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O Partido Comunista do Chile e a conciliação de classes

A adaptação aos setores do regime vem levando o Partido Comunista do Chile a se diluir cada vez mais no reformismo, expresso em seu pré-candidato à presidência Daniel Jadue que acena cada vez mais que a radicalidade não terá lugar em seus discursos.

quinta-feira 3 de junho de 2021 | Edição do dia

O PCB em seu site e nas redes de suas figuras vêm demonstrando bastante entusiasmo com o Partido Comunista do Chile (PCCh), comemoram o resultado da Convenção Constitucional, que de fato no ponto de vista das urnas foi uma derrota para a direita e os partidos tradicionais, mas sem se atentar aos detalhes que levaram tanto a uma Constituinte que não é livre, nem soberana, quanto da própria atuação do PCCh, acenando cada vez mais ao reformismo.

Mas como chegamos nessa Convenção Constituinte? Ela é fruto da mobilização da classe trabalhadora chilena que se expressou nas revoltas de 2019, ao mesmo tempo que é a válvula de contenção: a Constituinte foi uma armadilha encontrada pelo Governo de Piñera e o conjunto do regime para canalizar institucionalmente o ódio das ruas. Não se trata de negar a importância de uma nova Constituinte que limpasse todos os resquícios de Pinochet na sociedade chilena, mas sim de apontar os grandes limites dessa frente a essa árdua tarefa. Além disso, por mais que uma Assembleia Constituinte Livre e Soberana não extinguiria automaticamente os traços de Pinochet em todo o regime, ao menos permitiria aos trabalhadores a partir do choque entre as classes, numa constituinte no limite da democracia burguesa, fazer experiência, avançar subjetivamente e com auxílio de um partido revolucionário, caminhar rumo a um Governo dos trabalhadores de rupturas com o capitalismo.

Enquanto a população mostrava sua disposição de seguir nas ruas e continuar a greve geral, os partidos reformistas sentavam na mesa de negociação do Governo Piñera. A Frente Ampla (bloco de partidos de esquerda) e o Partido Comunista do Chile (que saíram pela mesma ‘lista’ nas últimas eleições) cumpriram um papel central para o regime nesse momento: A Frente Ampla (FA) de maneira mais frontal ao embarcar em leis propostas pelo Governo que endureciam a repressão aos manifestantes, ao travar acordos “pela paz” e aceitar a constituinte cheia de limites proposta por Piñera. Apesar de não ter assinado o acordo pela constituinte, o PCCh que dirige a CUT, maior central sindical do país, no calor das revoltas freou a greve geral de 12 de Novembro de 2019 que poderia seguir, possivelmente resultando na queda de Piñera, ajudando na trégua. Na verdade, a própria greve da maneira que aconteceu já foi uma imposição da radicalidade das ruas porque, para 30 de Outubro de 2019, o PCCh propôs uma paralisação nacional na qual todos ficassem em suas casas ao invés de ocupar as ruas e se limitasse a não levantar a consigna pelo “Fora Piñera”. A constituinte convocada expressava diversos limites, além de preservar os Poderes Estatais e a autonomia das Instituições da maneira que estão (muitas tão herdeiras do Pinochetismo quanto a própria constituição) e a necessidade de ⅔ de aprovação para passar alguma lei (que só não permitirá a Direita barrar qualquer aspecto mais progressista pela sua própria debilidade em conseguir votos), têm o grave fator de manter os presos políticos da revolta na cadeia.

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Após o resultado das eleições constituintes, o tom minimamente cético PCB quanto à conjuntura na qual a constituinte foi instaurada, deu lugar à empolgação pelos resultados do PCCh, obviamente sem apontar seus limites estratégicos. Sobre os presos políticos, o pré-candidato do partido Daniel Jadue fez “pedidos” (não saiu do campo das palavras) à Piñera para que os liberasse se quisesse recuperar sua credibilidade ao invés de pressionar coordenando os milhares de trabalhadores que dirigem pela CUT e de fazer pressão pública muito mais enérgica com seus parlamentares, que agora participam de uma constituinte na qual muitos civis que lutaram por, não estão em liberdade para ver. Mais que isso, em Março de 2021, Jadue em um programa de TV, declarou que Mauricio Hernández Norambuena, guerrilheiro da Frente Patriótica Manuel Rodríguez que combatia a Ditadura de Pinochet, não era um preso político, pois seus crimes eram violências políticas e que o partido condenava sua atitude. Ou seja, os presos políticos que praticaram alguma ação direta pelo conjunto da classe trabalhadora devem ser punidos? Não merecem indulto? Para Jadue e o PCCh, parece que não.

Jadue nesse sentido, vêm adotando um discurso cada vez mais institucionalizado em nome da unidade das esquerdas e dos progressistas a todo custo. Por isso, vêm se aproximando do Partido Socialista, que administrou o Chile em 3 das 6 vezes nos últimos 30 anos e passou ataques seguindo a cartilha neoliberal, inclusive com a presença do PCCh na coligação do segundo Governo de Michelle Bachelet, que chegou a matar um mineiro durante uma greve. Num sentido ainda mais direitista, Jadue vem flertando com setores do grande empresariado chileno, o mesmo que lucrou décadas a custas da classe trabalhadora que se revoltou em 2019. Ainda que em seu site, o PCB ao citar o resultado ruim da direita, lembre do ”desastroso [...] resultado da outrora poderosa Democracia Cristã, que apenas contará com três dos 155 convencionais que compõem esse corpo”, Jadue parece caminhar na direção oposta, 5 dias depois da matéria do PCB, fez uma declaração sobre a Presidenta do Senado (da Democracia Cristã) no qual diz que "Não tenho dúvidas de que podemos chegar a acordos".

Por isso, desde o Partido dos Trabalhadores Revolucionários, partido irmão do MRT no Chile, batalhamos pela independência de classe, diferente do PCCh que vêm buscando apoio político, em nome de acabar com o regime pinochetista, com os mesmos setores que se beneficiaram e aprofundaram este regime, típico da tradição frente populista do Stalinismo, que busca “burguesias progressistas”. Nesse sentido, nas eleições atuamos em uma lista própria com bandeiras explicitamente revolucionárias, atingindo quase 50.000 votos no total. Em nosso diário no Chile fazemos campanhas pela libertação dos presos políticos, buscando impulsionar comitês de coordenação, diferente da linha de Jadue que pede em tom de favor a Piñera. Além disso, sempre apontamos os limites da constituinte de forma clara e explícita, que era um desvio institucional frente ao medo da rebelião, resolvido em um grande acordo entre os setores do regime que os chilenos estão chamando de "cocina". É preciso retomar o espírito da revolta de 2019 para exigir a libertação dos presos políticos e avançar no choque contra todo e qualquer resquício de Pinochet no Chile.




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