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100 ANOS DA REVOLUÇÃO RUSSA
Lenin chega para virar o curso da história
Jazmín Jimenez
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"O trem se colocou em movimento até Gottmadingen, a estação fronteiriça alemã. Eram três e dez. E o mundo mudou brutalmente sua programação. Milhões de obuses destruidores haviam sido lançados durante a guerra mundial. Os engenheiros continuavam inventando as armas mais pesadas, as mais poderosas e as mais devastadoras. Mas nenhum obus foi mais devastador e mais decisivo que esse trem, com seu carregamento de revolucionários, os mais perigosos e mais decididos do século, este trem, que da fronteira suíça se lançava então através de toda a Alemanha até Petrogrado e se preparava para fazer explodir a ordem dos tempos”. (Stefan Zweig, Sternstunden der Menschheit, citado em Jean-Jacques Marie, Lenin)

A Revolução de Fevereiro de 1917 encontrou Lenin na Suíça. Suas tentativas de retornar à Rússia enfrentaram a oposição do governo britânico. O único plano realizável foi voltar através da Alemanha, que estava em guerra com a Rússia. Finalmente, em 16 de abril conseguiu chegar a Petrogrado.

Milhares de operários e soldados foram celebrar sua chegada. Também os conciliadores se apressaram para recebê-lo, com a intenção de “entender” sua política. A resposta de Lenin foi taxativa. Na própria estação pronunciou um discurso em que disse: “Queridos camaradas, soldados, marinheiros e operários: me sinto feliz ao saudar em vocês a revolução russa triunfante, e ao saudá-los como a vanguarda do exército proletário internacional... Não está longe o dia em que, respondendo ao chamado de nosso camarada Karl Liebknecht, os povos virarão as armas contra seus exploradores capitalistas... A revolução russa, feita por vocês, iniciou uma nova era. Viva a revolução socialista mundial!”

Para Lenin, a queda do tzarismo era apenas a primeira etapa na revolução. A revolução burguesa não podia satisfazer as demandas das massas, a guerra continuava, a terra permanecia nas mãos dos latifundiários e a crise econômica seguia as privando do pão. A tarefa do proletariado era se armar, fortalecer o poder dos sovietes, despertar os distritos do país e se preparar para a conquista do poder para reconstruir a sociedade sobre bases socialistas.

Contudo, o partido dirigido por Kamenev e Stalin vinha tendo uma política oportunista de apoio crítico ao Governo Provisório, influenciados pelo processo político posterior à revolução de fevereiro, no qual a revolução havia se detido diante das portas do poder estatal. Por isso Lenin teve que se colocar à cabeça de uma verdadeira luta de tendências dentro do partido e para tal se apoiou na base operária do partido.

No dia seguinte de sua chegada, Lenin expôs diante do partido um breve texto com seu ponto de vista. Esse escrito, que passou para a história como as “Teses de Abril”, se converteria em um dos documentos mais importantes da revolução. Lenin vinha para reorientar radicalmente a estratégia e a tática bolchevique. Nesse texto colocava o essencial das novas tarefas na revolução. Caracteriza a guerra imperialista e assinala que atitude devem ter os socialistas, explica a tática de enfrentamento com o Governo Provisório e a necessidade de uma luta paciente para conquista a maioria da classe operária e os sovietes para uma política anticapitalista. Desenvolve como os sovietes, liberados da tutela da burguesia, eram não apenas organizações para a auto-organização operária, mas também “a única forma possível de governo revolucionário” e a base para construir um novo Estado.

Uma fórmula que ficava velha

Os bolcheviques historicamente haviam reivindicado uma fórmula de poder governamental que chamavam de ditadura democrática de operários e camponeses, que deveria derrotar o tzarismo quebrando a resistência da burguesia e levar adiante os objetivos “democráticos” próprios de uma revolução burguesa, como a repartição de terras para os camponeses, a jornada de 8 horas para os operários e a convocação de uma Assembleia Constituinte que reorganizasse a nação, eliminando a herança do tzarismo.

Mas os fatos se sucederam de forma mais complexa do que o esperado e a revolução de fevereiros não resolveu essas tarefas democráticas. E isso não aconteceu justamente porque a burguesia havia ficado no poder. Por isso a fórmula de ditadura democrática de operários e camponeses havia ficado velha, já não tinha sentido sob as novas circunstâncias.

Lenin pergunta: “Porque não se tomou o poder?”. Os velhos bolcheviques repetiam: “Porque não foi superada a primeira etapa, que é democrática e burguesa”. Lenin respondia: “Isso é absurdo. A única razão é que o proletariado não é consciente o bastante e nem está suficientemente organizado. É preciso reconhecer isso. A força material reside nas mãos do proletariado; mas a burguesia se demonstrou mais consciente e melhor preparada. É um fato monstruoso, mas é necessário reconhecê-lo franca e abertamente e dizer ao povo que se não tomou o poder, foi por sua desorganização e a falta de uma consciência clara.” A vacilação do partido até esse momento contribuía para impedir que a subjetividade das massas conquistasse a “consciência clara” do que estava em jogo.

Trotski, na “História da Revolução Russa”, conta que as teses de Lenin foram publicadas exclusivamente como obra sua. Os organismos centrais do partido as acolheram com hostilidade. Ninguém, nenhuma organização, nenhum grupo, nenhuma pessoa colocou sua assinatura nesse documento. Desde Genebra, Lenin advertia em suas cartas que estava disposto a romper com todo aquele que fizesse a menor concessão à guerra e ao chauvinismo ou se inclinasse a pactuar com a burguesia.

Os operários do partido de Lenin

Como já vimos em textos anteriores, na revolução de fevereiro os operários bolcheviques desempenharam um papel decisivo. Estes consideravam natural que a classe operária que havia obtido o triunfo sobre o tzarismo tomasse o poder. No entanto, como conta Trotski, o que faltava aos operários revolucionários para defender suas posições eram recursos teóricos, mas estavam dispostos a atender ao primeiro chamado claro que lhes fosse feito. Será neles que Lenin encontrará um ponto de apoio contra os velhos bolcheviques. Lenin vivia mentalmente os acontecimentos ao lado desses operários, extraindo de tudo as conclusões necessárias, mas de um modo mais amplo e audaz. “Para lutar contra a indecisão dos altos escalões e da oficialidade do partido, Lenin se apoiava com confiança nos suboficiais, que eram os que melhor expressavam o estado de espírito do operário das fileiras bolcheviques.”

O papel da personalidade

Trotski explica que no começo da revolução só Lenin tinha uma concepção revolucionária clara, elaborada até nos mais mínimos detalhes. Os quadros russos do partido estavam dispersos e bastante desorientados. Contudo, o partido tinha autoridade sobre os operários avançados e Lenin tinha uma grande autoridade sobre os quadros. Isso permitiu que o partido alinhasse rapidamente sua política até que essa correspondesse à concepção de Lenin. Isso o leva a encontrar um apoio firme entre os trabalhadores avançados e em poucos meses foram capazes de convencer a maioria dos trabalhadores da precisão de suas consignas. Essa maioria, organizada nos sovietes, foi a que, por sua vez, foi capaz de atrair as massas de operários e camponeses.

É importante compreender que Lenin não havia caído do céu, ele encarnava a tradição revolucionária da classe operária russa. O que permitiu que suas consignas encontrassem o caminho das massas foi a existência de quadros do partido, e que esses quadros tivesse confiança em sua direção, uma confiança fundada na experiência do passado. Por isso o papel e a responsabilidade da direção em uma época revolucionária são de uma importância colossal.

Lenin havia lutado ao lado dos operários avançados durante todo o quarto de século precedente. Não era um fator que se colocava à frente do partido a partir de fora, mas era sua mais perfeita expressão. Ao formar o partido, formava nele sua pessoa. Trotski explica que a chegada de Lenin a Petrogrado, em 16 de abril de 1917, fez com que o partido bolchevique girasse a tempo e permitiu que ele levasse a revolução à vitória. Lenin constituía um dos elementos vivos do processo histórico. Encarnava a experiência e a perspicácia da parte mais ativa do proletariado. Sua aparição no momento preciso no terreno da revolução foi necessária para mobilizar a vanguarda e lhe oferecer a possibilidade de conquistar a classe operária e as massas camponesas. Nos momentos cruciais dos giros históricos, a direção política pode se converter em um fator tão decisivo como o de um comandante em chefe nos momentos críticos da guerra.

 
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