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GRÉCIA | Uma viagem internacionalista à agitada Grécia

Em meio a uma situação política extremamente interessante e rica no que concerne à lições para os trabalhadores e a juventude do mundo inteiro, estivemos na Grécia em uma viagem internacionalista, com o objetivo de conhecer a cerca da realidade, conversar com ativistas e a esquerda do país.

Alejandra RíosLondres | @ale_jericho

Josefina L. MartínezMadrid | @josefinamar14

sábado 15 de agosto de 2015 | 00:27

Fotografía: EFE

Uma crise evidente e um clima de profundo debate político

Recém chegado a Atenas, estivemos percorrendo suas ruas. Cada esquina da cidade oferece testemunhas da profunda crise que atravessa o país, com dezenas de locais fechados convivendo com grafites e cartazes que enchem as paredes desde a campanha pelo NÃO no referendo. As negociações com a Troika (da qual fazem parte o FMI, Banco Central europeu e União Europeia) ocupam as primeiras páginas dos jornais, mesmo que em pleno verão.

Apenas dois dias antes de nossa chegada, o governo de Tsipras condenava três ativistas por terem participado das manifestações do dia 15 de julho, as quais eram contra o acordo do governo heleno com a Troika.

Europa, um continente de muros

Como no resto do continente europeu, a questão dos imigrantes foi um tema muito discutido nas últimas semanas. Milhares de imigrantes chegam todos os dias nas costas da Europa, fugindo da guerra e da miséria de seus países, consequências da política levada adiante por esses mesmos países que, hoje, negam aos refugiados um direito tão básico como a documentação que lhes permita minimamente buscar uma forma de sobreviver nesta Europa em crise. Durante nossa estadia em Atenas, estivemos presentes no parque Areos, ocupado, em tal momento, por umas 400 pessoas, em sua maioria originadas da Síria e Afeganistão. Pudemos falar com vários ativistas e entrevistamos três militantes de uma rádio livre, que foram levar solidariedade e nos explicaram que os refugiados ainda não haviam recebido resposta alguma do governo de Tsipras em relação às suas demandas.

Como se pode ver nestes últimos dias, os refugiados seguem sofrendo não só com a indiferença, mas como também com a repressão por parte do governo. Na ilha de Kos, centenas de imigrantes lotaram e ocuparam um estádio de esportes para exigir documentos, na terça-feira passada, quando foram brutalmente reprimidos pela polícia, que atacou, inclusive, mulheres e crianças.

Uma experiência acelerada com o Syriza no poder

Tivemos a oportunidade de falar com numerosos ativistas sociais e sindicais, que nos contaram como viveram os últimos meses na Grécia, enquanto aconteciam as negociações do governo com a Troika e também durante a semana anterior ao referendo de 5 de julho, com a campanha pelo NÃO nos lugares de trabalho, nos bairros e nas ruas. Conversando com vários deles, nos comentaram que nos dias anteriores ao referendo se viveu uma extrema polarização social, um clima vertiginoso de discussão política. Todos expressavam a raiva, a incerteza e muita gana de contar o que se viveu no país nas últimas semanas. Todos concordavam com a necessidade de continuar a luta, e não descartam que em outubro, quando as novas medidas do terceiro memorando vão começar a se sentir com força, os trabalhadores voltem a sair em luta. Como lição do que aconteceu nos últimos meses, diziam, sem relutar, que para que as coisas mudem de verdade serão necessárias lutas muito fortes.

Também tivemos a oportunidade de entrevistar Nikos Tsibidas, uma referência da heróica luta dos trabalhadores de rádio e televisão pública ERT, que nos relatou a experiência de luta dos trabalhadores da rede estatal. Durante dois anos, os trabalhadores funcionaram como emissora pública, de auto-gestão, a "ERT Aberta", logo após o fechamento decretado pelo governo de direita de Samaras. Apesar de terem sido desalojados de seus estúdios pela polícia, continuaram transmitindo de outros lugares. Atualmente, suas conquistas se vêem ameaçadas pelo terceiro referendo. A chanceler alemã, Angêla Merkel, exige que o governo volte a privatizar aquilo que retrocedeu por pressão das massas.

Importantes debates seguem atravessando a esquerda grega

Durante nossa viagem, conversamos, em várias oportunidades, com os companheiros da organização OKDE-Spartakos, membro de coalizão anti-capitalista Antarsya, os quais nos convidaram à sua escola de verão com o povo de Kamena-Vourla, no centro da Grécia. Durante três dias, tivemos a oportunidade de discutir com vários companheiros, entre eles Yanis Felekis e Kostas Skordoulis, dirigentes de muita tradição. Nos contaram uma importante iniciativa, já que ambos são fundadores do Instituto de investigação política e social Pantelis Pouliopoulos. Tal instituto tem por objetivo trazer as ideias do marxismo revolucionário e do trotskismo às novas gerações, com um trabalho de publicações, pesquisas e conferências. Também dialogamos com militantes universitários e referências da coalizão estudantil nacional EAAK, que reagrupa as distintas organizações anti-capitalistas nas universidades.

Os companheiros convidaram Josefina Martínez, militante do Classe contra Classe no Estado espanhol, a intervir na fala de abertura do acampamento sobre a situação política na Espanha, o fenômeno Podemos e a intervenção dos revolucionários. No ato de encerramento, Laura Varlet também foi convidada a compartilhar a experiência da Frente de Esquerda e dos Trabalhadores (FIT) na Argentina, e em particular do PTS (Partido de Trabalhadores Socialista, que atua na Frente de Esquerda). No mesmo dia em que acontecia a interna da FIT na Argentina (PASO, eleições primárias abertas e simultâneas), na Grécia afirmávamos que nós, militantes revolucionários, não estamos condenados a abandonar o programa e a se adaptar aos "novos" fenômenos como Syriza e Podemos. Esta conversa serviu para enriquecer o debate no calor da experiência grega e demonstrar que só um trabalho paciente e no movimento operário, enfrentando os patrões e a burocracia sindical, e também na juventude, é que se pode dar passos firmes nessa grande tarefa, que é colocar de pé uma poderosa organização dos trabalhadores, das mulheres e da juventude exploradas que tenha como objetivo acabar com o poder dos capitalistas.

Aproveitamos esta viagem também para dialogar com algumas organizações da esquerda grega. Tivemos a oportunidade de discutir com dirigentes de NAR e SEK (dois componentes importantes de Antarsya), e de OKDE-Ergatiki Pali (OKDE-Luta Operária). Importantes debates atravessam a esquerda grega ao longo de vários meses de experiência com o Syriza no poder. Alguns colocam a necessidade de reagrupar todos que estão à esquerda do Primeiro Ministro, inclusive os setores da chamada Plataforma de esquerda que seguem dentro do Syriza enquanto o governo aplica os ajustes. Segundo eles, a base para esse reagrupamento é ao redor da ruptura com o euro. Entretanto, outros defendem que a chave é manter um programa de independência de classe e anti-capitalista para que sejam os capitalistas que peguem pela crise.

No interior do Syriza, se trocam acusações entre a maioria, liderada por Alexis Tsipras, e a Plataforma de esquerda, liderada por Lafazanis, sem que nenhuma saída progressista seja posta realmente no centro do debate.

Próximos ataques e as perspectivas para os trabalhadores e a juventude da Grécia

Em 4 de agosto, o governo de Tsipras e os representantes da Troika, acordaram as cláusulas do terceiro "resgate", o qual prevê uma soma de 85 milhões de euros em troca de uma longa lista de reformas e ataques que vai contra os trabalhadores e o povo pobre. O parlamento grego deverá adotar 35 "medidas prioritárias" nos próximos dias, deixando o resto das medidas para outubro. Tsipras deve assegurar-se do recebimento de uma primeira parte da "ajuda" antes do dia 20 de agosto, data em que o governo heleno deve reembolsar 3.500 milhões de euros ao Banco Central Europeu.

Como comentamos em um dos artigos que escrevemos em Atenas, o difícil problema que está por se resolver é se os trabalhadores da educação, de serviço, dos estaleiros navais, os desempregados junto de setores da juventude e o movimento estudantil, tiram lições dos acontecimentos dos últimos meses. Isto é fundamental para se colocar novamente de pé e em movimento uma força social que se proponha, desta vez, a levantar um programa e uma estratégia que permita enfrentar não só a Troika e os governos europeus, como também os planos do próprio governo do Syriza e dos capitalistas gregos.




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