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DEBATE COM O "MAL MENOR"
O PT como “mal menor” ajuda a combater o golpismo e a direita?
Diana Assunção
São Paulo | @dianaassuncaoED

Contra o autoritarismo do poder judiciário, defendemos o direito de Lula ser candidato. Mas não apoiamos os candidatos do PT porque acreditamos que o voto no apoio ao chamado "mal menor" vai contra a construção de uma força anticapitalista que aposta na mobilização independente da classe trabalhadora, das mulheres, dos negros e da juventude contra o golpismo e a extrema direita. Por isso queremos debater com os companheiros/as que defendem o mal menor cada um de seus argumentos.

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Amplos setores de massas associam hoje, sem reservas, a piora de suas condições de vida ao golpe institucional e ao governo golpista de Temer. Não apenas suas condições econômicas, mas a destruição de todos os direitos sociais. A extrema direita encabeçada por Jair Bolsonaro leva até as últimas consequências os efeitos do golpe institucional: o trabalhador deveria escolher entre “ter menos direitos e algum emprego, ou ter os direitos e zero emprego”, as mulheres “devem ganhar menos porque podem engravidar”, além do ódio contra os negros e os LGBTs.

Essa política de extrema direita, que também defende a reforma trabalhista, a terceirização irrestrita, as privatizações e a militarização das escolas, cria uma base social reacionária, como surgiu em Roraima com a abominável xenofobia contra os venezuelanos. O arco da direita ainda se completa com golpistas como Geraldo Alckmin e sua vice, a latifundiária Ana Amélia, além de Marina Silva, que apoiou o golpismo do TSE. Todos querem acabar com qualquer regulamentação trabalhista, defensores das reformas de Temer e da Lava Jato.

Nós que lutamos contra o autoritarismo judiciário e defendemos o direito de Lula ser candidato e portanto do povo decidir em quem votar também deixamos claro que não apoiamos o voto no PT. E quando falamos isso muitos respondem, “mas e Bolsonaro”? “E Alckmin”? “Não seriam muito piores”? Sem dúvida são os candidatos diretos do golpe institucional, alguns mais selvagens que outros. Entretanto, reconhecer o “mal maior” não valida a lógica do mal menor porque foi essa mesma lógica que nos conduziu até aqui, ao golpe institucional.

Como chegamos ao golpe e ao avanço da direita?

Chegamos aqui graças a intermináveis ações parlamentares, empresariais e judiciais, graças a arbitrariedades e uma mãozinha secreta e escondida de parte do capital imperialista. Mas cumpre pensar: quem esteve no comando do Executivo nos últimos 13 anos?

Se é verdade que a aliança golpista entre a direita, empresários, mídia e judiciário estraçalhou direitos sociais e trabalhistas, não é menos verdadeiro que Lula, Dilma e o PT governaram lado a lado com a direita e os capitalistas antes do golpe de 2016, e agora seguem buscando um “pacto de reconciliação” com o capital financeiro e a direita golpista que Lula disse “perdoar”.

Se aliar ao agronegócio, a Temer, Feliciano, Sarney, Collor, Kassab, Maluf, Cunha, à bancada evangélica, etc, era parte de garantir “governabilidade” e um “mal menor” do que ter que fechar acordos com o PSDB; fazer uma parte da reforma da previdência era parte de conseguir se sustentar diante do que o mercado exigia; dar bilhões do BNDES a capitalistas como Odebrecht e JBS que viraram donos do país; oferecer-se para ocupar e reprimir os haitianos era parte de avançar no “cenário internacional” e uma longuíssima lista podia ser citada. Estes fatos apontam ao pilar do que foi a hegemonia lulista e como ela mesmo abriu caminho à direita. Ao mesmo tempo o PT, através das centrais sindicais que dirige como a CUT e a CTB, esta última dirigida pelo PCdoB, atuou sistematicamente para impedir que os trabalhadores entrassem em cena e derrubassem as reformas de Temer e o próprio golpista. Vale lembrar o clima no país em maio-junho de 2017 quando a CUT e demais centrais cancelaram a greve geral.

O lulismo assentou as bases para a direita e para o golpe

Além da atuação concreta na luta de classes dos últimos dois ou três anos, as raízes para o avanço da direita e do golpismo podemos traçar na própria hegemonia lulista. O enigma do imenso consenso e “paz social” do país rendeu livros e vivos debates anos atrás. Havia até um ex-ministro de Lula, André Singer, que se
arriscava em prever uma hegemonia de décadas. Para nós sempre foi um impressionante castelo erguido sobre uma base de areia, e cada passo foi afundando-o mais.

O lulismo era um grande consenso nacional que oferecia a todas classes e camadas sociais um “projeto de país” que tinha por base três pilares: conciliação, commodities e consumo. A crise internacional – com um atraso, cobrou seu preço – fazendo ruir o pilar econômico do boom das matérias-primas que se combinava a crédito barato e abundante no mercado internacional. As jornadas de junho de 2013 e onda de greves com elementos selvagens de setores precários e de serviços urbanos que antecederam e sucederam 2013, mostraram a ruína do PT como conciliador e sua função de freio à luta de classes. O PT começou a descarregar a crise econômica sobre as costas dos trabalhadores e do povo pobre mostrando que o pilar do consumo não tinha mais como se sustentar.

A burguesia demandava ataques maiores do que o PT podia realizar, e por mais que os realizasse, não era com a intensidade e rapidez demandadas por aqueles que abraçaram a “Ponte para o Futuro” e outros que hoje abraçam o racismo, machismo e autoritarismo de Bolsonaro como uma alternativa para aumentar a repressão e suas taxas de lucro.

Toda a hegemonia baseada em quanto o trabalhador iria consumir baseado em emprego precário e crédito, tinha como função subordinada um grande apreço pela “ordem”, pela “estabilidade” e um individualismo avançando a galope. O empreendorismo de Doria não veio com um porta-aviões ianque, nem o reacionarismo de Bolsonaro surgiu do nada, estava ali nas telas da TV todas noites e com mil e um aliados e ministros de Lula e Dilma.

Uma hegemonia também baseada no pagamento da ilegal, ilegítima e fraudulenta dívida pública. Os governos do PT foram os que mais pagaram esse roubo aos banqueiros internacionais: se somarmos o pagamento de juros e amortizações da dívida pública nos governos Lula e Dilma, chegaremos à inacreditável cifra de R$13 trilhões. Os gastos sociais do orçamento federal continuaram a ser reféns do enriquecimento de banqueiros estrangeiros. Antes de ser deposta, Dilma havia pago R$6 trilhões em juros da dívida aos especuladores financeiros, o que desmente a idéia fantasiosa de Singer de que “Dilma abriu guerra contra as finanças”. Outra herança da década de FHC nos 90 assumida pelo PT.

Cada aspecto hoje visível estava lá germinando sob as asas do lulismo. Eram o “mal menor”, o “preço a pagar”.

Mal menor, capitulação aos poucos e abrir mão de construir uma alternativa

O golpe de 2016 começa a ser lido por parte da intelectualidade petista devido à “radicalização” de Dilma ao tomar medidas contra os bancos privados e outros setores monopolistas do capital nacional e estrangeiro, ou porque “governaram para os pobres” (sic) – quando até mesmo Lula afirmou que os banqueiros nunca lucraram tanto quanto em seu governo. O programa pós-golpe é de radicalizar neste suposto caminho? Não. É de buscar mais conciliação, prometer alguma reforma da previdência, prometer respeitar novamente a Lei de Responsabilidade Fiscal, seguir o criminoso pagamento da dívida pública, etc.

As promessas de hoje não oferecem um élan de nenhum sonho reformista de ontem, oferecem a tentativa de retorno a um passado que já não tem bases materiais. Já não há sustentação econômica e social para a velha hegemonia lulista.

O que oferecem é "mal menor" e este é o caminho para entregar tudo – não de uma vez – mas aos poucos, e mesmo se a Globo, o judiciário forem derrotados nas urnas, um novo governo “mal menor” em uma outra situação econômica só teria a oferecer uma versão igual ou aumentada dos “ajustes” do segundo governo Dilma.

Gramsci em seu 16º Caderno do Cárcere afirma sobre o mal menor:

“Um mal menor é sempre menor que um subsequente possivelmente maior. Todo mal resulta menor em comparação com outro que se anuncia maior e assim até o infinito. A fórmula do mal menor, do menos pior, não é mais que a forma que assume o processo de adaptação a um movimento historicamente regressivo cujo desenvolvimento é guiado por uma força audaciosamente eficaz, enquanto que as forças antagônicas (ou melhor, os chefes das mesmas) estão decididas a capitular progressivamente, em pequenas etapas e não de uma só vez (o que teria um significado muito diferente pelo efeito psicológico condensado e poderia fazer surgir uma força competidora ativa e contrária à aquela que passivamente se adapta à “fatalidade” ou reforçaria [esta força] se esta já existisse).”

A atuação do PT é justamente esta descrita acima.

Uma capitulação aos poucos, leva dia a dia a incorporar o programa de adversários a sua direita, com o agravante de seguir fazendo isso não em qualquer democracia liberal burguesa, mas em um regime político degradado pelo golpismo, com o líder das pesquisas preso arbitrariamente, consuma aos poucos e fecha caminhos para surgir uma alternativa ao PT, reforçando o poder do que querem os apoiadores de Moro, de Bolsonaro e Alckmin.

Com toda a estrutura do Estado (empresários e seus parlamentares, juízes, a mídia etc) nas mãos dos grandes grupos capitalistas, enquanto os trabalhadores seguirem dando seu apoio político ao "mal menor", ou seja, a governos como o do PT que entram nesse Estado dos ricos, incorporam todos os métodos corruptos de governar - incluindo as alianças com golpistas e aplicando ajustes que os banqueiros pressionam, descarregando a crise nas costas dos trabalhadores, vamos só abrindo espaço para o fortalecimento da direita, pois foi assim que chegamos até aqui.

Mesmo que Bolsonaro não vença, seu programa, seu reacionarismo a serviço de aumentar a exploração dos trabalhadores no país já gera uma base social mais à direita. Mesmo se o privatismo tucano não triunfar, assenta-se maior base para que os que governarem sejam “obrigados” a ceder “alguma privatização” como “mal menor” do que ceder várias de uma vez. Mesmo que Moro, Dallagnol e o STF sejam calados pelas urnas, seu poder arbitrário está longe de ser derrotado. Vive nos 40% de presos sem julgamento no país e em ter conseguido – até o presente momento – roubar o miserável direito de votar livremente para presidente. Por isso, para nós, a luta vai muito além das eleições.

Os avanços obtidos pelos capitalistas, pelos golpistas e pela direita não serão desfeitos sem combates. E o “mal menor” leva a tudo menos o combate e à construção de uma força que se prepare para isso.

Para combater a direita, o golpismo e os capitalistas é preciso do oposto do “mal menor”. É preciso criar uma força de esquerda, com peso nos locais de trabalho e estudo, que arranque os sindicatos da conciliação e traição, que se apoie na força das mulheres, dos negros, da juventude e da classe trabalhadora. É preciso dedicar energia para dar corpo e mente a um partido revolucionário que contribua à classe trabalhadora a tirar estas lições e esteja preparada e com força nos locais de trabalho e estudo para ser uma “força competidora ativa e contrária” à conciliação petista. Em meio a eleições manipuladas é tarefa desta força que busca superar o PT pela esquerda defendendo o direito de Lula ser candidato e portanto, o direito do povo decidir em quem votar.

O proletariado brasileiro, segundo maior do mundo ocidental, junto às grandes massas populares urbanas e rurais pode muito mais que o “mal menor”, pode muito mais do que o que for aceitável para Carmen Lucia, para a Fiesp e Wall Street. Pode sonhar – e atuar sistemática e energicamente – para abrir em nossas terras um novo caminho à humanidade avançando na ruptura com o capitalismo. Sem isso nem o golpismo e a direita derrotaremos.

 
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