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STF | Três votos para a descriminalização e zero para a legalização

Após diversos adiamentos, o julgamento da descriminalização da maconha que teve início em agosto foi retomado hoje, com o voto favorável do ministro Luiz Edson Fachin, que havia pedido vista (mais tempo para análise) sobre o caso.

Raíssa CampachiCoordenadora do Centro Acadêmico de Ciências Humanas (CACH)

sexta-feira 11 de setembro de 2015 | 00:08

Como acontece em vários países da América Latina e inclusive alguns estados dos Estados Unidos, o Brasil pode ser o próximo país a descriminalizar o plantio para uso pessoal da maconha, bem como o porte da droga. Três dos onze passos necessários para isso já foram dados: três ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) votaram pela descriminalização do porte de maconha para consumo próprio; porém, a aprovação desta descriminalização, cheia de lacunas em aberto, não significa a imediata legalização do porte de drogas. Para tal, será necessária uma regulamentação, em relação à quantidade, e isso pode ser feito tanto pelo STF quanto pelo congresso; muitas lacunas ainda precisam ser preenchidas e tal ação questiona a constitucionalidade da proibição.

O tema foi retomado nesta quinta-feira, 10, pela Corte, mas foi suspenso por um pedido de vista do ministro Teori Zavascki.

Ainda que com algumas divergências entre si, os ministros Gilmar Mendes (que, na semana passada, havia dado seu parecer favorável na votação), Luiz Edson Fachin e Luís Roberto Barroso, os quais votaram à favor no dia de hoje, disseram entender que o porte de maconha para consumo próprio deve ser descriminalizado.

Gilmar, que é relator do caso, colocou que o porte para consumo deveria ser liberado para qualquer droga, enquanto que Fachin foi enfático em dizer que a descriminalização deveria ser feita "exclusivamente" para o porte de maconha. Enfatizou também que devem ser punidos criminalmente aqueles que comercializarem e produzirem maconha; Barroso afirmou que não se manifestaria sobre a criminalização dos demais tipos de entorpecentes, mas, assim como Gilmar, diz que a produção da droga para consumo próprio não deveria ser considerada crime. Para isso, Barroso sugeriu que seja adotado no Brasil o mesmo critério do Uruguai: o de não ser considerado crime o cultivo de até seis plantas fêmeas de maconha.

Os ministros Fachin e Barroso discutiram sobre a criação de parâmetros que possam diferenciar um usuário de um traficante. "Enquanto não houver pronunciamento do Poder Legislativo sobre tais parâmetros, é mandatório reconhecer a necessidade do preenchimento dessa lacuna", disse Fachin. Contudo, Barroso propôs que seja considerado usuário aquele que portar até 25 gramas de maconha, mesmo critério adotado por Portugal. Já para Fachin, os parâmetros devem ser estabelecidos pelo Poder Executivo até que o Congresso aprove lei sobre o assunto.

Durante o julgamento, os ministros apresentaram estudos que mostram que a descriminalização de drogas não refletiu, em outros países, em um aumento do consumo. Além disso, foi debatido o impacto da discussão sob a ótica da saúde pública. Fachin colocou que "todo cidadão deve ter direito à saúde universal e que o dependente é vitima e não criminoso germinal".

Segundo Barroso, a descriminalização do porte para consumo próprio "deve ser um passo inicial para testarmos se essa não é uma política pública melhor do que essa guerra que temos lutado". Por diversas vezes o ministro disse que um dos principais problemas enfrentados pelo País é o tráfico de drogas.

Guerra às drogas, usuário ou traficante e palavra final

Em julgamento realizado em agosto, Gilmar Mendes fundamentou seu posicionamento dizendo que a criminalização do consumo próprio fere a vida privada. "A criminalização da posse para consumo pessoal afeta o direito ao livre desenvolvimento de personalidade pra diversas manifestações", afirmou. Segundo o ministro, a medida "parece ofender de forma desproporcional a vida privada e a autodeterminação".

O ministro considerou que o artigo 28 da lei 11.343, de 2006, que trata sobre drogas, é constitucional. O dispositivo define como crime o fato de adquirir, guardar ou portar drogas para consumo pessoal. Contudo, Gilmar votou para que uma pessoa que for pega com entorpecentes seja levada a um juiz. Ele criticou a forma como isso é feito hoje, em que cabe a um delegado de polícia definir se o portador de droga é traficante ou usuário. "A palavra e a avaliação dos policiais merece crédito, mas há necessidade de um juiz", disse, acrescentando que um magistrado tem mais "neutralidade" para cuidar do caso.

Para Mendes, o que deve ser afastado é o tratamento "criminal" ao caso. Com isso, ficam mantidas medidas administrativas, como a possibilidade do recebimento de advertências sobre os efeitos das drogas ou de o portador ter de comparecer a programas ou cursos educativos.

A proibição e criminalização começaram nos anos 70, no governo Regan, nos Estados Unidos, e foi internacionalizada com acordo e tratados, se espalhando por vários países, principalmente na América Latina com um fundamento muito comum em que a política é tratar a questão das drogas como questão policial e de repressão.

Uma política aplicada com tamanha rigidez e com resultados numéricos tão gritantes, pois, segundo cálculo feito pela Folha, baseado nos relatórios do Depen (Departamento Penitenciário Nacional), um a cada quatro detidos no Brasil se dá por "tráfico de drogas". O número de presos no Brasil é de 715.655; passando ao terceiro país com maior número de presidiários do mundo, ultrapassando a Rússia e ficando atrás apenas dos Estados Unidos e da China, enquanto existe superlotação, os detidos estão em péssimas condições e cerca de 40% sequer foi julgado.

Se o portador será encaminhado para um juiz ou se a um delegado não é a questão que resolverá a grande questão desta guerra: até quando a arbitrariedade significará a chacina ao povo negro, pobre e de periferia?

A partir de informações da Agência Estado




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