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DITADURA MILITAR
O escandaloso envolvimento da Volkswagem do Brasil com a ditadura militar
Barbara Tavares

Imprensa alemã obtém acesso exclusivo à investigação sobre o envolvimento da montadora com a ditadura militar brasileira. Cooperação envolvia espionagem aos trabalhadores e perseguição a suas ideias políticas, e os dados acabavam em "listas negras" nas mãos do Dops, além de galpões cedidos para práticas de tortura a prisioneiros políticos e frotas de carros doadas à repressão.

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O jornal Süddeutsche Zeitung e as emissoras estatais NDR e SWR realizaram uma força-tarefa investigativa em conjunto e obtiveram acesso exclusivo a uma investigação externa, ordenada pela própria Volkswagen, empresa alemã, sobre o papel que cumpriu sua filial de base aqui no Brasil durante o período de ditadura militar no país.

A empresa tem sua montadora no Brasil desde o ano 1953 e emprega aproximadamente 20 mil trabalhadores.

Segundo o que foi veiculado no domingo (23), aqui no Brasil a multinacional Volkswagem colaborou de forma ativa e presente, colaborando e financiando atrocidades cometidas pelos militares na perseguição de opositores do regime e aos trabalhadores organizados.

Ao que tudo indica, através das análises de documentos corporativos da filial brasileira encontrados na sede alemã, papéis classificados como secretos pelo Departamento de Ordem Política e Social (Dops) e relatórios confidenciais do Ministério das Relações Exteriores da Alemanha, a sede da montadora, localizada em Wolfsburg, tomou conhecimento do que acontecia por aqui por volta do ano de 1979, quando funcionários brasileiros viajaram à Alemanha para confrontar o então presidente da companhia, Toni Schmücker. Os repórteres alemães também tiveram acesso às atas de investigação do Ministério Público de São Paulo.

"Operários eram presos na planta da fábrica e, em seguida, torturados: a colaboração da Volkswagen com a ditadura militar brasileira foi, aparentemente, mais ativa do que antes presumido", escreveu Süddeutsche Zeitung.

Em entrevistas com antigos trabalhadores da Volkswagen do Brasil, muitos confirmaram que foram detidos na fábrica em 1972. Eles faziam parte de grupos militantes de oposição ao regime, alguns militavam e distribuíram panfletos do Partido Comunista e/ou eram sindicalistas, atuavam em seu local de trabalho organizando assembleias e reuniões sindicais.

Os veículos de comunicação alemães afirmam que houve espionagem aos trabalhadores e perseguição a suas ideias políticas, e os dados acabavam em "listas negras" nas mãos do Dops. "O departamento de segurança, dirigido por ex-militares, se tornou cada vez mais um serviço secreto. Espionou funcionários e documentou em inúmeros relatórios, que terminaram nos arquivos da polícia política." descreve a NDR.

As vítimas relembram que foram torturadas durante meses, por perseguição política realizada no seu local de trabalho:

"A Volks roubou dois anos da minha vida", disse Lúcio Bellentani, ex-operário da montadora, hoje com 72 anos, que declara ter sofrido oito meses de tortura e ter passado um ano e quatro meses na prisão. "Indiretamente a Volkswagen foi responsável por numerosos casos de tortura e perseguição. A Volkswagen deve ter a dignidade de reconhecer sua responsabilidade por esses atos.", desabafa.

"Volkswagen não foi a única empresa envolvida, mas teve um papel de inteligência em São Paulo e ainda coordenou outras empresas. Por coincidência, os documentos que temos contra ela são devastadores, no sentido de que permitiu um estado policial dentro da empresa ou mesmo detenções desde os próprios postos de trabalho", afirmou Sebastião Neto, coordenador do Fórum dos Trabalhadores e Trabalhadoras por Verdade, Justiça e Reparação em declarações à agência AFP.

Espionagem e colaboração com Dops

Em 2016, a própria Volkswagen nomeou o historiador Christopher Kopper para uma investigação sobre seu passado, e ficou confirmada a existência de "uma colaboração regular" entre o departamento de segurança da filial brasileira e o órgão policial do regime militar.

"O departamento de segurança atuou como um braço da polícia política dentro da fábrica da Volkswagen", antecipou Kooper, pesquisador da Universidade de Bielefeld, à imprensa alemã. Segundo ele, numa linha bastante generosa, a montadora "permitiu as detenções" e ao compartilhar informações com a polícia, há chances de que "contribuísse para elas". Ele, diante de tudo o que investigou, sugeriu que a montadora alemã peça desculpas aos ex-funcionários afetados pela conduta.

Sabemos que um simples pedido de desculpa não basta diante das famílias destruídas pelas perseguições políticas realizadas a milhares de trabalhadores e trabalhadoras durante o período da ditadura militar no Brasil. Devemos exigir a responsabilização, julgamento em juri-popular e punição de todas as empresas e patrões cúmplices e colaboradores dos crimes cometidos pela ditadura civil-militar.

Sobre a veiculação na mídia sobre o que acontecia na filial da Volkswagen em São Bernardo do Campo, a sede da montadora se negou a comentar o conteúdo das alegações e reiterou ter encarregado o historiador Kooper de investigar e apresentar um parecer sobre a questão. Kooper apresentará suas conclusões até o final do ano. Os trabalhadores e as família devastadas já tomaram suas conclusões há muitos anos.

Galpões cedidos aos militares

Há quase dois anos foi aberta em São Paulo uma investigação sobre a Volkswagen do Brasil para verificar e mapear a responsabilidade da empresa na violação dos direitos humanos durante a ditadura militar.

Conforme sabemos, inúmeras empresas e patronais possuíram relações profundas, econômicas e ideológicas, com a ditadura militar, como a Odebrecht. Ficou estabelecido pela própria Comissão Nacional da Verdade (CNV), que examinou as violações dos direitos humanos cometidas pela ditadura militar, o envolvimento de muitas empresas privadas, nacionais e estrangeiras, que deram apoio tanto financeiro como operacional ao regime militar.

No caso da Volkswagen, a CNV constatou que alguns galpões que a empresa tinha numa fábrica de São Bernardo do Campo foram cedidos aos militares, que os usaram como centros de detenção e tortura. Além disso, foram encontradas provas que a multinacional alemã doou ao regime militar cerca de 200 veículos utilizados pelos serviços de repressão.

Esse modo de operar, de cumplicidade entre a patronal e os militares foi sistemático durante a ditadura, buscando atacar a resistência que crescia nas fábricas frente ao ajuste e as distintas medidas anti operárias. Exigimos punição aos torturadores, total revelação de seus nomes, assim como de todos os empresários que participaram colaborando e financiando a ditadura civil-militar no Brasil, que matou, aprisionou e torturou cruelmente milhares de jovens, mulheres e homens, trabalhadoras e trabalhadores que faziam resistência ao regime marcado pela violência, o cerceamento das liberdades democráticas, a autocracia e a repressão institucionalizada.

 
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