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Dia Latino-Americano e Caribenho pela legalização do aborto | O Estado laico no qual a igreja ainda mantém o controle dos nossos corpos

Desde aprovação da constituição de 1988 o Brasil é um Estado Laico, o que na teoria seria ter uma posição neutra no campo religioso, defendendo a liberdade religiosa a todos os seus cidadãos e não permitindo a interferência de correntes religiosas em matérias sociopolíticas e culturais. Contudo na prática o que vemos é cada vez mais a interferência da igreja nos governos, nas leis e na vida cotidiana de cada cidadão. Um controle permanente dos nossos corpos e mentes. Um exemplo disso é que até hoje milhares de mulheres continuam morrendo por realizar abortos clandestinos, já que as bancadas religiosas e conservadoras impedem o direito ao aborto.

Odete AssisMestranda em Literatura Brasileira na UFMG

segunda-feira 28 de setembro de 2015 | 00:01

A igreja, principalmente a igreja católica, esteve diretamente ligada com a formação do Estado brasileiro e com a classe dominante que o governa. Desde a colonização, com a presença dos jesuítas que vieram “educar” os povos indígenas no país, até os dias de hoje, onde observamos o poder das bancadas religiosas e conservadoras ao barrarem o debate de gênero e sexualidade nos planos nacionais e municipais de educação, é visível a influencia da religião naquilo que deveria ser um Estado laico.

As relações entre a Igreja e o Estado no Brasil

No período do Brasil Colônia e do Brasil Império (1500 a 1889), em decorrência da herança recebida de Portugal o catolicismo era a religião oficial do Estado Brasileiro. Em fevereiro de 1891, a primeira Constituição Republicana, com pleno assentimento da Igreja Católica, estabeleceu a separação entre Igreja e Estado. Durante a primeira República (1891 a 1930) e o primeiro período da era Vargas (1930 a 1945), as relações entre Igreja e Estado foram pautadas pelo respeito mútuo e pela cooperação em assuntos de interesse comum. O que na prática significava que a igreja opinava diretamente na política do Estado e nada que fosse além dos interesses dessa seria aprovado.

A igreja foi uma das maiores beneficiadas pela vigência da ditadura militar no Brasil. A falta de liberdade dos partidos políticos de esquerda abria caminho para a expansão da igreja e para que a doutrina religiosa fosse encarada como única esperança de salvação diante dos horrores da ditadura. Atualmente a influência da igreja nas políticas do estado ainda é muito forte. Em 2006 o acordo Brasil-Vaticano firmado pelo então presidente Lula e em vigor até hoje, dá a isenção fiscal para a Igreja Católica e estabelece o ensino religioso nas escolas.

A presidente Dilma, em nome do apoio das bancadas religiosas e conservadoras, se cala diante das milhares de mulheres mortas por abortos clandestinos no país. Foi em seu mandado que o reacionário Marco Feliciano, autor de projetos como “Cura Gay” e o “Estatuto do Nascituro”, assumiu a presidência da Comissão de Direitos Humanos. E que diversos outros representantes da bancada religiosa, que constituíam a base aliada de seu governo como Cunha e Bolsonaro, ganharam mais espaço no congresso.

Atualmente, além da retirada do debate de gênero e sexualidade nas escolas, tramita no congresso algumas leis que demonstram a interferência direta da ideologia religiosa no Estado, como o PL 5069/2013 de autoria de Eduardo Cunha, que prevê o aumento de penas para quem faz ou realiza um aborto e o recém aprovado PL 6583-13 que define família como uma união exclusivamente entre homem e mulher.

O Papa cúmplice da ditadura Argentina e a influência de sua igreja em nossas vidas

A igreja católica e seu representante máximo o Papa Francisco, tentam passar uma imagem de benevolência e preocupação com as pessoas, longe de querermos questionar a fé religiosa das mulheres e da população, o que queremos é demonstrar todas as contradições do discurso religioso e como a influência da igreja impede que o Estado seja realmente laico. Em sua recente visita aos EUA o Papa Francisco mostrou seu apoio à agenda política do governo e sua aliança com o Barack Obama, presidente da maior potência imperialista do mundo.

Durante a ditadura militar argentina, uma das mais sangrentas ditaduras da história, o hoje Papa Francisco militou numa organização de direita chamada Guarda de Ferro e manteve estreitas ligações com os generais da ditadura, responsáveis pela morte de mais de 30 mil pessoas e o roubo de milhares de crianças filhos dos militantes de esquerda. Após a ditadura, ele colocou-se contra a anulação das leis de impunidade defendendo a reconciliação com esses mesmos generais.

Em 2013, Francisco colocou-se contra a Lei de Matrimônio Igualitário na Argentina, dizendo que era “uma guerra de Deus” contra “uma movimentação do diabo”, além de censurar toda a possibilidade de educação sexual nas escolas e políticas de saúde reprodutiva. Assim como aqui no Brasil a Igreja Católica foi uma das responsáveis por barrar distribuição do Kit Anti-homofobia nas escolas e em contraposição distribuiu mais de 70 mil cartilhas contra o casamento igualitário LGBT, contra o direito a adoção de crianças por casais homoafetivos e contra o direito ao aborto.
O papel da igreja na criminalização do aborto

Hoje a Igreja Católica juntamente com outras igrejas são responsáveis diretas pela criminalização do aborto e pelas milhares de mulheres mortas em decorrência de procedimentos clandestinos. Quase 1 milhão de mulheres realizam abortos clandestinos no Brasil. Ao mesmo tempo em que o Estado, governos e patrões em aliança com as Igrejas, impõem as mulheres o destino da maternidade, não garantem este direito, como podemos ver através dos cortes e ajustes de Dilma que afetam primeiramente as mulheres.

O aborto clandestino é uma verdadeira prática de tortura contra as mulheres e ao contrário do que dizem não se trata de método anticonceptivo, mas da possibilidade de decidir sobre seu próprio corpo e não morrer. Como dizia Leon Trotsky, dirigente da Revolução Russa, o aborto é um triste direito.

A ideologia cristã que considera que o papel fundamental da mulher é a sua capacidade biológica de reprodução está intimamente relacionada com a criminalização do aborto. É ela que dá base à opressão das mulheres e sustenta esse sistema de opressão e exploração onde mulheres, LGBT e negros são super explorados e discriminados cotidianamente. Por isso atacam o direito da livre escolha da sexualidade e o direito de decidir sobre o próprio corpo, tratando como vida um embrião e não tratando da vida das mulheres que são estupradas, violentadas e morrem todos os dias na clandestinidade do aborto.

Organizar nas ruas a luta pelo direito ao aborte e por um Estado realmente laico
Apesar do Brasil ser considerado um estado laico, a ideologia cristã e a igreja ainda possuem enorme influencia em nossos corpos e mentes. Seja por meio de leis como o Estatuto do Nascituro, Estatuto da Família (PL 6583-13), PL 5069/2013, por meio de seus representantes diretos no balcão de negócios da burguesia, como Eduardo Cunha, Bolsonaro, Feliciano e toda essa corja reacionária e conservadora ou por acordos firmados com os governantes, como os acordos estabelecidos por Lula e Dilma com o Vaticano.

Por isso mais do que nunca é o momento de erguermos um forte movimento que lute nas ruas em defesa dos direitos das mulheres, um forte movimento que arranque desse congresso a aprovação do PL pela legalização do direito ao aborto, por educação sexual nas escolas, distribuição gratuita de métodos anticoncepcionais e pela separação definitiva da Igreja e do Estado. Para deixarmos bem claro que não aceitaremos mais que a igreja e o Estado controle nossos corpos e mentes.




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