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A greve na Ford entra no sétimo dia com paralisação apenas em dois setores da montadora: logística e mensalistas. Rafael Marques (presidente do sindicato dos metalúrgicos do ABC), compara os métodos utilizados pelos golas vermelhas em 1990, aos métodos utilizados pela direção do sindicato na atual greve.

quinta-feira 17 de setembro de 2015 | 01:35

A greve na Ford de SBC entrou nessa quarta-feira (16/09) em seu sétimo dia de forma bastante confusa. Após a paralisação total da fabrica na terça (15/09), o sindicato depois da sua cerimoniosa assembleia - onde somente os dirigentes da CUT/PT tem direito a fala - informou aos trabalhadores que as negociações não avançaram, e que a empresa se mantém irredutível nas mais de 200 demissões, orientando todos os trabalhadores da produção voltarem ao trabalho normalmente, exceto mensalistas e logística.

A direção dos Metalúrgicos do ABC, desde de segunda-feira vem utilizando uma estratégia para a greve, fazendo menção a luta dos trabalhadores da Autolatina (fusão entre Volks e Ford que ocorreu de 1987 em 1996) que em 1990 protagonizaram uma greve que ficou conhecida como a “greve dos golas vermelhas”, na qual ferramentaria e manutenção paralisaram totalmente, inviabilizando a produção. Na segunda-feira (14/09) a direção sindical orientou os trabalhadores da manutenção e ferramentaria a não trabalharem, enquanto que, os da linha de produção que bateram o cartão foram dispensado logo após a entrada por não haver condições da linha funcionar.

Terça-feira a paralisação foi total, após rápida assembleia onde o presidente do sindicato Rafael Marques atualizou as informações sobre a mesa de negociações, dando bastante destaque para o ato que a CUT estava organizando naquele dia em defesa da democracia e da presidenta Dilma - PT. Ao fim da assembleia os sindicalistas fecharam os portões do estacionamento, onde se realizava a discussão, para garantir que a maior parte dos trabalhadores entrassem nos ônibus que iriam para a Av. Paulista, onde seria realizado o ato organizado pela CUT.

Os golas vermelhas de 1990 e a atual greve da Ford

A referência a “greve dos golas vermelhas”, causa estranheza, pois além da diferença na conjuntura, existe uma diferença na estratégia de negociação que a direção sindicato procura esconder fazendo referência a uma luta histórica bastante importante e radicalizada no ano de 1990. Naquele ano, o presidente eleito havia sido Fernando Collor, após derrotar Lula no segundo turno, a inflação era de aproximadamente 116,9% ao ano, e a proposta da Fiesp era de reajustar os salários dos metalúrgicos em 11,52%, algo que foi encarado como uma provocação pela categoria, a direção sindical negociava a portas fechadas tentando conter a fúria dos trabalhadores que estavam prontos para disparar uma rebelião contra o novo sistema democrático que só aumentava a carestia de vida.

Em 29/06/90 a direção da CUT conseguiu aprovar, em uma assembleia bastante dividida, um acordo de reajuste de 59,11% encerrando a mobilização. Porém, na Ford a questão era muito mais complicada, a empresa havia demitido 100 trabalhadores, entre eles representantes da CIPA e da comissão de fábrica, todos dos setores de manutenção e ferramentaria, que estavam a frente da mobilização. A resposta dos trabalhadores foi imediata e todos os funcionários desses dois setores entregaram suas carteirinhas (manutenção e ferramentaria que usavam uniformes com golas vermelhas) , o restante dos mais de 7 mil funcionários da Ford decidiram em solidariedade doar o valor de 10 hrs de trabalho para que seus colegas não ficassem sem salário. Essa decisão dos trabalhadores deixou completamente desconcertada, tanto a direção da Ford como a do sindicato, pois cada ação de repressão patronal era respondida com uma ação radicalizada dos trabalhadores. Quase um mês após a assembleia que havia encerrado a greve da campanha salarial da categoria, a Ford decidiu suspender o pagamento de todos os trabalhadores da fabrica.

Nesse momento entrou em ação os golas azuis (trabalhadores da produção) nas palavra de Tsukassa Isawa “A Greve dos Golas Vermelhas ficou famosa e deu muita visibilidade ao pessoal da manutenção e da ferramentaria e até hoje se fala sobre isso. Os golas vermelhas têm todo o mérito de terem feito uma greve extremamente organizada, com a militância muito coesa, com a unidade do movimento muito forte, o comando com bastante controle, mas o que chama a atenção sobre a Greve, no entanto, é o que não foi feito pelos golas vermelhas. O que chamou a atenção da imprensa e do governo foi a radicalização dos trabalhadores e essa radicalização foi feita pelos golas azuis. Com todo o mérito que merecem e não pode ser tirado dos golas vermelhas”. Os trabalhadores chegaram quase a ocupar a fábrica, tombaram carros, incendiaram postos de trabalhos, e estavam irredutíveis quanto as demissões e o pagamento dos salários.

A direção sindical da CUT foi chamada as pressas junto com Lula, para frear o levante dos trabalhadores, e assim foi encerrada a greve, marcando mais uma vez o papel da direção do sindicato dos metalúrgicos como freio para as lutas operárias, foram readmitidos 80 dos 100 trabalhadores demitidos. Até hoje nos parece uma incógnita o que aconteceu com os 20 demitidos, a direção do sindicato afirma que aceitaram a demissão voluntaria, algo que parece bastante suspeito, pois quem luta dessa forma por seu posto de trabalho e direito de outros trabalhadores, não estariam dispostos a abrir mão voluntariamente de seus postos de combate, porém esse tipo de atuação acabou gabaritando Lula junto a patronal para se tornar presidente anos depois. Hoje em dia essa casta dirigente do sindicato tenta se utilizar desse exemplo histórico de luta dos trabalhadores para continuar dirigindo e traindo a luta dos trabalhadores nas montadoras da região, para manterem seus privilégios, inclusive o atual presidente do sindicato, Rafael Marques que era um dos golas vermelhas.

Hoje em dia comparar os métodos utilizados pela direção do sindicato na Mercedes, Volks e agora na Ford, para barrar as demissões, fazendo descer goela abaixo dos trabalhadores, táticas como PPE, que reduzem a jornada de trabalho com redução dos salários, aos métodos utilizados pelos golas vermelhas em 1990, na manutenção de seus postos de trabalho é um insulto a inteligência e a memória dos trabalhadores, pois até agora não expressou sequer uma fagulha do elemento de radicalização utilizados nos idos anos 90. A estratégia que a direção cutista vem utilizando parece muito mais com uma forma de estrangulamento das greves, organizando as lutas isoladamente nas fábricas da região, em um momento que necessariamente precisaria de uma greve geral nas montadoras que barrassem as demissões. E não paralisando apenas nos dias convenientes para os fins políticos da CUT.




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