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USP
Os convênios da USP com a Vale: uma reflexão sobre o papel da universidade
Weckson Vinicius
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A produção de conhecimento na sociedade burguesa é determinada por um monopólio da invenção científico-tecnológico. O que determina em última instância que quem direciona essa produção é a classe social dominante: a burguesia. As universidades, além de seu papel de classe, concentram a produção das tecnologias e aglutinam os indivíduos que se apropriam e põem em movimento tais conhecimentos e técnicas. Não é diferente com a USP, uma das maiores universidades do mundo. Esta, em específico, carrega uma contradição imanente: ao mesmo tempo em que é mantida pela classe trabalhadora brasileira, eterniza e difunde o pensamento dominante, servindo aos interesses das elites na perpetuação de sua exploração.

Esta breve introdução vai servir para entender o porquê da existência de dezenas de convênios que a Companhia de Mineração Vale do Rio Doce realizou nos últimos anos com a Universidade de São Paulo, com cifras estimadas em mais de 50 milhões de reais.

Antes, resgato aqui um trecho de Moral e Revolução de Leon Trotsky:
“[...] a moral é um produto do desenvolvimento social; ela não tem nada de imutável; serve aos interesses da sociedade; esses interesses são contraditórios; mais que qualquer outra forma ideológica, a moral tem um caráter de classes”. [1]

Por que introduzi este trecho? Se eu perguntar a você, leitor, se se deve colocar em primeiro lugar a vida dos trabalhadores ou a extensão do lucro das empresas, creio que a resposta seja aparentemente óbvia, certo? Não! Pelo menos quando se diz respeito aos donos da empresa Vale. A sua condição de classe o faz transcender a moral do senso comum e submeter dezenas de trabalhadores à catástrofes em prol de seu enriquecimento.

Em uma busca na página de transparência do site da USP [2], é possível identificar que, somente na Escola Politécnica, a Vale investiu absurdos 50 milhões de reais em convênios para a realização de pesquisas, projetos, ações, que logicamente têm a finalidade de aperfeiçoar os métodos de produção, transporte, manutenção e todos os estágios da fabricação da empresa. Por que então não investiu na segurança dos trabalhadores e em métodos de construção de barragens mais sofisticados e seguros para a população e o ecossistema? Porque por um lado, o conhecimento produzido nas universidades não está a serviço da classe trabalhadora e da população pobre, e por outro lado, as empresas e empresários, reproduzindo a irracionalidade do sistema capitalista, nos leva a desastres de proporções incalculáveis em prol de seus lucros e riquezas.

Para além de todos esses investimentos com vistas a aumentar a taxa de lucro da empresa, o próprio Estado financiou pesquisas como o projeto de “Otimização de ativos aplicada à operação de minas a céu aberto”, que consta na lista de convênios da USP com a Companhia Vale do Rio Doce com custo ZERO para a empresa criminosa.

Uma breve pesquisa nos levará a uma revista da Vale que descreve e dá mostras de tal projeto:

“No edital lançado conjuntamente pela Vale e a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) em 2010, um dos projetos aprovados foi o “Min_AO (sigla para Mining Asset Otimization): otimização de ativos aplicada à operação de minas a céu aberto”, desenvolvido por uma equipe de pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP). Por meio dele, foi possível estudar o processo de planejamento de curto prazo, incluindo o line-up (plano diário de atividades de lavra), já bem consolidado na Mina do Sossego, no Pará, e propor mudanças específicas para esta operação, baseadas sobretudo em metodologias de mapeamento dos processos.” [3]

Depois dessa primeira experiência (Min_AO), firmou-se um contrato de 5 anos - de 2014 até 2019 - para a continuação do projeto “bem-sucedido”, denominado agora de “Min_AO2” ou “Minão 2” como é conhecido, com vistas a elaborar “um plano de desenvolvimento para automatizar procedimentos que antes eram feitos manualmente e, às vezes, intuitivamente” [4] , o que implica em um investimento da população que só beneficiará, única e exclusivamente, a própria empresa. Utilizo-me do recurso da citação de um envolvido na pesquisa, o engenheiro sênior Sandro Freitas, para novamente demonstrar que o conhecimento da universidade não está a serviço da classe trabalhadora, mas sim de seu algoz, a burguesia:

“Uma das minhas preocupações é associar as necessidades
da empresa à pesquisa (grifo nosso). Nesse processo, não é preciso que o projeto esteja concluído para obtermos resultados. Durante a realização do Min_AO², adquirimos um software de inteligência artificial (redes neurais), simulação e otimização estocástica (otimização sob incerteza) para fazer a análise de risco da disponibilidade de caminhões.” [5]

Como se pode ver, um dos interesses que estão sendo defendidos na pesquisa (vale ressaltar novamente, pesquisa essa financiada pela população), diz respeito ao processo de transporte dos minérios, ou mesmo a capacidade de planejamento de extração de minério de forma antecipada, planos de manutenção de equipamentos, até a otimização do sistema de despacho, que diz respeito ao sistema de controle dos equipamentos, como os de perfuração e desmonte, produção de minério, infraestrutura da mina, etc. Trocando em miúdos: um grandessíssimo investimento (que nem ao menos temos acesso aos valores envolvidos) com o objetivo de diminuir os riscos de qualquer imprevisto que venha a prejudicar financeiramente a empresa e para aumentar o planejamento e metas que somarão cifras cada vez maiores para os proprietários da Vale.

A VALE ASSASSINA (como bem expôs aquele que com spray reproduziu a voz de milhões) gastou 56 MILHÕES (mais exatamente 56.995.356,16) de reais em convênios só com a Escola Politécnica da USP para aumentar a sua eficiência na produção tendo por objetivo extrair maiores taxas de lucros, ao invés de garantir condições seguras para os trabalhadores em Brumadinho, Mariana, e em diversas outras cidades. Um detalhe não menos importante e que passa despercebido escancara a negligência, ou melhor, a crueldade da burguesia quando se trata da segurança dos trabalhadores e da população: cerca de 130 barragens, incluindo a de Mariana e Brumadinho, aqui no Brasil, foram construídas pelo método de “Montante”, um procedimento barato e que oferece um alto grau de risco de rompimento [6]. O processo consiste em criar diques que isolam os rejeitos com materiais dos próprios rejeitos produzidos no processo de lavra do minério (sic!).

Eles não levam a sério nossas vidas.

As privatizações e a política de Bolsonaro e sua trupe prometem novos Brumadinhos e Marianas. A burguesia forja seus lucros sobre o suor e o sangue daqueles que trabalham e fazem da própria vida o mecanismo que movimenta o mundo.

As nossas vidas valem mais que o lucro deles!!

A única forma de prevenir novas tragédias sociais e ambientais é lutar pela reestatização da Vale sob gestão dos trabalhadores e controle popular, para enfrentar a mineração predatória e a contaminação do meio ambiente, com controle popular e com representantes de ambientalistas eleitos nas universidades e comunidades. Todas as pesquisas e convênios hoje firmados com a Vale deveriam se voltar imediatamente para pensar como ajudar a população e o meio ambiente afetados pelas tragédias de Mariana e Brumadinho. E posteriormente avançar para pesquisas que permitam o desenvolvimento de forças de extração de minérios que não sejam tão prejudiciais a vida humana e ambiental.

 
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