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RACHA NA CWI/CIT | O racha no CWI/CIT: Lições para os trotskistas

O Comitê por uma Internacional dos Trabalhadores (CWI/CIT) se dividiu em dois. Um lado está se adaptando a política identitária e largando a classe trabalhadora? O outro lado está perdendo o contato com os novos movimentos de massa contra a opressão?

sábado 12 de outubro de 2019 | Edição do dia

Foto: Kshama Sawant (Socialist Alternative, U.S.) e Peter Taaffe (Socialist Party, England and Wales) em fases melhores. PAUL MATTSSON

Por algumas medidas, o CWI/CIT a maior corrente trotskista internacional do mundo. O CWI/CIT, cujas raízes remontam a tendência Militant dentro do Partido Trabalhista Britânico, alegava ter seções em 35-40 países, algumas com vários milhares de membros [1]. Em 10 de julho, a seção britânica do CWI/CIT, o Partido Socialista, anunciou que iria promover uma “conferência internacional para reconstituir” o CWI/CIT. Em 26 de julho, a maioria do Comitê Executivo Internacional (CEI) do CWI/CIT os acusou de “um golpe burocrático” e de organizar um “racha”. Isto foi a culminância de uma luta de tendências de oito meses. Muitos documentos internos tinham vazado, mas nenhum lado havia admitido a luta interna. [2]

Durante 2019, o CWI/CIT havia sido dividido em tendências conflitantes com nomes igualmente peculiares. Por um lado, o Secretariado Internacional (SI) do CWI/CIT em Londres, o corpo permanente de liderança sob Peter Taaffe, 77 anos, formou a tendência: “Em defesa de um CWI/CIT trotskista da classe trabalhadora” (IDWCTCWI, na sigla em inglês). A maioria dos membros do CEI (representando uma clara maioria dos membros) foi então forçada a oposição. Eles não formaram uma tendência própria, mas o SI os intitulou de “Tendência Não-Tendência” (NFF, na sigla em inglês).

Agora existem duas organizações competindo, e os nomes não estão claro, com o SI planejando “reconstituir” o CWI/CIT, enquanto a maioria quer continuar ele. Para evitar confusões, vamos usar o nome das tendências internas. O IDWCTCWI é pela maioria das seções da Inglaterra, País de Gales ou Escócia, junto a pequenos grupos na França, Chile e Índia, menos da metade da seção alemã, com um apoio instável vindo de seções da África e da Ásia. A NFF, por outro lado, é apoiada por todo o resto, incluindo as seções maiores na Irlanda, nos Estados Unidos, Grécia, Suécia e Bélgica.

A crise estourou quando o SI começou a criticar a seção irlandesa (também chamada de Partido Socialista), que tem tido alguns importantes sucessos eleitorais nos últimos anos. Taafe os acusou de “fazer concessões para a política identitária” e abandonar o trabalho nos sindicatos e a classe trabalhadora em geral. Os irlandeses tinham fundado ROSA, uma frente feminista-socialista, e esse conceito foi copiado pela seção belga. A tendência de Taafe também tomou particular ofensa em um foco excessivo nos direitos das mulheres, criticando o SP irlandês por lançar uma candidata “feminista-socialista” nas eleições europeias [3]. A [NFF respondeu_> https://www.socialistalternative.org/2019/07/26/bureaucratic-coup-will-not-stop-cwi-majority-from-building-a-strong-revolutionary-socialist-international/] que o SI está subestimando o potencial de “movimentos tomando formas novas e inovadoras pelo mundo, comumente mas nem sempre por fora das estruturas formais do movimento operário oficial”.

Houve algumas crises de organizações trotskistas nos últimos meses, incluindo a dissolução da I.S.O nos Estados Unidos e o racha no PO na Argentina. Para chegar as raízes dessa crise, e tirar conclusões corretas dela, precisamos primeiramente ver a história do CWI/CIT.

Do Secretariado Unificado ao CWI/CIT

O CWI/CIT traça seu legado até o trotskista sul-africano Ted Grant (pseudônimo de Isaac Blank), que virou uma liderança do movimento trotskista na Grã-Bretanha durante a Segunda Guerra Mundial. No período do pós-guerra, a liderança da IV Internacional sob Michel Raptis (Pablo), Ernest Mandel, James P. Cannon e outros, desenvolveu a estratégia do entrismo.

O entrismo originalmente era uma tática. Nos anos 1930, Trotsky propôs que os revolucionários se juntassem brevemente a partidos reformistas de massa em estado de fermentação política, para ganhar seus membros para a política revolucionária. Segundo a visão de Pablo no início da década de 1950, no entanto, os trotskistas deveriam se juntar a partidos social-democratas ou stalinistas e ficar lá por décadas. Isso obviamente não era compatível com a defesa do programa marxista revolucionário. Os trotskistas precisariam operar em segredo e se apresentar como reformistas de esquerda. “Entrismo profundo” ou “entrismo sui generis” foi parte da degeneração centrista da IV Internacional no pós-guerra. Pablo defendia essa estratégia pois ele acreditava que não havia tempo para construir partidos revolucionários já que uma guerra mundial poderia estourar a qualquer momento. Grant, por outro lado, defendia o entrismo de longa duração na expectativa de um período de crescimento e estabilidade capitalista.

Grant e seus seguidores trabalharam diligentemente no Partido Trabalhista. Em meados da década de 1960, a IV Internacional (então Secretariado Unificado ou SU, sob Ernest Mandel) estava começando a se afastar de seu trabalho dentro da social democracia. A radicalização da juventude estava acontecendo em grande parte por fora das antigas organizações reformistas, e o SU lentamente começou a formar organizações revolucionárias independentes de juventude. Grant rompeu com o SU para continuar seu trabalho no Partido Trabalhista. O “Militant” então rompeu sozinho em 1964, e formou o CWI/CIT como uma corrente internacional uma década mais tarde. Neste sentido, o “Militant” e o CWI/CIT representam um resto da fase mais conservadora da degeneração centrista do trotskismo no período do pós-guerra.

Partido e Programa

Ao longo dos anos, o trabalho paciente do “Militant” dentro do Partido Trabalhista permitiu que eles ganhassem controle dos Jovens Socialistas do Partido Trabalhista, eleger três membros do parlamento e até ganhar a maioria no Conselho Municipal de Liverpool. Não é preciso dizer que uma burocracia partidária reformista não iria permitir marxistas revolucionários por décadas e, como consequência, o “Militant” foi forçado a fazer revisões significativas no programa trotskista para se manter no Partido Trabalhista. Para dar apenas três exemplos:
1.Eles defenderam que se podia atingir o socialismo por uma via pacífica, contanto que os socialistas conseguissem uma maioria no parlamento, passassem uma “Enabling Bill” (uma espécie de projeto de lei) para nacionalizar as 200 maiores empresas e que mobilizassem a classe trabalhadora. [4]

2.Eles se recusaram a se opor a guerra imperialista de Margaret Thatcher contra a Argentina pelas Ilhas Malvinas. Em vez de chamar pela derrota de sua própria burguesia, Grant alegou que a Argentina também era “imperialista”. Ele escreveu que tentativas de organizar resistência dos trabalhadores à guerra no Reino Unido era “ridículo”. [5]

3.Em vez de chamar pela abolição da polícia, eles tomaram a demanda por “controle comunitário” sobre uma instituição tão reacionária. Eles queriam a polícia organizada em sindicatos, e, nos anos recentes, o CWI/CIT na Grã-Bretanha organizou o secretário-geral do “sindicato” dos guardas de prisão. O representante do CWI/CIT no Conselho Municipal de Seattle, Kshama Sawant, chegou ao ponto de votar por uma nova chefe de polícia por causa de sua popularidade na comunidade.

"Militant” também era profundamente hostil a auto-organização dos setores oprimidos. Eles se opuseram a criação de estruturas especiais para mulheres e negros no Partido Trabalhista, e tinham a reputação de serem homofóbicos [6]. Um membro de Lesbians and Gays suport the Miners [Lésbicas e gays apoiam os Mineiros] relembrou em uma entrevista o clima homofóbico no Militant. Foi quase 20 anos depois de Stonewall que o CWI/CIT levantou a bandeira do “Pride”. Essa questão se reflete no racha atual, com o NFF criticando Taafe por argumentar que existe “um conflito de direitos entre pessoas trans e outros setores da classe trabalhadora”.

Apogeu e Queda

O apogeu da influência do “Militant” veio na segunda metade dos anos 1980, quando ganhou controle do Conselho Municipal de Liverpool, e teve um papel de liderança no movimento de massas contra a tentativa de Margaret Thatcher de introduzir um “Poll Tax” em 1990. Mas ambas as oportunidades foram desperdiçadas. O “Militant” falhou em ligar sua luta em Liverpool com a greve simultânea da União Nacional dos Mineiros. Pior ainda, quando 200 mil pessoas se juntaram na Trafalgar Square em 31 de março de 1990 para protestar contra o Poll Tax (Margaret Thatcher) reforma tributária neoliberal implementada por Margareth , a polícia atacou a manifestação e provocou um tumulto. Um porta-voz do “Militant” culpou “anarquistas”, prometendo que eles iriam “fazer uma investigação e dar nomes”.

Foi neste momento a burocracia do Partido Trabalhista resolveu se livrar dos trotskistas que eles haviam tolerado por tanto tempo, expulsando a liderança do “Militant”. Alguns membros proeminentes propuseram uma contra-ofensiva, que levaria a um racha no Partido Trabalhista e a criação de uma organização de talvez 10 mil membros. Mas a liderança do “Militant” respondeu que para cada trabalhador que que talvez apoiasse um partido independente, “teriam outros cinco, dez ou talvez cem que posteriormente entrariam no Partido Trabalhista”. Isso está completamente em cossonância com o esquema histórico que Grant propôs décadas antes. Então, em vez de lutar, o “Militant” tentou se enterrar ainda mais profundamente no Partido Trabalhista [7], esperando que eles seriam capazes de toma-lo cedo ou tarde. Essa política defensiva levou à desmoralização e, não muito depois, a um êxodo de militantes.

No início dos anos 1990, “Militant” estava se despedaçando. Seu grande aparato - “Militant” empregava mais de 250 pessoas [8], mais que o próprio Partido Trabalhista – precisava fazer algo para preservar essa base material. Peter Taafe, o chefe do aparato, rompeu com o “Militant” do Partido Trabalhista. Eles primeiro criaram o Militant Labour, depois o Partido Socialista. A maioria das outras seções do CWI/CIT seguiu este caminho e abandonou os partidos social-democratas onde eles estavam. Isso foi justificado pela teoria de Taafe de que esses partidos, uma vez chamados de “partidos operários com lideranças burguesas” tinham mais ou menos simultaneamente se transformado em partidos burgueses. Uma minoria ao redor de Ted Grant, no entanto, se opôs a “destruir 40 anos de trabalho” e resolveu se manter no Partido Trabalhista, liderando um racha com o CWI/CIT. Desde a morte de Grant em 2006, a resultante Corrente Marxista Internacional (IMT/CMI) tem sido liderada por Alan Woods.

Desde 1992, o CWI/CIT sob a liderança de Taafe tem chamado pela construção de novos partidos operários. Eles não são concebidos como revolucionários nem reformistas – O CWI/CIT se juntaria a eles e atuaria como uma ala revolucionária, como eles fizeram por muitas décadas dentro do Partido Trabalhista. É por isso que, apenas para citar um exemplo, o CWI/CIT é parte do partido reformista Die Linke na Alemanha desde a sua fundação em 2006.

O CWI/CIT não teve sucesso em criar esse partido na Grã-Bretanha. Em vez disso, ele formou alianças eleitorais com burocratas sindicais pós-stalinistas. Essas plataformas eleitorais, como a “No2EU”, combinavam demandas sociais com um programa de maior soberania nacional. É nesse quadro que o CWI/CIT se opõe a posição marxista de defesa de fronteiras abertas.

A seção britânica do CWI/CIT teve sucesso, no entanto, dentro de burocracias sindicais. O Partido Socialista venceu a maioria das cadeiras da liderança nacional do Public and Commercial Services Union (PCS), que representa trabalhadores do setor público. Enquanto eles estavam certamente a esquerda das burocracias sindicais na Grã-Bretanha, não havia nada remotamente “revolucionário” nessa liderança - e inclusive parece que eles aceitaram os salários exorbitantes pagos aos burocratas sindicais. No entanto, nos últimos meses, o CWI/CIT perdeu a maioria de seus membros na liderança do PCS. Enquanto se recusando a se juntar ao Partido Trabalhista, o Partido Socialista tem sido entusiástico no apoio ao reformista de esquerda trabalhista Jeremy Corbyn.

Durante 100 anos, os partidos de esquerda nos EUA se opuseram a ambos os partidos da burguesia. Em 2016, Socialist Alternative (a seção do CWI/CIT nos EUA) começou a apoiar a campanha de Bernie Sanders para ser o candidato presidencial do Partido Democrata, enquanto simultaneamente chamavam-no a concorrer fora do partido. Eles formaram o que eles chamaram de “Movement4Bernie”, argumentando que não estavam apoiando o candidato, mas o “movimento” ao redor dele, e carregavam banners com o slogan de Sander “We Need a political revolution”[Nós precisamos de uma revolução política]. Eles não fizeram senão as críticas mais suaves a Sanders que, entre outras coisas, consistentemente vota para custear os militares americanos. O “Bern Turn” da Socialist Alternative ganhou alguns novos recrutas, mas também afastou membros de longa data. No curso do racha do CWI/CIT, o SI começou a fazer críticas a torcida pró-Sanders. Mas até a seção dos EUA ir em oposição contra esta tendência, toda a liderança do CWI/CIT tinha vigorosamente apoiado essa posição, tanto internamento quanto externamente.

Esse apoio a políticos burgueses é parte do legado compartilhado de todas as organizações que se baseiam no legado de Ted Grant. A IMT/CMI, por exemplo, corretamente critica o CWI/CIT por apoiar Sanders – mas apenas alguns anos atrás eles eram apoiadores entusiasticos do presidente venezuelano Hugo Chávez e seu “Socialismo do século XXI”. O CWI/CIT, de sua parte, não apoia a Chávez mas apoia Sanders. Tanto o CWI/CIT quando a IMT/CMI concordam no apoio ao presidente de centro-esquerda do México, Andrés Manuel López Obrador.

As Teorias de Ted Grant

O conceito original de “entrismo sui generis” ou “entrismo profundo” formulado por Pablo era conspiratório. Nos anos 1950, quando os trotskistas entravam nas organizações stalinistas ou social-democratas eles se apresentavam como reformistas de esquerda, mas também mantinham organizações trotskistas secretas que defendiam suas verdadeiras ideias. Por exemplo, os trotskistas britânicos publicavam o reformista “Socialista Outlook” enquanto seu grupo era conhecido apenas como “The Club”.

Grant, por outro lado, construiu o “Militant” como uma organização única sem um centro trotskista secreto. Mas como uma organização poderia se considerar revolucionária e ficar dentro do Partido Trabalhista por décadas? Grant justificava isso revisando o conceito do Programa Transicional. Como foi desenvolvido no terceiro e quarto congressos da Terceira Internacional, e posteriormente completado por Leon Trotsky, um programa transicional “[parte] das condições de hoje e da consciência de amplas camadas da classe trabalhadora e indiferivelmente [leva] a uma conclusão final: a conquista do poder pelo proletariado”.

Para o CWI/CIT, em contraste, uma “demanda transicional” se refere a qualquer demanda que necessitasse uma luta para ser ganha dentro do capitalismo. Os programas do CWI/CIT invariavelmente consistem em demandas popular-reformistas, mas em quantidades muito maiores que nas versões apresentadas pelas burocracias reformistas. Essa lista é coroada com um chamado vago pelo “socialismo”. Elas nunca incluem uma palavra sobre a conquista do poder, i.e. sobre a necessidade histórica da classe trabalhadora de destruir o Estado burguês e criar um governo baseado em órgãos de poder operário. Grant assumiu que a consciência dos trabalhadores se radicalizaria de maneira mais ou menos automática com o desenvolvimento da luta de classes, eliminando a necessidade de propaganda revolucionária clara.

O conceito de Grant de programa chamava para um tipo de ambiguidade calculada, para que pudesse generosamente ser interpretado como revolucionário, mas sem ofender a sensibilidade dos reformistas. Ele aconselhou seus seguidores a se orientar para o que eles presumiam ser a consciência média da classe trabalhadora em qualquer momento, em vez da necessidade objetiva. É por isso que, por exemplo, o CWI/CIT rejeita a demanda socialista de fronteiras abertas, pois isso supostamente “assustaria” os trabalhadores. Trotsky enfatizava o completo oposto:

“Nós repetimos muitas vezes que o caráter científico de nossa atividade reside no fato de que nós adaptamos nosso programa não a conjuntura política ou aos pensamentos e humores das massas como eles está hoje, mas adaptamos nosso programa a situação objetiva como é representada pela estrutura econômica de classes da sociedade. A mentalidade pode ser retrógrada; então a tarefa política do partido é trazer a mentalidade em harmonia com os fatos objetivos, fazer os trabalhadores entenderem a tarefa objetiva. Mas não podemos adaptar nosso programa a mentalidade retrógrada dos trabalhadores, a mentalidade, o humor é um fator secundário - o fator primário é a situação objetiva (...) Esse programa é um programa científico. Se baseia na análise objetiva da situação objetiva. Não pode ser compreendido por todos os trabalhadores”.

Ted Grant postulou ainda uma “lei histórica” que sempre que os trabalhadores se radicalizam, eles iriam, pelo menos inicialmente, ir para as “organizações tradicionais”. É por isso que eles acreditavam que os trotskistas sempre deviam estar dentro de partidos reformistas de massa. Certamente existem vários exemplos históricos de trabalhadores radicalizados se juntando a partidos reformistas de massa em grandes números. Mas situações revolucionárias desde 1945 mostraram muito mais exemplos na qual a radicalização ocorreu fora destes partidos. Para dar apenas um exemplo, foi precisamente o fato que os trotskistas da Alemanha Ocidental estavam enterrados na social-democracia em 1968 que fez com que eles perdessem a fase mais importante de radicalização da juventude.

Uma coisa similar aconteceu com o “Militant”: ainda que tivesse tido um papel de liderança no movimento contra o Poll Tax em 1990, ele não conseguia recrutar, visto que os melhores ativistas contra Thatcher não queriam se juntar ao Partido Trabalhista. Agora estamos vendo como o fenômeno neo-reformista, como Syriza e Podemos, estão emergindo como novas organizações fora e opostas à social-democracia. Grant tomou um momento tático que pode ser aplicado temporariamente em situações específicas e transformou em uma “lei”. A contribuição de Grant ao Marxismo então cai em grande parte na categoria de justificação por adaptações de longo prazo a social-democracia.

Classe vs Identidade

O debate que dividiu o CWI/CIT é parcialmente um reflexo de um debate mais amplo que rompeu a esquerda internacional: a relação entre classe e identidade. Social-democratas (representados nos EUA por Bernie Sanders, a liderança do D.S.A., Jacobin etc) não põem prioridade em questões de opressão. Ao invés disso, eles focam em “demandas universais” que beneficiariam todos os trabalhadores, assumindo que isso seria um grande passo para resolver o problema do machismo, racismo, da opressão LGBTQ+, etc. Se opondo a isso, existe uma tendência liberal-radical que foca em políticas identitárias, vendo a exploração da classe trabalhadora como apenas mais um elemento em uma teia infinitamente complexa de diferentes formas de opressão.

As duas tendências do CWI/CIT refletem isso de forma distorcida. O IDWCTCWI representado o economicismo tradicional do CWI/CIT, secundarizando a luta das mulheres, minorias étnicas e pessoas LGBTQ+, confiantes que as lutas econômicas vão unificar toda a classe trabalhadora. Isso reflete os preconceitos das burocracias que vivem do movimento dos trabalhadores. O NFF, em contraste, tem uma orientação mais forte aos movimentos reais que estão acontecendo hoje. Mas assim como seus oponentes se adaptam as burocracias sindicais, o NFF tende a se adaptar a burocracia dos movimentos sociais (na forma de ONGs). Isso se refletiu na falha de ROSA de chamar por aborto legal, seguro e gratuito e a qualquer momento. Sentindo que isso seria avançado demais para o movimento existente, [limitaram sua reivindicação ao direito ao aborto nas primeiras 12 semanas de gravidez=> https://weeklyworker.co.uk/worker/1243/another-round-of-splits/].

Apesar de suas diferenças, os dois lados incorporam o método fundamental de Ted Grant: se adaptar as burocracias existentes e se posicionar levemente a esquerda do que eles consideram a “consciência das massas”, cuidadosos para não dizer nada que possa ofender setores mais retrógrados. A diferença que levou ao racha do CWI/CIT é fundamentalmente sobre qual burocracia se adaptar: aquela dos antigos sindicatos social-democratas ou a dos novos movimentos sociais. Então, por um lado, as críticas que cada tendência levanta sobre a outra são corretas.

Existe uma maneira de resolver esta difícil questão? Nós achamos que o trotskismo tem uma solução. Lutas contra as opressões não dividem a classe trabalhadora. Na realidade, é a opressão que nos divide. Lutas contra todas as formas de opressão são necessárias para unir a classe trabalhadora na nossa luta contra os capitalistas. Mas isso não pode ser feito de uma maneira isolada. Os revolucionários devem estar na linha de frente das lutas anti-racistas, feministas e LGBTs, enquanto lutam para que esses movimentos se orientem em direção a classe trabalhadora.

A luta pela hegemonia proletária em todos os movimentos contra a opressão precisa de uma base material. Não pode ser em aliança com as burocracias sindicais ou a burocracia das ONGs – na verdade, ela demanda correntes revolucionárias independentes no interior do movimento dos trabalhadores e em todos os movimentos sociais. É verdade que o trabalho no novo movimento de mulheres cria enormes pressões em organizações revolucionárias - tanto quanto o trabalho em sindicatos ou trabalho em qualquer outro movimento. O ponto de partida para resistir a essas pressões só pode ser uma fração trotskista que entenda as tarefas objetivas do movimento.

O Momento do Trotskismo

Ted Grant se apresentou como o “fio de continuidade” de Trotsky, Lênin, Marx e Engels. Na realidade, seu legado representa a degeneração centrista da IV Internacional depois da Segunda Guerra Mundial.
Neste momento existem pelo menos cinco tendências que se baseiam no legado de Grant:

1. O IDWCTCWI (CWI/CIT reconstituído)
2. O NFF (a maioria do CWI/CIT)
3. A IMT/CMI, formada depois que Grant rompeu com o CWI/CIT em 1992
4. Izquierda Revolucionária, que rompeu com a IMT/CMI em 2009, depois se juntou ao CWI/CIT e agora rompeu de novo
5. Os rachas do CWI/CIT, Reform and Revolution nos EUA e Lernen im Kampf na Alemanha.

Muitos oponentes do trotskismo irão rir, alguns camaradas irão desacreditar de seu objetivo revolucionário, e há grande risco de que ambos os lados do antigo CWI/CIT se afastem ainda mais de uma política de independência de classe. Mas no contexto da atual crise histórica do capitalismo, nós acreditamos que o programa do trotskismo é mais relevante que nunca.

A experiência da Frente de Esquerda e dos Trabalhadores (FIT na sigla em espanhol) na Argentina mostra que é possível atingir uma audiência de massa com um programa abertamente revolucionário. Não há necessidade histórica dos revolucionários se organizarem dentro de partidos reformistas ou com um programa que separe reforma e revolução.

Existem oportunidades reais para frações independentes revolucionárias no movimento dos trabalhadores e nos movimentos sociais. Para dar dois exemplos:
1. Trabalhadores trotskistas na gráfica Madygraf organizaram protestos em defesa de dos direitos de um colega trans, o que foi parte de um processo que incluiu greves, uma ocupação e produção sob controle operário.
2. Mulheres trotskistas, organizadas no movimento internacional de mulheres feministas e socialista Pão e Rosas, lutam por greves feministas para mobilizar toda a classe trabalhadora, incluindo colegas homens.
Essa é a base de nossa proposta de construir um Movimento por uma Internacional da Revolução Socialista. Para nós, isso significa refundar a IV Internacional com seu programa histórico. Com nossas forças humildes à disposição, nós queremos reagrupar os trotskistas em um novo projeto internacional. Na nossa opinião, é a única saída progressista para a crise do CWI/CIT.

Notas

[1] O SU provavelmente tem mais membros que o CWI/CIT, mas não possui qualquer tipo de política comum. Se se for considerar apenas tendências de tradição trotskista com algum tipo de liderança política central, então o CWI/CIT talvez tenha sido o maior. Os documentos das duas tendências, no entanto, revelam que todos os grupos do CWI/CIT são menores do que eles alegam. A seção britânica (o Partido Socialista) alega ter “mais de 2 mil membros” mas apenas 300 participaram dos debates recentes.

[2] Relatos da crise do CWI/CIT tem sido dados por Paul Demarty no jornal britânico “Weekly Worker” desde março deste ano

[3] Em “Opressão das mulheres e lutas identitárias - nossa abordagem na Irlanda e internacionalmente”, que fazem partes de documentos internos, o IDWCTCWI escreveu :
“Em 2018, todas as reuniões públicas mensais divulgadas no Facebook do Partido Socialista da Irlanda era relacionado a opressão das mulheres ou LGBTQ+ ... nós achamos que isso está indo longe demais. Existe um risco que ... algumas camadas de trabalhadores - que não percebam essa pauta como central – achem que nossa organização “não é para eles” ’
Semanas antes de qualquer lado admitir as diferenças, o Partido Socialista na Irlanda defendeu um slogan feminista-socialista enquanto o SI publicou uma crítica
[4] Militant International Review, 22, junho 1982.

[5] Ted Grant, “The Falklands Crisis – A Socialist Answer,” Militant, maio 1982.

[6] A tendência Militante escreveu em um panfleto de 1976:
“ ‘a liberação gay’ pertence a esfera das relações pessoais. É necessário manter um senso de proporção. Alguns diletantes, notavelmente no NUS, exploraram o valor diversionário dessa questão para desviar a atenção de questões mais importante que causa embaraço político neles. Socialistas sérios reconhecerão que a ‘liberação gay’ não pode providenciar a menor base social para uma contribuição independente ao movimento dos trabalhadores. As várias teorias exóticas e argumentos emotivos que as vezes são postos para provar o contrário são apenas sintomas da profunda confusão e falta de perspectiva que ainda reina na política puramente estudantil.”
Ver também: Colin Lloyd and Richard Brenner, ”Militant After Grant: The Unbroken Thread?”, Permanent Revolution 10.

[7] Peter Taaffe and Tony Mulhearn, Liverpool: The CWI/CITy that Dared to Fight (Londres 1988). CWI/CIT citado em: ibid.

[8] O CWI/CIT continua tendo um número enorme de liberados. O IDWCTCWI alega que o PS irlandês tem 27 liberados por 100 membros, enquanto o NFF responde que o SP britânico tem 50 liberados enquanto apenas 300 membros são verdadeiramente ativos na organização.

Original: https://www.leftvoice.org/the-split-in-the-cwi-lessons-for-trotskyists




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