×

FRANÇA | Hollande tenta evitar a unidade entre estudantes e trabalhadores

A jornada do dia 9 de março foi bem-sucedida, com milhares de trabalhadores e jovens participando dos bloqueios desde as primeiras horas da manhã, saindo às ruas e fazendo assembleias gerais.

Juan ChingoParis | @JuanChingoFT

sexta-feira 11 de março de 2016 | 00:00

Tradução do espanhol: Cassius Vinicius

O começo da construção de um grande movimento social

A jornada de mobilização de quarta-feira (09/03) foi um êxito. Ainda estamos longe do ponto culminante da mobilização contra o “Contrato do Primeiro Emprego”(CPE) em 2006, como algumas pessoas deliberadamente nos fizeram pensar, depois das milhares de assinaturas recolhidas contra a lei trabalhista. Mas seria pouco inteligente relaxar sobre o assunto, pelo fato de não ter acontecido, como parece ser o caso dos integrantes do Executivo que estavam mais assustados. Como foi dito na assembleia dos estudantes de Paris1/Tolbiac: “Esta jornada de mobilização não é nada mais que um começo”.

Mas o que surpreende é a rapidez em que a mobilização se constrói. O que durante a manifestação contra o CPE demorou mais de dois meses – depois de um forte isolamento daqueles que estavam contra a lei e procuravam com dificuldade mobilizar os estudantes -, dessa vez levou apenas duas semanas. Diferente de outros movimentos sociais bem-sucedidos das últimas décadas, esse movimento desde o principio começou com uma forte tendência a unidade dos estudantes, secundaristas e trabalhadores que hoje marcharam juntos pelas ruas de Paris e em outras 230 cidades francesas.

Em 1995, os trabalhadores aderiram a luta quando a mobilização estudantil já estava no final e em 2006 as semanas de agitação estudantil obrigaram as Confederações Sindicais a se unirem a luta dos estudantes contra o CPE.

Ao mesmo tempo, é preciso levar em contra que vários setores da Confederação Francesa Democrática do Trabalho (CFDT) participaram da mobilização e que sua base está em ebulição, que se evidenciará pela firmeza durante a negociação que deve demonstrar o secretario geral dessa central (a segunda em número de filiados na França), Laurent Berger, que até agora tinha apoiado todas as reformas do governo do Partido Socialista (PS), sem vacilar. Isso se confirma na marcha chamada pelas centrais “reformistas” para este sábado (12/03), especialmente pela CFDT, que exigia há dez anos atrás a remoção do teto das indenizações nos tribunais do trabalho. De agora em diante, essa será uma pré-condição.

Por último, as assembleias e organizações estudantis fazem um chamado a uma nova mobilização na quinta-feira (17/03): o fantasma de um movimento estudantil e secundarista continua presente, como um pesadelo, para todo o poder executivo na França.

Hollande está obrigado a fazer fortes concessões...

O presidente francês, François Hollande cometeu um erro de cálculo com o conteúdo e a apresentação da reforma trabalhista, uma “reforma a mais” que ressaltou todos os descontentes contra o seu governo desde o inicio de seu mandato quinquenal (cinco anos), principalmente sobre sua antiga base eleitoral. Agora o presidente francês procura evitar que isso se concretize e recaia sobre si próprio e seu primeiro ministro. Dessa maneira, depois de ter anunciado uma prova de forças ao parlamento com o recurso bonapartista do articulo 49.3, postergou sua apresentação no Conselho de ministros que deveria ter feito nessa quarta-feira, e abriu uma mesa-redonda com os chamados “parceiros sociais”, os sindicatos e as federações patronais.

Depois das grandes manifestações do dia 9 de março, Hollande se vê obrigado a fazer fortes concessões sobre o conteúdo da lei. Esse retrocesso é indispensável para que uma lei de reforma trabalhista menos ambiciosa passe pelo parlamento, onde os deputados da maioria não votariam se não tiverem a afluência da CFDT. A partir dai, seria possível alterar profundamente vários pontos importantes da reforma, como por exemplo, sobre as indenizações dos tribunais de trabalho, a facilitação das demissões econômicas e a liberdades adicionais para as patronais no que concerne a flexibilidade.

...para evitar o “Tous ensamble”(todos juntos)

Mas o verdadeiro medo do Executivo é que o movimento se concretize em um “Tous ensemble”(todos juntos) dos estudantes, secundaristas e o conjuntos dos sindicatos nas ruas, obrigando a direção da CFDT a aderir a mobilização se o governo não retroceder o suficiente. Laurente Berger, apesar de seu papel abertamente colaboracionista parece, no momento, pouco inclinado a eliminar seus antigos sucessores na central, Nicole Notat e François Chereque, repudiados por setores importantes de sua base nos movimentos sociais de 1995 e 2003 contra a reforma Fillon, que inclusive levaram a importantes rupturas da central sindical reformista. Ele está consciente que sua política de dialogo social com um governo tão impopular compensa cada dia menos, vendo-se obrigado a brandir a ameaça da mobilização (embora essa perspectiva tampouco o agrade).

Como destaca Cecile Cornudet do jornal patronal Les Echos: “Para os chegados do chefe de Estado, não há mais caminhos. É preciso retroceder. Estamos em um tobogã. A questão é como agir a partir de hoje até segunda-feira para que não se desenvolva uma mobilização, como se fosse uma bola de neve”, disse um hollandista do primeiro escalão. A possibilidade de redigir o texto que está sobre a mesa, até agora está excluída pelo primeiro ministro. Até onde se pode chegar? Deve-se entregar para a CFDT o que está pedindo em relação aos tribunais de trabalho? Será o suficiente?

O menu do almoço entre Hollande e Valls na quinta-feira no palácio do Eliseu será abundante. E há o risco de terminar mal para o primeiro ministro, que havia deixado que o limite sobre as indenizações nos tribunais de trabalho fosse seu cavalo de batalha, como símbolo reformador. “Essa medida é esperada pelos líderes de empresas, as adaptações são possíveis sem colocar em questão o princípio”, explicou no Le Journal du Dimanche (Jornal de Domingo-JDD). Como diz o título matéria: “Valls saberá admitir seu erro?”.

Ainda estamos por ver mais dessa situação, mas não podemos excluir sua renuncia para ficar com a bandeira reformista, o único capital eleitoral desse pretendente Massimo D’Alema francês (aquele dirigente do ex Partido Comunista Italiano que levou até na simbologia a transformação burguesa do antigo partido estalinista, formando o Partido Democrático da Esquerda e mais tarde, o Partido Democrata, como Valls aspira fazer com o atual Partido Socialista).

A única certeza, é que essa primeira ação foi uma advertência suficientemente forte para fazer que o governo se decida depressa sobre o conteúdo da lei trabalhista; com o intuito de boicotar o verdadeiro teste que será as próximas semanas e especialmente a jornada do dia 31 de março, chamada pelo Confederação Geral do Trabalho e demais sindicatos contestatários. Se for amplamente bem-sucedida, a jornada pode gerar a perspectiva de uma greve geral política pela derrota do governo e de seus planos de reforma trabalhista.

As tarefas do momento

O fantasma do “tous ensemble” assusta dirigentes do Eliseu. Assim, além das manobras do Executivo, será a construção consequente de uma mobilização nas ruas que determinará o resultado; como também a massificação através da multiplicação das assembleias gerais nos lugares de trabalho e estudo e a coordenação dos combatentes, como ocorre nos chamados em algumas universidades.

Um programa ofensivo de luta que parta da remoção da reforma trabalhista, ao mesmo tempo em que responda as necessidades postergadas de milhões de desempregados, a fúria dos precarizados e o sofrimento no trabalho do conujunto dos trabalhadores, incluindo os “supostos” privilegiados que disfrutam de um Contrato de Duração Indeterminada (CDI) ou de algum outro regime especial. São esses que estão estrategicamente na linha de fogo com a degradação do CDI da atual reforma ou os duros discursos da direita contra os privilégios dos trabalhadores ferroviários da Société Nationale des Chemins de fer Français – SNCF (empresa ferroviária francesa), assim como o plano de reduzir os funcionários públicos, como propõe Sarkozy ou Juppe, caso a direita chegue ao governo em 2017.

Em um sistema capitalista em crise, não há a mínima margem para um sindicalismo de “acompanhamento”. Ou retornamos às condições de trabalho do século XIX ou que a crise seja paga por aqueles que a criaram, ou seja, os capitalistas; esse é o verdadeiro dilema que atravessa todas as camadas dos trabalhadores.

É fundamental alcançar a unidade, não somente para que não volte a perspectiva repulsiva da brutal escravidão salarial de nossos ancestrais, mas também para começar a organizar a vida econômica e social de forma racional, deixando tempo livre para o desenvolvimento humano de todos, já que nossas vidas valem mais que seus lucros.




Comentários

Deixar Comentário


Destacados del día

Últimas noticias