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CINEMA | Infiltrado na Klan: o racismo dos anos 1970 e de hoje, por Spike Lee

Antes de tudo é preciso avisar que esse texto possui Spoilers. Mas se por um acaso você deixar de lê-lo por esse motivo já direi o mais importante: assista Infiltrado na Klan!

Gabriela FarrabrásSão Paulo | @gabriela_eagle

segunda-feira 21 de janeiro de 2019 | Edição do dia

Spike Lee está de volta e veio com uma obra prima. A primeira pessoa que me falou de Infiltrado na Klan me contou a sinopse por cima: um filme sobre um policial negro que se infiltra na ku klux klan; um filme aflitivo. Ela declarou o filme como um filme aflitivo, mas ele foi classificado como uma comédia; isso porque Spike Lee é um mestre em construir obras que embaralham as classificações e borram as linhas de delimitação entre um gênero e outro - nisso também temos a mão de Jordan Peele, diretor de Corra!, que participa da produção junto de Lee.

Outra característica marcante do cinema de Spike Lee é a estética, o enquadramento dos personagens negros de maneira central como um retrato, a quebra da quarta parede, a mistura entre ficção e documentário - novamente a mistura entre gêneros, agora para além do conteúdo, em sua estética.

O filme baseado em uma história real se passa no final dos anos 1970 e acompanha a história de Ron Stallworth (interpretado por John David Washington), primeiro policial negro do Colorado - isso bastaria para que o conflito estivesse dado, pois Ron acredita poder combater o racismo estando dentro de uma das instituições mais racistas. Mesmo antes de ser um policial infiltrado Ron já é visto e se sente como um por ser um negro na polícia.

Spoiler importante: Spike Lee não passará pano para a polícia como instituição nesse filme, e, mais do que isso, explicita aqui os limites que será imposto mesmo quando de salvam alguns poucos membros bem intencionado, mostrando que não é por dentro dessa instituição que as coisas serão mudadas, como coloca a personagem Patrice (interpretado por Laura Harrier), presidente do Grêmio estudantil negro com quem Ron se envolve.

Ron já no setor de inteligência da polícia decide ligar para um telefone da Ku Klux Klan e no discurso racista convence os membros de que é um cidadão americano branco autêntico - outra palavra pra racista -, em parceria com um policial judeu, Flip Zimmerman (interpretado por Adam Driver), eles vão se infiltrando mais e mais nessa organização racista que queima cruzes para amedrontar militantes negros, que pregam o ódio e o racismo na defesa de uma América próspera aos autênticos cidadãos americanos - sim, esse discurso se assemelha muito ao discurso de Trump, mas não é uma forçação de barra que torna o discurso semelhantes, mas o simples fato de que o racismo do final dos anos 70, da Ku Klux Klan, é o mesmo racismo da política de Trump, 40 anos depois; nada mudou. Isso fica evidente ao fim do filme quando são mostradas filmagens reais de David Duke, apresentado no filme como o grã mestre da Ku Klux Klan (interpretado por Topher Grace, discursando em defesa de Trump no ato de Charlottesville).

O discurso de Kwame Tree (interpretado por Corey Hawkins), um pantera negra, sobre o poder de se reconhecer negro e a revolução, a história do jovem enforcado e queimado por um crime que não cometeu em um verdadeiro show de horrores em praça pública, as cenas do filme O nascimento de uma nação, em que negros são retratados como bestas são todos trunfos poderosíssimos de Infiltrado na Klan.

Pegar uma história ambientada no fim dos anos 70, a possibilidade que estava dada de a Ku Klux Klan se infiltrar nos meios de poder políticos, fazer a ponte dessa história com o presente momento é o golpe de mestre dessa obra prima de Spike Lee, pois escancara o que nunca deixamos de repetir: nada mudou e nada mudará enquanto esse sistema racista existir.


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