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A VIAGEM DO PAPA | Francisco mostra ao mundo sua aliança com Obama

O encontro do Papa com Obama na Casa Branca serviu para afirmar a agenda comum entre o Vaticano e o governo estadunidense centrada no avanço nas relações com Cuba, a imigração e o meio ambiente.

sexta-feira 25 de setembro de 2015 | 04:46

Fotografia: REUTERS

Assim a visita de Francisco aos Estados Unidos se insere na campanha eleitoral desse país. A visita culminou com um discurso frente aos bispos estadunidenses onde Francisco reconheceu os escândalos por abusos sexuais.

Frente a um grande público de convidados nos jardins da Casa Branca, na manhã de quarta-feira (23), se deu o esperado encontro entre o Papa Francisco e o presidente Barack Obama. Depois de uma entrada com ares hollywoodianos, chegaram os discursos que confirmaram o bom momento que vive a relação entre o Vaticano e a Casa Branca, que leva a definir o Papa como o “principal aliado de Obama no mundo”, segundo comentam funcionários do governo estadunidense.

Em seu discurso, Obama ressaltou várias ideias em comum com o Papa e aproveitou para confirmar que compartilha sua preocupação pelo meio ambiente e o tema migratório (casualmente, duas iniciativas políticas impulsionadas pelo presidente e freadas no Congresso pela oposição republicana), e agradecer por sua ajuda para facilitar o restabelecimento das relações diplomáticas com Cuba.

Bergoglio, por sua vez, mostrou um apoio explícito à agenda política do governo dos Estados Unidos. “Como filho de uma família de imigrantes, me alegra estar neste país, que foi construído em grande parte por tais famílias”, começou dizendo o Papa em uma mostra de apoio à reforma migratória, para continuar qualificando como promissora a iniciativa de Obama para reduzir a contaminação. Não faltou uma alusão ao “degelo” com Cuba; Bergoglio ressaltou “os esforços realizados recentemente para consertar relações quebradas e abrir novas portas”, que dias atrás afiançava sua aliança com a burocracia castrista.

Se nos dias anteriores alguns se perguntavam se Bergoglio ia deter-se nos excessos do capitalismo, na questão racial ou sobre a crise humanitária (cujas consequências se vê na crise migratória na Europa) que produziram as guerras, em especial no Oriente Médio onde a ingerência dos Estados Unidos é forte, nada disto aconteceu. Pelo contrário, Bergoglio passou por algumas diferenças com Obama, ao se referir a sua participação no encontro das famílias na Filadélfia, ressaltando que o objetivo é “celebrar e apoiar a instituição do casamento e da família” contra o apoio do presidente estadunidense ao casamento igualitário e ao direito ao aborto. Também aproveitou para fazer alusão às polêmicas pela reforma na saúde conhecida como “Obamacare”, que obriga inclusive as estruturas religiosas a garantir a saúde reprodutiva de suas empregadas (algo que é lido por Vatican Insider, sugestivamente, como "seguros por aborto").

Bergoglio confirmou no ato da Casa Branca sua aliança com o presidente da maior potência mundial. Uma aliança que Obama e os Democratas saúdam frente às batalhas contra os opositores Republicanos no congresso, que mantêm paralisadas várias iniciativas do executivo, e frente às eleições presidenciais.

Depois de seu encontro com Obama, a agenda da viagem levou Bergoglio a um encontro com os bispos dos Estados Unidos. Os assessores do Papa descreveram este encontro como um dos mais difíceis de sua visita ao país, pela firme tendência conservadora da cúpula eclesiástica norte-americana.

Neste encontro Bergoglio deixou uma das frases que teve grande repercussão, ao se referir aos casos de abuso de menores, “sou consciente da valentia com a qual enfrentaram momentos escuros de sua história eclesial (…) Sei o quanto pesou em vocês a ferida dos últimos anos, e acompanhei seu generoso compromisso para curar as vítimas (…) e para continuar atuando para que tais crimes não se repitam nunca mais”. Os meios de comunicação ressaltaram o final da frase, mas lida de conjunto, mostra um forte apoio do Papa às autoridades da Igreja local enquanto as denúncias pelos abusos ainda continuam sem ser investigados pelas autoridades do Vaticano como denuncia a Rede SNAP (Rede de Sobreviventes de Abusados por Sacerdotes) em um comunicado que diz “em declarações cuidadosamente elaboradas, Francisco clama que funcionários da Igreja estão trabalhando ‘para garantir que não se repitam estes crimes’, ele sabe, no entanto, que isto é falso. Estes crimes estão acontecendo neste momento, em todo o mundo”.

Bergoglio aproveitou a ocasião para traçar uma linha de ação para que a Igreja norte-americana recupere sua autoridade e expanda sua influência. Aconselhou os bispos a seguirem seus passos: utilizar seus gestos e discursos para mostrar uma instituição que faz eco das demandas sentidas por setores populares para fortalecer a Igreja como mediação, sem que isto implique abandonar seu caráter obscurantista e conservador. Foi claro quando disse “As vítimas inocentes do aborto, as crianças que morrem de fome ou sob as bombas, os imigrantes que se afogam buscando um amanhã…Não é lícito, portanto, evitar tais questões ou fazê-las ficar em silêncio” ao mesmo tempo que lhes lembrava que terá tempo “no próximo Encontro Mundial das Famílias na Filadélfia” para se referir a temas como a luta contra o aborto ou os casamentos entre pessoas do mesmo sexo.

Bergoglio terminou a reunião com os bispos dando uma recomendação sobre os imigrantes “nenhuma instituição estadunidense faz mais pelos imigrantes que suas comunidades cristãs. Agora têm esta grande onda de imigração latina em muitas de suas dioceses… Portanto, os acolham sem medo. Ofereçam a eles o calor do amor de Cristo”.

Esta recomendação de Bergoglio aos bispos, junto aos gestos realizados, como a controvertida canonização do padre franciscano Junipero Serra (que várias organizações de nativos norte-americanos rechaçaram pela situação de abuso que se vivia em suas missões), e a apresentação na Casa Branca como “um filho de família imigrante”, mostram o interesse do Papa em conseguir que a Igreja estadunidense vá se transformando em porta-voz dos milhões de imigrantes, em especial os latinos, que cada vez têm maior peso político e social no país.




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