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ELEIÇÕES GOVERNADOR SP
Um debate com o programa para educação de Lisete e do PSOL
Danilo Paris
Editor de política nacional e professor de Sociologia

Eleições governador São Paulo: Um debate com o programa para educação de Lisete e do PSOL.

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Estamos diante de um dos maiores ataques à educação pública das últimas décadas. Uma verdadeira ofensiva neoliberal na educação básica e superior. Os dois anos de golpismo foram fundamentais para isso. Mas também as heranças do PT na educação contribuem muito para o cenário devastador. A extrema-direita elegeu a educação como carro chefe para destilar seu reacionarismo e demagogia. A farsa da suposta cartilha LGBT levada por Bolsonaro ao Jornal Nacional que teria sido entregue nas escolas, que na realidade nunca existiu, e o Escola Sem Partido são exemplos da importância que o tema da educação adquiriu nessas eleições.

O golpe mirou em primeiro lugar a educação, com o decreto através de Medida Provisória da Reforma do Ensino Médio. Agora o golpismo segue manipulando as eleições, retirando o direito do povo decidir em quem votar com impedimento da candidatura de Lula. Apesar de não votarmos no PT, denunciamos fortemente esse absurdo, incluindo um chamado ao PSOL para concentrar todos os seus recursos jurídicos em uma ação pelo cumprimento da solicitação liminar do Comitê de Direitos Humanos da ONU ao Estado brasileiro que garanta o direito de Lula de ser candidato.

Diante disso, era de se esperar das candidaturas da esquerda, em especial das que são oriundas da educação, uma resposta enérgica.

No entanto, o programa de governo do PSOL e da professora Lisete, candidata ao governo de São Paulo, são a expressão de uma esquerda que desistiu de se enfrentar com os grandes problemas, incluindo a superação das políticas do PT para educação. Apesar de Lisete defender que a marca de seu governo será “uma revolução a partir da educação”, na realidade encontramos um programa muito parecido com o reformismo clássico, e portanto impotente em anos de crise, assemelhando-se com programas defendidos pelo PT. A seguir, sintetizamos quatro grandes problemas do programa da professora Lisete para a educação pública.

1-Lei do Piso, condições do trabalho pedagógico e salário para os professores

Uma das principais pautas históricas do magistério público não aparecem entre as propostas apresentadas por Lisete. Mesmo dando destaque para os baixos salários do professorado, promovido pelos governos do PSDB, o programa do PSOL sequer se compromete com a aplicação da Lei do Piso, aprovada desde 2008. Nela se prevê que a jornada de trabalho dos professores seja cumprida com 1/3 de horas para atividades extra-sala, destinada para a formação pedagógica, programação de aulas, correção de atividades entre outras tarefas fundamentais para que exista qualidade para o trabalho pedagógico nas escolas.

Há dez anos de sua aprovação, a Lei do Piso segue não sendo respeitada em grande número de estados e municípios, entre eles São Paulo. Ao final de 2016, oito estados não cumpriam integralmente a lei, 55% dos municípios não pagavam o piso e 62% não cumpriam a composição da jornada estabelecida, segundo levantamento feito pela CNTE. Seu resultado é a manutenção da educação pública com uma qualidade precária, submetendo os professores à jornadas extenuantes de trabalho que muitas vezes passam das 60 horas semanais.

Vale lembrar que vários governos municipais e estaduais petistas também não cumpriram a Lei do Piso, como Tarso Genro quando era governador do Rio Grande do Sul.

Esse tema foi pauta de inúmeros fóruns e é uma bandeira histórica dos professores da rede pública de São Paulo, que sempre defenderam que a jornada de trabalho seja composta com metade do tempo exclusivo para o cumprimento de atividades extra-sala. Esse programa é central para enfrentar a precarização do trabalho docente, que hoje é quase inteiramente realizado dentro de sala de aula. Porém, inexplicavelmente, nem mesmo aquilo que já é lei consta no programa da candidata a governadora.

2-A super-exploração dos professores

Outra assustadora omissão no programa do PSOL para educação está na completa ausência do tema dos professores com contratos precários e temporários, conhecido como categoria O, V e F. Um estudo feito pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), utilizando dados do Censo Escolar, mostrou que um em cada quatro professores das escolas de Educação Básica mantém contratos temporários com o poder público. São dezenas de milhares de professores que todos os anos são demitidos e recontratados, período quando uma grande parte fica meses sem receber seus salários ou com uma jornada de trabalho muito baixa e com salários de fome. Esses trabalhadores sequer podem usar o hospital do servidor, entre outros direitos que lhe são tolhidos.

Lisete não propõe uma resolução efetiva para acabar com essa situação, e nem ao menos cita esse enorme descaso com a vida dos professores. A defesa da imediata efetivação desses professores sem necessidade de concurso (uma vez que já trabalham há anos nas escolas públicas e deveriam ter os mesmos direitos que um professor efetivo) é uma questão elementar para interromper esse sofrimento e humilhação promovidos por Alckmin e o PSDB. Contudo, Lisete limita-se a tímida proposta de defesa de mais concursos públicos, proposta que por si só deixará uma grande parte desses professores sem emprego.

3-Lei de Responsabilidade Fiscal, dívida pública e financiamento para educação

Outro tema que não está em questão para a professora Lisete é o da Lei de Responsabilidade Fiscal. Diversos estudos e intelectuais da educação, sem dúvida conhecidos por Lisete que é professora da Faculdade da Educação da USP, demosntram que essa lei é responsável pelo avanço das privatizações dos serviços públicos, da precarização das condições de trabalho do funcionalismo e dos serviços públicos.

O processo de terceirização que atingiu os trabalhadores da merenda, limpeza e transporte das escolas públicas é um dos cruéis resultados dessa lei. Hoje, uma série de creches são gerenciadas por OS e empresas privadas, também em função da mesma lei. Ela é a cara da política neoliberal, que obriga estados e municípios manterem o fiel pagamento de suas dívidas com um único objetivo: dar prioridade absoluta ao pagamento da dívida pública, tanto para a União, como para estados ou municípios.

Assim, as leis neoliberais de FHC - honradas em todos governos do PT - significaram submeter todo o orçamento público ao pagamento da dívida. Significaram não aumentar substancialmente o financiamento da educação e de muitos outros direitos para enriquecer os donos da dívida. Somente no governo FHC foram quase R$ 6 trilhões para o pagamento da dívida. Nos governos Lula, foram gastos mais de R$ 7 trilhões. Nos governos Dilma, quase R$ 8 trilhões, valor o equivalente ao necessário para construir mais 220 mil escolas. E o governo golpista de Temer até o momento gastou mais de R$ 3 trilhões.
Assim como Lisete não defende o fim da Responsabilidade Fiscal, Guilherme Boulos não defende o fim do pagamento da dívida pública, como criticamos aqui.

O PT nunca se propôs a acabar com a Lei de Responsabilidade Fiscal porque ele estava comprometido com o “equilíbrio fiscal” a fim de garantir recursos para o pagamento da dívida pública. Não defender o fim da Lei de Responsabilidade Fiscal, como faz Lisete, é seguir os mesmos caminhos trilhados pelo PT.

4-Os ataques dos golpista e os grande monopólios da educação privada

As candidaturas do PSOL, através das figuras como de Lisete e de Guilherme Boulos, vieram defendendo a revogação da Reforma do Ensino Médio e da Emenda Constitucional 95 (que limita o aumento do investimento em saúde, educação e serviços sociais pelos próximos 20 anos) através de plebiscitos. No entanto, em seu programa são incapazes de apresentar qual seria o próximo passo após essas medidas.

Um dos efeitos diretos da política educacional petista foi a formação de imensos monopólios do ensino privado no país. As políticas como Prouni e FIES, no Ensino Superior, e Pronatec, no Ensino Profissional, fortaleceram fortemente as empresas do setor. Hoje, o Ensino Superior privado detêm 75% das matrículas nesse nível de ensino. Desse amplo mercado, a participação dos quatro maiores monopólios concentram mais de 70% dele. Das quatro maiores empresas de ensino privadas no Brasil, três tem suas ações abertas em bolsas de valores (Kroton, Estácio e Laureate), com acionistas de grandes grupos imperialistas.

Uma empresa como a Kroton, maior empresa de Ensino Superior do mundo, conta com um capital estimado de mais de R$ 20 bilhões e 1 milhão de matrículas. O balanço financeiro da Kroton nos mostra que a participação do FIES é responsável por mais da metade de suas matrículas presenciais e mais de 25% das matrículas totais (presencial + a distância) e o Prouni lhes dá anualmente isenções milionárias, chegando a quase R$ 885 milhões em 2015.

O PT vende a ideia de que ele promoveu a expansão do Ensino Superior, mas não diz que sua imensa maioria foi nas universidades privadas. A juventude trabalhadora que conseguiu ingressar no ensino superior (que em sua maioria oferecem cursos de qualidade extremamente precários) através desses programas, hoje está extremamente endividada pagando o FIES, ou está sendo expulsa das vagas do PROUNI criadas a partir de vultuosas cifras em isenções fiscais, mas que poderiam ser oferecidas diretamente em universidades públicas.

Contra esse verdadeiro monstro privatizante, que está por trás da articulação da implementação da Base Nacional Comum Curricular e da Reforma do Ensino Médio, o que o programa de governo do PSOL propõe se resume a apenas: “1-Regulamentação da participação acionária de empresas transnacionais na propriedade de estabelecimentos privados, como parte de uma transição que leve ao seu impedimento, e 2-Estabelecer regras que garantam padrão de qualidade para o funcionamento das instituições”.

É inacreditável que diante desse quadro o PSOL proponha apenas a regulamentação do ensino privado. As milhões de matrículas foram criadas com o dinheiro público e a única proposta realmente realista para expansão significativa de vagas nas universidades públicas é a estatização desses monopólios sem indenização. Não há possibilidade de maior expansão e financiamento público para educação pública sem enfrentar esses grandes monopólios e os mecanismos de espoliação da dívida pública, seja no pagamento direto do governo federal seja nos mecanismos, como a Lei de Responsabilidade Fiscal, que impedem maiores investimentos públicos diretos no setor. O PSOL não apresenta qualquer alternativa em seu programa aos milhões de jovens que tiveram as portas do ensino superior fechadas pelos cortes nesses programas, e muito menos para aqueles que nunca tiveram essa perspectiva. Assim, o programa do PSOL é incapaz de apresentar uma proposta de superação das políticas do PT para educação.

Os grandes monopólios do ensino superior privado, gestados nos anos de PT, agora se apoiam no governo golpista para avançar na educação básica. A herança petista e os avanços golpistas na educação precisam ser superados pela raiz, com um programa anti-imperialista e de independência de classe que responda a fundo essas questões. A “revolução a partir da educação”, prometida por Lisete e pelo PSOL, é apenas letra morta ao não se propor enfrentar esses grandes problemas e desafios para educação pública brasileira.

 
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