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RIO GRANDE DO SUL
A senzala no Acampamento Farroupilha e o racismo de Bolsonaro, Heinze, Ana Amélia e a elite escravagista
Valéria Muller

Uma senzala reproduzida no Acampamento Farroupilha em Porto Alegre escancarou o nível impressionante de racismo do 20 de setembro e do Movimento Tradicionalista Gaúcho. Após críticas do movimento negro e nas redes sociais, a senzala foi retirada. Ainda assim vale refletir sobre esse absurdo episódio e suas relações com o fortalecimento de uma extrema-direita racista que odeia a população negra.

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Foto: Joana Berwanger/Sul21

O 20 de setembro é um feriado em que os gaúchos comemoram a Revolta dos Farrapos, ou Revolução Farroupilha, como tratam alguns, em referência ao que ocorreu no estado entre 1835 e 1845. Nesse período do ano é montado um acampamento com diversos piquetes onde ocorrem shows de música tradicionalista, além de churrascos, comércio e outras atividades. Na prática, o acampamento remonta a vida das elites escravocratas da época, que estiveram à frente da revolta contra o então governo regencial devido à taxação de seus produtos, sobretudo o charque (carne seca) e o couro.

Há críticas sobre se comemorar uma guerra perdida. Tal comentário parte da compreensão de que os revoltosos pretendiam a independência do Rio Grande do Sul em relação ao restante do Brasil. A verdade é que, do ponto de vista das elites que dirigiram a revolta, o desfecho foi bastante favorável. O governo central, de fato, negociou termos mais vantajosos aos proprietários gaúchos. Não o fez sem que fosse derramado sangue da população negra escravizada, enganada pelas elites escravocratas com promessas de liberdade que não se concretizaram, jogando-se sem armas para morrer em uma guerra que não era sua. O dramático episódio conhecido como a Traição de Porongos, ou mesmo Massacre de Porongos, marca o fim da Revolta dos Farrapos, com um acordo entre as elites gaúchas e o império selado em um verdadeiro banho de sangue do pelotão conhecido como Lanceiros Negros.

Veja mais: Dia 20 de Setembro: o que é comemorado pelos gaúchos?

Voltando aos dias de hoje, foi chocante e revoltante ver a reprodução de uma senzala, inclusive com manequins negros em posição de acoite, no Piquete Aporreados do 38. Após inúmeras críticas, uma reunião entre os coordenadores do piquete, o Movimento Tradicionalista Gaúcho e o Conselho Municipal dos Direitos do Povo Negro decidiu desmontar aquele absurdo. Vale ressaltar que isso é menos do que o mínimo. O mínimo seria não reproduzir espaços onde a população negra escravizada era torturada, onde assentava-se parte da manutenção do trabalho forçado ao qual aqueles homens e mulheres eram submetidos. O mínimo seria não comemorar o massacre dos Lanceiros Negros, possibilitado por falsas promessas de abolição da escravidão. Porém, não há o mínimo de respeito à memória e à história do povo negro na cultura dominante do Rio Grande do Sul. Não há, entre as elites, um pingo de vergonha por tudo isso e por todo o período da escravidão. O MTG não é mais que um movimento criado pelas elites brancas e latifundiárias, que construiu uma espécie de mitologia em torno dessa barbárie que foi a Revolta dos Farrapos, embelezando episódios dos quais o povo gaúcho deveria ter vergonha.

A reprodução de uma senzala como uma das "atrações" de um evento cultural não se explica por fora do fortalecimento de uma extrema-direita racista, que odeia a população negra. Isso ocorre em um país onde o candidato com maiores intenções de voto à presidência já declarou que quilombolas "nem para reprodução" servem, que a classe trabalhadora terá que escolher entre ter direitos e ter emprego, além de uma infinidade de barbaridades contra a população LGBT e as mulheres. Neste estado onde se comemora o massacre dos Lanceiros Negros Bolsonaro tem nada menos que 40% das intenções de voto.

No Rio Grande do Sul vemos também algumas versões locais de Bolsonaro. Um deles é Luiz Carlos Heinze, candidato a senador pelo PP. Heinze foi eleito em 2014 deputado federal e em Brasília era parte da bancada do Bala, Boi e Bíblia, atuando principalmente no que diz respeito à parte do boi, mas também garantindo votos favoráveis a ataques como o golpe institucional, o teto de gastos, a terceirização irrestrita e a reforma trabalhista. O latifundiário chegou a ser considerado como o racista do ano por um ONG inglesa chamada Survival. Não poupa ódio ao falar da população negra, quilombola, LGBT e das mulheres, e chegou a declarar que estes setores são "tudo que não presta". Embora regional e nacionalmente seu partido esteja coligado com o PSDB, seu voto à presidência só poderia ser de uma extrema-direita tão asquerosa como ele, hoje encabeçada nacionalmente pela candidatura de Bolsonaro.

Do mesmo partido de Heinze, Ana Amélia Lemos, candidata à vice-presidente de Alckmin, é também parte desse setor repugnante. Antes de se candidatar a qualquer cargo era jornalista política, porta-voz do agronegócio na RBS, correspondente da Rede Globo no Rio Grande do Sul. No Senado ela também votou todas as medidas que atacam a classe trabalhadora principalmente negras e negros, que ocupam os postos de trabalho mais precários da sociedade. Além disso Ana Amélia expressou a ignorância, o preconceito e o racismo da direita quando confundiu a Rede de Comunicação Árabe Al Jazeera e o Estado Islâmico (!), como se fossem tudo uma mesma coisa. Também não vacilou em saudar os tiros contra a caravana de Lula no sul, um ataque proto-fascista que demonstra o reacionarismo medieval dos latifundiários locais.

Hoje vemos Bolsonaro, defensor da ditadura militar, falando em sua campanha eleitoral sobre liberdade. Luiz Carlos Heinze no horário eleitoral gratuito da TV saúda os Farrapos, que enganaram a população negra escravizada, também fazendo referência aos supostos ideais de liberdade que moviam aquela guerra suja. Os ideais de liberdade deles correspondem com aqueles defendidos por Bento Gonçalves, David Canabarro e outros fazendeiros e generais que colocaram o povo negro e trabalhador a morrer pela sua sede de lucro. Tanto Heinze quanto Bolsonaro não fazem questão de esconder em nada suas veias escravagistas. Bolsonaro chegou a propor diretamente a revogação da lei de combate ao trabalho escravo. Heinze, por outro lado, propõe trabalho escravo à população carcerária dizendo que é "um absurdo" que não trabalhem para "custear sua estadia". Obviamente ele também votou contra projetos de lei que buscavam combater o trabalho escravo no Brasil, apoiando a portaria do governo Temer que flexibilizava esse combate. O governo acabou recuando na portaria mas deputados escravagistas como Heinze não serão esquecidos.

Se a senzala do Acampamento Farroupilha foi desmontada a partir de um acordo, o racismo estrutural do Brasil, e ainda mais escancarado nas tendências escravagistas das elites gaúchas e seus políticos, não poderá ser enfrentado com acordos. Essas elites asquerosas são inimigas do povo negro, assim como também das mulheres, dos LGBTs e da classe trabalhadora. Se fortalecem nacionalmente nestas eleições com a candidatura de Bolsonaro. Mesmo que ele não ganhe, seguirá disseminando junto a Heinze, Ana Amélia e outros vermes desta mesma natureza, todo esse ódio, esse racismo e toda essa sede pelo máximo de exploração possível do trabalho da população negra. Haddad e o PT se mostram mais uma vez incapazes de enfrentar a radicalidade e a dureza dessa extrema-direita, quando mais uma vez atuam para formar um governo com golpistas e outros setores como o PSDB. É necessário uma alternativa política que supere o PT pela esquerda, sem ilusões de conciliação com os golpistas e empresários, que aposte na mobilização independente da classe trabalhadora, da juventude, das mulheres, do povo negro e LGBT para assim fazer frente às viúvas da escravidão e da ditadura militar. É a serviço disso que está o Esquerda Diário.

 
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