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CRISE POLÍTICA EUA | Trump entre a provocação de Putin, o impeachment e a fissura republicana

Putin interveio na crise aberta nos Estados Unidos sobre a relação de Trump com o Kremlin, após a demissão do diretor do FBI e da divulgação de informação confidencial. Os pedidos de impeachment e as fissuras entre os republicanos.

quarta-feira 17 de maio de 2017 | Edição do dia

Em um novo capítulo do “Russiagate”, o presidente Vladímir Putin disse nessa quarta-feira que está disposto a entregar a transcrição do encontro que Donald Trump e o ministro russo de Relações Exteriores, Serguéi Lavrov, tiveram na semana passada.

Trata-se de uma verdadeira provocação em meio aos escândalos que acumula o presidente estadunidense pela investigação de suas relações com a Russia. Já faz uma semana que Trump atravessa turbulências, após a decisão de demitir o diretor do FBI, James Comey, que investigava a relação da campanha do presidente com o Kremlin antes e depois de assumir. As suspeitas de que, após a demissão, encontrava-se a necessidade de “entorpecer” esta investigação cresceram nessa terça-feira quando a imprensa divulgou que Trump havia pedido a Comey em fevereiro que não investigasse seu ex-assessor de segurança nacional, Michael Flynn, que renunciou a poucos dias por haver mentido sobre o conteúdo das conversas que manteve com o embaixador russo em Washington. A isso se somou o escândalo provocado pelos dados confidenciais que Trump havia fornecido ao chanceler russo Serguei Lavrov durante uma reunião na Casa Branca semana passada.

É sobre essa última acusação que Putin saiu em “defesa” de Trump, com um estilo muito particular: “Se a administração dos EUA considerar oportuno, estamos dispostos a oferecer ao Senado e a Câmara dos Estados Unidos a gravação da conversa [entre Trump e Lavrov]”.

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Para baixar o nível de tensão que havia gerado a ideia de que as conversas haviam sido gravadas pela Russia, o assessor de Putin, Yuri Ushakov, esclareceu mais tarde que o Kremlin não dispõe de uma gravação de áudio da conversa, apenas uma transcrição dela.

A mídia estadunidense haviam denunciado nessa semana que, nessa reunião, celebrada no Salão Oval da Casa Branca, Trump compartilhou com Lavrov informações confidenciais sobre os planos do Estado Islâmico (EI) de utilizar “ordenadores” portáteis com a finalidade de atentar contra aviões em voo.
Putin respondeu com um humor ácido à guerra de baixa intensidade que vive-se em Washington, e que já alentou alguns chamados tímidos de impeachment contra Trump: “Vemos que nos Estados Unidos está se desenvolvendo uma política esquizofrênica. Por outro lado, não posso explicar as acusações contra o presidente [Trump] de haver compartilhado segredos com Lavrov”. E acrescentou brincando. “De fato, hoje eu já falei com ele [Lavrov] e terei que repreende-lo, porque não compartilhou conosco esses segredos, nem comigo, nem com os serviços de inteligência. Muito ruim da sua parte”

Russia também deu a entender que a informação que Trump os facilitou não provinha dos serviços secretos estadunidenses, mas de Israel. Esta informação não apenas não foi confirmada por Israel, mas também deixa mal para o próprio Trump que na terça saiu publicamente, desde sua conta no Twitter, em defesa do seu “direito absoluto” de compartilhar com a Russia informações relativas ao terrorismo.

A Casa Branca tem insistido que Trump não fez nada “inapropriado” e nem pôs em risco a seguridade nacional, ainda que a essa altura as explicações da Casa Branca parecem enlamear cada vez mais o terreno em que se move o presidente.

Impeachment e as fissuras entre os republicanos.

A imprensa liberal está encabeçando a campanha pelo julgamento político de Trump. O New York Times dedicou um editorial chamando diretamente para que o fiscal geral adjunto vá até o final com a investigação sobre o que há por trás da demissão de James Comey como diretor do FBI. Essa ideia, que também vinha sendo agitada por militantes e ativistas desde o primeiro dia da “assunção” de Trump, agora parece começar a ser validada pelas ruas após a publicação de pesquisas que mostram que metade da população apoiaria um impeachment do presidente. No momento são apenas dados (e campanhas), porém dão uma ideia do dano que Trump causou a si mesmo com seus últimos movimentos políticos.

As comparações com o caso “Watergate” em 1973, do então presidente Richard Nixon, que demitiu o fiscal que estava o estava investigando, também aparecem como argumento para fortalecer a hipótese e um julgamento político contra Trump. Ainda que a demissão do fiscal geral que devia seu posto a Nixon não seja diretamente comparável com a atual demissão do diretor do FBI, o escândalo é aproveitado pelos democratas que timidamente começam a falar do tema, ainda que não o façam desde as suas principais figuras para não ficar como uma “minoria destituinte” (e impotente). É que no caso de Trump, os republicanos ao terem a maioria em ambas as câmaras do Congresso, parece difícil que um processo de julgamento político seja posto em marcha no momento, ainda que não se pode descartar pela velocidade em que vem crescendo a crise.

Ainda que sem chegar todavia ao extremo do impeachment, a situação política tem-se tornado suficientemente virulenta como para provocar algumas fissuras entre Trump e a bancada republicana do Congresso. A blindagem de que gozou agora começa a se perder, e não são poucos os republicanos que estão pensando no custo que deverão pagar em seus próprios estados em vista às eleições intercalares de 2018.

Com a intenção de não se mostrarem prostrados ante a crise aberta, a bancada republicana, que forma parte da comissão de justiça do Senado, deu um prazo para que o FBI, até o dia 24 de maio, entregue os “memorandos” relacionados com as reuniões entre Trump e Comey, dos quais supostamente Trump pede ao diretor do FBI não investigar Flynn. A comissão de inteligência do Senado, por outro lado, fez um chamado a Comey para que compareça em sessões públicas como também a portas fechadas, com a intenção de ampliar a investigação sobre a suposta intervenção da Russia nas eleições de 2016.

O próprio chefe da bancada republicana Paul Ryan, que veio sendo um aliado de ferro para o presidente no Capitólio, disse que este pedido era necessário para “contar com todos os feitos”.

O senador republicano John McCain foi o primeiro a comparar a situação de Trump com o escândalo de Watergate: “Creio que está atingindo o ponto em que tem o alcance e magnitude de Watergate, e de outros escândalos que temos visto”

Segundo a publicação do POLITICO, foi registrado uma mudança na posição de vários legisladores republicanos após saberem que Trump havia pressionado Comey sobre as investigações da relação com a Rússia: “Mais republicanos estão discutindo abertamente a possibilidade de nomear um comitê ou um fiscal especial para investigar a conexão de Trump e Rússia”. Trata-se de um giro impensável há somente uma semana e que deixa evidente as fissuras que começam a abrir no interior do partido no Congresso.

É possível que a demissão de Comey, que Trump quis fazer passar como mais um trâmite de sua gestão pragmática, seja o maior erro que tenha cometido em quatro meses de governo que estiveram marcados por uma crise permanente mostrando a debilidade da origem de sua presidência.




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