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Resposta de um grevista ao editorial do Estadão “A derrota dos baderneiros”

Danilo ParisEditor de política nacional e professor de Sociologia

sexta-feira 19 de junho de 2015 | 01:14

Em seu editorial intitulado “A derrota dos baderneiros”, o jornal Estado de São Paulo mais uma vez se prova como um fiel escudeiro do governador Geraldo Alckmin. A intransigência, truculência, e falta de democracia do governo com a mais longa greve dos professores da história é motivo de comemoração e deleite dos editorialistas desse jornal. Assim como a capa da Folha de São Paulo do dia 13/06 (“Derrotados, professores encerram a greve mais longa da categoria em SP”), o objetivo do Estadão é alardear aos trabalhadores que aqueles que ousarem deflagrar greves serão derrotados.

Para chegar a esses objetivos usam dos recursos mais rasteiros. A mentira como argumentação é utilizada desavergonhadamente para conclusão de que os “baderneiros” grevistas não são dignos sequer “de estar em sala de aula, ensinando e formando crianças e adolescentes.” Ou seja, dedução lógica dessa afirmação é que o Estadão defende a demissão dos professores grevistas. Porém, para esconder as arbitrariedades e ilegalidades cometidas pelo governo, cria um cenário de que foram os grevistas responsáveis pelos desmandos, justificando assim a repressão do governo do estado.

Vamos aos argumentos, assim afirma o editorial: “Depois que os grevistas passaram a fazer assembleias no vão livre do Masp, bloquear o tráfego em ruas e avenidas de grande circulação, promover badernas e depredações de edifícios públicos e constranger e agredir as alteridades estaduais, o governador mandou cortar o ponto dos faltosos.” Qualquer um que tenha acompanhado minimamente o histórico das greves no estado de São Paulo sabe que a primeira medida adotada pelos governos tucanos, antes mesmo de ocorrer qualquer ato ou manifestação, é o corte de salário dos grevistas.

O editorial prefere não mencionar que através do corte de salários o governo tem como objetivo coagir os professores e impedir que exerçam seu legítimo direito de greve previsto na Constituição Federal. Não por acaso, os editorialistas “acidentalmente” esqueceram-se de escrever sobre o atentado a atividade sindical que foi a proibição de grevistas entrarem nas escolas, ou mesmo a imposição do governo em modificar unilateralmente a data-base a revelia da legislação estadual. Com isso em vista, aqueles que realmente agrediram a atuaram de forma ilegal, não foram os professores que participaram das assembleias do vão do Masp ou dos fechamentos de rodovias, mas foram aqueles que estavam muito bem acomodados no Palácio dos Bandeirantes e na Secretaria de Educação.

Além disso, soa ridículo o velho argumento de que as manifestações de rua promovem baderna e confusão. Há exatos dois anos das grandes jornadas de junho, quando setores de massas da população despertaram a vida política, as linhas mumificadas que guiam as opiniões desse jornal seguem reproduzindo ideias que foram avassaladas pelo peso das multidões nas ruas.

Dando sequencia ao injustificável, diz o mesmo editorial que os “desordeiros violentos” fizeram reféns os alunos e suas famílias de exigências irrealistas. Todos que vivem a realidade da escola pública sabem que irrealista é considerar e defender que exista alguma condição pedagógica em salas de aulas com 40 alunos. Considerar que não são justas as reivindicações da categoria (daquelas com ensino superior) que recebe os piores salários e possui a maior jornada de trabalho é obra da mais reacionária concepção de desmonte do ensino público.

Deliberadamente o jornal omite que parte considerável da categoria possui uma jornada de trabalho comparável às do período da revolução industrial, chegando a 65 hr semanais. As condições de trabalho são tão estafantes, que dados divulgados por esse mesmo jornal mostram que por ano 3000 professores desistem de dar aula na rede estadual de SP. Não suficiente, a prática da demissão anual compulsória de dezenas de milhares de professores temporários (conhecido na categoria como “duzentena”) escancara a degradação absurda que se chegou as condições de trabalho do magistério paulista. Defender a revalorização dos professores, que inevitavelmente deve passar por um robusto reajuste salarial, é uma condição incontornável para melhoria do ensino público.

Porém, o que nenhum editorial ou capa de qualquer grande mídia conseguirá apagar foi o novo setor que nasceu no calor dessa grave. Ativistas que organizaram comandos de greve por todo o estado, conformando uma forte aliança com os pais e alunos que ativamente apoiaram a greve através de atos, manifestações e abaixo assinados. Grande parte desse novo ativismo é consciente que não conseguimos o atendimento de nossas reivindicações, não só pela truculência do governo tucano, mas também por uma direção burocrática que há mais de 30 anos esta cristalizada na APEOESP, sem organizar seriamente nossas greves. Ao ser uma grande “organizadora de derrotas” essa burocracia petista permite que a grande mídia ataque ofensivamente um dos maiores sindicatos da América Latina.

Por fim, aos que adornaram com belas palavras a sangrenta ditadura militar não poderíamos esperar ideias diferentes. Amam o passado, com o ódio daqueles que lutam pelo futuro. Das derrotas também saem aprendizados, reorganizações e novas forças. Quando essas estiveram em movimento, serão incontroláveis.




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