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RESPOSTA
Reitoria da USP: cinismo e demagogia frente a aprovação das cotas raciais
Flávia Toledo
São Paulo
William Garcia

Na edição da Folha de São Paulo deste sábado, 8 de julho, a seção Tendências e Debates foi dedicada à aprovação das cotas étnico-raciais pela Universidade de São Paulo. A pergunta era “A USP está correta em adotar cotas sociais e raciais?”. O reitor da USP, Marco Antonio Zago, defendeu o “Sim” em seu texto, e o professor Sérgio Almeida “Não”.

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Imagem: Adesivo de campanha da Secretaria de Negras e Negros e Combate ao Racismo do Sindicato dos Trabalhadores da USP

Na reunião do dia 4 de julho, o Conselho Universitário da USP aprovou uma medida histórica, a reserva de vagas para alunos de escola pública de forma escalonada sendo 37% em 2018, 40% em 2019, 45% em 2020 e 50% em 2021, e dentro desse percentual 37,2% para pretos, pardos e indígenas.

É absolutamente escandaloso o nível de cinismo e demagogia que o reitor Zago demonstra em seu artigo. O reitor distorce completamente a realidade, tentando transmitir a impressão que a própria reitoria da USP foi favorável à implementação dessa medida. Em seu artigo, afirma que “A decisão sem precedentes revela a convergência de opinião ao redor de duas premissas. A primeira é a necessidade premente de aumentar a inclusão social, pelos seus efeitos práticos e pelo elevado simbolismo.”

A “convergência de opinião” é a mais absurda mentira do reitor. A reitoria da USP não apenas apresentou uma proposta que não continha qualquer critério de inclusão racial, como se recusou a ouvir e a reconhecer a legitimidade dessa luta levada à frente há décadas pelo movimento negro, reivindicada por estudantes, funcionários e setores de professores. Durante a sessão do Conselho Universitário, a reitoria foi pega de surpresa com o grau de apoio que a proposta de cotas tinha entre os membros do CO – tendo inclusive parado a sessão para reunir seus aliados pois havia sido instalada uma crise.

Não somente não reconheceu a legitimidade dessa luta como está processando alunos e funcionários por lutarem por cotas. Complementar aos processos desatados contra funcionários e alunos que lutam por cotas, a reitoria sempre proferiu discurso meritocrático, excludente e elitista em relação ao ingresso na USP. A reitoria da USP, inclusive na figura de Zago, se recusou a adotar cotas étnico-raciais, mesmo sendo estas lei federal desde 2012. Assim, a USP foi uma das últimas universidades a adotar cotas no país e a última entre universidades estaduais, quando já não era mais possível negar o caráter racista de seu sistema de ingresso.

É tão oportunista o cinismo e a demagogia da reitoria da USP ao tentar posar como paladino da cotas raciais ou de qualquer modelo de inclusão social que a reitoria é obrigada a falsear os dados em seu artigo ao afirmar que 37% dos estudantes da USP são de escola pública e que dentro desse percentual 19% seriam pretos, pardos e indígenas. Essa mentira visa esconder o fato de que hoje na USP, do total de estudantes, apenas 9% são pretos, pardos ou indígenas. Além desse número estarrecedor, dos cerca de 6 mil professores da USP, apenas 120 são autodeclarados pretos, pardos ou indígenas. Isso demonstra o elitismo absurdo existente na universidade que, durante toda sua existência, reivindicou o vestibular como um dos mecanismos para manter seu elitismo. Essa manobra do reitor é uma tentativa de esconder uma das expressões racistas dessa instituição, que durante anos perpetuou o argumento de que cotas prejudicariam a excelência da universidade – argumento este que faz parte do artigo do rol de excrescência escrito pelo professor Sérgio Almeida.

A reitoria não consegue esconder seu racismo. Mesmo com considerável esforço contido em seu artigo, Zago afirma que os estudantes pretos, pardos e indígenas não afetaram a qualidade de ensino. Isso é compreensível para qualquer pessoa em sã consciência que não sucumba ao argumento racista de que os negros e pobres teriam capacidade cognitiva inferior ao dos brancos. Qualquer pessoa que não aceite esse argumento racista poderia facilmente entender aquilo que durante anos o movimento negro, os estudantes, funcionários e professores vem dizendo: não há nenhum motivo, a não ser o puro racismo, para defender que a presença de pretos, pardos e indígenas feriria a qualidade de ensino e pesquisa. Essa afirmação de Zago deixa transparecer essa desconfiança e se transforma em uma auto-denúncia.
Nesses dois artigos há uma espécie de divisão de tarefas, onde Zago busca posar de progressista e trata de se diferenciar desastradamente de posições do tipo das do professor (?) Sérgio Almeida, que durante tanto tempo foram predominantes nas esferas de direção da USP.

É lamentável que tenha sido o reitor a escrever na Folha de São Paulo a favor das cotas e não o movimento negro, os estudantes e funcionários processados por lutarem por cotas. Os dois artigos da FSP são as duas caras de uma mesma moeda, do mesmo elitismo e do mesmo racismo que a USP ainda preserva. A reitoria da USP está buscando diversas formas de se relocalizar frente à vitória da luta por cotas étnico-raciais, adotando desesperadamente um discurso favorável às cotas. Essa postura revela o receio do movimento negro, dos estudantes, funcionários e professores frente à continuidade da intransigência às cotas uma vez que estas foram aprovadas. Tendo perdido o controle do navio na sessão do CO, Zago busca de todas as maneiras agarrar o timão.

Agora, fortalecidos por esta vitória, é fundamental aprofundar a luta contra a punição daqueles que lutaram por cotas, pelo fim do vestibular, para que toda a juventude negra e pobre tenha acesso ao ensino superior, e pela permanência, para que possam terminar seus estudos.

 
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