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PARALISAÇÃO DE ENTREGADORES | Trabalhadores plataformizados do mundo, uni-vos

Esta reflexão é uma contribuição do pesquisador pós-doc Marco Antônio Gonsales, da Sociologia da Unicamp, ao Observatório da Precarização do Trabalho e da Reestruturação Produtiva atual.

sábado 4 de julho de 2020 | Edição do dia

De tempos em tempos os trabalhadores saem vitoriosos. Mas é um triunfo efêmero. O verdadeiro resultado de suas lutas não é o sucesso imediato, mas a união crescente. Ela é incentivada pela expansão dos meios de comunicação, produzidos pela grande indústria, que colocam os trabalhadores das mais diversas localidades em contato (MARX, 2010, p. 48).

Na última quarta-feira, entregadores e entregadoras por aplicativos promoveram a primeira greve nacional do setor. Além de ter sido o primeiro movimento paredista nacional, fora também a primeira participação da categoria em uma manifestação de dimensão internacional. Os repartidores e repartidoras da Argentina, México, Peru, Equador, Guatemala, Costa Rica e Espanha, que realizaram duas grandes paralisações nos últimos três meses, aderiram ao movimento e também brecaram suas motos e bicicletas por melhores condições de trabalho¹.

O resultado superou as expectativas e o que presenciamos foi o maior movimento paredista internacional desde a greve global dos trabalhadores e trabalhadoras do setor de comidas rápidas (fast-food), em 15 de maio de 2014. Cabe lembrar, para melhor dimensionarmos a importância do evento internacional realizado, pelos entregadores e entregadoras, que a greve de 2014, do setor de fast-food, foi a primeira de dimensão global organizada pela classe trabalhadora.

Neste último primeiro de julho, as manifestações aconteceram nas principais capitais brasileiras, com destaque para São Paulo, onde centenas de entregadores e entregadoras interditaram importantes vias da cidade, como a av. Paulista e a Ponte Estaiada. Na Cidade do México, os protestos também foram massivos e os entregadores e as entregadoras usaram capacetes brancos em homenagem aos colegas que faleceram recentemente durante o exercício do trabalho. No Equador, as manifestações ocorreram em frente à sede do governo, pois este acena para a proibição das empresas-aplicativos de entregas de encomendas no país. Na Costa Rica, que vive uma escalada de casos de covid-19, o protesto foi mais tímido, mas aconteceu na frente do Ministério do Trabalho. Na Argentina, as manifestações aconteceram em pelo menos quatro cidades: Buenos Aires, Mar del Plata, La Plata e Rosário.

A escalada internacional da categoria começou no último 22 de abril, quando repartidores e repartidoras da Argentina, México, Peru, Equador, Guatemala, Costa Rica e Espanha anunciaram a formação de uma frente única internacional de luta e juntos articularam duas grandes paralisações, a primeira realizada no dia 22 de abril e a segunda no dia 29 de maio. No entanto, não são apenas os entregadores e as entregadoras que se articulam e se organizam internacionalmente. Os pioneiros, no universo do trabalho digital intermediado por plataformas, foram os e as motoristas de transporte particular por aplicativo. Há pouco mais de um ano, em 8 de maio de 2019, um dia antes da Uber estrear suas ações na bolsa estadunidense, motoristas por aplicativos de diversas cidades do mundo realizaram a primeira greve global do setor.

Menos de dez meses depois, a articulação internacional dos e das motoristas ganhou uma nova dimensão. Em Thame, Oxfordshire, na Inglaterra, entre os dias 29 e 30 de janeiro de 2020, 60 motoristas de 27 países se uniram e realizaram o primeiro encontro internacional da categoria. O evento marcou a inauguração da primeira associação internacional da classe, a Alliance of App-Based Transport Workers (IAATW), e deu início à produção do primeiro manifesto da categoria: “Manifesto for App-based Transport Workers”.

Não por menos, nos dias 25 e 26 de junho, por meio de uma conferência virtual, intitulada Global Digital Workers Conference, foi fundada a Transnational Workers Network (TWN), uma organização internacional para defender os direitos dos trabalhadores e trabalhadoras intermediados por plataformas. Inicialmente, participam da TWN, trabalhadores e trabalhadoras de associações e sindicatos dos EUA, Espanha, França e Inglaterra.

Por mais eficientes que sejam as novas formas, objetivas e subjetivas, de controle sobre o trabalho realizadas pelas empresas, através das novas tecnologias da informação e da comunicação, leia-se gestão por algoritmos, extração de dados e vigilância em tempo real, são inúmeros os exemplos de trabalhadores e trabalhadoras intermediados por aplicativos que se conscientizam e se organizam através de associações, sindicatos e coletivos e logram importantes conquistas por melhores condições de trabalho. A novidade é que, assim como as principais empresas-aplicativos são organizações globais que se beneficiam das novas tecnologias da informação e da comunicação para gerirem multidões dispersas pelo mundo, seus trabalhadores e trabalhadoras, também capacitados pela popularização de tecnologias similares, se identificam, se comunicam, partilham sentidos, e se articulam em dimensões internacionais. É luta que segue!

MARX, K.; ENGELS, F. Manifesto Comunista. São Paulo: Boitempo, 2010.

Nota de Rodapé:

1. A greve foi votada em assembleia virtual com participação dos Raiders Unidos (Chile), Glovers Unidos (Ecuador), Treta no Trampo (Brasil), Entregadores Antifascistas (Brasil), Repartidrxs Unidxs (Costa Rica), Motociclistas Unidos (México), Ni un Repartidor Menos (México), Agrupación Trabajadores de Argentina e Agrupación Trabajadores de Reparto de Argentina.




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