um movimento estudantil que defenda fortemente a conquista das cotas étnico-raciais, mas também busque questionar profundamente o filtro social e racial do vestibular, os monopólios privados da educação, defendendo sua estatização sob controle dos estudantes e trabalhadores. Um movimento estudantil capaz de questionar a estrutura de poder que hoje faz com que nossas universidades estejam a serviço das grandes empresas capitalistas, defendendo sua autonomia frente aos governos, mas buscando transformá-la profundamente para que estejam a serviço da classe trabalhadora e de toda população pobre e oprimida em nosso país.

Retomar a UNE como ferramenta de organização dos estudantes: abaixo a burocracia da UJS, PT e Levante

Não faltam motivos para, desde já, organizar em todas as escolas e universidades do país grandes debates sobre todos esses temas, culminando em um processo de organização desde a base, que, a partir de discussões vivas em que se expressem todas as visões presentes no movimento estudantil, os estudantes sejam também sujeitos políticos, elegendo delegados para o Conune que levem à frente posições escolhidas pelos estudantes, fazendo um congresso que sirva para armar toda a juventude do país com medidas radicais contra esse governo.

Mas a direção da UNE está nas mãos de dois partidos que tem um política e estratégia que não nos permite vencer. Muitos estudantes que tiveram experiências com a UNE puderam perceber como agem o PT e o PCdoB, que dirigem essa entidade por via da União da Juventude Socialista, Levante Popular da Juventude e Kizomba: com processos antidemocráticos, descolados da maioria dos estudantes, sem promover discussões e processos democráticos de decisões, chegando a usar de fraudes e outros absurdos dignos da direita.

Assim o fazem porque querem que qualquer resistência ao governo Bolsonaro se expresse unicamente pela via parlamentar. Isso significa confiar, mesmo depois de um golpe no país, que pela via da conciliação com políticos como Rodrigo Maia ou do apoio parcial à reforma da previdência de Bolsonaro como alguns governadores petistas, é possível conquistar pequenas concessões. Enquanto isso, nas entidades estudantis e sindicatos, seguem sua política paralítica, evitando que qualquer indignação se transforme em mobilização, quiçá em organização. Para impedir os ataques da extrema direita contra a UNE, a UJS prefere confiar em Rodrigo Maia, ao invés de colocar todos os centros acadêmicos e DCEs que dirigem a serviço de promover a organização coletiva dos milhares de jovens, que em todo país protagonizaram diversos processos de luta e resistência nos últimos anos.

Até então essa burocracia encastelada na UNE, assim como na CUT e na CTB, tem conseguido algum êxito na contenção de movimentos mais amplos. Hoje impera a passividade, enquanto a ampla maioria da juventude amarga uma vida de desespero sem emprego ou com condições ultra precárias de trabalho e estudo. Antes do golpe a UNE era base apoiadora do governo do PT, que com sua política de conciliação, favoreceu fortemente os latifundiários do agronegócio, a bancada evangélica (Cunha, Feliciano, Malafaia e tantos outros) e as forças repressivas (como esquecer as tropas brasileiras no Haiti e as UPPs nas favelas e comunidades cariocas?), abrindo caminho para que se fortalecessem e consolidassem num momento de maior agudeza da crise capitalista, o golpe institucional. Com o golpe, a direção majoritária da entidade passou a ser oposição, mas isso não significou usar sequer uma pequena parcela do potencial que a UNE tem para fazer, nos locais de estudo e nas ruas, uma resistência capaz de expressar a força real que o movimento estudantil pode ter, ao lado da classe trabalhadora, frente ao avanço da extrema direita. Portanto nos perguntamos: um congresso que não só poderia, como deveria ser histórico, poderá ser se deixarmos nas mãos da mesma burocracia que já se provou descomprometida com a defesa dos direitos da juventude pela via da luta de classes?

Para lutar seriamente contra Bolsonaro, sua reforma da previdência, pelo não pagamento da dívida pública, por justiça para Marielle, contra os cortes na educação e na ciência, entre tantas outras demandas… é imprescindível denunciar o papel nefasto que tem cumprido a direção da UNE. E exigir que rompam já com a trégua que têm dado aos golpistas e que preparem o Conune em todo o país sem nenhum rotineirismo, como uma tarefa prioritária de barrar o principal ataque deste governo, que é a reforma da previdência. Contra todos os métodos e práticas burocráticas que a entidade tradicionalmente leva a adiante. Assim como rechaçar que alianças com partidos que defendem consensuar uma reforma da previdência com Bolsonaro, como o PDT de Tábata Amaral, podem ser alternativa.

Mas que papel tem cumprido a oposição de esquerda?

Para que tem servido os cargos de diretoria na entidade que têm correntes do PSOL, assim como de outros partidos como PCB e UP(PCR)? Essas correntes, além de conviverem pacificamente com a burocracia do PT e do PCdoB na direção da UNE, muitas vezes repetem métodos antidemocráticos de preparação de fóruns do movimento estudantil que deveriam ter expressão da base dos estudantes, como foi formação de chapas na UFABC, cujo DCE é dirigido pelo PCR: um processo “às escondidas”, sem chance de participação dos estudantes. É preciso fazer como os estudantes de Serviço Social e Geografia da UERJ, que fizeram grandes assembleias organizadas desde a base e paralisaram suas aulas por justiça para Marielle Franco e contra a Reforma da Previdência. Imaginem a força que teríamos para exigir da direção majoritária da UNE, se em cada Centro Acadêmico e DCE que o PSOL e as correntes da Oposição de Esquerda dirigem fizessem o mesmo? Quantos estudantes não poderiam ver ali um caminho para se organizar contra esse governo, confiando em nossas próprias forças e não esperando passivamente que um acordo parlamentar tire da pauta a votação da reforma da previdência?

O próprio PSOL aposta na mesma estratégia que já se provou ineficaz: a resistência meramente parlamentar. Uma prática que leva um de seus principais representantes, Marcelo Freixo, ao absurdo de declarar que é possível melhorar o pacote “anticrime” de Sérgio Moro. O mesmo pacote que poderia inocentar os assassinos de Evaldo, de Jennifer, de Marcus Vinícius e tantos outros jovens negros que são brutalmente assassinados pela polícia que mais mata em todo mundo. Não podemos ter nenhuma ilusão que esses métodos arbitrários da Lava Jato podem trazer algum benefício para a luta da juventude e da classe trabalhadora. Pelo contrário, só estão sendo usados agora como forma de girar a situação ainda mais a direita para usarem todos os recursos repressivos que forem necessários quando nos organizarmos. Por isso, também não compactuamos com a posição de algumas correntes de juventude, como o Juntos da Sâmia Bomfim e o Afronte, que comemoraram acriticamente como se aquela prisão “show” de Michel Temer pela Lava Jato, fosse o Fora Temer pelo qual nós lutamos.

Imaginem a força que poderia ter se a Oposição de Esquerda, ao invés dessas políticas, colocasse seus parlamentares, sindicatos, entidades e projeção do PSOL como um partido à esquerda do PT para ecoar uma exigência às centrais sindicais e à UNE que movam o enorme contingente da classe trabalhadora e da juventude brasileira, provendo todos os meios para que, pela nossa auto organização, tomemos as entidades em nossas mãos e façamos delas instrumentos de luta? Como poderia ser a articulação da oposição se Guilherme Boulos, que vem reunindo centenas de jovens em diversas universidades do país, fizesse esse chamado se contrapondo na prática as concepções burocráticas da direção da UNE e das Centrais Sindicais?

Construir uma juventude marxista e revolucionária para que a UNE volte a representar a base dos estudantes

Nós, militantes da Juventude Faísca e do grupo de mulheres Pão e Rosas, batalhamos por uma perspectiva marxista no movimento estudantil, buscando resgatar as lições dos grandes processos históricos, como o maio de 68 Francês, os Cordões Industriais do Chile, a Revolução Haitiana, e sobretudo a Revolução Russa, para pensar como atuar hoje sob um capitalismo decadente, em que é necessário enfrentar o imperialismo e esta burguesia nacional escravista, para que não sejam os trabalhadores, sobretudo os jovens, mulheres, negras e negros, e LGBTs, que paguemos as contas desta crise novamente. Nos propomos a construir uma corrente militante de jovens marxistas e revolucionários no movimento estudantil, com a perspectiva de nos aliarmos com a classe trabalhadora na defesa de um programa e uma estratégia que nos permita enfrentar o governo Bolsonaro, o avanço do autoritarismo judiciário e cada um dos ataques que os capitalistas querem nos impor.

Desde a plenária estadual de São Paulo do grupo de mulheres Pão e Rosas, fizemos um chamado ao PSOL e a todas as mulheres lutadoras do país, para construir um encontro nacional de mulheres por Justiça pela Marielle. Achamos que essa política poderia ser muito forte se fosse encampada por entidades como a UNE, colocando na linha de frente da construção do encontro as jovens mulheres que despertaram para política com a primavera feminista. Um encontro que pudesse estar a serviço de preparar uma mobilização massiva para lutarmos por justiça para Marielle, exigindo uma investigação independente. Ao mesmo tempo que debatesse como essa luta está profundamente ligada as lutas contra esse governo e sua nefasta reforma da previdência.

Veja o chamado do Pão e Rosas ao PSOL e a todas as lutadoras

Nos próximos dias divulgaremos nossa Pré-Tese rumo ao 57º Congresso da UNE, e queremos debater com todas e todos os estudantes nossas ideias, nosso programa e estratégia comunista, com a perspectiva de construir essa batalha antiburocrática nas universidades, exigindo de suas entidades uma eleição de delegados para o Conune que conte com discussões vivas na base e votações democráticas. É dever de cada DCE garantir essas condições, assim como pode ser uma grande contribuição para um cenário de passividade que cada universidade tenha seu próprio congresso, e que a construção do Conune sirva à construção desses fóruns que tendem a atingir mais estudantes. Não será com menos que o movimento estudantil pode ser um obstáculo para os planos de Bolsonaro e dos imperialistas, é preciso almejar incendiar o país contra esse governo e nos aliar aos trabalhadores, uma aliança que é revolucionária.

 
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