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DITADURA MILITAR | Por que repudiar o golpe militar de 51 anos atrás?

Flavia ValleProfessora, Minas Gerais

terça-feira 21 de abril de 2015 | 22:00

No dia 1º de abril, completaram 51 anos do golpe militar de 1964. Como de costume, fui buscar nos grandes jornais regionais o que saiu sobre o assunto. Para meu espanto, não havia nenhuma menção ao golpe militar no jornal Estado de Minas. Essa é mais uma mostra de como perdura a construção do senso comum para construir o esquecimento em relação ao período que marcou uma política das classes dominantes nacionais, subordinadas ao imperialismo contra os trabalhadores e o povo.

Delimitando-se dessa prática do esquecimento, impulsionada por setores da classe dominante e dos militares, o governo Dilma e sua Comissão Nacional da Verdade (CNV) avançaram para outra, menos obscurantista, mas tremendamente perigosa. O governo petista leva à frente a estratégia (atualmente hegemônica) da reconciliação e “normalização defeituosa”.

Essa estratégia é a que está por trás da CNV, que tem a lei da anistia de 1979 como fundamento, deixando clara a permanência do pacto de não punição aos civis e militares envolvidos com a ditadura. Ou seja, não ameaça os acordos com os militares ao mesmo tempo em que dá uma satisfação aos movimentos sociais e organizações que defendem os direitos humanos.

Ao contrário dessas duas estratégias, é necessário recuperar a estratégia da luta independente da classe operária contra a ditadura para conseguir acabar com as heranças da mesma na democracia degradada que foi, enfim, instituída a partir de 1985.

Visto que o golpe militar foi um golpe das classes dominantes financiadas pelo imperialismo norte americano, o principal sujeito que queriam combater eram aqueles que estavam à frente da luta de classes. O Brasil naquele momento viveu uma situação pré-revolucionária em que os trabalhadores em greve, os camponeses que buscavam as vias de impor a reforma agrária na marra e os marinheiros que se insubordinavam contra sua alta patente e chegaram a construir embriões de duplo poder nas forças armadas, eram os principais sujeitos para os que buscavam uma saída revolucionária da classe operária contra o golpe.

Naquele momento, havia direções reformistas da burguesia que atuavam em distintos graus contra a completa subordinação ao imperialismo, e várias vezes se enfrentavam com o mesmo, apoiando-se nas massas e visando criar mais espaço de ação para a burguesia nacional. Para isso, todas elas usavam a classe operária e as massas como massa de manobra para seus interesses e privilégios. João Goulart (Jango) era expressão dessa política, que podemos entender melhor a partir da definição marxista de bonapartismo sui generis. Brizola (do PTB, Partido Trabalhista Brasileiro) a sua expressão mais radicalizada de uma ala dentro destas correntes burguesas.

Apenas uma alternativa revolucionária de trabalhadores poderia transformar a classe operária em sujeito hegemônico das massas oprimidas pelo capital contra o imperialismo e as variantes nacionais burguesas. Porém, as direções operárias estavam aquém dessa necessidade, em grande parte subordinadas às manobras do stalinismo brasileiro.

Desde as direções do movimento operário, o PCB (Partido Comunista Brasileiro), naquele momento o maior partido operário com influência de direção de massas, cumpriu um papel de contenção dos movimentos mais radicalizados a partir de sua confiança de que setores da burguesia nacional contrários ao golpe poderiam cumprir qualquer papel progressivo na luta de classes. O resultado foi a grande traição do PCB, sendo derrotado sem combate, que levou mais uma vez esse partido à clandestinidade quando iniciou a ditadura militar, impondo uma derrota ao movimento de massas. Assim, o repúdio ao golpe também traz à tona a necessidade de construir hoje as vias para poder existir um partido de trabalhadores, que diferente do PCB e posteriormente o PT, seja criado a partir de uma estratégia revolucionária e não de conciliação de classes.

A vitória da burguesia e do imperialismo abriu um período de 21 anos de chumbo no Brasil, seguido por uma democracia dos ricos, degradada, que mantêm os pactos com militares e carrega muitas heranças malditas daquele período. Exemplo disso são os autos de resistência (verdadeiras execuções) de uma das polícias mais assassinas do mundo que atua em primeiro lugar contra o povo pobre e negro fazendo com que o Brasil seja um dos campeões mundiais em violações dos direitos humanos. Também no encarceramento em massa da juventude, em especial negra. Essa herança aparece em filhotes da ditadura que estão na Câmara dos Deputados como Bolsonaro e na presidência desta mesma Câmara, como Eduardo Cunha, da base aliada do PT, que são líderes de campanhas contra os direitos das mulheres, dos negros e dos direitos LGBTs.

Esses são apenas alguns exemplos pontuais da herança da ditadura militar nessa democracia dos ricos. Por isso é importante repudiar o golpe militar de 1964 e também é uma tarefa da classe trabalhadora, da juventude e de seus setores organizados em partidos de esquerda, a luta pela memória, verdade e justiça de uma perspectiva militante e independente do estado, dos governos e do aparato repressivo.

Por este motivo, junto a outras organizações, seguiremos debatendo o golpe, tirando lições sobre o mesmo, sobre a atuação da esquerda, e não só na data do aniversário do mesmo seguiremos este debate, como em importante evento da Frente Independente pela Memória, Verdade e Justiça/MG, que construiremos junto no dia 25/04 na sede do Instituto Helena Greco.

O golpe não é uma data para passar em branco como faz o Estado de Minas nem para lembrar em um só dia. Mas algo para pensarmos profundamente e como tocou cada aspecto da realidade dos trabalhadores e dos setores oprimidos, por isto o Esquerda Diário fez uma extensa cobertura nestes dias.




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