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[Podcast Feminismo e Marxismo] Especial 25 de julho: as mulheres Panteras Negras

[Podcast Feminismo e Marxismo] Especial 25 de julho: as mulheres Panteras Negras

Neste dia internacional da mulher negra latino-americana e caribenha, o podcast Feminismo e Marxismo, uma iniciativa do grupo de mulheres Pão e Rosas e do Esquerda Diário, fez um programa especial dedicado a debater as Panteras Negras. A conversa aconteceu entre Diana Assunção fundadora do Pão e Rosas no Brasil e uma das apresentadoras do podcast, Letícia Parks, professora e fundadora do Quilombo Vermelho, movimento de luta antirracista e anticapitalista, e Odete Assis, fundadora da Faísca, um coletivo de juventude anticapitalista e revolucionária.

Confira abaixo um trecho do diálogo e acesse o link para escutar o programa na íntegra.

Diana Assunção: E começamos aqui mais um episódio do podcast Feminismo e Marxismo, e dessa vez o nosso tema são as mulheres Panteras Negras, um tema que a gente decidiu discutir não só porque é fortíssimo, mas também porque na semana do dia 25 de julho, que é o dia da mulher negra latino-americana e caribenha, vale a pena resgatar algumas experiências como essa do Partido dos Panteras Negras, que é uma das mais conhecidas internacionalmente da relação entre marxismo e luta negra e é um exemplo para todas as mulheres da América Latina e Caribe, porque nossa luta não tem fronteiras. Pra essa conversa, a gente tem duas convidadas frequentes aqui do programa, a Letícia Parks e a Odete Assis, que são também duas das três organizadoras do livro Mulheres Negras e Marxismo, que foi publicado em março de 2021 pelas edições Iskra e que tem dentro dele alguns artigos de debate sobre os Panteras Negras e o papel das mulheres negras ali. Bom, antes da gente começar, vamos entender o que é o dia 25 de julho, né, conta um pouco Let, qual a história por trás do dia da mulher negra latino americana e caribenha?

Letícia Parks: Oi Di, oi Det. Olha, esse dia é muito especial pro nosso subcontinente porque tem a ver com resgatar a história de luta contra a opressão racista e patriarcal numa região que foi a que mais recebeu escravos no mundo todo. Sendo assim, é de se imaginar que as mulheres negras cumpriram um papel muito importante nos milhares de relatos de lutas por liberdade. Aqui no podcast Feminismo e Marxismo a gente já falou sobre algumas delas… A Cecile Fatman e as outras líderes mulheres da revolução haitiana, de quem a gente fala no episódio 13. Também falamos sobre algumas líderes brasileiras no episódio 43, sobre o livro Mulheres Negras e Marxismo. Apesar de toda essa história e de tantas líderes e anônimas na luta por liberdade, foi só em 1992 que a gente conseguiu esse dia, como resultado dos debates do 1º Encontro de Mulheres Afro-latino-americanas e Afro-caribenhas, que foi na República Dominicana. Cada país presente escolheu um símbolo nacional pra esse dia, e aqui no Brasil, nosso símbolo histórico é a Tereza de Benguela. Aliás, valeria um episódio todinho sobre ela, mas conto curtinho aqui pra gente “esquentar” pra ele, que a Tereza de Benguela foi escolhida como símbolo nacional de luta das mulheres negras porque ela foi uma líder quilombola que assumiu a dianteira do Quilombo do Piolho, também conhecido como Quilombo do Quariterê. Ela foi a dirigente política e general militar desse quilombo, que ficava ali na região onde hoje é o Mato Grosso, por décadas durante o século XVIII.

Odete Assis: É muito louco que conforme a gente vai investigando a trajetória da luta negra no continente americano vai ficando evidente isso que a Angela Davis comenta no livro dela, o Mulheres, raça e classe, que por não serem diferenciadas do ponto de vista das relações de trabalho, era difícil impedir que as mulheres negras tomassem uma posição de destaque também nos processos de luta. Ela comenta muito essa ideia no livro dela e é uma parte que eu acho muito interessante, de como todo esse discurso do feminino como frágil, submisso, não se aplicava às mulheres escravizadas justamente porque isso impediria explorar igualmente o trabalho delas. Em geral, o patriarcalismo só aparecia no momento do castigo, do estupro, pra buscar submeter de forma mais profunda essas mulheres e assumir o controle do corpo, ou seja, o próprio patriarcado assume um contorno distinto no caso dessas mulheres.

Diana: Sem dúvidas, Det. Interrompi aqui pra dizer como é interessante como em dois minutos aqui conversando a gente já viu a relação entre mulheres negras latino-americanas e caribenhas e a experiência dos Panteras Negras né. Vamos praí então, vamos seguir, entende porque a gente escolheu esse tema né.. Qual a relevância da história desse partido pra luta negra na América Latina e Caribe?

Odete: Sim, bora lá entender isso. O Partido dos Panteras Negras foi um grupo que se organizou a partir de 1966 em várias regiões dos EUA, e foi o maior partido negro da história desse país. E antes de entrar propriamente na história dos Panteras eu queria dar um breve panorama histórico desse momento, porque ele vai ajudar bastante a gente entender o porquê surge um partido negro no coração da principal potência imperialista no pós Segunda Guerra Mundial. Essa foi uma época marcada pelas intensas disputas entre o imperialismo norte-americano e a União Soviética já burocratizada pelo stalinismo. Que colocava em questão o choque entre duas formações socioeconômicas com bases abertamente opostas: o capitalismo versus o Estado operário, já que mesmo depois da burocracia estalinista avançar contra os organismo de auto-organização da classe operária, o fato de existir um Estado cuja base econômica era totalmente oposta à lógica capitalista, era algo que fazia a burguesia tremer. E ao mesmo tempo que EUA e URSS estavam em permanente choque, o papel da burocracia desses Estados operários era muito importante para que os EUA conseguissem gerir a nova ordem mundial. A década de 1960 foi a expressão de um mundo em convulsão, com processos revolucionários e movimentos políticos que atravessaram o mundo. Nas cidades dos EUA, teve um processo conhecido como “verões quentes”, rebeliões urbanas em todos os anos de 1965 até 1970. Que começou justamente em 1965 em Watts, uma cidade da Califórnia, o que influenciou muito Huey P. Newton e Bobby Sealee, dois fundadores dos Panteras Negras, que começam a se organizar em Oakland, na Califórnia, a partir de uma série de assassinatos de negros pela polícia, com uma única ação, que era o porte explícito de armas pra garantia de auto-defesa das negras e negros em bairros pobres. O que tem de interessante nesse ponto de partida dos panteras é que eles se apoiam num direito constitucional – a autodefesa – para explicitar a hipocrisia do Estado norte-americano, porque no caso das negras e negros, não só a violência estatal é um fato cotidiano como qualquer direito constitucional é ausente. Um exemplo ilustrativo dessa hipocrisia do Estado, era que em pouco mais de um ano de existência do PPN na Califórnia, a legislatura desse estado alterou as leis de porte de armas, tornando ilegal a principal ação dos panteras – que era fiscalizar armados a ação dos policiais nos bairros. Era um escândalo nessa sociedade racista que uma vanguarda de negras e negros andassem pelos seus bairros na Califórnia portando armas pra se defender de ameaças à vida, e realmente só era um escândalo porque estamos tratando de uma sociedade racista, né? Porque é bem conhecido que nos EUA qualquer um consegue comprar uma arma.

Diana: Claro, e aqui a gente tá falando de armamento pra se defender do Estado que oprime e explora, e não o contrário, como no caso da extrema-direita que defende armamento pra defender o estado capitalista.

Letícia: Sim, e só um comentário breve gente. Pra gente ver como o marxismo revolucionário busca pensar os problemas profundos da massas exploradas e oprimidas em todo mundo. Porque na década de 1930, antes mesmo do surgimento do partido dos Panteras Negras, o Trótski debatia com o SWP, um grupo de revolucionários da oposição de esquerda e depois da IV Internacional nos EUA, sobre o papel que teria para o partido defender o direito a autodeterminação do povo negro. Porque como o grande revolucionário que era, ele via o potencial que tinha a luta do povo negro e como a opressão racista era um pilar essencial do Estado capitalista naquele país.

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Escute o programa na íntegra abaixo:


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