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Sérgio Moro, a Lava Jato e os Estados Unidos de Trump

sexta-feira 29 de janeiro de 2016 | Edição do dia

Arte: Juan Pablo Díaz Vio

Depois de formado em Direito no Paraná, o “herói” da direita brasileira – e de certa “esquerda” que considera legítima a reconfiguração do regime político pelo autoritarismo judiciário – participou de curso para especialistas de direito em Harvard, em 1998, sem deixar de nutrir interesse por tudo o que relaciona o Judiciário brasileiro com os Estados Unidos. Por intermédio de um programa do Departamento de Estado norteamericano, o juiz conheceu pessoalmente os interesses dos grandes monopólios, especialmente os vinculados ao petróleo.

O Wikileaks já havia revelado o informe enviado ao Departamento de Estado norteamericano do seminário de cooperação, realizado em outubro de 2009, com a presença de membros seletos da PF, Judiciário, Ministério Público, e autoridades norteamericanas, no Rio de Janeiro. Trata-se das formas de “combater a lavagem de dinheiro”.

Nesse evento, segundo a documentação confidencial do serviço de inteligência americano, a opinião do Judiciário ianque não era nada lisonjeira sobre a Justiça brasileira: “A democracia brasileira não alcança 20 anos de idade. Assim, os juízes federais, promotores e advogados brasileiros são iniciantes no processo democrático, não foram treinados em como lidar com longos processos judiciais [...] e se encontram incapazes de utilizar eficazmente o novo código criminal que foi alterado completamente”.

Aceitando de imediato a necessidade da tutela disfarçada, Moro e a Polícia Federal fizeram o possível para não descaracterizar a Lava Jato como instrumento de intervenção do Departamento de estado dos Estados Unidos no Brasil. Não à toa, Moro toma muito cuidado em não colocar em risco qualquer acordo de colaboração com o Departamento, e garantir o pagamento em dinheiro de todas as exigências do chefe do norte nas causas da Lava Jato.

Há que dizer que o treinamento recebido por Moro para o “combate à lavagem de dinheiro” tem fundamentos materiais claros.

Basta dizer que é o artigo 7º, § 1º, da Lei n. 9.613, de 3 de março de 1998 (Lei de Lavagem de Dinheiro) que permite aos procuradores da Lava Jato em Curitiba, incluindo o juiz Moro, apropriar-se de 20% do dinheiro restituído de cada delação premiada, segundo anunciado pelo próprio Procurador Geral da República, Rodrigo Janot, numa verdadeira fábrica de dinheiro para a Lava Jato. Do lado dos monopólios estrangeiros, o benefício é taxativo: com a enorme crise da Petrobrás e as tratativas para a venda de ativos e do pré-sal a empresas estrangeiras, é possível enxergar como a Exxon Mobil, a Chevron e a Royal Dutch Shell, petroleiras com dívidas gigantescas, extrairão o seu futuro.

Documento da delação de Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro, em que o MPF solicita "80% do ressarcido" à União

O interesse empresarial imperialista com a Lava não se resume ao pré-sal, mas alcança as empreiteiras e o monopólio dos navios-sonda. Na construção civil, a Odebrecht é um empecilho para empreiteiras americanas avançarem na Venezuela, Cuba, Equador e alguns países da África. Já monopólios nunca investigados por Moro como a Halliburton, cujo ex-presidente foi o republicano Dick Cheney, que apoiou Trump, busca preservar-se como detentora de cruciais e estratégicas informações sobre o petróleo brasileiro, tendo sido “operadora terceirizada” da gestão dos dados da Agência Nacional de Petróleo do Brasil.

A “Lei de Combate à Lavagem de Dinheiro” é utilizada portanto para justificar a apropriação de parte da multa ressarcida pela Petrobrás. Um trecho da norma diz que a União deve regulamentar a destinação de "bens, direitos e valores" alvo de apreensão judicial e assegurar sua utilização "pelos órgãos encarregados da prevenção, do combate, da ação penal e do julgamento de crimes”. Essa norma é também inspirada na jurisprudência norteamericana, que é ilegal no Brasil, e que os procuradores da Lava Jato querem tornar constitucional nas "10 medidas contra a corrupção".

A condução da Operação Lava Jato sob os olhos da Justiça norteamericana e os benefícios extraídos pela força-tarefa do Ministério Público e do Judiciário estão interligados. A inspiração, como discutimos no Esquerda Diário por vezes, é a Operação Mãos Limpas na Itália, que em 1992 varreu os partidos tradicionais do regime político mantendo de pé todo o sistema de corrupção capitalista, encarnado na figura emblemática de Sílvio Berlusconi, tornado símbolo da política italiana nos 90.

Moro sempre revelou entusiasmo singular pela fórmula adotada pelos investigadores italianos, baseada métodos autoritários e reacionários, como as prisões preventivas que levaram a confissões, delações e à ampla divulgação dos fatos com apoio da mídia. Mesmo com a proteção parcial concedida a Temer no julgamento de Cunha, há que ver se a linha “Mãos Limpas” – que só se daria com acordo majoritário com o empresariado estrangeiro e nacional – será adotada caso se aprofunde a crise institucional do governo e a recessão econômica.

Quando se trata dos grandes jogos de poder, até mesmo uma “inocente” viagem de estudos precisa ser examinada. Como discutimos anteriormente, o triunfo de Trump implica a uma política externa mais agressiva dos Estados Unidos ao mundo. É possível que a eleição do republicano tenha alentado um lobby mais poderoso por parte das petrolíferas ianques de acelerar um processo de privatização que Temer está se mostrando incapaz de levar a cabo. É impensável seguir o exame do fortalecimento dos EUA no Brasil por fora do papel de Moro.




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