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Leninismo do século XXI: Esquerda Diário em nova etapa, a luta de classes na sua mão

Mateus Torres

Leninismo do século XXI: Esquerda Diário em nova etapa, a luta de classes na sua mão

Mateus Torres

“A luta de classes na sua mão” é uma síntese de múltiplos aspectos teóricos, políticos e estratégicos da concepção de mundo e da estratégia marxista, do papel de uma imprensa ou mídia revolucionária em geral, dos desafios que estão postos na atual situação internacional e brasileira em particular, mas também um chamado a cada seguidor de cada uma das iniciativas multimídia do Esquerda Diário a dar um passo à frente como sujeito da história construindo conosco uma Comunidade com milhares em todo o país.

Uma mídia leninista que coloca a luta de classes na sua mão

A Rede Internacional do Esquerda Diário, que surgiu em 2015 e está em 14 países e 7 idiomas, foi uma iniciativa inspirada na tradição marxista como atualização de um leninismo para o século XXI. Desde o começo, apostávamos que poderia ser mais do que um jornal que servisse para os militantes do MRT e da Fração Trotskista nos diversos países, mas que pudesse também cumprir um papel como “ferramenta de combate” para setores de vanguarda.

Conquistamos esse lugar em setores de vanguarda da esquerda nacional e em diversos países através do conteúdo da nossa política, denúncias e nos ligando aos principais processos da luta de classes. No Brasil, o Esquerda Diário se torna conhecido na luta contra o golpe institucional, a Lava Jato e a ofensiva golpista que levou Bolsonaro ao governo. Na Argentina, somos um jornal que disputa com a grande imprensa a consciência de setores das massas, e o La Izquierda Diario é uma ferramenta utilizada organicamente pelos trabalhadores em cada luta. Também ganhamos peso na França e no Chile com nossos jornais diários a partir dos processos da luta de classes intensos que vem ocorrendo nesses países, ao ponto de na França o Revolution Permanent (nome do nosso site) ser tema de jornais burgueses.

Uma das diferenças do Esquerda Diário em relação às demais imprensas no Brasil é justamente que colocamos a luta de classes na sua mão, confiando na força da classe trabalhadora e dos setores oprimidos. Ou seja, somos uma mídia que não encara seus seguidores como um público passivo, mas como um potencial sujeito na luta de classes. Não somos uma imprensa “de gabinete”, somos trabalhadores e jovens que estão em cada canto do país, sem nenhum financiamento de governos ou empresários, e nos conectamos com as lutas, colocando o Esquerda Diário como ferramentas delas. Fazemos uma ampla cobertura de cada processo de luta no Brasil, trazendo a luta de classes na sua mão, com tudo que os poderosos escondem.

A imprensa sempre foi um dos fatores que compõem a “espinha dorsal” de uma organização coletiva de combate para a luta de classes. Não pode existir partido político que aposte em sujeitos coletivos na luta de classes, que não hierarquize o papel de um jornal. Desde os primeiros panfletos e jornais dos sindicatos e partidos no início da história do movimento operário, o jornal ocupou um lugar central, mas Lenin teorizou sobre esse tema e o elevou a uma escala superior.

Em uma de suas obras clássicas, O Que Fazer?, de 1902, Lenin teoriza sobre o papel do Iskra (Faísca, na tradução em português, nome do jornal daquele momento do partido), como organizador coletivo da classe trabalhadora russa no combate contra a autocracia, como instrumento para seus militantes atuarem como “tribunos do povo” e construírem uma organização nacional forjada em bases a concepções marxistas revolucionárias.

Nesse livro, Lênin define que o “tribuno do povo” é aquele “capaz de reagir contra qualquer manifestação de arbitrariedade e de opressão, seja onde ela for produzida e qualquer que seja o setor ou classe social que afete; é aquele capaz de generalizar todos estes fatos e oferecer um quadro único da brutalidade policial e da exploração capitalista; capaz de aproveitar o menor detalhe para expor frente a todos as suas convicções socialistas e suas reivindicações democráticas, para explicar a todos a importância histórica mundial da luta emancipadora do proletariado”.

No livro Estratégia Socialista e Arte Militar, elaborado por Emilio Albamonte e Matias Maiello, dirigentes da nossa corrente internacional, a Fração Trotskista, definimos que essa atuação como “tribunos do povo” “se trata da condição política necessária para que o partido revolucionário da classe operária possa articular em torno de si os maiores volumes de força necessários para a revolução não só nas fileiras do proletariado (independência política), mas também entre seus aliados (hegemonia) (...) ‘tribuno do povo’ era sobretudo um conceito de combate (...) assim como o conceito de ‘escola de guerra’ permite aproveitar os acontecimentos da luta de classes para a preparação do partido para os combates físicos em momentos onde não há revolução, o conceito de ‘tribuno do povo’ cumpre um papel análogo em relação à preparação política do partido”.

Como definiu Emilio Albamonte, “queremos construir um partido de tribunos do povo”, ou seja, não se trata somente de algumas figuras públicas centrais serem “porta-vozes” da política do partido. Mas de cada militante no lugar onde atua individualmente, por um lado, e através do Esquerda Diário com elaborações que cada um de nós faz no Esquerda Diário, junto a colaboradores que não são militantes do MRT. Nossa concepção de jornal é ligada a uma convicção de que amplos setores da vanguarda dos trabalhadores, da juventude e setores oprimidos podem assumir essa perspectiva de colocar a luta de classes em suas mãos, começando por ser parte da Comunidade do Esquerda Diário que lançamos dia 15 de julho.

Outro elemento que trazemos como inspiração da tradição leninista, que é uma marca do jornal Pravda (A Verdade, na tradução para o português, que é o jornal do momento preparatório anterior à tomada do poder pelos bolcheviques), é o papel do jornal como organizador dos trabalhadores através das denúncias, distribuição e coletas financeiras. Trabalhadores de todo o país enviavam, em um certo momento, até 40 denúncias diárias de diferentes fábricas - endereçadas à reconhecida seção "informes de correspondentes" - e foram criados 327 grupos que apoiaram financeiramente a impressão do Pravda através de coletas coletivas. O Esquerda Diário e toda nossa Rede Internacional batalha para ser um instrumento como esse e vem dando vários exemplos nesse sentido, sempre colocando a luta de classes na sua mão.

Ainda em “O Que Fazer”, Lenin definia: “O jornal não é só um propagandista e um agitador coletivo, é também um organizador coletivo (...) pode ser comparado com os andaimes que são levantados ao redor de um edifício em construção, que assinala seus contornos, facilitam a comunicação entre os diferentes operários, ajuda-lhes a distribuírem o trabalho e a observar os resultados gerais alcançados pelo seu trabalho organizado”. Nós buscamos construir esse “andaime” com as atualizações do que isso significa para o século XXI, utilizando as distintas plataformas e redes sociais que permitem conectar trabalhadores de todo o país e do mundo. Todas as iniciativas multimídia que avançam no Esquerda Diário vem para potencializar essa perspectiva, colocando a luta de classes na sua mão nas mais diversas formas e plataformas.

Você não vai encontrar outros partidos da esquerda nacional que construam um jornal que tenha esses fundamentos e objetivos, pois não partem dessa concepção leninista que vê cada leitor ou seguidor como potencial sujeito. Os setores da esquerda institucional, como o PSOL, que tem uma estratégia eleitoralista e não de combate na luta de classes, apostam em construir organizações ao redor de figuras parlamentares que fazem discursos adaptados à “miséria do possível” e não colocam o centro em organizar a classe trabalhadora para o combate. Por isso, sequer têm jornais como algo central na atividade partidária. Nessa concepção, a base dos partidos é pensada meramente como eleitores, similar ao PT. Nos sites como Brasil 247, Diário Centro do Mundo e uma ampla gama que está vinculado ao PT ou até ao “cirismo”, a Comunidade é meramente seguidora e pensada também como massa eleitoral. Há também organizações da tradição stalinista como o PCB e UP, que são incapazes de construir uma imprensa que tem centenas de milhares de alcances mensalmente e com um conteúdo e forma que permite que este público seja sujeito, pois têm uma lógica burocrática de partido ultra centralizada por alguns dirigentes e figuras públicas, onde os militantes e colaboradores não podem ser sujeitos da elaboração da política, sendo pensados como executores, receptores passivos ou distribuidores de um conteúdo elaborado por alguns poucos que determinam tudo no partido.

O Brasil depende da luta de classes na sua e em muitas mãos

Em um país marcado por elementos reacionários na situação desde 2015 como o Brasil, em especial em alguns estados e cidades onde as forças políticas e sociais conservadoras tem mais peso, pode parecer que a roda da história está travada ou girando para trás. É o que um indivíduo que vive numa região dominada pelas milícias no Rio de Janeiro ou onde os povos e territórios indígenas estão sob ataque pode pensar. É o que parece quando vemos um governo e cada uma das instituições do regime político sendo ocupadas por militares, que vão buscando ditar as regras da política nacional, disputando com outros “ditadores de toga”, que são juízes que também não foram eleitos por ninguém. Nas zonas de desenvolvimento do agronegócio, pesa o conservadorismo do campo combinado com a ilusão de ascensão social gradual em um país que seja uma “fazenda do mundo”.

Mas essas forças conservadoras não são onipotentes. Há uma desigualdade nos ritmos das consciências de cada setor da classe trabalhadora, de cada segmento da sociedade e cada região do país, bem como um processo de experiência com a extrema direita no poder por parte dos setores mais atrasados em sua consciência. Por exemplo, categorias de trabalhadores com maior tradição de luta e organização, como metroviários de São Paulo e petroleiros, resistem aos ataques com importantes demonstrações de força e se não conquistam vitórias categóricas é porque as direções do movimento de massas mantêm cada luta isolada. Também tivemos recentemente uma série de lutas por vacinas. Vão sendo retomados, depois de “anos frios”, as lutas de resistência. Esta recomposição das lutas não será um processo linear, evolutivo. Veremos movimentações convulsivas pela frente, como sempre se deu na história de todos os países, quando se desenvolvem profundas contradições que podem dar lugar a giros bruscos e processos intensos de luta de classes a qualquer momento.

Mas, se vemos a política das direções do movimento de massas, esta vai na contramão de se preparar para este cenário e trabalhar para seu desenvolvimento. Ao contrário, colocam todas as suas forças na ilusão de resolver problemas estruturais pela via das instituições e das eleições, como agora o PT quer na eleição de Lula em 2022, conciliando com golpistas e a direita “não bolsonarista”, esta que aprova todos os ataques do governo e ajudou a elegê-lo e a dar o golpe institucional. PT e PCdoB propagam ideologias como se processos de luta de classes ou de radicalização nas ruas fossem “provocar a direita”. Por isso, promovem a paralisia dos sindicatos e movimentos sociais.

É também por isso que queremos “a luta de classes na sua mão”: somente se os trabalhadores, a juventude e os que se indignam com essa situação assumem para si a tarefa de construir outro caminho, baseada numa estratégia da luta de classes tomada em suas mãos, será possível vencer.

Trazemos a luta de classes internacional na sua mão

Mas todo aquele que tenha uma visão crítica da realidade deve ter claro que o que vem acontecendo no Brasil foi e seguirá sendo impactado pelo que acontece internacionalmente. Assim como com Trump se fortaleceu Bolsonaro, a derrota do amo do norte também impacta negativamente, ainda que Biden esteja longe de ser qualquer aliado na luta contra o bolsonarismo, como há setores da esquerda que lamentavelmente querem convencer. Os ventos da luta de classes também vão entrando por todos os poros da sociedade, ainda que não tenham se expressado de forma concentrada e aberta. Não chegou ainda o momento de um salto de qualidade.

Mas como não lembrar do medo que todo o sistema político no Brasil ficou de contágio do levantamento do Black Lives Matter no Brasil? Da noite para o dia, era a burguesia e a imprensa sendo obrigadas a falar contra o racismo e a violência policial. Já são milhões de trabalhadores que estão vendo o fracasso do modelo de neoliberalismo autoritário chileno, inspiração de Paulo Guedes e do bolsonarismo. O que chega do Chile é uma rebelião popular em 2019 e uma nova Constituinte, que ainda que tenha sido orquestrada como desvio da rebelião para evitar um processo revolucionário mais profundo, coloca no imaginário de setores amplos de vanguarda no Brasil a luta de classes nas ruas e de que é possível ir além de meramente trocar os jogadores. Colômbia e Peru, que também eram países “modelo” do neoliberalismo selvagem como o Chile, estão também diante de revoltas populares. No final de 2017, tivemos dias em que amplos setores da classe trabalhadora brasileira seguiu a luta contra a Reforma da Previdência na Argentina como se fosse sua. A existência de uma forte esquerda trotskista na Argentina, com um partido como o PTS e a Frente de Esquerda e dos Trabalhadores (FITU), também é um exemplo para o Brasil. Ainda que o impacto não seja direto, cada processo de avanço de luta e organização do proletariado francês também impacta no Brasil, por isso viemos difundindo um importante processo de surgimento de uma nova organização proletária revolucionária de centenas de pessoas expulsas do Novo Partido Anticapitalista, o NPA, que é um partido parecido com o PSOL no Brasil que não quer ter em seu interior revolucionários que lutem pela independência de classe e atrapalhem seus acordos com reformistas nas eleições.

Esses impactos internacionais da luta de classes em cada país não são uma novidade histórica. A América do Sul inclusive é marcada por ciclos relativamente comuns entre diversos países de luta de classes. Foi assim na virada do século, onde tivemos jornadas revolucionárias na Argentina, Bolívia, Equador e outros países. Vieram os governos que chamamos de “pós-neoliberais” como desvios dessas revoltas, que aproveitaram o boom das matérias primas para fazer mínimas concessões que já foram amplamente retiradas das massas e abriram espaço para a direita com sua política de conciliação permanente. Se voltamos mais atrás na história, ela é sempre marcada por grandes impactos internacionais de processos de um país para os outros, o Brasil não é uma ilha.

Esse é mais um fundamento da nossa Rede Internacional do Esquerda Diário, que está em 14 países, 7 idiomas, com milhares de correspondentes em 350 cidades do mundo, trazendo a luta de classes internacional na sua mão, para você ser sujeito dela no Brasil, começando pela difusão destes processos e dos debates teóricos, estratégicos e políticos que os movimentos revolucionários fazem em todo o mundo.

Você não vai encontrar em nenhuma outra imprensa oficial e nem mesmo em qualquer site ou mídia do campo “progressista” tamanha cobertura dos processos da luta de classes internacional. Somente o Esquerda Diário traz a luta de classes internacional na sua mão e isso ajuda a preparar-nos para quando esses processos se derem no Brasil.

A luta de classes na sua mão é a defesa da auto-organização

A tradição revolucionária deixada por Marx e Engels se fundamenta na ideia de que o motor da história é a luta de classes. No “Manifesto do Partido Comunista”, sintetizaram da seguinte maneira: “Homem livre e escravo, patrício e plebeu, barão e servo, burgueses de corporação e oficial, em suma, opressores e oprimidos, estiveram em constante oposição uns aos outros, travaram uma luta ininterrupta, ora oculta ora aberta, uma luta que de cada vez acabou por uma reconfiguração revolucionária de toda a sociedade ou pelo declínio comum das classes em luta”. Essa ideia se conecta de maneira indissociável ao papel da única classe com potencial revolucionário de transformar o conjunto da sociedade em perspectiva socialista: a classe trabalhadora.

Mas, para cumprir esse papel histórico para a humanidade, é uma classe que precisa superar a sua alienação, tomar consciência de classe e se organizar. Organizar-se em partido, organizar a sua própria imprensa operária e mídia independente e se auto-organizar em base à estratégia soviética. Foi ligado a esse sentido profundo que Marx e Engels definiram que “a emancipação dos trabalhadores será obra dos próprios trabalhadores”. Este que se tornou um dos lemas da Primeira Internacional, a Associação Internacional dos Trabalhadores, fundada em 1864.

Considerar que a luta de classes está na sua mão também tem esse sentido de não enxergarmos a história se movendo e dando os seus giros decisivos devido às intenções meramente de alguns indivíduos. Não se pode ter nenhuma ilusão que um governo Lula iria enfrentar a extrema direita. Nem que parlamentares “de esquerda” possam evitar mais ataques. Nem um pequeno partido com figuras públicas que falem em nome do “comunismo”, enquanto representam sua negação (o stalinismo), como são a UP e PCB. É somente a luta de classes e a classe trabalhadora atuando como sujeito coletivo, junto ao conjunto dos movimentos sociais, que pode dar uma saída para a crise pela esquerda.

Isso se condensa no que chamamos de estratégia soviética, na auto-organização, que é também colocar a luta de classes em nossas mãos. Trata-se de um elemento que é fundamento da estratégia marxista desde Marx, passando por Lenin e que Trotski desenvolveu, mas que toda a tradição eleitoralista “social-democrata” e tradição stalinista apagaram da história e buscaram negar, tanto em sua análise da luta de classes, quanto em sua prática política nos dias de hoje.

Nós lutamos pela construção de um partido revolucionário, mas de tipo completamente diferente dos que se apresentam no Brasil, onde não há nenhum partido que coloque no centro a estratégia de impulsionar a auto-organização da classe trabalhadora e das massas. Somos um partido que aposta em se fundir com a auto-atividade da vanguarda e das massas em meio às situações revolucionárias. No Brasil temos a tradição “social-democrata” petista, que o PSOL repete. E a tradição stalinista, na sua versão abertamente eleitoralista e em crise do PCdoB, e outras tentativas de renovação da UP e PCB. E temos também o PSTU e PCO, que são da tradição trotskista mas não se diferem das demais na ausência de uma batalha pela estratégia soviética.

Como dizemos no livro Estratégia Socialista e Arte Militar: “Apesar de suas diferenças, estes modelos têm um ponto em comum no que diz respeito à relação entre o partido e as massas: a classe é uma “massa de manobra” (seja no sentido eleitoral, sindical, militar, ou plebiscitária) de uma direção ou de um “líder”. O “modelo” leninista – não o da caricatura, mas sim o que ficou plasmado na história do Partido Bolchevique antes de sua burocratização – parte de uma aproximação oposta, a classe não é “massa de manobra”, mas sim sujeito de auto-atividade e auto-organização. Daí que, ao contrário dos outros modelos, assumam um papel-chave o partido e seus quadros na relação com o movimento de massas.” Ou seja, nenhum dos partidos no Brasil estabelece uma relação com as massas apostando nelas como sujeito de sua emancipação.

Nosso chamado a colocar a luta de classes na sua mão tem esse sentido de confiarmos na sua força como indivíduo para ser parte de um processo de conformação de um sujeito coletivo na luta de classes, construindo organismos de base para a luta, que enfrentem e superem as burocracias de todo tipo. Nossa inspiração não é somente os soviets na Rússia, mas os diversos organismos que surgiram em uma série de processos revolucionários, como foram as Juntas na revolução espanhola nos anos 30, os Cordões Industriais no Chile e que no Brasil surgiram incipientemente em vários momentos, como por exemplo na Revoada das Galinhas Verdes em 1934 ou na Rebelião dos marinheiros de 64 porque as direções burocráticas do PCB por longo período, e do PT depois, bem como todas as variantes derivadas desses grandes partidos, sempre se opuseram a potencializar essa auto-organização pela base.

É mais chamativo ainda que as correntes que se reivindicam trotskistas tenham abandonado a estratégia soviética, pois Trotski foi um dos seus principais impulsionadores e inclusive avançou sobre este tema teoricamente pensando como os revolucionários deveriam construir “comitês de ação” na França na década de 30, como preparatórios dos organismos de tipo soviético, como explicamos nesse artigo. Esse tipo de organização prévia a situações revolucionárias é o que impulsionamos no Chile com o “Comitê de Emergência e Resguardo”, na França na greve dos transportes em 2020 ou na Argentina nas lutas recentes e em Zanon. São exemplos como esse que queremos levar à frente no Brasil e criar uma nova tradição no movimento operário do país que coloque a luta de classes na sua mão, com a auto-organização.

Esses organismos de tipo soviético, de auto-organização, não são somente os organismos mais democráticos e eficazes para em cada luta superar as burocracias e vencer. Eles são parte integrante da estratégia marxista de preparação da tomada do poder pelos trabalhadores. Sem as massas auto-organizadas, não basta ter um partido revolucionário. Mesmo que em algumas situações históricas ao longo do século XX tenha sido possível tomar o poder sem organismos de auto-organização e partidos revolucionários, a ausência desses fatores cruciais (partido e soviete) marcaram profundamente o caráter desses Estados Operários, que já nasceram deformados burocraticamente e por este fator não foram parte de engrenagens da internacionalização da revolução socialista e em perspectiva do comunismo. Ao contrário, atuaram nos processos revolucionários que ocorreram no sentido de contê-los, bloqueando a dinâmica expansiva da revolução internacional e depois foram a força principal para a restauração do capitalismo na esmagadora maioria dos Estados operários degenerados e deformados.

Na estratégia marxista é indissociável a relação entre partido revolucionário e organismos de auto-organização das massas. Marx e Engels não chegaram a ver o surgimento de organismos de auto-organização no sentido pleno de frente única como se deu na Russia em 1905, que será o primeiro de vários processos onde vão se expressar posteriormente. Este elemento novo passa a compor organicamente a teoria de construção de partido leninista de combate, integrando na estratégia de construção de partido revolucionário a relação democrática com organismos de auto-organização das massas. A negação dessa concepção soviética da revolução e da própria concepção de Estado de transição socialista marxista, que está plasmada n’O Estado e a Revolução de Lenin e diversas outras obras clássicas, foi parte fundamental da degeneração stalinista da revolução russa e de todas as experiência do que ficaram chamadas de “socialismo real”.

Essa concepção foi tão abandonada, que até mesmo experiências de tímido nacionalismo burguês como Hugo Chavez, passaram a ser reivindicadas por setores da esquerda como exitosa administração do Estado e como se fosse algum tipo de início de transição socialista ou de um suposto “poder popular”. Nada mais falso. Não existirá transição socialista sem que a classe trabalhadora e as massas assumam a luta de classes em suas mãos, se auto-organizem, se enfrentem e superem todo tipo de burocracias e caudilhos e dirijam seu próprio Estado em base à democracia operária. Somente uma revolução desse tipo pode de fato avançar em um sentido comunista, que não tem nada a ver com qualquer tipo de militarismo estatista e exaltação de Estados fortes bonapartistas como “mal menor” frente ao imperialismo”.

Isto é a negação do comunismo, pois este só pode ser alcançado com a luta de classes internacional do proletariado e sua auto-organização e avanço de consciência socialista e em perspectiva comunista, que tenha como objetivo o fim das classes sociais e, consequentemente, o fim do Estado e das fronteiras nacionais. Desse ponto de vista histórico mais profundo, tomar a luta de classes nas suas mãos, aponta para a luta por uma nova sociedade onde não vai mais ser necessária a luta de classes e a humanidade vai poder viver uma vida plena de sentido e ter uma relação harmônica do homem com a natureza.

Esses são os fundamentos mais profundos do nosso leninismo do século XXI e desse projeto do Esquerda Diário, que inicia nova etapa em 15 de julho e chama você a colocar a luta de classes na sua mão.


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