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ESTADO ESPANHOL | Podemos: instrumento da relegitimação do regime construído após o pacto de Moncloa

As eleições parlamentares que ocorreram no final de 2015 no estado espanhol reaviavam os debates na esquerda sobre as organizações que refletem um novo tipo de reformismo, como o Syriza grego e nesse caso particular o PODEMOS.

quarta-feira 13 de janeiro de 2016 | 01:26

A expressiva votação da formação espanhola (foi a terceira força na eleição, com 20,6% dos votos) parece dar novo fôlego a esse tipo de organização, após o debacle e traição levados a frente pelo Syria na Grécia, apontando esse partido como algo viável, uma forma de organização de esquerda que consegue sair da penumbra e se apresentar como alternativa real para uma ampla gama de setores que se mobilizam.

No entanto, essa legitimidade que aparenta ganhar novamente esse tipo de neo-reformismo em setores de esquerda com a votação de PODEMOS no estado espanhol é apenas fruto da ilusão ótica causada pela disputa eleitoral, terreno que apesar de disputável e no qual certamente os revolucionários devem atuar é o menos frutífero para as ideias que buscam uma ruptura com o sistema.

Os setores à esquerda que buscam renovar a experiência com esse reformismo de novo tipo mesmo após a experiência do debacle da estratégia análoga levada a frente por Syriza na Grécia mostram apenas que não querem aprender com a história, mesmo aquela que se desenrola bem embaixo de seus narizes.

Para podermos construir efetivas alternativas ao capitalismo nesse momento de agudização da luta de classes a nível internacional é preciso que aprendamos com as experiências de luta e tiremos as conclusões necessárias. Uma óbvia lição a ser aprendida da história recente: não é possível construir alternativas radicais, anti-capitalistas, socialistas, à sociedade burguesa por dentro de parlamentos e sem uma estratégia de enfrentamento direto com o capital. Se podemos e devemos disputar as eleições temos que ter claro que esse é um movimento tático, que serve a divulgação e propagação de ideias revolucionárias, submetido a estratégia de derrubada do capitalismo.

Para entender-se o fenômeno PODEMOS no estado espanhol é necessário pensar o próprio regime democrático burguês que se construiu ali, a recente crise desse regime e o papel de PODEMOS em sua reconstituição.

O pacto de Moncloa

O regime “democrático” existente hoje na Espanha é expressão da luta pela queda da ditadura franquista e dos pactos entre os principais partidos burgueses para garantir a estabilidade do novo regime que se construía e para que as mobilizações não assumissem um caráter mais profundo e radical, que junto a luta contra o franquismo, contra a monarquia e pelo direito a autodeterminação, pudesse colocar em questão a própria dominação capitalista.

Os dois principais partidos que conseguiram aparecer como parte do processo de luta pela redemocratização, o ressurgido PSOE, “socialista”, e o Partido Popular, conservador, dirigiram um pacto pela estabilidade e democracia, conhecido como pacto de Moncloa para construir um regime na Espanha nos moldes das democracias burguesas nos países imperialistas, um regime baseado na divisão de funções entre um partido conservador e um partido pretensamente de esquerda, que se alternam no poder, podendo assim absorver os conflitos sociais.

Assim, o regime que se construiu após a queda do franquismo tinha tarefa central de legitimar a dominação burguesa e ser válvula de escape para os conflitos sociais, se baseando no bipartidarismo e na rotatividade no poder de PSOE e PP.

A crise econômica e a crise no regime, o papel de PODEMOS

Esse regime sofreu um duro golpe com a crise econômica que atingiu fortemente o país (o desemprego na Espanha atingiu altíssimos patamares, principalmente entre a juventude) e as consequentes mobilizações da juventude e trabalhadores (indignados, mineiros de Astúrias, etc).

Foi no bojo desse processo de deslegitimação do regime que surgiu um novo partido, o PODEMOS. Com um discurso ideológico profundamente antimarxista, que nega hoje uma separação entre esquerda e direita no espectro político, não parte de nenhuma centralidade da classe trabalhadora, mas apela para o cidadão comum, para a “plebe”, que parte não da análise da realidade objetiva, mas de “relatos”, tendo uma posição ambígua em relação a monarquia -Pablo Iglesias, principal expoente do partido, participou de recepção ao rei espanhol no parlamento europeu no meio do ano passado presenteando-o (pasmem!!) com um DVD do seriado Game of Trones- esse partido reflete, por dentro do regime, a ideologia difusa existente no movimento dos indignados espanhóis.

PODEMOS, nesse sentido, representa a acomodação e desvio daquilo que existia de legitimo no movimento de indignados para dentro das instituições “democráticas” do estado espanhol. Todo seu discurso pretensamente radicalizado contra a “casta” (forma difusa e populista de nomear os políticos tradicionais) mostrou sua falácia nas últimas eleições municipais espanholas assim que se mostrou a possibilidade de esse partido administrar cidades importantes, desde que fizesse aliança com o partido que aparece como pata esquerda do regime, o PSOE.

Assim, PODEMOS é a ferramenta de “esquerda” construída pelo regime espanhol para atrair para dentro de suas instituições a forte mobilização que atravessou e atravessa o país desde o começo da crise. Para não deixar margem de dúvida quanto a essa perspectiva PODEMOS ganhou inclusive sua contra-cara populista de direita, Ciudadanos, que busca ser a formação pela direita que absorve o descontentamento popular e deslegitimação do regime e de seus dois partidos tradicionais para dentro de suas instituições.

Longe assim de ser uma formação que partidos efetivamente de esquerda pudessem reivindicar como algo legítimo, com caráter progressivo, PODEMOS é uma barreira à construção de um efetivo partido revolucionário no estado espanhol, partido com o qual os revolucionários tem que se enfrentar frontalmente.




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