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CRISE POLÍTICA | Se aprofunda a crise no Haiti em meio a mobilizações contra Jovenel Moïse

No Haiti vive-se uma grande agitação política em meio a protestos e mobilizações contra o odiado Jovenel Moïse. Desde janeiro, mas sobretudo desde o começo de fevereiro, a tensão e as crises aumentaram com forte repressão contra o povo.

quarta-feira 10 de fevereiro de 2021 | Edição do dia

Fotografía EFE/ Jean Marc Herve Abelard

Os eventos mais dramáticos começaram nos dias 1 e 2 de fevereiro, quando os sindicatos e a oposição política haitiana convocaram uma greve geral que nas grandes cidades teve uma alta participação. O governo respondeu rapidamente com a militarização das ruas da capital Porto Príncipe e outras cidades ao longo do país caribenho.

Moïse se recusa a deixar o governo após a data emblemática de 7 de Fevereiro em que, de acordo com um artigo da própria constituição, expira o seu mandato, argumentando de acordo com a sua própria interpretação da lei que ainda lhe resta um ano de governo.

Durante os dois dias de greve geral houve mortos por tiros da polícia, principalmente em Cabo Haitiano, segunda cidade do país, com três vítimas fatais da repressão.

Mas o ódio a Moïse é tamanho, que quase desde a sua chegada ao governo vem sendo submetido a constantes protestos pelas suas suas políticas de fome e miséria, sobre um país mergulhado na pobreza, sujeito ao imperialismo e às políticas do FMI, que não fazem mais do que aumentar a agonia de todo o povo haitiano.

Se Jovenel Moïse não caiu até o momento foi pelas próprias políticas dos partidos da oposição e outros setores de poder, pois faz mais ou menos três anos que estes vêm lhe salvando a pele montando mesas de negociação em busca de uma transição política. Enquanto é o povo que protesta nas ruas, a oposição se apropria como cabeça dos protestos e exigem que Jovenel Moïse se demita considerando que em 7 de fevereiro concluía o seu mandato de acordo com a própria Constituição.

São eles que vêm decidindo cada passo, sendo que nesta segunda-feira proclamaram um presidente provisório, mas sem consultar absolutamente ninguém, a não ser o povo que está nas ruas.

Da mesma forma que convocaram a greve geral sem consultas, a articularam de maneira burocrática sem a tomada de decisões com os trabalhadores, tudo para manter seus ritmos de pressão, para que a situação não se descontrole e a própria mobilização lhes passe por cima.

É importante dizer que as manifestações contra o governo de Jovenel Moïse começam em novembro de 2018, quando o povo haitiano o colocou contra a parede, obrigando à renúncia de vários ministros. Após um impasse, os protestos foram retomados em setembro de 2019 contra a escassez de combustíveis que causou cortes no fornecimento de eletricidade, problemas com os transportes públicos, aumento dos preços dos produtos e serviços básicos. Nessa época, as manifestações foram brutalmente reprimidas, deixando mais de 40 mortos e centenas de feridos.

Durante essas mobilizações, a oposição sentou-se com o governo em busca de negociações para forçar um governo de transição, entretanto, em todo esse tempo não conseguiram avançar nas diferentes mesas que se montaram, mas sim deram ar a Jovenel Moïse, que foi se consolidando, sobretudo pelo grande apoio dado pelos Estados Unidos.

Com o argumento dos protestos, o governo de Moïse adiou sem data as eleições legislativas previstas para 2019, encerrando o parlamento em janeiro de 2020, que o isolou politicamente. O presidente governa desde então por decreto, sob o grande descontentamento de uma população minada pela pobreza e que sofre diariamente a violência das quadrilhas criminosas, muitas delas ligadas ao próprio governo.

Enquanto o herdeiro político de Michel Martelly, vem se assentando no poder em um Haiti onde a vida se torna cada dia mais cara para as massas, os membros do governo e seus aliados ficam cada dia mais ricos. O presidente que vem de um partido de extrema-direita, que chegou ao governo em uma eleição denunciada por fraude com apoio da comunidade internacional e da burguesia, juntamente com os seus aliados são acusados de desvio de fundos estatais, sequestro e roubo.

Em plena crise, os militares anunciaram que se manterão fiéis a Moïse, que reformou as Forças Armadas em 2017 duas décadas depois de terem sido dissolvidas pelo então presidente, Jean-Bertrand Aristide.

"As Forças Armadas do Haiti reafirmam sua determinação em respeitar a Constituição e as autoridades legítimas, democraticamente eleitas pela população", diz um comunicado assinado pelo comandante em chefia, tenente-general Jodel Lessage e divulgado pelas fontes oficiais.

Fotografía EFE/ Jean Marc Herve Abelard

Considerando que o mandato expirava em fevereiro, vários partidos e organizações da oposição do Haiti nomearam nesta segunda-feira o juiz Joseph Mécène Jean-Louis "presidente da transição". Jean-Louis, juiz de 72 anos e membro do Tribunal de Cassação desde 2011, gravou um vídeo no qual disse que aceita "a eleição da oposição e da sociedade civil para poder servir o país". Colocar um membro do Tribunal de Cassação tem sido uma política que a oposição vem ensaiando desde a crise de 2019.

A "nomeação" de Joseph Mécène Jean-Louis ocorreu um dia depois que Moïse denunciou que outro juiz da Corte de Cassação tinha organizado um complô para dar um golpe de Estado. Na mesma segunda-feira Moïse publicou um decreto através do qual aposentou três juízes opositores, entre eles Joseph Mécène Jean Louis, no mesmo tempo o ministro da Justiça, Rockefeller Vincent declarou que o governo procederá à prisão imediata do presidente nomeado pela oposição.

O decreto retira também de suas funções na Corte de Cassação, máxima instância judicial do país, Jean Louis, Ivickel Dabrésil, preso no fim de semana sob acusação de preparar um golpe de Estado, e o magistrado Wendelle Coq Thelot, também da oposição. A ordem dada por Moïse seria contrária ao artigo 177 da Constituição, que estabelece que os juízes da Corte de Cassação são "inamovíveis" e não podem ser destituídos ou cessados a menos que sejam imputados penalmente, ou no caso de incapacidade física ou mental permanente e devidamente comprovada. Mas Moïse procura se fazer de um Tribunal de máxima autoridade mais favorável a seu governo.

Moïse tem cada vez menos apoios dentro do país, mas na sexta-feira passada recebeu o apoio expresso do Governo de Joe Biden na tese de que o seu mandato dura até 2022. Não somente dos EUA, mas de outras potências imperialistas através do Core Group integrado pelos EUA, França, Canadá e a União Europeia, à qual se junta o Brasil e outras nações, além de uma parte da burguesia para se manter no poder.

Em meio a toda essa crise, o povo que vem se mobilizando desde 2018 contra as políticas de Moïse mostra uma enorme desconfiança também com os líderes políticos da oposição, muitos deles questionados por corrupção e ligados também a setores da burguesia. Se não fosse pela política desta própria oposição Jovenel Moïse já teria caído faz tempo nas grandes mobilizações contra a fome e a miséria que estremeceu o país.

Se trata de setores da oposição pertencentes ao establishment político que têm vindo a fazer parte de negociações e que utilizam a mobilização de massas para os seus próprios interesses. Nem o governo de Moïse, nem os partidos da oposição, são uma alternativa para o povo haitiano. Frente ao repudiado governo de Moïse os principais partidos da oposição mostraram seu verdadeiro rosto político nestes anos em que o povo haitiano manteve-se mobilizado.

Propõem uma solução que não rompe com a histórica subordinação aos Estados Unidos e ao FMI que vem destruindo o país e manteriam quase inalterado o sistema de corrupção que as massas repudiam nas ruas assim como todo o sistema de miséria e extrema pobreza.




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