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Um discurso irrigado de nacionalismo e xenofobia na posse de Trump
André Barbieri
São Paulo | @AcierAndy
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Donald Trump se tornou oficialmente o 45º presidente dos Estados Unidos, em meio a protestos em Washington e em outros 57 países. Na presença de alguns ex-presidentes, como Bill Clinton e o próprio Barack Obama, Hillary Clinton e Bernie Sanders, além de muitas figuras religiosas, Trump reafirmou as linhas gerais do discurso de populista de direita, fortalecendo o tom nacionalista orientado pela política do “isolacionismo belicoso”. Toda a retórica de Trump transpirava o sentimento de nova era e de “ruptura institucional” com as administrações anteriores.

Nós reunidos aqui hoje lançamos um novo decreto que deve ser ouvido em cada cidade, em cada capital estrangeira, por cada governo,” Trump martelou, “Daqui em diante, uma nova visão de mundo comandará nossa pátria, daqui em diante o lema será ‘os Estados Unidos em primeiro lugar’!”.

Trump estabeleceu este quadro de ruptura institucional e discursiva com os governos anteriores frisando os elementos da “antipolítica” que mais agradaram seu eleitorado, buscando dar respostas à crise de representatividade. “Vamos tirar o poder de Washington e devolvê-lo ao povo”, disse o novo presidente. Remarcou a idéia de que, até então, todos os políticos haviam se enriquecido às custas do povo, que perdia empregos e riquezas; agora, este povo se converteu no novo “governante” do país.

Durante muito tempo, um pequeno grupo em Washington administrou as coisas e as pessoas sofreram. Os empregos se foram e as fábricas fecharam. As vitórias e triunfos de Washington não eram as vitórias do povo. Os esquecidos de nosso país não serão mais esquecidos. Essa carnificina americana termina aqui”, disse Trump.

À antipolítica, Trump acrescentou os ingredientes explosivos do protecionismo e do ódio aos imigrantes. Deu muita importância em dialogar com os setores da classe trabalhadora branca que, enfurecida com as elites tradicionais, votou massivamente em Trump no antigo cinturão industrial (Rust Belt) em decadência no meio-norte dos Estados Unidos.

Ainda que não tenha mencionado a China, o México ou a União Européia, Trump desenhou um quadro em que os Estados Unidos foram prejudicados e roubados por auxiliar as outras nações: golpeou a OTAN e a União Européia, principal bloco aliado de Obama, ao dizer que enquanto os Estados Unidos protegiam fronteiras de outras nações, deixavam de proteger a sua. Em entrevista recente, Trump havia dito que a existência da União Européia “não importa a ninguém, já que serve de veículo para a Alemanha”.

Sem mencionar as colônias e semicolônias donde os monopólios americanos extraem seus superlucros a sangue e fogo, disse que enquanto os Estados Unidos faziam outros países ricos em infraestrutura, empobrecia o seu próprio, deixando suas fábricas fecharem.

Concluiu com duas regras simples: “Buy american and hire american” (compre produtos americanos e empregue americanos), regras que usou para ameaçar de aumento tarifário automotrizes como a Ford e a Toyota, e mais recentemente a alemã BMW, que produzem no México para exportar aos Estados Unidos.

A única vez que mencionou os muçulmanos, que compõem mais de 1% da população, foi ao dizer que “esmagará o terrorismo islâmico”, expelindo racismo e xenofobia por todos os poros; os imigrantes mexicanos ficaram de fora do discurso, mas estiveram presentes em toda a última semana, em que Trump não se cansou de repetir que construirá imediatamente o muro na fronteira com o México.

O racismo trumpista não esteve ausente. Em tempos de uma série de assassinatos de jovens negros por parte da polícia, Trump comentou depois da posse que: “o clima anti-polícia no país é altamente perigoso”. Nos últimos dias, Trump figurou ao lado de policiais e delegados dizendo que “comigo no governo, ninguém mexerá com a polícia”. Uma clara ameaça ao movimento de resistência Black Lives Matter [As Vidas Negras Importam], considerado uma “desgraça” por Trump, e à juventude negra que saiu às ruas contra a violência racista do estado.

Até mesmo o chamado de unidade feito pelo novo presidente, chamado que arde em chamas nos protestos ao redor do país, esteve embebido em patriotismo: “Não importa se somos negros, marrons ou brancos, todos sangremos o sangue de patriotas”.

Este populismo nacionalista e isolacionista de Trump irriga o país com as tradições implantadas por outro presidente, que Trump considera “como seu favorito”: Andrew Jackson, que presidiu o país entre 1829-1837 com semelhante discurso populista contra o sistema bancário das elites. Vale lembrar que Jackson era um senhor de escravos e um brutal assassino de indígenas, principalmente depois de seu próprio decreto “Ato de Remoção de Indígenas” de 1830, que obrigava indígenas a marcharem para o oeste e participar como escravos na tomada de terras mexicanas.

Podemos dizer que a retórica rupturista de Trump se dedica a estabelecer laços com esta tradição não apenas de Jackson, mas também de James Monroe, seu predecessor, dono da doutrina "América para os americanos". Traduzida como "A América em primeiro lugar" num contexto absolutamente distinto, em que os Estados Unidos querem o mundo para si em meio a sua decadência hegemônica.

Há que ver até quanto a relação de forças interna e externa permite Trump aplicar seu programa, e quanto assimilará do establishment Republicano, do qual precisa para fazer passar suas emendas na Câmara e no Senado. No reacionário gabinete montado por Trump, vários se posicionaram contra sua visão de aproximação com a Rússia, e aumento de tensões com a União Européia, o que torna contraditória uma atuação centralizada.

Trump representa a cara mais podre da decadência do imperialismo americano, que teve seu caminho pavimentado pelo imperialismo de Obama, os Clinton e o partido Democrata. Os protestos em Washington são inéditos depois da posse de um presidente, fruto da crise orgânica, de representatividade e da polarização social.

Para os povos do Cone Sul, que se viram vítimas de sangrentas ditaduras militares impostas pelos Estados Unidos, é de primeira importância levantar a bandeira pelo "Fora imperialismo de toda a América Latina". Uma esquerda à altura do combate contra Trump, na América Latina e nos Estados Unidos, deve buscar na luta da classe trabalhadora aliada aos negros, às mulheres e à juventude a política que desafie o imperialismo e o capitalismo ianque.

 
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