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UNICAMP | “Mãe solo, tenho tido imensas dificuldades para realizar as aulas à distância”

As dificuldades das aulas à distância são imensas para as mães, que se encontram numa situação na qual seus filhos pararam de ir às escolas e demandam mais tempo e atenção. Na Unicamp o caso pode ser ainda mais difícil, pois estudantes bolsistas são obrigadas a manter um vínculo com a universidade, fazendo ao menos uma matéria, para receber. Veja o relato de Thauane, uma estudante mãe e bolsista, da Faculdade de Educação.

segunda-feira 4 de maio de 2020 | Edição do dia

Desde o dia 16 de março o reitor da Unicamp decidiu de forma autoritária sem consultar os estudantes que na pandemia do Coronavírus as aulas iriam seguir “normalmente” pela via online. A implementação desse modelo de educação reforça o caráter elitista da universidade, que além de excluir milhares de estudantes todos os anos com o vestibular, agora escancara que de acordo com a vontade da reitoria e da burguesia, esse espaço não é para estudantes mães, bolsistas, pobres, negros ou indígenas.

A implementação desse modelo abre espaço para a precarização do ensino. Além de ser excludente pois vários estudantes não têm acesso aos equipamentos necessários, ou tem uma internet precária que mal carrega vídeos como é a realidade na moradia estudantil, a educação à distância também afeta o processo de aprendizagem. Isso se agrava na pandemia, na qual encontramos uma série de outros problemas tanto psicológicos como objetivos, visto que parentes, amigos e pessoas próximas podem começar a adoecer.

Esse contexto aprofunda as dificuldades para as mulheres, que por um reflexo estrutural da sociedade machista muitas vezes têm que cuidar sozinhas de seus filhos, que na pandemia estão sem ir às escolas e tendo que estudar à distância, o que impõe para as mães um trabalho extra. Trancar o semestre poderia ser a única saída, apesar de muito desigual pois colocaria essas estudantes a lidar sozinhas com as dificuldades. Mas na Unicamp nem isso é uma opção, visto que a reitoria mais uma vez mostrando seu caráter excludente obrigou estudantes bolsistas a terem que realizar ao menos uma matéria para receber a bolsa.

Veja o relato de como isso está sendo para Thauane Nunes, estudante do curso de Pedagogia da Unicamp, mãe e bolsista:

“Sou graduanda de pedagogia na Unicamp, ingressante 2019, enfrentei muitos desafios no meu ano de caloura mas não imaginava que meu maior desafio viria no ano seguinte. Com a saúde da população em cheque devido ao covid-19, seguindo as recomendações da OMS a unicamp aderiu ao isolamento social. Embora ele preserve nossa saúde física, já não preserva tanto nossa saúde mental. Sou aluna bolsista BAS e o anúncio das aulas EAD tomou conta e somou as preocupações.

Mãe solo, de uma garota de 9 anos, tenho tido imensas dificuldades para realizar as aulas a distância. Além do baixo aproveitamento de conteúdo, enfrento diversas dificuldades para acompanhar minhas aulas.

Mesmo com o empréstimo dos equipamentos, o que de certa forma diminui o problema, mas não o finda, questões diárias de rotina interferem na efetividade do aprendizado. Como dar conta da casa, da rotina escolar da minha filha e ainda estudar todos os conteúdos que os professores nos mandam? a realidade de cada um não foi analisada, não foi pensando em algo coletivo que pudesse ajudar a todos sem exceção.

Uma coisa é uma menina, com seus 17/18 anos, sem filhos, sem responsabilidades domésticas e outra bem diferente é nós mães solo que mal temos tempo de sentar em frente ao computador, pois com o isolamento social outras demandas surgem dentro da casa da gente.

Nós bolsistas não pudemos perder vínculo com a universidade, isto é, não pudemos trancar todas as disciplinas pois deste modo perderíamos a bolsa. O que mantém a mim e muitos outros estudantes na unicamp.

Realizar pequenas tarefas como ler, assistir filmes e colocar em dia as tarefas da única disciplina que me matriculei, tem sido uma luta diária. Levando em consideração, que além de todos os trabalhos com a disciplina, eu como bolsista ainda estou realizando as tarefas do projeto ao qual estou vinculada.

Eu sempre utilizei o laboratório de informática para realizar meus trabalhos, e atividades do projeto, o ensino a distância me tirou essa comodidade. Mãe de uma aluna do ensino fundamental, preciso dividir o único acesso à internet com ela e ainda ensiná-la, apesar de pequena ela já compreendeu e sentiu como é difícil estar longe da sala de aula.

Infelizmente a decisão da reitoria obrigou os alunos a fazer uma escolha, com muita tristeza eu usei o critério de “eliminação” para escolher em qual matéria permanecer matriculada, muito triste e contribui de forma direta para sucateamento da formação.”

Não podemos ignorar o absurdo que é essa situação à qual diversos estudantes estão passando na Unicamp e em outras Universidades. Somos integralmente contra esse modelo de ensino que precariza a educação e exclui estudantes. Chamamos todos os centros acadêmicos, o Diretório Central dos Estudantes da Unicamp (DCE) e a UNE a se colocarem também frontalmente contra esse projeto, se ligando às demandas das mães e dos estudantes mais pobres, negros e indígenas.




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