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MÉXICO
Três meses da “Quarta Transformação” e o despertar da luta dos trabalhadores no México
Pablo Oprinari

Os três meses de governo de Lopez Obrador foram marcados por dois eventos recentes, altamente significativos, que confirmam o que sustentamos desde 1° de julho. A novidade que nos avisa: a resistência operária.

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Na quarta-feira, 20 de fevereiro, Samir Flores, organizador da resistência contra a termelétrica de Huexca e à consulta que pretendia legitimá-la, foi ardilosamente assassinado. Em resposta ao repúdio e mobilização popular - que também chegou às ruas da Cidade do México -, Andrés Manuel López Obrador [AMLO, Presidente do México desde 1° de dezembro de 2018], manteve a "consulta cidadã" e os planos de construção da megaempresa, enquanto continuou a acusar os opositores de “conservadores”.

Poucos dias depois, a Câmara dos deputados aprovou - praticamente por unanimidade - a criação da Guarda Nacional. As bancadas de Morena, do PRI, do PRD, do PAN, do Encontro Social, do Verde Ecologista, do Movimento dos Cidadãos e do Partido Trabalhista legitimaram um novo avanço na militarização do país. A reivindicação de centenas de milhares de pessoas que foram às ruas durante o mandato presidencial de Calderón e Peña del Nieto, membro do PRI, foi ridicularizada por aqueles que concorreram como alternativa aos partidos tradicionais. Na quinta-feira, dia 28, como o Senado já havia adiantado, todos os partidos do Congresso - começando com aqueles que a AMLO chamava de "máfia no poder" - se uniram para sancionar o projeto presidencial.

Desde que Lopez Obrador ganhou as eleições, dissemos que o novo governo teria de manter o equilíbrio entre as expectativas dos trabalhadores, que votaram amplamente nele esperando por mudanças, e seu programa limitado, que nem sequer questionava parcialmente a penetração imperialista e os interesses dos empresários. E que, por essa razão, não poderia resolver as demandas e aspirações populares.

Assim, a chamada Quarta Transformação, enquanto desenvolve algumas medidas e concessões - tais como programas sociais ou a anulação da reforma educacional - promove "obras" como o Trem Maia entre outras, que prometem altos lucros para o capital privado, ou à Guarda Nacional, uma nova corporação que preserva, sob outro nome, a militarização exigida por Washington nas últimas décadas.

Ao serviço de manter sua imagem como alternativa a de seus antecessores, AMLO coloca sua retórica anti neoliberal, que impacta profundamente em um contexto marcado pelo rechaço aos velhos partidos. A “Quarta Transformação” procura ressignificar os principais momentos da história mexicana, para fortalecer ideologicamente o projeto lopezobradorista, como discutimos aqui, em torno da interpretação desses momentos históricos. Tudo isso combinado com um posicionamento internacional que rompe com a tendência hegemônica reacionária na região, como expressado no caso da Venezuela, porém estando longe de significar um projeto antiimperialista quando acompanhado por constantes tentativas de evitar atritos com a Casa Branca.

No entanto, além dessa aparência "progressista" e de seus apelos para "governar para ricos e pobres", a essência do projeto lopezobradorista é preservar e administrar o capitalismo, garantindo estrategicamente os interesses da classe dominante, com políticas como as que criticamos anteriormente. Por essas razões que ele fala de anti-neoliberalismo antes de se encontra com Slim, Salinas Pliego e outros, argumentando que o objetivo é transformar o México em um paraíso para investimentos ... dos capitalistas. A demissão de milhares de trabalhadores a serviço do Estado, sendo a maioria precarizada e com salários muito baixos, é um testemunho grosseiro de quem será afetado pela “Quarta Transformação”, muito além do mencionado combate "contra a alta burocracia".

Os trabalhadores no centro

No início desta coluna, dizemos que a novidade no México, no contexto do novo governo que assumiu, é a irrupção da luta dos trabalhadores.
Não é exagerado recordar que enquanto dezenas de milhares de operários e operárias realizavam greves e paralisações contra a patronal em Matamoros, em outras latitudes - França! - se desenvolve um dos processos de luta de classes mais avançados das últimas décadas. Os trabalhadores começam a se colocar em ação para além das fronteiras.

A rebelião operária das maquiladoras - como merecem chamar-se - mostrou em movimento um dos setores mais concentrados e poderosos da classe trabalhadora, que cresceu ao calor das instalações da indústria de exportação nos estados do norte e do centro do país.

O que a luta de Matamoros pois em questão não foi somente os baixos salários e a prepotência patronal. A irrupção espontânea de milhares de trabalhadores questionou o poder ditatorial da burocracia sindical, como a dos Villafuerte e dos Mendonza e Matamoros.

E torna-se urgente recuperar os sindicatos para a luta, baseado na democracia operária, com delegados revogáveis e com mandato, cuja função, longe de facilitar os planos empresariais como fazem os burocratas, seja de defender incansavelmente os interesses dos trabalhadores, com independência do Estado, da patronal e dos partidos a seu serviço.

A emergência das e dos operários maquiladores de Matamoros não é um raio em céu sereno. Ele impulsionou a saída em luta de outros setores de trabalhadores: desde os professores de Michoacán e Oaxaca, até os trabalhadores das universidades como a UAM - que estão a quase um mês em greve - Chapingo, Uabjo, assim como distintas empresas, algumas delas transnacionais, como Coca Cola e TPI e do setor minero. Isso coloca a urgência de impulsionar um encontro nacional de luta e uma paralisação nacional, a qual as centrais sindicais que se proclamam democráticas e combativas devem convocar.

A ação do movimento operário em distintos estados da república tem entre seus motores as aspirações de mudança, da que dizemos antes. Um trabalhador da Coca Cola disse, na paralisação, “nos prometeram uma transformação, e estamos lutando por ela”; e a classe operária a faz com seus próprios métodos, com greve. Também disseram “não há outra maneira. O com a patronal ou com a classe trabalhadora”. Toda a atenção para o governo e seu discurso de conciliação de classes.

As palavras recentes de AMLO, chamando para resolver “mediante o diálogo” as greves para “não afetar as empresas”, não só busca distanciar-se de seus predecessores, como é uma tentativa de adormecer e conter as lutas dos trabalhadores que exigem a resolução íntegra de suas demandas.

Estamos frente a um novo ciclo de luta operária no México. Um ressurgir das lutas de classes que insurgiu sem aviso e sem pedir licença no horizonte da Quarta transformação Lopezobradorista. Nos anos anteriores a resistência foi encabeçada fundamentalmente pelo magistrado, a juventude e os povos indígenas. Hoje a ponta de lança são os trabalhadores industriais, a chamada “classe operária oculta” que, evidentemente e sem nenhuma dúvida, já não é mais e ainda mais, tem inúmeros laços dos trabalhadores mexicanos do outro lado da fronteira, uma razão mais para que o xenófobo e racista Trump, se preocupe.

A classe trabalhadora deve ocupar ainda mais generalizadamente seu lugar, no centro da vida política, de forma independente do governo e dos partidos do Congresso.

Nas fileiras da greve, as mulheres são a maioria e estão na primeira linha da luta, como se viu nas greves nas maquiladoras. Por isso, neste mês em que ocorreu o 8 de março, com massivas marchas pelo mundo, no México as mulheres podem ser a vanguarda da luta. Nesse 2019, se trata que a classe operária pode começar a tomar a história em suas mãos.

 
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