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O degelo do PT abre espaço para batalhar por uma esquerda revolucionária e socialista

André Barbieri São Paulo | @AcierAndy

segunda-feira 31 de outubro de 2016 | Edição do dia

O PT se confirma como o grande derrotado nas eleições municipais de 2016. Todos os dados mostram um derretimento em regra da sigla. De 638 prefeituras conquistadas em 2012, ficou com apenas 256, uma queda de 59,4%. De 11.243.382 eleitores sob governos petistas, passou-se para 1.678.479. O PT governa apenas uma capital (Rio Branco/AC), e pela primeira vez desde 1982 o PT não elegeu nenhum prefeito na região do ABC paulista, berço do partido na década de 80.

Essa derrota histórica coloca a necessidade de “tirar de cima” a poeirenta teoria do “mal menor” (que sempre implica em uma adaptação à falta de independência de classe na esquerda, caminho certo para o mal maior) e assimilarmos todas as conclusões necessárias desta experiência petista.

Depois de oito anos de gestão petista com Luiz Marinho, pupilo de Lula, os tucanos saíram vencedores em São Bernardo do Campo. Em Santo André, o PSDB esmagou o PT com mais de 80% dos votos válidos.

Na região nordeste, onde o PT ainda retinha alguma força, a derrota não foi menor: perdeu 113 prefeituras. Tendo perdido o segundo turno no Recife para o PSB e a cidade de Vitória da Conquista/BA para o PMDB, o PT não governará nenhuma das 17 cidades com mais de 200 mil eleitores na região. A Bahia é ainda o estado da região com mais prefeitos petistas, com 39 – queda de 58% em relação a 2012. O único estado onde houve crescimento foi o Piauí, com 38 prefeitos. Os dois Estados, além do Ceará, são governados por petistas.

A derrota eleitoral do PT é inseparável da passividade desse partido frente ao golpe institucional de uma direita que se viu fortalecida pelos governos Lula e Dilma, e também da paralisia da burocracia sindical petista frente aos ataques do governo Temer.

Assimilando toda a corrupção própria dos governos capitalistas e bloqueando com sua influência qualquer mobilização independente dos trabalhadores, o PT foi identificado por muitos a qualquer partido fisiológico da direita: perdeu 102 prefeituras para PMDB, 96 para PSDB, 47 para o PP, 44 para o PSD e 36 para o DEM. O PSC de Bolsonaro arrebatou 12 prefeituras aos petistas.

A direita se aproveitou do degelo petista. Com vitória em 29 das 93 cidades do país com mais de 200 mil eleitores, prefeitos tucanos vão administrar municípios que somam 23,7% da população brasileira. A base aliada dos golpista Temer emplacou mais de 4000 municípios.

Entretanto, este avanço da direita não é mérito de sua força política, altamente fragmentada, e sim é fruto da decadência do PT e do discurso da “antipolítica”, que capitalizou a crise de representatividade nas principais capitais.

Mostra de que não se alterou a relação de força entre as classes e o caminho para uma esquerda operária e socialista está aberto.

Grandes dificuldades no degelo petista

Esta derrota eleitoral acachapante coloca em grande dificuldade mesmo o projeto imediato do PT de preparar a candidatura de Lula para 2018, desviando burocraticamente as expressões de resistência aos ataques de Temer, principalmente nas ocupações de escolas e universidades, para seus objetivos eleitorais. A perda do nordeste evidencia que mesmo a estratégia concentrada de Lula de viajar pela região não surtiu o efeito de contenção da crise que esperava.

Lula já chegou a cogitar o nome de Ciro Gomes para encabeçar uma chamada “Frente Ampla”, uma confederação de organizações e partidos inspirado no Uruguai, que congrega desde setores mais à esquerda até setores burgueses como o PSB e o PDT, que impediria o surgimento de uma alternativa de esquerda independente do PT. Esta formação uruguaia aplicou no governo o mesmo programa de conciliação de classes enraizado no DNA petista, com privatizações, ataques aos trabalhadores e parcerias com empresários.

Os problemas internos também aumentam. Deputados petistas iniciaram a briga pelos recursos do fundo partidário pensando as eleições de 2018, em cujo pleito grande parte poderá ter deixado o PT. Para tentar costurar as fissuras, Lula convocou para o dia 7 uma reunião com as duas bancadas do PT no Congresso Nacional, em que se discutirá a “nova vida” como oposição em frangalhos, o rearranjo das correntes internas e inclusive a mudança de nome da sigla. Passam longe até mesmo da sombra da luta de classes e dos conflitos ao redor dos ataques de Temer a educação.

Fingindo não acusar o golpe recebido, as burocracias sindicais da CUT e da CTB brilham no esplendor da paralisia. Convocam uma jornada nacional de luta no próximo dia 11 nos mesmos moldes do que vieram fazendo durante o golpe institucional: nenhum chamado a assembléias de base para que os trabalhadores decidam seus métodos de luta. A intenção é que se constitua em outra medida burocraticamente isolada que não estimule a vontade de luta dos trabalhadores, e separá-los da luta da juventude. A trégua com Temer e as patronais está a serviço de não colocar em risco seus privilégios sindicais, no marco da estratégia da burocracia de centrar seu discurso na preparação do “Lula 2018”.

Entretanto, os resultados eleitorais são um sinal de alerta à burocracia sindical petista: a perda de influência política pode em pouco tempo se traduzir em declínio da capacidade de contenção e controle das lutas, o que já vem ocorrendo desde o início do ano.

Uma esquerda operária e socialista, que desafie o capitalismo, é a lição do fracasso petista

Ao contrário de todas as alternativas embaralhadas para fazer o PT voltar a respirar sem aparelhos, uma eventual recomposição petista significaria reviver um cadáver estratégico. Inexistem as condições econômicas mundiais que permitiram ao PT estabilizar na década anterior uma política de conciliação de classes com mega-lucros aos empresários e algumas concessões à população.

Uma Frente Ampla, além de não apresentar nenhuma novidade, é um exemplo difícil de se repetir no Brasil em meio a enorme crise de representatividade. Para nós, marxistas revolucionários, a possibilidade de qualquer frente de esquerda com independência de classe exige ser constituída sem o PT (e o PCdoB) e contra ele. Na Argentina, existe o exemplo da Frente de Esquerda e dos Trabalhadores – composta pelo PTS, o PO e outras organizações que reivindicam o trotskismo – que emergiu como alternativa política independente da direita porque se delimitou taxativamente do kirchnerismo e da estratégia de colaboração de classes de todo o "progressismo latinoamericano", inclusive o petismo e o chavismo (além dos neoreformismos europeus Syriza e Podemos) para constituir uma frente de independência dos trabalhadores.

É preciso tirar lições das imensas derrotas do PT e não repetir seu caminho de conciliação com os empresários como Freixo buscou fazer no Rio, e mais ainda não repetir a conciliação com os partidos patronais como fez o PSOL se coligando com partidos burgueses em Belém e Porto Alegre. Podemos e devemos ver na crise de representatividade, nas ações da juventude e nos resultados no Rio uma oportunidade para batalhar por um programa e uma força anticapitalista, revolucionária e socialista.

O fortalecimento da direita teve um contraponto no Rio de Janeiro: mais de um milhão de pessoas mostraram querer resistir aos ataques de Temer. Jovens em muitos estados ocupam suas escolas, e alguns setores do funcionalismo começam a cruzar os braços contra a PEC 241. A organização dessa resistência, exigindo à CUT e CTB que rompam sua subordinação ao PT e convoquem uma luta séria, é a base para a construção de uma esquerda classista e revolucionária, que seja uma verdadeira alternativa ao petismo e não uma nova roupa para um velho projeto que já mostrou seus limites.

É a serviço dessa perspectiva que o Esquerda Diário e o MRT vem batalhando.




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